R$ 555,6 milhões. Esse é o orçamento proposto pela Câmara Legislativa do DF a ser incluído no projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2017. O montante, superior ao orçamento total de 97% dos municípios brasileiros, é, segundo a própria CLDF, 7,06% maior que o previsto para este ano.
Em notícia publicada em seu site, a CLDF afirma que o valor proposto significa que, considerada a inflação, “não haverá aumento” em relação a 2016. Acrescenta que “normalmente” os montantes efetivamente gastos são menores que os previstos e que, no fim, a Câmara Legislativa devolve aos cofres públicos as diferenças.
Trocando em miúdos, aparentemente, a CLDF acredita que a população do Distrito Federal deveria comemorar o fato de que o Legislativo local pretende gastar R$ 555,6 milhões em 2017.
Apenas para fim de ilustração, o valor corresponde a todo o gasto previsto pelo Governo do Distrito Federal em Ciência e Tecnologia; Cultura; e Desporto e Lazer. Sim, somadas, essas áreas têm previsão orçamentária de R$ 555,1 milhões para o próximo ano. O valor também representa mais que o recurso destinado à Assistência Social (R$ 485,8 milhões) e equivale a 60,8% do orçamento da segurança pública (R$ 913,2 milhões).
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Nada disso significa, por si só, que a Câmara Legislativa gasta muito. Como se sabe, o Legislativo tem atribuições essenciais numa democracia, destacando-se a elaboração de leis, a fiscalização do Poder Executivo e a própria participação na definição do orçamento público. Um juízo completo depende, assim, da análise do retorno oferecido à sociedade.
No primeiro ponto, pode-se dizer, no mínimo, que a CLDF vem escorregando. Apenas nos últimos cinco anos, mais de 200 leis distritais foram declaradas inconstitucionais pelo Conselho Especial do Tribunal de Justiça do DF (TJDFT) – em 2016, até agora, são 18.É bom reiterar: esse número limita-se a leis que, na avaliação do TJDFT, são inconstitucionais, seja por vício de iniciativa, seja por violação de princípios constitucionais. Não estão contempladas, portanto, normas passíveis de legítimo questionamento quanto ao mérito em si.
E quanto à fiscalização do Executivo? É, na melhor das hipóteses, espasmódica, não raro movida mais por desentendimentos políticos do que pela responsabilidade de cumprir a atribuição prevista na Constituição e na Lei Orgânica do DF. Em tempos de boas relações, tudo o que o Executivo faz é chancelado; em tempos de crise, criam-se obstáculos aqui e ali, quase sempre removidos depois de uma boa DR.
Em relação ao orçamento geral da capital, a atuação da CLDF é, normalmente, de mera carimbadora. Alterações são pontuais e, no mais das vezes, servem para atender reivindicações de corporações.
E assim voltamos ao orçamento da própria Câmara. A maior parte dos gastos da CLDF é com servidores. Em 2015, foram R$ 309,8 milhões em despesas com pessoal. A discussão aqui é complexa e longa, mas um dado interessante, que cabe neste breve comentário, é a divisão do quadro: são 673 servidores efetivos e 837 comissionados em 2015.
O resto do orçamento da Câmara Distrital vai para despesas de manutenção como material de consumo, diárias e serviços em geral (R$ 17,5 milhões em 2015); indenizações trabalhistas e ressarcimentos (R$ 18,9 milhões em 2015); e verba indenizatória do exercício parlamentar (R$ 3,1 milhões em 2015).
Mas o principal gasto mesmo, fora a despesa com pessoal, é com publicidade institucional. Para divulgar tudo o que faz, inclusive as leis inconstitucionais, em outdoors, ônibus, táxis, totens, pontos de ônibus, TV, jornais, blogues, a Câmara investiu R$ 25,2 milhões em 2015. Este ano o valor caminha para alcançar R$ 26 milhões.
Tudo isso ocorre num quadro de pouca transparência, espaço limitado para a efetiva participação popular e, neste ano, uma cereja no bolo: o afastamento da Mesa Diretora no âmbito de uma investigação de pagamento de propina a deputados. A presidente da Casa, por sinal, continua fora do cargo.
É tanta coisa que ficou para o fim mencionar a razão de ser de toda a administração pública: melhorar a vida do cidadão. Esse é o critério fundamental para se avaliar o gasto público.
E aí, vale os R$ 555,6 milhões?
* Rodrigo Chia é vice-presidente do Observatório Social de Brasília, presidente do Conselho de Transparência e Controle Social do DF, membro da Comissão de Combate à Corrupção da OAB/DF e empreendedor cívico Raps.