Folha de S. Paulo
Fux levou seu currículo a Dirceu por vaga no STF
O ministro Luiz Fux, 59, diz que desde 1983, quando, aprovado em concurso, foi juiz de Niterói (RJ), passou a sonhar com o dia em que se sentaria em uma das onze cadeiras do Supremo Tribunal Federal (STF).
Quase trinta anos depois, em 2010, ele saía em campanha pelo Brasil para convencer o então presidente Lula a indicá-lo à corte.
Fux era ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), o penúltimo degrau na carreira da magistratura. “Estava nessa luta” para o STF desde 2004 -sempre que surgia uma vaga, ele se colocava. E acabava preterido. “Bati na trave três vezes”, diz.
AVAL
Naquele último ano de governo Lula, era tudo ou nada.
Fux “grudou” em Delfim Netto. Pediu carta de apoio a João Pedro Stedile, do MST. Contou com a ajuda de Antônio Palocci. Pediu uma força ao governador do Rio, Sergio Cabral. Buscou empresários.
E se reuniu com José Dirceu, o mais célebre réu do mensalão. “Eu fui a várias pessoas de SP, à Fiesp. Numa dessas idas, alguém me levou ao Zé Dirceu porque ele era influente no governo Lula.”
O ministro diz não se lembrar quem era o “alguém” que o apresentou ao petista.
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Fux diz que, na época, não achou incompatível levar currículo ao réu de processo que ele poderia no futuro julgar. Apesar da superexposição de Dirceu na mídia, afirma que nem se lembrou de sua condição de “mensaleiro”.
“Eu confesso a você que naquele momento eu não me lembrei”, diz o magistrado. “Porque a pessoa, até ser julgada, ela é inocente.”
Conversaram uma só vez, e por 15 minutos, segundo Fux. Conversaram mais de uma vez, segundo Dirceu.
A equipe do petista, em resposta a questionamento da Folha, afirmou por e-mail: “A assessoria de José Dirceu confirma que o ex-ministro participou de encontros com Luiz Fux, sempre a pedido do então ministro do STJ”.
Foram reuniões discretas e reservadas.
‘Pensei que não tinha provas; li o processo e fiquei estarrecido’
Sentado num sofá de couro preto na sala de sua casa, em Brasília, na terça passada, o ministro Luiz Fux ainda estava sob o efeito da repercussão da posse de Joaquim Barbosa, na semana anterior.
Ele roubou a cena ao fazer um discurso de mais de 50 minutos repleto de agradecimentos e elogios à presidente Dilma Rousseff.
Mais tarde, na festa, tocou guitarra para homenagear o novo presidente do Supremo.
Fux já tocou em banda. Em 2011, compôs uma canção. “Fala das virtudes das mulheres. O Michael Sullivan musicou e vai colocá-la em seu novo CD”. O título: “Ela”. O refrão: “Capaz de ir ao céu por uma estrela/Que ilumina e brilha o ser amado”.
“O Fagner também quer fazer uma versão. E a gente ainda tem a ambição de levar para o Roberto Carlos ver.”
O ministro pede para a cozinheira, dona Lourdes, trazer uma bandeja com refrigerantes. Só diet.
PF planejou operação dentro da sala de ex-assessora em SP
Os menos de dez minutos entre a chegada ao prédio na av. Paulista e a subida ao 17º andar foram suficientes para dar início ao plano de ação.
A partir dos dados levantados foram definidos qual dos quatro elevadores que servem do 3º ao 19º andar seria usado, como lidar com a segurança local e quais salas seriam vasculhadas em busca de computadores e papéis.
Três semanas antes da deflagração da Operação Porto Seguro, policiais federais estiveram na sede da Presidência em São Paulo. No último dia 23, esse foi um dos pontos de busca e apreensão feitas pela PF, cujo alvo foi Rosemary Noronha, então chefe de gabinete da Presidência.
No começo de novembro, no entanto, o motivo oficial da visita dos policiais à sede da Presidência em São Paulo era outro: uma reunião para discutir a onda de violência no Estado. Quem recebeu os delegados foi justamente Rose, como ela se apresentou.
A agenda com os temas de segurança pública transcorreu normalmente. Mas os policiais usaram o encontro para levantar dados e programar a busca e apreensão.
A operação ainda era sigilosa mesmo dentro da PF. Ela era tocada pelo Núcleo de Inteligência, que tem interlocução direta com a Diretoria de Inteligência em Brasília.
Poucas pessoas dentro da PF sabiam do caso. O momento da deflagração teria de ser negociado com o Ministério Público Federal e aprovado pela Justiça, levando em conta a possibilidade de fugas ou o vazamento de informações.
