Soraia Costa, Edson Sardinha, Renaro Cardozo e Ricardo Taffner
Levantamento feito pelo Congresso em Foco, a partir de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), revela que o mandato de quatro anos na Câmara custou, em média, R$ 507.797,10 para cada um dos deputados federais eleitos em outubro.
Entre os 513 eleitos para a nova Câmara, 59 declararam ter arrecadado e gastado mais de R$ 1 milhão. Desses, oito conseguiram levantar mais de R$ 2 milhões em recursos. Em 2002, quando as 20 campanhas mais caras arrecadaram R$ 20,3 milhões, apenas cinco candidatos declararam receitas e despesas acima de R$ 1 milhão (veja a relação dos que gastaram mais).
Neste ano, as 20 campanhas mais abastadas gastaram praticamente o dobro de recursos do que quatro anos atrás – R$ 40.177.087,03. Entre as candidaturas mais ricas, nove são de tucanos. O seleto grupo dos 20 candidatos que mais arrecadaram e gastaram na última eleição é composto ainda por três peemedebistas, dois petistas e um representante do PPS, do PCdoB, do PP, do PL, do PDT e do PTB.
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A pesquisa levou em consideração as despesas e as receitas declaradas pelos 494 deputados eleitos cujas prestações de contas estão disponíveis na página do TSE na internet. Juntos, eles informaram ter gastado R$ 250.851.765,64 ao longo de toda a campanha. Até o fechamento desta edição, ainda não haviam sido divulgadas as despesas e as receitas de 19 parlamentares.
Sobrou dinheiro
Apesar do grande volume de recursos investidos, os eleitos não podem se queixar da falta de dinheiro para conquistar a simpatia do eleitorado. Pelo contrário, a julgar pela prestação de contas. Juntos, declararam ter arrecadado R$ 252.528.974,07 – ou seja, R$ 1,67 milhão a mais do que gastaram. Mesmo os envolvidos com os escândalos dos sanguessugas e do mensalão arrecadaram bem mais do que nas eleições passadas (leia mais).
Segundo a legislação eleitoral, essa diferença, também conhecida como “sobra de campanha”, tem de ficar com os partidos, “de forma integral e exclusiva”, para “criação e manutenção de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política”.
A exemplo da semana passada, quando divulgou a relação completa dos financiadores da eleição dos 27 senadores que começam o mandato no ano que vem (clique aqui para ver quem financiou os senadores), o Congresso em Foco publica hoje, após exaustivo levantamento, a lista dos financiadores das campanhas dos deputados eleitos (confira aqui a relação por bancada).
Seja na corrida à Câmara, seja na disputa ao Senado, a maior parte dos recursos saiu de tradicionais doadores, como empreiteiras, mineradoras, metalúrgicas, siderúrgicas, bancos, usinas de álcool e açúcar e empresas ligadas ao agronegócio, além do caixa dos próprios partidos, abastecidos com recursos públicos do fundo partidário (leia mais).
PSDB gastou mais
De todas as 21 legendas que conquistaram ao menos uma cadeira na Câmara, nenhuma teve candidatos com mais recursos financeiros do que o PSDB (veja a distribuição por partido). Os 63 deputados eleitos pelo partido cujas declarações estão disponíveis na internet foram, de longe, os que mais investiram na campanha, tanto em números absolutos quanto proporcionalmente. Os dados de outros três eleitos pelo PSDB não haviam sido lançados no site do TSE até o fechamento desta edição.
Os tucanos declararam ter gastado R$ 51.126.062,91 para se elegerem. Para cada um deles, a eleição custou, em média, R$ 811.524,81. Bem mais do que os R$ 555.386,42 declarados por cada um dos 83 peemedebistas cujas contas estão disponíveis na internet. Dono da maior bancada na nova Câmara, com 89 assentos, o PMDB teve, proporcionalmente, a quarta campanha mais cara.
