Bezerra Couto |
Conheço muita gente inteligente que se escandaliza com o fato de a quinta e recém-encerrada versão do Big Brother Brasil ter arrebatado o país. Talvez por não ser tão inteligente, fui um daqueles milhões de anônimos brasileiros que garantiram os sucessivos recordes de audiência batidos pelo programa. Mais que isso: no momento final, não resisti e votei no baiano Jean, fazendo minha modesta parte para ajudá-lo a levar o prêmio de R$ 1 milhão. Encarei o BBB como uma espécie de laboratório de gente. Um espetáculo que só a espécie humana pode proporcionar. Diante das câmaras onipresentes, viu-se de tudo: competição desleal, intrigas, inveja, ignorância, vaidade, deselegância, desonestidade e, também, franqueza, amizade, carinho, autocontrole emocional, bom humor. A cultura das celebridades, devo esclarecer, me cansa. Não vai demorar muito, e já não agüentarei mais ouvir falar em Jeans, Pinks e congêneres. Mas, por ora ainda sob os efeitos de mais essa catarse coletiva, imagino que delícia seria manter sob vigilância, 24 horas por dia, certos personagens da nossa trôpega república. Sou capaz de apostar que os maus modos – seja no governo ou na oposição, seja no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário – ultrapassariam em muito os tenebrosos erros de português cometidos pelos BBBs reais, um eventual dedo flagrado em plena limpeza nasal ou a absoluta falta de educação à mesa de refeições. E já pensaram como seria prazeroso ver no paredão alguns ministros, parlamentares ou juízes? Leia também Na impossibilidade de concretizar tal sonho, dedico-me a outra tarefa: mostrar como os participantes do BBB 5 guardam semelhanças com figurinhas carimbadas da cena nacional. Vejam alguns exemplos. Zé Dirceu – É o Gê, claro. No reality show, o médico pitbull Rogério cantava de galo por ter sob o seu controle os votos da maioria dos participantes. Esqueceu que, no paredão, quem mandava era o público. Dançou bonito. No show da realidade, o chefe da Casa Civil amarga, dia após dia, o sabor de descobrir que seus poderes são bem menores do que ele próprio apregoava. O seu algoz não é o público, mas Lula, que o desautorizou várias vezes. Enfraquecido primeiro pelo caso Waldomiro e depois por diversos embates internos no governo e no Congresso, segue derretendo como gelo ao sol. Mercadante – Como Natália, tinha tudo para ser uma pessoa bacaninha. Ela, bonita, charmosa, sensível. Ele, educado nas melhores escolas, bem relacionado, com dois gramas e meio de carisma. A arrogância e a vaidade em excesso condenaram, porém, a versão revisitada de Iracema a se tornar nenhum milímetro a mais do que a pelada da vez das revistas masculinas. Iguais defeitos fazem do líder do governo no Senado, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), um sujeito cada vez mais antipatizado nos meios políticos, tanto dentro como fora do seu partido. Palocci – Alan, um dos líderes da chamada “tropa de choque”, fez o que pôde para eliminar os favoritos do público (o trio Jean, Grazielli e Pink). Poupado do castigo aplicado em quase todos os integrantes do grupo a que pertencia, aproximou-se da banda boa do BBB, caiu de amores pela Grazi, e, mineiramente, conquistou a simpatia de numerosa legião de telespectadores. Ex-trotskista, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, é o condutor de uma política econômica ultra conservadora. Com a finada Medida Provisória 232, ensaiou um monumental assalto aos contribuintes. Nem sua metamorfose ideológica nem sua compulsão arrecadatória lhe tiraram o charme. Você vê o cara falando, com aquele jeito macio, e, se bobear, cai molinho, molinho na conversa dele. Arthur Virgílio – A agressividade adolescente, decorada por piercings, de Juliana tem muito a ver com o estilo combativo do amazonense que lidera a bancada do PSDB no Senado. Há uma diferença importante, contudo. A BBB voou rápido do programa, por ter a má sorte de disputar, de cara, um paredão com o vencedor Jean. Arthur Virgílio, ao contrário, continua no palco. E é a todo tempo brindado com trapalhadas que facilitam a vida de quem se dedica com talento e prazer à arte de mordiscar os calcanhares do governo. Patrícia Saboya – A senadora do PPS cearense é o que há de mais parecido com a Grazi na cena política nacional. Uma morena, a outra loura. Ambas, belas, simpáticas, francas e alvo da admiração e do carinho gerais. Nas duas, entretanto, falta alguma coisa. Na estonteante paranaense, a capacidade de pronunciar duas frases seguidas sem cometer meia dúzia de erros gramaticais, daqueles de doer os ouvidos. Na parlamentar cearense, ousadia para enfrentar os grandes temas do Parlamento, encarando os medalhões do Congresso de igual para igual. Aldo Rebelo – É a Geni da história, assim como Jean. Um levou o prêmio por sua capacidade de reagir com elegância, cordialidade, autocontrole, lealdade e inteligência aos petardos disparados sistematicamente por pelo menos dez dos 14 concorrentes do BBB 5. O outro não ganhou prêmio nenhum e está longe de conquistar os poderes que sua pasta exigiria para desempenhar adequadamente suas atribuições. Mas, sempre perseguido por um furacão de intrigas, o ministro responsável pela Articulação Política sobrevive no governo exatamente por exibir, a olhos vistos, as mesmas qualidades que o professor baiano demonstrou possuir. O grande problema, amigas e amigos, é a Tatiane Pink. Não há nada, na política nacional, que lembre – mesmo remotamente – aquela figuraça. Quem terá, ao mesmo tempo, a sinceridade, a língua ferina, a coragem e o sangue bom da cabeleireira pernambucana? Se alguém pensou na ex-prefeita paulistana Martha Suplicy, pode parar. Só por que ela também adora um rosa? A petista vem de berço rico, é chata e esnobe. A BBB é de origem humilde, escrachada e divertida. A senadora Heloísa Helena (Psol-AL), é verdade, também tem a língua solta. Mas, em termos de conteúdo, ainda está no século XIX do velho Karl. Em termos de forma, nem dá para comparar as batinhas com jeans da Heloísa com, digamos, a indefectível gravata rosa da Tatiane. O deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ)? Nunca. Sério demais, contido demais… Sabem de uma coisa? Minha elevadíssima taxa de descrença na política e nos políticos vai experimentar sensacional redução quando aparecer uma Pink para quem eu possa dar o voto. |
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