José Dirceu compara caso ao mensalão
O ex-ministro José Dirceu chamou de “Operação Mensalão 2” as repercussões do caso que envolve Rosemary Noronha, que foi assessora dele e se tornou próxima de Lula -com quem passou a ter relação de intimidade.
Condenado pelo mensalão, Dirceu costuma dizer que o julgamento foi político.
Em seu blog, ele criticou o ex-presidente FHC -que havia dito na quinta que a “confusão” entre interesse pessoal e público leva à corrupção.
“Agora com a chancela e o apoio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que não deveria falar de relações privadas e de confusão entre público e privado. Fazê-lo é falar em corda em casa de enforcado”, diz.
“O ex-presidente devia ter o recato e a humildade de se calar, e não usar essa questão para fazer crítica à gestão do ex-presidente Lula”, diz.
Rose fez BB beneficiar empresa de seu marido
Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência em São Paulo, conseguiu que uma empresa do Banco do Brasil contratasse a firma que tem seu marido, João Vasconcelos, como diretor e um genro como sócio.
A New Talent recebeu R$ 1,12 milhão da Cobra, braço tecnológico do BB, num contrato com dispensa de licitação. Tanto o nome de Vasconcelos como o do genro, Carlos Alexandre Damasco Torres, estão no contrato.
O contrato foi assinado em maio de 2010, quando o vice-presidente de tecnologia do BB era José Luiz Salinas. Apadrinhado do ex-ministro José Dirceu e do deputado Ricardo Berzoini, Salinas tinha ascendência sobre as decisões da Cobra. Ele deixou o cargo em junho de 2010, deslocado para um setor do BB na Ásia.
A Folha apurou que Salinas costumava frequentar o gabinete de Rosemary, onde despacha o presidente da República em São Paulo.
Segundo as investigações da Polícia Federal na Operação Porto Seguro, a New Talent apresentou atestado supostamente falso de capacidade técnica, datado do final de 2009, para conseguir a obra na empresa do BB.
Governador da Bahia recebeu empresários a pedido de ex-assessora
O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), recebeu dois representantes da Tecondi e da Formitex, empresas supostamente beneficiadas pelo esquema desbaratado pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro, a pedido de Rosemary Noronha.
A audiência ocorreu em 4 de fevereiro de 2009, quando Rose era assessora do ex-presidente Lula no gabinete da Presidência em São Paulo.
O encontro com Carlos Cesar Floriano (Tecondi) e Alípio Gusmão (Formitex) com Wagner, um dos governadores mais próximos de Lula, ocorreu após conversas entre Rosemary e Paulo Vieira, ex-diretor da ANA (Agência Nacional de Águas).
Os empresários estavam interessados em obter incentivos para empreendimentos na Bahia. A reunião, conforme e-mails trocados entre Rose e Paulo Vieira, aconteceu no Centro Administrativo da Bahia. A própria Rose passou os números do telefone da secretária do governador.
Segundo Wagner, o encontro foi agendado porque se tratava de uma “audiência institucional solicitada pela secretária do gabinete da Presidência da República”.
Os empresários, segundo os e-mails, queriam ainda adquirir terras da Sudic, uma autarquia do Estado.
PF indicia Indio da Costa e outros 16 por Cruzeiro do Sul
A Polícia Federal concluiu o inquérito aberto para apurar as fraudes no Banco Cruzeiro do Sul, que foi liquidado pelo BC em setembro após ter apurado um rombo contábil de R$ 3,1 bilhões.
Ao todo, 17 pessoas foram indiciadas por crimes contra o sistema financeiro. Entre elas estão os ex-controladores do banco Luis Octavio Indio da Costa e Luis Felipe Indio da Costa.
O inquérito foi encaminhado pela Polícia Federal na quinta-feira para o Ministério Público Federal em São Paulo, que deverá fazer a denúncia do caso para a Justiça.
Também foram indiciados Horacio Martinho Lima e Maria Luisa Mendonça (membros do conselho de administração) e os diretores Fabio Meyer (Rio), Sergio Capela (Consignado), Marcelo Xandó (Verax), Roberto Valente (Informática), entre outros.
A PF indiciou ainda pessoas que fizeram operações suspeitas com ações do banco.
O inquérito foi instaurado em junho de 2012 após o Banco Central constatar fraudes contábeis e indícios de operações de crédito fictícias no Banco Cruzeiro do Sul.
Para quitar dívida, eleitos continuam arrecadando
Com os resultados das eleições já definidos, prefeitos eleitos em capitais pelo país em outubro ganharam doações milionárias que ajudaram a quitar dívidas de campanha.
Para as empresas, a contribuição pós-vitória acaba sendo uma forma garantida de ajudar uma coligação que em breve estará no poder.
Esse tipo de doação é legal, já que os partidos precisam enviar a prestação final de contas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até 30 dias após a votação.