Proporcionalmente, ficou atrás do PTB e do PPS. A eleição dos 22 petebistas saiu, em média, a R$ 609.371,35. No caso do partido presidido pelo deputado Roberto Freire (PE), esse valor alcançou a marca de R$ 572.699,99.
Assim como o PSDB e o PPS, outro partido de oposição cujos candidatos investiram pesado na eleição foi o PFL. Em termos absolutos, os 65 pefelistas eleitos gastaram R$ 33.299.427,56 – o terceiro maior volume no ranking partidário. Na média, com R$ 512.298,89 por cadeira conquistada, a legenda aparece na sexta posição, logo atrás do PL.
Custo/benefício
Além festejar o aumento do número de assentos na Câmara, o PT também pode comemorar o fato de ter sido o partido grande que teve a melhor relação custo/benefício na eleição de seus deputados. Na média, a campanha dos 80 petistas cujas declarações estão disponíveis na internet custou R$ 179.725,70, quase cinco vezes menos do que a média dos tucanos eleitos.
Proporcionalmente, só cinco pequenas legendas conquistaram cadeiras gastando menos dinheiro por candidato eleito do que o PT: o PRB, o Psol, o PTdoB, o PTC e o Prona. Os dois representantes do Prona no novo Congresso – o veterano Dr Enéas (SP) e a novata Suely (RJ) – declararam ter gastado, juntos, R$ 14.598,64.
Menos de um centavo por voto
Mesmo tendo ficado longe dos mais de um milhão de votos que, em 2002, o levou à condição de fenômeno eleitoral, Enéas voltou a se destacar este ano como o eleito que menos gastou por voto. Com os R$ 6.004,80 declarados como despesas, cada um dos 386.905 votos recebidos por ele em outubro saiu a menos de um centavo de real.
“Enéas já tem o eleitorado dele, não faz santinho, não faz comício, não tem cabo eleitoral. A campanha foi feita só na TV. O único gasto foi com a produtora”, explicou Aryone Altino Franco, chefe de gabinete do deputado reeleito. Destaque este ano, Clodovil Hernandes (PTC-SP) também não ficou atrás na economia. O apresentador de TV e estilista viu cada um dos 493.951 votos que recebeu em outubro sair por R$ 0,029, em relação aos R$ 14.378,36 investidos na campanha.
A campanha mais barata do país entre os deputados eleitos, no entanto, não foi de nenhuma figura conhecida nacionalmente, mas do até agora anônimo Marcos Antônio (PSC-PE). Único financiador de sua corrida ao Congresso, ele tirou do próprio bolso R$ 5,7 mil, conquistou 62.019 votos e ainda conseguiu deixar uma sobra de R$ 120 no caixa. (veja a relação das campanhas mais baratas, segundo declarações prestadas pelos deputados eleitos ao TSE).
Os gastadores
Na outra ponta, numa eleição para todos os gostos e todos os bolsos, alguns se destacaram por não medir recursos para conseguir o mandato. É o caso, por exemplo, do novato Rocha Loures (PMDB-PR). Cada um dos 89.204 recebidos pelo deputado eleito demandou um investimento de R$ 32,76 na campanha. Foi o voto mais caro da eleição para a Câmara. O peemedebista, que é filho do presidente da Federação das Indústrias do Paraná, declarou à Justiça Eleitoral ter gastado R$ 2.923.137,58 para conquistar o primeiro mandato federal.
O industrial declarou ter tirado do próprio bolso nada menos que R$ 1,129.943,16 para a sua campanha. Outros R$ 1,5 milhão saíram de uma de suas empresas, a Nutrimental S/A Indústria e Comércio de Alimentos, fabricante da barra de cereais Nutry.
Entre os demais 512 eleitos, só um – curiosamente, também do Paraná – declarou ter gastado mais do que Loure. Dono da campanha mais dispendiosa na Câmara, o empresário Alfredo Kaefer (PSDB) foi também o que mais investiu recursos próprios na campanha. Dos 2.949.964,25 gastos em sua eleição, nada menos que R$ 952 mil saíram das contas do próprio candidato.
