O papa Bento XVI chega ao Brasil em meio a uma cruzada contra o aborto – ou "em defesa da vida", como prefere chamar a Santa Sé. Já durante a viagem da Itália para São Paulo, ele defendeu a excomunhão de políticos mexicanos que votaram a favor da legalização da prática. Em entrevista a jornalistas que acompanharam a viagem, o papa disse que a mulher que opta por interromper a gravidez é egoísta.
Ao chegar à base aérea do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, Bento XVI continuou: "Eu estou certo de que em Aparecida, durante a conferência-geral do episcopado, será reforçada tal identidade [os valores radicalmente cristãos que, na opinião do papa, a sociedade brasileira conserva], ao promover o respeito pela vida, desde a sua concepção até o seu natural declínio, como exigência própria da natureza humana".
Mesmo antes de o líder máximo da Igreja Católica desembarcar no país, a cruzada do papa gerava polêmica. Durante a manhã de ontem, no Senado, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, criticou a postura da igreja de tentar "prescrever dogmas e preceitos de uma determinada religião para o conjunto da sociedade".
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"No Brasil, o Estado e a Igreja se separaram há séculos. Uma questão é que cada um possa se manifestar livremente sobre suas crenças e opiniões. Outra coisa é a decisão do governo do Estado brasileiro, por meio do Congresso Nacional, em relação a essas questões", disse.
Para o ministro, a discussão sobre a legalização do aborto é uma questão de saúde pública e está permeada pelo machismo. Segundo o papa Bento XVI, "é uma questão de valor e beleza da vida".
Ainda não há como medir o impacto das declarações do papa sobre as políticas públicas relacionadas ao aborto. O ministro Temporão defende a realização de um plebiscito, assim tudo seria decidido com o aval da população. Movimentos feministas, contudo, acreditam que Temporão foi precipitado ao tratar do tema durante a visita do papa.
Para elas, o interessante seria evitar a discussão durante a presença de Bento XVI no Brasil. Assim, a significativa parcela da população que é católica não tomaria partido em meio à comoção pela visita – o que certamente levaria a uma derrota dos defensores da legalização no plebiscito. (Carol Ferrare)