Antônio Carlos de Medeiros *
Nada de ruptura para uma terceira via. Esse foi o recado das urnas nas eleições presidenciais. No primeiro turno, o país escolheu o caminho da primeira (PSDB) ou da segunda via (PT). No final, ganhou a segunda via, com Dilma Rousseff. Predominou a conservação da institucionalidade vigente, por dentro dos partidos políticos e da democracia representativa. Nesse sentido, foi uma opção conservadora. A grande maioria que deseja a mudança escolheu as alternativas já conhecidas. Paradoxos políticos brasileiros.
Venceu a proposta de continuidade com mudança. Ambos, Aécio Neves e Dilma Rousseff, disputaram a primazia do capital simbólico, o da capacidade de condução das mudanças. Mas acabou vencendo a candidatura que conseguiu transmitir maior capacidade de entrega pela via da continuidade. Opção conservadora por aí também.
Essa forma tortuosa de buscar o novo, uma espécie de terceira via em algum ponto futuro, mas através de atores políticos já conhecidos, sem rupturas e via transição, não é novidade histórica no Brasil. Não temos história e cultura de rupturas. Prevaleceu sempre a experiência de mudança por acumulação, e não por ruptura. Mais uma vez, agora. Ao fim e ao cabo, o aforismo de Gramsci permeou e permeia o momento político brasileiro: o velho está morrendo, mas o novo não nasceu ainda.
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As expectativas da mudança e da entrega, em circunstâncias históricas de polarização política e fragmentação da representação política no Congresso Nacional, colocam gigantescos desafios para o arco de alianças que venceu as eleições presidenciais e para a nova coalizão politicamente dominante que vai dirigir o país nos próximos quatro anos. Tempos fraturados. Ajuste fiscal, conflitos distributivos, baixo crescimento, espada da inflação. Necessidade imperativa de capacidade de concertação.
As costuras para a formação do novo governo e a articulação da agenda para o país, juntamente com a composição das direções da Câmara e do Senado, deverão dar nitidez à natureza e ao conteúdo da coalizão. Para que as expectativas de diálogos sociais, federativos e empresariais obtenham respostas que apontem para o horizonte das mudanças. Enquanto isso, a tensão política circunscreve o processo político. Para 2015, não há ainda cenário de diminuição da temperatura política. É pesada a carga de demandas sociais, econômicas e políticas sobre o novo governo. É multilateral, transversal , vertical e horizontal a miríade de mediações políticas a serem conduzidas.
E é aí que aparece, forte, a expectativa do papel e postura de Lula. Com sua liderança e capacidade de mobilização, de mediação, e de influência na agenda do país, Lula mais uma vez deverá ter a presença da imanência. Um poder imanente. Nem tão longe, nem tão perto. O que poderá, outra vez, resultar em efeito político moderador, com dimensão real de poder moderador. Com sua capacidade extraordinária de artífice da conciliação, da mediação e do consenso, Lula vai precisar estar mais presente na retaguarda da presidente neste segundo mandato.
Eleita sobretudo para entregar, e para entregar mudanças, Dilma Rousseff está sob escrutínio e vigilância da oposição ampliada pelas urnas e, principalmente, sob o olhar dos brasileiros que desejam mais acesso aos serviços públicos, menos filas, mais segurança, mais mobilidade, menos inflação, mais crescimento. As expectativas e demandas são muito grandes. As cobranças serão constantes e crescentes. Tempos difíceis.
* Antônio Carlos de Medeiros é cientista político.
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