Ag. Brasil/Roosewelt Pinheiro
A voz dele continua a mesma. Mas a sua atuação, quanta diferença. De volta à Câmara após 20 anos de afastamento, o controverso ex-prefeito Paulo Maluf (PP-SP) converteu-se num discreto e disciplinado deputado da base governista do presidente Lula.
Em três meses de mandato, Maluf apresentou três projetos de lei, ocupou a tribuna quatro vezes para discursar, não se envolveu em nenhuma polêmica com os colegas e ganhou o que parecia impensável até poucos anos atrás: elogio de petistas, seus adversários históricos em São Paulo. Só não conseguiu mesmo foi se livrar de seus intermináveis rolos judiciais.
“O deputado Maluf tem contribuído, colaborado com o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]. Ele vê que é uma proposta boa para o país. Tem uma atuação boa na Câmara”, elogia o líder do PT, Luiz Sérgio (RJ). Questionado sobre as antigas desavenças entre Maluf e os petistas paulistas, o líder do PT desconversa: “Eu tenho que olhar daqui para frente. Não posso rejeitar contribuições”.
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Para outro petista, o deputado Ângelo Vanhoni (PR), “um bom governo” atrai a simpatia de Maluf. “Não há ninguém contra o que o governo faz. O PSDB faz oposição formal, e não por mérito”, diz.
Adversário de Lula na eleição presidencial de 1989 e do PT em São Paulo, Maluf também dá sinais de que não está disposto a olhar pra trás. Em seus discursos, o ex-prefeito e ex-governador mostra-se fiel à principal bandeira do governo federal, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), até mesmo quando critica.
No dia 17, por exemplo, ele protestou contra a comemoração da Receita Federal em torno de um recorde de arrecadação. “Cada vez que se comemora a transferência de recursos do setor privado para o setor público, está-se indo contra o PAC, contra os desejos de crescimento econômico do presidente Lula, contra o Brasil”, declarou.
Novos tempos de Lula
Para o deputado João Leão (PP-BA), companheiro de partido de Maluf e vice-líder do governo no Congresso, a adesão do ex-prefeito paulistano ao governo Lula é simbólica. “São os novos tempos de Lula”, brinca Leão. O baiano completa: “O exemplo disso foi o [senador] Tasso [Jereissati (PSDB-CE)] na semana passada [ao visitar o presidente]. É o lulismo tomando conta da política”.
Os oposicionistas, no entanto, não vêem a atuação do deputado, que também foi aliado de tucanos e pefelistas no governo Fernando Henrique Cardoso, com olhar tão generoso. Para um deputado do DEM, o mandato de Maluf serve apenas para ele se proteger das acusações na Justiça. Como todos os parlamentares, eles usufrui de foro privilegiado, ou seja, da prerrogativa de só ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “Ele faz um ou dois discursos. Fica observando. Aqui, os processos são lentos”, avalia o parlamentar.
Maluf em apuros
Desde que se tornou deputado, Maluf enfrentou um único revés: foi em março, quando a Promotoria Distrital de Manhattan (Nova York) pediu seu indiciamento por evasão de divisas. O deputado foi acusado de remeter ilegalmente para um banco norte-americano US$ 11,5 milhões, que teriam como origem obras públicas em São Paulo. De lá, os dólares teriam sido remetidos para paraísos fiscais. Maluf nega veementemente a denúncia e diz que jamais teve conta bancária no exterior.
Em 2005, ele ficou preso 40 dias, acusado de formação de quadrilha, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. À época, o doleiro Vivaldo Alves, o Birigüi, acusou Maluf de chantageá-lo para que não o incriminasse. O ex-governador foi solto porque a Justiça entendeu que, em razão da idade e por problemas de saúde, não tinha condições físicas de permanecer detido. Como todo parlamentar, o ex-prefeito agora não pode ser preso, a não ser em flagrante.
Pauladas
Outro deputado da oposição ouvido pela reportagem considera Maluf um “gentleman” no trato pessoal e, ao mesmo tempo, “um animal da política”. “Ele é o Paulo Maluf. Para enfrentar tudo o que passou, não é qualquer um. Evidentemente que é uma estratégia ficar no limbo. Tanto ele quanto [os petistas José] Genoino e [Antonio] Palocci estão assim”, comenta. “Porque, cada vez que são citados, é uma paulada”, completa.
Nesse ponto, pelo menos, Maluf está de acordo. “Sou fruto da liberdade de imprensa. A imprensa só mete o pau em mim”, disse ele, aos risos, a duas estudantes ao ser abordado pelo Congresso em Foco. Bem-humorado, o deputado perguntou ao repórter se as críticas feitas a ele por seus colegas teriam mais espaço que os elogios na reportagem. "Eu estou [trabalhando] lá na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça]. Vocês [da imprensa] é que não têm ido lá", alfineta.
O deputado que recebeu a maior votação absoluta nas últimas eleições (739.827 votos) nega que esteja atuando de forma discreta. Afirma que, apesar da votação expressiva, tem a mesma dimensão que seus colegas. “Todos os eleitos são iguais. Não se exerce mais ou menos o mandato”, justifica.
“Temos lei aqui. Nem sempre é possível fazer um grande expediente”, diz Maluf, ao comentar seus discursos. Em seus pronunciamentos, o assunto é sempre economia. Para simpatizantes e adversários do ex-prefeito, a discrição do parlamentar é reflexo da série de denúncias às quais ele responde na Justiça.
Entre os três projetos de lei apresentados por ele até agora, um causa polêmica. O PL 265/07 “deixa expressa a responsabilidade” de promotores e procuradores que ajuízam ações com intenção de “promoção pessoal” ou “perseguição política”. Como Maluf responde a dez inquéritos no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal Regional Federal da 3ª Região e a um processo na Justiça de Nova York, nos bastidores, seus adversários o acusam de legislar em causa própria.