“O Baixinho”, “o gênio da grande área”, um dos maiores atacantes da história do futebol mundial, craque da Copa de 1994 e reconhecido como o melhor jogador do mundo naquele ano, ou simplesmente “o cara”, segundo sua própria definição. “Quando nasci, papai do céu apontou para mim e disse: este é o cara.” Romário de Souza Farias chega aos 50 anos de idade, nesta sexta-feira (29), marcados pelos dribles que deu na pobreza, pelas arrancadas que o fizeram construir uma carreira longa e de sucesso como atleta e por uma guinada surpreendente em sua vida: a troca dos gramados, da areia e do futevôlei pelos corredores do Congresso Nacional.
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Na próxima segunda-feira (1º), Romário também comemora cinco anos de mandato parlamentar. Mais tempo, por exemplo, do que suas passagens por Barcelona, Flamengo ou Fluminense, alguns dos clubes que defendeu. A familiaridade com o novo palco, os atuais colegas e o figurino está longe de ser a que tinha nos gramados, com os ex-companheiros, o uniforme esportivo e a bola. Uma coisa, porém, o terno e a gravata não mudaram nele: “o cara” continua polêmico.
Na Câmara, onde passou quatro anos, ou no Senado, no qual vai para o segundo, Romário também marcou seus gols. No ano passado, foi o segundo senador mais bem avaliado pelos internautas no Prêmio Congresso em Foco. Sempre entre os mais assíduos, apresentou dezenas de propostas legislativas, várias delas de grande impacto social.
Defendeu bandeiras como a ampliação dos direitos das pessoas com deficiência e o incentivo ao esporte. Foi ao ataque contra a organização da Copa do Mundo no Brasil e dirigentes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), como o ex-presidente José Maria Marin, hoje em prisão domiciliar nos Estados Unidos, e o atual, Marco Polo Del Nero, ambos envolvidos no mais rumoroso escândalo de corrupção do futebol mundial.
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Mas o craque da seleção brasileira, com passagens marcantes pelo Vasco da Gama e pelo PSV, da Holanda, também se viu em meio a controvérsias na política. Seja por suas declarações ou por eventuais contradições. A mais recente delas contribuiu para que o senador fosse afastado da presidência do PSB no Rio de Janeiro. O jornal O Globo revelou, em dezembro, que um dos assessores dele, Wilson Musaer Junior, é réu por homicídio, formação de quadrilha e ocultação de cadáver na Justiça fluminense. Depois que o fato veio à tona, o presidente nacional do partido, Carlos Siqueira, tirou do cargo não apenas Romário como todos os funcionários indicados por ele.
Pouco antes disso, as gravações que levaram o senador Delcídio do Amaral (PT-MS) à prisão trouxeram à tona novamente a polêmica sobre a existência de uma conta no exterior não declarada pelo “Baixinho” à Receita. No áudio, Delcídio e Edson Ribeiro, então advogado do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, comentaram que Romário desistiu de disputar a prefeitura do Rio para apoiar a candidatura de Pedro Paulo (PMDB) à sucessão de Eduardo Paes (PMDB) em troca de ocultação de uma conta dele na Suíça.
O ex-jogador havia negado ser dono da conta com saldo de quase R$ 7,5 milhões após reportagem da revista Veja no meio do ano. Viajou até a Suíça para buscar na instituição financeira o comprovante de que não tinha dinheiro por lá. Após a divulgação do áudio de Delcído e Edson Ribeiro, ele admitiu em entrevista ao jornal O Globo que já havia sido correntista do banco suíço BSI na época em que jogava na Europa. Diante disso, Romário pediu que o Ministério Público investigasse o caso.
O BSI foi comprado por André Esteves, que deixou a presidência BTG Pactual após ser preso no mesmo dia em que Delcídio e o advogado de Cerveró, todos acusados de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato. O senador, no entanto, nega ter acertado apoio à candidatura peemedebista.
O craque e as urnas
Essas polêmicas abalaram a pré-candidatura de Romário à prefeitura. A disputa pelo cargo era uma vontade antiga do senador, tanto que ele chegou a brigar com o PSB e a se desfiliar do partido quando era deputado, em 2013. Só voltou para a sigla um mês depois, na condição de presidente do diretório regional.
Romário disse ao Congresso em Foco, por meio de sua assessoria, que vai priorizar o mandato no Congresso, onde tem sido um político aplicado. No Senado, esteve presente em todas as sessões destinadas a votação, as únicas em que o comparecimento é exigido, em 2015. Foram mais de 120 sessões deliberativas. Como deputado, sua média de presença também foi das mais altas: 93,6% ao longo dos quatro anos.