Outra parte do dinheiro veio de empresas pertencentes ao deputado eleito. Só a Diplomata S/A Industrial e Comercial repassou R$ 1.581.479,09 à candidatura do tucano, o maior financiamento individual registrado na campanha.
Perfil empresarial
A explicação para tantos gastos, segundo a assessoria de imprensa do deputado eleito, é que Kaefer nunca foi político e, por isso, precisou investir mais na divulgação de suas propostas para ser conhecido pelo eleitorado. Além disso, ressaltou a assessoria, mais de 700 pessoas foram contratadas para trabalhar na campanha do tucano.
“Tradicionalmente os políticos de carreira também têm gastos elevados na primeira candidatura, porque estão colocando um nome que não tem chamamento junto à comunidade”, disse a assessoria de Kaefer. “Fizemos uma campanha com perfil empresarial. O número de contratações, na verdade, foi menor que o de outras campanhas, mas nem todos declararam tudo”, observou o assessor.
Ratinho
Além de ter as duas campanhas mais caras para a Câmara, o Paraná também proporcionou outra curiosidade. Eleito com a terceira maior votação do estado, o deputado estadual paranaense Ratinho Júnior (PPS) foi o que declarou ter desembolsado maior volume de recursos próprios: R$ 1,94 milhão. Isso sem contar nos R$ 970 mil doados pelo pai, o apresentador de TV Carlos Roberto Massa, o Ratinho, ex-deputado federal pelo PRN.
“Essa lei nova é uma lástima para todos os candidatos. Proibiram os showmícios e os outdoors, que eram maneiras fáceis de se divulgar a campanha. Com isso, tivemos que gastar mais em cabos eleitorais”, disse Ratinho Júnior. O deputado eleito não esconde seu sonho de ser um governador um dia e diz que o dinheiro aplicado agora em sua campanha foi apenas um investimento em sua carreira política.
“Na minha prestação de contas coloco tudo. Tem candidatos que fazem caixa dois. Se há deputados que gastam menos, quero que me ensinem economizar, porque precisei de todo o dinheiro investido”, afirmou ele.
Muito dinheiro, pouco voto
Mas não foi em todos os casos que a destinação de grandes recursos resultou em fartura de votos nessa eleição. Dos cinco candidatos a deputado que declararam ter gastado maior volume de recursos nessa eleição, apenas Alfredo Kaefer e Rocha Loures conseguiram se eleger.
Apesar dos R$ 2.790.209,39 investidos em sua campanha, o também paranaense Wilson Picler (PDT) não conseguiu votos suficientes para garantir um mandato na Câmara. O mesmo aconteceu com o atual suplente de deputado Márcio Fortes (PSDB-RJ). O ex-vice presidente do PSDB e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não se elegeu, mesmo tendo feito a quarta campanha mais cara do país, gastando R$ 2.643.500.
Dono da quinta campanha mais cara entre todos os candidatos que disputaram uma vaga à Câmara, Eduardo Alves de Moura (PPS-MT) também naufragou com os R$ 2.320.997,88 investidos em sua candidatura.
Mau negócio
Para consolo dos que gastaram muito mas não conseguiram uma vaga na Câmara, a candidata que mais investiu na corrida ao Senado também fracassou nas urnas. A prefeita de Boa Vista, Teresa Jucá (PPS-RR), gastou R$ 5.155.481,60 para convencer o menor eleitorado do país a lhe garantir uma cadeira ao lado do marido no Senado, o líder do governo Romero Jucá (PMDB-RR).
Mas os 233.596 eleitores de Roraima não se sensibilizaram com a campanha de Teresa e reelegeram Mozarildo Cavalcanti (PTB). Pior para o suplente dela, o empresário José Abdala Filho, que destinou nada menos do que R$ 5,1 milhões de suas próprias finanças para, até aqui, o frustrado sonho de ser senador.
Matéria publicada em 17.11.06. Última atualização em 23.11.06, às 10h27