Boletim Radar Clima & Sustentabilidade afirma: governo federal deve ser responsabilizado por descumprimento de metas de desmatamento
De acordo com o filólogo João Ribeiro em seu livro “A língua nacional” no tempo do Império, as autoridades brasileiras, fingindo que cediam às pressões da Inglaterra, anunciavam tomar providências para combater o tráfico de escravos africanos. Ação essa que, na verdade não acontecia, era para “inglês ver“. Qualquer semelhança com o compromisso do general Mourão no combate aos desmatamentos na Amazônia não é mera coincidência.
Enquanto o presidente Bolsonaro afirma para mídia mundial que não há devastação florestal no Brasil, o general Mourão, responsável pelo tema no governo, não apenas confessa perante o mundo que vai descumprir (nos quatro anos de governo Bolsonaro) a meta brasileira de redução de desmatamento na Amazônia, como empurra nova meta, menos ousada, para 2023. E sem ainda, após quase dois anos de governo, anunciar um plano efetivo para cumpri-la.
O compromisso com a redução dos desmatamentos estabelecido na Lei Federal 12.187/2009 (Lei de Política Nacional de Mudança do Clima) é qualificado, na própria Lei, como compromisso nacional “Voluntário”.
Porém é preciso examinar de forma mais detida o que significa esse “voluntário” no campo da legislação nacional. Voluntário, no campo jurídico, não quer dizer “faço se quiser” sem deveres de justificativas ou motivações. Quer dizer, ao contrário, que o governo “fará todo esforço possível e ao alcance”, com base em elementos objetivos e mensuráveis como políticas públicas, planos, programas, orçamento apropriado, avaliações independentes e legislação convergentes para alcançar a meta.
PublicidadeContudo, as evidências mostram com clareza solar que, desde 1o de janeiro de 2019, o governo federal deixou de fazer a lição de casa, e o que estava ao pleno alcance sem necessidade de alteração legislativa ou orçamento extraordinário, que é a implantação do PPCDAm – Plano de Prevenção e Controle dos Desmatamentos na Amazônia e Cerrado. Além de não fazer o básico, ainda vem desautorizando e reduzindo orçamento dos órgãos de monitoramento e controle como ICMBio, Ibama e INPE.
Prova pública e oficial de que o anúncio pelo vice-presidente Mourão constitui meta “para inglês ver” está na “Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil”, publicada em decreto pelo governo nesta terça-feira, 27 de outubro. Ela estabelece uma série de diretrizes e metas econômicas, sociais e ambientais dentro do planejamento do governo, para o período de 2020 a 2031, inclusive na área ambiental.
No “eixo ambiental” do decreto 10.531 de 2020 (aqui), as metas de combate ao desmatamento não aparecem, assim como não há nenhuma menção à Amazônia ou ao Pantanal, biomas que, desde o ano passado, registram os piores níveis históricos dos últimos anos em relação a desmatamentos e queimadas.
Neste boletim “Radar Clima e Sustentabilidade” abordo, juntamente com um trecho da fala do nosso vice-presidente do IDS, João Paulo Capobianco, feita em audiência pública em setembro passado perante o Supremo Tribunal Federal, as razões pelas quais o governo federal deve ser responsabilizado jurídica e politicamente pelos aumentos seguidos dos desmatamentos ilegais consequentemente o descumprimento da meta.
Veja nesse vídeo link abaixo:
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.