A troca de uma Casa pela outra ocorreu em grande estilo: tornou-se o candidato eleito com maior votação no Rio de Janeiro, com 4,6 milhões de votos (63,4% dos votos válidos), impondo derrota humilhante ao ex-prefeito da capital fluminense César Maia (DEM), que recebeu apenas 20% dos votos.
Cartão amarelo
Em sua estréia como senador, Romário se envolveu em polêmica já na véspera da posse. Anunciou que votaria em Renan Calheiros (PMDB-AL), para presidente da Casa, contrariando a orientação de seu partido, que decidiu apoiar a candidatura alternativa de Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC).
Ele comunicou ao PSB que votaria em Renan por ter se comprometido com o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, e com o prefeito da cidade, Eduardo Paes. Sua sigla, no entanto, havia fechado questão para apoiar o catarinense. Pressionado pelo partido, Romário anunciou que refletira melhor e que votaria em Luiz Henrique. A votação para os cargos de direção do Senado é secreta.
No Senado, ele acumula dois cargos importantes: o de presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, e da CPI do Futebol. Em dezembro, ao interrogar na CPI Marco Polo Del Nero, a quem chamou de “câncer do futebol”, foi direto ao assunto: “O senhor é corrupto? A CBF é uma instituição corrupta?”. O ex-jogador questionou o dirigente sobre pagamentos de propina na Copa América e a distribuição de lucros no COL (Comitê Organizador Local) da Copa do Mundo de 2014, temas investigados pela CPI.
Gols no Congresso
Como a maioria dos parlamentares, inclusive com muito mais tempo de Casa do que ele, Romário ainda não conseguiu converter seus projetos em lei. Mas comemorou como o seu primeiro gol a inclusão, em 2011, de uma emenda em uma Medida Provisória para beneficiar pessoas com síndrome de Down. O interesse dele pelo assunto tem um nobre motivo familiar: sua filha, Ivy. Em março do ano passado, quando ela completou dez anos, o “Baixinho” foi às redes para publicar uma declaração de amor à filha: “A Ivy colocou a síndrome de Down na pauta da mídia e aos poucos foi mudando a forma como as pessoas a enxergam. Sua estrela brilha muito além do seu ciclo familiar e é essa luz que vem me guiando há algum tempo. Na prática, Ivy me colocou no eixo correto”.
Já no primeiro ano de Senado Romário apresentou mais de 100 proposições. Entre elas, 39 projetos de lei (confira a lista completa), média de praticamente um por semana, de acordo com o calendário do Congresso. O senador propôs, por exemplo, que os processos penais dos crimes de corrupção sejam julgados com prioridade, que a divulgação de fotos ou vídeos com cena de nudez ou ato sexual sem autorização da vítima seja enquadrada como crime e que os “encoxadores” de ônibus e metrô sejam punidos com prisão e multa e que seja obrigatória a criação de vagões só para mulheres.
Romário também quer tornar crime, passível de três meses a um ano de prisão, a chamada “carteirada” – uso do cargo por funcionário público para obter vantagem ou privilégio.Também sugeriu a extensão do seguro de vida e acidentes para atletas em competições internacionais e a reserva de vagas nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio para pessoas com deficiência.
“Porra nenhuma”
Romário também é considerado um dos políticos com melhor inserção nas redes sociais, espaço em que também acumulou polêmicas. Com cerca de 2,3 milhões de seguidores no Facebook, está atrás apenas de Aécio Neves (PSDB-MG), que disputou a Presidência em 2014. Como deputado, ele usou as redes para explicar por que havia se recusado a fazer teste de bafômetro após ser parado em uma blitz no Rio.
Ainda na Câmara, usou o Twitter para criticar abertamente a paralisia na Casa. Dizendo-se “puto”, protestou que não tinha “porra nenhuma” para fazer em Brasília. “Tem absurdo que só acontece na política brasileira, principalmente na Câmara. Acredito que seja por falta de objetividade e de sensatez que algumas coisas lamentáveis acontecem no nosso país. A PEC 300 (que estabelece piso salarial para policiais nos estados) também não foi votada. Tem greves acontecendo, pessoas morrendo e lojas sendo saqueadas. Nós políticos somos culpados mesmo”, escreveu na ocasião.
Procurado pelo Congresso em Foco, Romário não quis comentar o aniversário de 50 anos e os seus cinco anos de atividade parlamentar.