A postura cautelosa tornou-se uma característica da campanha que ainda não chegou ao fim: "Estou praticamente eleito, mas ainda é preciso esperar o fim da apuração". Foi nesse clima que o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), representante do Campo Majoritário nas eleições internas do partido, falou pela primeira vez como o novo presidente do PT. Berzoini, que venceu o candidato da Democracia Socialista, Raul Pont, por uma apertada diferença de 5 mil votos, deve tomar posse no dia próximo 22.
A serenidade de Berzoini, entretanto, não é a mesma quando o assunto é dividir a culpa pelos erros do partido. Ligado a ala partidária do ex-ministro e agora deputado ameaçado de cassação José Dirceu (SP), o presidente eleito do PT admite que faltou "noção dos limites" para integrantes da antiga cúpula do partido. "Ocorreu uma certa soberba, a presunção de que, por estar ligado a um projeto meritório como o governo Lula, poderiam fazer aquilo que entendessem mais adequado sem consulta às instâncias."
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Em entrevista ao Congresso em Foco concedida na terça-feira à noite, ele responsabiliza, em especial, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares pelos atos que mancharam 25 anos de história política. Mas acredita que faltou "vigilância" Executiva Nacional anterior. "Eu acho que todos os membros deveriam ter tido um papel de maior cobrança e de maior fiscalização para que pudéssemos evitar esses riscos", reconheceu Berzoini, que, pessoalmente, não se sente "atingido" pelos descaminhos partidários.
O ex-ministro do Trabalho do governo Lula sinaliza que os sete deputados petistas ameaçados de perda de mandato por envolvimento no escândalo do mensalão terão tratamento diferenciado pelo PT. "O partido apura se houve quebra da ética partidária ou não, que é diferente da ética parlamentar", pondera, ao ser questionado se os deputados renunciarem ao mandato poderiam concorrer nas próximas eleições. "Portanto, não há, por parte do partido, qualquer necessidade de atropelar o processo", completa, sobre o ritmo das apurações no partido.
Para recuperar o brilho da estrela abalado pelo escândalo de corrupção, Berzoini quer ampliar o diálogo entre o Diretório Nacional e as sedes regionais do partido, consultar os militantes na hora das decisões estratégicas e preparar o terreno dentro do PT para chegarem fortes no pleito de 2006. Com Luiz Inácio Lula da Silva candidato à reeleição? Ele confia que sim. "Creio que é um candidato que tem todas as condições para ganhar", afirma. Berzoini cita o que ele chama de realizações na área econômica – o controle da inflação, o retorno do crescimento econômico e a melhoria das contas internas e externas do Brasil – e, no campo social, os programas Bolsa Família e Universidade para Todos, para justificar uma nova candidatura de Lula.
"Não deve ser atribuído a esses milhares de militantes uma responsabilidade de poucos"
Como a nova Executiva pode fazer para melhorar a imagem do PT no cenário político?
Eu acho que os milhares de militantes que compõem as diversas chapas do Campo Majoritário em todo o Brasil não têm nenhuma responsabilidade pelo ocorrido. São algumas pessoas que cometeram irregularidades e que extrapolaram da confiança política do partido. Portanto não deve ser atribuído a esses milhares de militantes uma responsabilidade de poucos. Eu próprio não me sinto atingido pessoalmente porque sei do que faço, do que não faço e tenho certeza de que tenho tranqüilidade para enfrentar o debate político. O que é fundamental neste momento é que o PT possa fazer um processo de comunicação transparente com a sociedade para que o povo possa perceber que o PT é um partido de homens e mulheres honestos, que temos uma tradição na política brasileira e que sabemos enfrentar nossas dificuldades. Podemos reconstruir os caminhos que nos levaram às vitórias de 2002 e 2004 e viabilizar uma grande capacidade de competir também em 2006.
"Nosso governo é um governo de boas realizações
e tem capacidade de viabilizar uma reeleição do presidente Lula"
O presidente Lula será o candidato do partido à presidência para as eleições de 2006?
Eu tenho confiança de que o presidente Lula colocará seu nome novamente à disposição do povo brasileiro para mais uma eleição. E creio que é um candidato que tem todas as condições para ganhar. Primeiro porque o conjunto de realizações de seu governo é significativo. Não apenas na área econômica – com o controle da inflação, o retorno do crescimento econômico, a melhoria das contas internas e externas do Brasil – como também na política social, através do Bolsa Família, Universidade para Todos e outros programas importantes e também na política externa. O Brasil deixou de ser um país subordinado aos interesses (norte) americanos e hoje é um país que respeita os Estados Unidos, mas mantém sua própria estratégia. Portanto, nosso governo é um governo de boas realizações e tem capacidade de viabilizar uma reeleição do presidente Lula.
