O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, confirmou que procurou o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero para tratar “da discordância” entre o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Secretaria de Assuntos Jurídicos da Casa Civil sobre o embargo à construção de um prédio em área nobre tombada como patrimônio histórico de Salvador, no qual o ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima admitiu ter comprado um imóvel.
Em nota divulgada na noite desta quinta-feira (24), Padilha afirma que foi informado da controvérsia que surgiu quando Geddel procurou Calero defendendo que o Iphan liberasse a construção do edifício La Vue Ladeira da Barra. O ex-ministro da Cultura entendeu a ação de Geddel como um ato de pressão política, motivada por interesses pessoais, e pediu demissão. Já o então ministro da Secretaria de Governo afirma não ter cometido qualquer irregularidade e que estava preocupado apenas com a manutenção de empregos e com o estímulo à atividade econômica. A repercussão do caso levou Geddel a deixar o cargo hoje (sexta, 25).
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“Fui informado do licenciamento de um edifício pelo Iphan, em discussão no âmbito do Poder Judiciário”, confirma Padilha, ao justificar por que procurou Calero. “Ante as decisões judiciais e a controvérsia entre os órgãos públicos federais, sugeri ao ex-ministro [Calero] que, em caso de dúvida, na forma da Lei, buscasse a solução junto à AGU (Advocacia-Geral da União)”.
Em depoimento na Polícia Federal (PF) no último sábado (19), um dia após pedir exoneração do cargo, Calero disse que, em junho deste ano, recebeu um telefonema de Geddel, pedindo-lhe para orientar a presidente do Iphan, Kátia Bórgea, a receber os advogados da construtora responsável pelas obras. Calero diz que orientou Kátia a agir conforme as normas técnicas e a legislação. De acordo com Calero, Geddel classificou a paralisação da obra de absurda, por trazer prejuízos à atividade econômica.
O ex-ministro da Cultura afirmou que Geddel ligou novamente na noite de 28 de outubro, pedindo que o Iphan homologasse a autorização para o início das obras fornecida pela Superintendência do instituto na Bahia. Segundo Calero, foi nessa conversa que Geddel disse ter um apartamento no La Vue.
Calero também informou contou à PF que esteve com Geddel no dia 31 de outubro e que este insistiu no assunto. Ele disse ainda que, mesmo não estando subordinado a Geddel, sentia-se como se devesse responder ao então secretário de Governo, por ser este um “integrante do núcleo palaciano da administração federal”.
O ex-ministro da Cultura disse que recebeu pelo menos mais uma ligação de Geddel até que, em 6 de novembro, o Padilha telefonou e argumentou que, se a questão estava judicializada, não cabia ao Iphan proferir uma decisão administrativa definitiva. Segundo Calero, o chefe da Casa Civil o aconselhou a procurar uma saída junto com a AGU. Calero afirmou que, no dia seguinte, encontrou-se por acaso com Geddel e com o secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, na antessala do gabinete da Presidência da República, e que ambos insistiram para que ele procurasse a AGU.
Calero disse ainda que o presidente Michel Temer estava a par de tudo. O ex-ministro contou que, no jantar que Temer ofereceu a senadores, no dia 16 deste mês, relatou os fatos à chefe de gabinete do presidente, Nara de Deus, antes de procurar o próprio Temer. De acordo com Calero, após ouví-lo, Temer disse que ficasse tranquilo. Calero acrescentou que, no dia seguinte (17), ao atender a um chamado do presidente, Temer disse que a decisão do Iphan criou “dificuldades operacionais ao gabinete presidencial” e deixou Geddel “irritado”. O ex-ministro da Cultura afirmou que Temer o aconselhou a procurar a advogada-geral da União, Grace Mendonça, e a procurar “construir” uma saída.
Em nota divulgada no fim da noite de quinta-feira, Grace Mendonça classifica de irresponsabilidade o envolvimento de seu nome no episódio e de insensatas as declarações atribuídas a Calero. Segundo Grace, não há possibilidade de construir qualquer solução jurídica para o caso do empreendimento imobiliário em Salvador que não seja fundamentada na Constituição e no ordenamento jurídico brasileiro.
A advogada-geral nega ter recebido qualquer orientação para direcionamento nas manifestações da AGU. “Tampouco aceitaria qualquer tipo de interferência na atuação independente e técnica do corpo jurídico da instituição. Qualquer afirmação em contrário é inverídica e leviana”, afirmou Grace, confirmando o pedido da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Casa Civil para que a AGU avaliasse uma possível divergência jurídica entre órgãos da administração. “Dirimir conflitos jurídicos é uma das funções da AGU”, disse a advogada.
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