Na denúncia encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, acusa o candidato à presidência do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) de ter cometido três crimes: peculato (desvio de dinheiro público ou bem público por funcionário público), falsidade ideológica e uso de documento falso. A revista Época teve acesso à denúncia, revelada em primeira mão pelo Congresso em Foco no último sábado (26), que aponta o uso de notas fiscais frias para comprovar que tinha renda suficiente para cobrir despesas da mãe de sua filha.
Favorito para voltar à presidência do Senado, Renan também é acusado, na denúncia, de ter desviado R$ 44,8 mil do Senado, por meio da chamada verba indenizatória, benefício ao qual os parlamentares têm direito para cobrir despesas associadas ao mandato. A punição para esses três crimes varia de cinco a 23 anos de prisão, além de pagamento de multa.
Em 2007, Renan deixou a presidência do Senado após sofrer uma série de denúncias. Entre elas, a de que o lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior, pagava R$ 16,5 mil mensais à jornalista Mônica Veloso, com quem o senador tem uma filha. Segundo a revista Veja, entre 2004 e 2006, a empreiteira recebeu R$ 13,2 milhões em emendas parlamentares de Renan destinadas a uma obra no Porto de Maceió.
PublicidadeAo defender-se no Conselho de Ética, Renan apresentou documentos bancários e fiscais para comprovar que tinha recursos suficientes para cobrir as despesas com a filha, graças aos rendimentos provenientes da venda de gado. Para o procurador-geral da República, uma série de irregularidades na documentação apresentada pelo senador apontam fortes indícios de que ele falsificou e apresentou esses papéis em sua defesa.
“Em síntese, apurou-se que Renan Calheiros não possuía recursos disponíveis para custear os pagamentos feitos a Mônica Veloso no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, e que inseriu e fez inserir em documentos públicos e particulares informações diversas das que deveriam ser escritas sobre seus ganhos com atividade rural, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, sua capacidade financeira”, afirma Gurgel. “Além disso, o denunciado utilizou tais documentos ideologicamente falsos perante o Senado Federal para embasar sua defesa apresentada (ao Conselho de Ética)”, acrescentou o procurador-geral na denúncia encaminhada ao STF.
Ainda de acordo com a revista Época, perícia realizada pela Polícia Federal nas contas do senador apontou que “os recursos indicados por Renan Calheiros como sacados em dinheiro não poderiam amparar os supostos pagamentos a Mônica Veloso no mesmo período, seja porque não foi mencionada a destinação a Mônica, seja porque os valores destinados ao denunciado não seriam suficientes para suportar os pagamentos”.
Entre os 118 cheques relacionados por Renan como fontes dos pagamentos da pensão, 66 eram destinados a outras pessoas e empresas, e outros 39 tinham como beneficiário o próprio senador. Os peritos também encontraram informações inconsistentes ao confrontar datas e quantidades de gados vendidos especificados pelo senador como fonte de seus rendimentos. Reportagem publicada pelo Congresso em Foco em 2007 já apontava nesse sentido (Exclusivo: perícia da PF derruba documentos de Renan).
Foram constatadas falhas, como falta de selos fiscais de autenticidade, campos deixados em branco e informações rasuradas. Além disso, segundo a PGR, Renan não registrou quaisquer despesas com o custeio de suas atividades como pecuarista. De acordo com Época, Roberto Gurgel também apontou inconsistências na evolução do patrimônio declarado oficialmente por Renan.
A denúncia também acusa o senador de se apropriar de recursos do Senado por meio de um empréstimo com uma empresa pertencente a um primo de Renan, Tito Uchôa, que recebia recursos do gabinete por “serviços”. “A PGR descobriu, porém, que os empréstimos não foram declarados à Receita e que o dinheiro supostamente proveniente deles ‘não transitou pelas contas apresentadas’. No papel, Renan recebia mais dinheiro da Costa Dourada do que o lucro que a empresa tinha”, afirma Época.
Em nota à imprensa, divulgada no sábado, Renan rebateu a denúncia do procurador-geral da República. Segundo o senador, ela tem “natureza nitidamente política”.