"(Precisamos) Dar confiança às pessoas que acreditam no PT de que aquilo que se propaga de fato é o pensamento sincero dos dirigentes"
O que a nova Executiva pretende fazer para diferenciar-se da anterior?
Primeiro, nós precisamos ampliar a transparência e a democracia interna. Priorizar uma política de disseminação de informações não só para os membros da direção, mas também para os filiados do partido. Dar confiança às pessoas que acreditam no PT de que aquilo que se propaga de fato é o pensamento sincero dos dirigentes e o comportamento transparente daqueles que tem a responsabilidade de conduzir o partido. Em segundo lugar, viabilizar que nós tenhamos, num curto prazo, uma política de organização nos estados que garanta condições de competir com qualidade para os governos estaduais. O Diretório Nacional tem o papel de pensar uma estratégia nacional, adequar essa estratégia nacional aos diretórios regionais e, a partir daí, lutar, não só para eleger governadores, mas muitos deputados federais e deputados estaduais do PT.
"O envolvimento com pessoas como Marcos Valério e outras evidentemente demonstra uma falta de prudência nas relações políticas e administrativas"
Qual foi o principal erro da Executiva anterior?
Ocorreu uma certa soberba, a presunção de que, por estar ligado a um projeto meritório como o governo Lula, poderiam fazer aquilo que entendessem mais adequado sem consulta às instâncias. E também uma falta de noção dos limites do risco da atividade partidária. O envolvimento com pessoas como Marcos Valério e outras evidentemente demonstra uma falta de prudência nas relações políticas e administrativas. O que eu pretendo fazer é justamente assegurar que nós tenhamos uma convivência coletiva na bancada. A bancada tem que agir coletivamente, tem que ter capacidade de diálogo, a direção do partido também tem que ter essa capacidade de diálogo. Vamos trabalhar para criar um ambiente de cooperação fraterna dentro partido. Várias correntes de opinião têm posições diferentes, mas o comportamento tem que ser de unidade e de solidariedade.
"Toda vez que há um clima de informalidade e uma confiança pressuposta, ou seja, uma confiança sem base real, o risco de ocorrerem erros (…) é muito grande"
Quem pode ser considerado o principal responsável pelos erros da Executiva anterior?
Eu acho que especialmente o ex-tesoureiro (Delúbio Soares), mas eu acredito que houve também falta de vigilância pelo conjunto da Executiva. Eu acho que todos os membros deveriam ter tido um papel de maior cobrança e de maior fiscalização para que pudéssemos evitar esses riscos. Não apenas os partidos, mas também nas empresas e sindicatos e outras organizações, toda vez que há um clima de informalidade e uma confiança pressuposta, ou seja, uma confiança sem base real, o risco de ocorrerem erros e malversações é muito grande.
"O grande desafio é justamente estabelecer
mecanismos de consulta e de participação"
Como será o diálogo da nova Executiva com os filiados?
Eu acho que agora o grande desafio é justamente estabelecer mecanismos de consulta e de participação de informação que permita ao filiado se sentir de fato não apenas uma pessoa que é convocada a votar de tempos em tempos, mas uma pessoa que tem acesso à informação e que, quando necessário, participa de decisões sobre linha política, política de alianças e outras questões importantes.
E como fica a situação de Delúbio Soares no PT com a nova Executiva?
Nós pretendemos dar curso àquilo que já foi feito na Executiva Nacional e no diretório. Em relação ao Delúbio, a Comissão de Ética já tem um parecer pela expulsão.
"O partido apura se houve quebra da ética partidária
ou não, que é diferente da ética parlamentar"
E a dos deputados petistas acusados pelas CPIs de envolvimento no mensalão. Caso eles renunciem, podem perder a legenda?
Em relação a esses deputados, nós teremos ainda um processo de apuração. O partido apura se houve quebra da ética partidária ou não, que é diferente da ética parlamentar que a Câmara dos Deputados apura no Conselho de Ética, e diferente da legalidade ou não dos atos que aí a justiça e as CPIs que apuram. Portanto, não há, por parte do partido, qualquer necessidade de atropelar o processo. Podemos examinar com o tempo necessário inclusive se baseando nas investigações que foram feitas no Conselho de Ética e nas CPIs.