“O projeto do novo código cria mais taxas, muitas delas, por sinal, dificultando e encarecendo sobremaneira a formalização de obras e edificações, prática que estimula ainda mais a informalidade”.
O empenho da Secretaria de Urbanismo em aprovar um novo Código de Obras e Edificações do Distrito Federal nos leva a algumas reflexões preliminares: como essa norma dialoga com o desenvolvimento econômico, urbanístico e ambiental do DF? Por que, com o código atual, não foi possível enfrentar os problemas de informalidade nas construções nem impulsionar o desenvolvimento econômico? É de novas leis que precisamos, ou de novas práticas de gestão?
O Distrito Federal sempre contou com códigos de obras – veja o Decreto nº 944, de 1969 –, entretanto a maior parte de todo o conjunto de milhares de obras e edificações concluídas ocorre sem nenhum tipo de licenciamento, com enormes impactos ambientais, urbanísticos e econômicos, sem contar os costumeiros acidentes ocasionados pela falta de acompanhamento das obras por profissionais capacitados.
É preciso dizer que essa realidade não é um “privilégio” de assentamentos irregulares ou de bairros periféricos, como à primeira vista poderia parecer, mas ocorre também em bairros regularizados, com escritura, em setores centrais e em áreas de desenvolvimento econômico.
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No senso comum, aqueles que ingressam com um projeto para licenciamento de uma obra são submetidos a um verdadeiro calvário, que passa por análises sem fim, numerosas exigências, formalidades que permeiam os graus mais elevados da burocracia. Um procedimento injustificável, que sujeita a emissão de um simples alvará de construção a uma espera de meses, superando até um ano.
Com isso, é muito comum que a edificação (habitação ou negócios) seja concluída muito antes de o alvará de construção, que por sinal deveria autorizar o início da obra, ser expedido. O habite-se, que atesta as condições de uso e habitabilidade da edificação, é outra estação do processo demorado, custoso e sofrido.PublicidadeEmbora o problema seja conhecido, parece longe de ser solucionado: longe porque a burocracia estatal não cede, longe porque os governos têm vendido a ideia de que problemas crônicos de gestão podem ser solucionados magicamente com novas leis.
Modernamente, fala-se muito em gestão gerencial, em substituição à chamada gestão burocrática. Ao invés de obedecer a normas e procedimentos rígidos e concentrar-se no processo, a gestão gerencial foca em resultados e vislumbra o cidadão como cliente.
Ao contrário de tudo o que se esperava, o projeto do novo código insiste em práticas de gestão ultrapassadas, que nem sequer deveriam constar de um projeto de lei.
O código atual, de 1998, atribui às Administrações Regionais, órgãos descentralizados da Administração Pública, a competência para aprovar projetos, licenciar obras e edificações e decidir sobre possíveis recursos administrativos por parte dos cidadãos. O projeto do novo código retrocede: centraliza procedimentos e cria mais uma instância recursal, uma espécie de conselho de notáveis, tudo na Secretaria de Urbanismo, localizada no Plano Piloto.
Assim, por exemplo, o empreendedor que investe no Recanto das Emas terá que se deslocar até o Plano Piloto, numa lógica de gestão que tira serviços essenciais de perto do cidadão/cliente e impõe deslocamentos e custos acintosos.
Além disso, o projeto do novo código cria mais taxas, muitas delas, por sinal, dificultando e encarecendo sobremaneira a formalização de obras e edificações, prática que estimula ainda mais a informalidade.
A lógica do projeto do novo código, portanto, é equivocada: o combate à informalidade urbana envolve agilidade nos procedimentos de licenciamento de obras e edificações, rapidez nas respostas, baixo custo e facilidades ao cliente.
Prestar serviços de melhor qualidade é, sem dúvida, uma estratégia econômica mais inteligente. Se o setor produtivo e o cidadão se encorajarem a formalizar suas obras e edificações, cientes de que serão atendidos a contento, de forma ágil, em suas próprias regiões administrativas e com custos baixos, o resultado esperado será uma elevação da arrecadação de tributos e a geração de empregos, resultando em qualidade de vida e bem-estar para toda a população.
Foi isso que fez a cidade de Campinas, que tornou possível o licenciamento de obras de baixo impacto, como casas, comércio, serviços, igrejas, clubes, escolas, etc., com área de até 1.000m2, até no mesmo dia da entrada do pedido de licenciamento. Prática similar vem ocorrendo em Belo Horizonte, com o programa “Alvará na Hora”.
É preciso que o cidadão que constrói dentro da lei tenha mais vantagens em relação àqueles que constroem ao arrepio dela, caso contrário teremos menos empregos, menos renda; em contrapartida maiores danos à ordem urbanística e ao meio ambiente, gastos elevados com fiscalizações, demolições e embargos e com todos os conflitos sociais que essas medidas suscitam.
Assim, o projeto do novo código, infelizmente, caminha em sentido oposto ao que a sociedade espera.
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