Lucas Ferraz
Parlamentares ouvidos pelo Congresso em Foco apontam ao menos três razões para justificar a facilidade encontrada pelo governo nas votações realizadas no Congresso no primeiro semestre: a fidelidade da coalizão governista, a ausência de projetos polêmicos em pauta e a tradicional tranqüilidade de primeiro ano de mandato.
Na Câmara, com exceção do PTC, do PPS, do PSDB e do DEM, a média de votações com orientação partidária coincidindo com a recomendação do líder do governo foi superior a 50%. No Senado, apenas o PRB e o Psol, com um senador cada, votaram em mais de 50% das vezes contra o governo (leia mais).
A situação de calmaria, contudo, tende a se complicar nos próximos quatro meses, segundo líderes do governo e da oposição. O principal motivo da mudança, de acordo com eles, está na pauta da Câmara: a votação de propostas de grande importância para o Executivo, como a prorrogação da Contribuição Provisória de Movimentação Financeira (CPMF, como é chamado o imposto do cheque) e a Desvinculação das Receitas da União (DRU).
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Na avaliação do líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO), a entrada de seu partido na coalizão governista foi decisiva para o sucesso do Planalto nas votações em plenário. “O PMDB tem tradição de apoiar a governabilidade. Ele não faz oposição por fazer, independentemente do governo”. A fidelidade dos peemedebistas com o governo chegou a 83,33% no Senado e a 80,20% na Câmara.
Para o deputado Márcio França (SP), líder do PSB, um “bom” aliado é aquele que propõe alternativas para o governo. “Pelo fato de a oposição ter perdido o rumo, às vezes temos [a base aliada] que fazer o papel de situação e oposição”, afirmou. O PSB votou em 79,21% das vezes com o governo na Câmara e em 75% das vezes no Senado.
Adesão, não
Líder do Democratas – partido que mais votou contra o governo –, Onyx Lorenzoni (RS) diz que os números mostram a força de sua bancada na oposição. “O DEM é o único partido de oposição firme ao governo Lula”, destacou o deputado.
“Mas votar eventualmente com o governo não significa adesão. Se algum projeto beneficia a sociedade, não vamos votar contra só porque foi elaborado pelo governo”, acrescenta. Os antigos pefelistas só votaram em 25,74% das vezes na Câmara com os governistas no primeiro semestre. No Senado, o percentual foi maior: 58,33%, o mesmo registrado pelos tucanos.
Segundo o líder dos tucanos, senador Arthur Virgílio (AM), os dados “provam a seriedade” do PSDB na oposição. “Não há nada de errado nisso. Esses projetos que apoiamos fazem parte de nosso ideário, que foi adotado pelo governo”, diz. O senador amazonense, contudo, não deixa de criticar o PT. “No passado, o PT votava 100% contra FHC. Nós temos um projeto de país, não de poder. Se o projeto é viável, por que não aprovar?”, questionou.
O mesmo raciocínio tem o deputado Fernando Coruja (SC), líder do PPS na Câmara: “Ser oposição não é tudo ou nada”. “O Psol não faz oposição sem critério. Nem todo projeto do governo é ruim, apesar de ele ser, em sua maioria, ruim”, declarou o deputado Chico Alencar, líder do Psol. O partido, que rendeu menos apoio ao governo no Senado (33,33%), seguiu com os governistas em 54,46% das votações na Câmara.
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Para Roberto Romano, professor de ética e filosofia política da Universidade de Campinas (Unicamp), a tranqüilidade do Executivo nas votações mostra que o governo Lula manteve o “modus operandi” adotado pelos tucanos na relação com o Legislativo. A tarefa, segundo ele, foi facilitada pela manutenção da política econômica. “Com isso, a oposição partilha de muitas posições do governo”, explica. “Não houve uma ruptura doutrinária. Há, contudo, uma guerrilha da oposição em relação a certos grupos ou pessoas do governo”.
Roberto Romano concorda que a coalizão formada em torno do governo facilitou a aprovação de matérias e projetos de seu interesse. “O PMDB sempre cumpriu um papel de integrador de forças dentro do Congresso, o que pode ser bom ou ruim”, diz.
Sobre o fato de um partido como o Psol, por exemplo, que faz oposição sistemática ao governo Lula ter registrado um índice alto de adesão aos projetos governistas, o professor cita o caráter regional como aspecto que influencia a decisão dos parlamentares na hora de votar determinada matéria.
“Não é impossível de entender isso. O aspecto regional pesa enormemente nas adesões, tanto no governo quanto na oposição. É uma espécie de sobrevivência eleitoral. Os deputados do Psol não votaram contra projetos que os interessavam regionalmente”, afirmou.