Levantamento feito pela Folha aponta que R$ 20,4 milhões foram arrecadados por eleitos em capitais após o fechamento das urnas.
Esse número representa cerca de 10% do total obtido por eles em toda a campanha eleitoral.
Quem mais se valeu do expediente foi o prefeito reeleito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB). Ele conseguiu arrecadar R$ 4,3 milhões após a festa da vitória. Ainda assim, gastou mais do que arrecadou (confira no quadro ao lado).
Situação semelhante ocorreu com o petista Fernando Haddad, em São Paulo. Os R$ 4 milhões recebidos por sua campanha depois da votação não foram suficientes para evitar que Haddad tivesse o maior deficit de arrecadação do país.
Gabeira lança livro para marcar o fim de 50 anos de atuação política
Ex-guerrilheiro, ex-exilado e ex-deputado, Fernando Gabeira quer tirar o “ex” de sua fase como jornalista. Ele retoma a profissão e suspende a atuação política de 50 anos relatando sua trajetória no livro “Onde está tudo aquilo agora?” (Cia. das Letras).
Da infância em Juiz de Fora (MG) à tentativa frustrada de conquistar o governo do Rio, o subtítulo da obra, “Minha vida na política”, parece se inverter: o livro mostra experiências que a política proporcionou à vida de Gabeira.
Com o período na luta armada já descrito em “O que é isso companheiro?”, o novo livro revela como o filho de pais conservadores se aventura em terras cariocas e assiste à efervescência política dos anos 50 e 60.
Gabeira pouco ligou quando a revolução cubana eclodiu. Ao cobrir manifestação em apoio a Fidel Castro, preocupou-se em saber se deixariam a barba crescer.
Primeira general diz que é preciso cautela com mulher militar
A mulher que há poucos dias se tornou a primeira oficial general das Forças Armadas brasileiras pede cautela no avanço feminino na carreira militar. A contra-almirante médica Dalva Maria Carvalho Mendes, carioca de 56 anos, na Marinha desde 1981, defende “um estudo muito aprofundado” antes de inserir mulheres na linha bélica.
Atualmente elas ocupam funções nas áreas administrativas, de saúde e no magistrado. Só a Aeronáutica tem pilotos do sexo feminino. O Exército tem prazo de cinco anos para inserir mulheres na frente de combate. A Marinha ainda não tem norma.
O Globo
Aposentadoria vai consumir 46% do PIB a partir de 2030
O Brasil está envelhecendo em ritmo mais acelerado do que o previsto. Isto acontece por causa da intensa queda da fecundidade e do aumento da expectativa de vida. Se nada for feito para preparar o país para este novo cenário, com cada vez mais idosos e menos crianças e população em idade ativa, uma pesquisa do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (Iess) estima que de 46% a 57% do PIB (a variação depende do crescimento da economia) estarão comprometidos apenas com a Previdência em 2030. Hoje, esta proporção é de 19%. A mesma pesquisa prevê também que o envelhecimento populacional trará impactos nos gastos com saúde pública, que crescerão 150% no mesmo período.
Além de preparar o país para garantir qualidade de vida à população idosa sem sacrificar crianças e jovens no futuro, as mudanças impõem também outro desafio: melhorar a produtividade da mão de obra. Haverá menos trabalhadores na ativa, e os que estarão ainda enfrentarão problemas como a baixa qualificação. A transição demográfica, no entanto, oferece também oportunidades para amenizar esses problemas. Com menos crianças na população, fica mais fácil aumentar o investimento per capita na infância.
Os autores do estudo do Iess defendem que as mudanças necessárias à preparação do país para este novo cenário não sejam mais adiadas.
Para as mães trabalhadoras, um salário 11% menor
O principal motivo para a diminuição da população brasileira – a queda da taxa de fecundidade – e o fato de que está caindo o número de pessoas mais jovens também trazem uma oportunidade para o país: como haverá menos crianças e adolescentes, o Brasil terá, portanto, mais dinheiro a ser investido per capita na Educação.
Além disso, o investimento nos mais jovens também vai permitir não só que a força de trabalho do futuro seja mais qualificada, mas que a parcela feminina dessa força de trabalho possa ter participação mais ativa no mercado, em vez de deixar de trabalhar para cuidar dos filhos.
Estudo inédito apresentado no Encontro Nacional de Estudos Populacionais deste ano, e realizado pela pesquisadora do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG Maíra Andrade Paulo, mostra que o custo de ser mãe no Brasil aumentou ao longo das últimas décadas: se em 1992 as mulheres que eram mães recebiam 4% menos que aquelas que não eram, em 2009 essa diferença salarial passou a ser de 11%.
De secretária petista a protagonista de fraudes
O ano é 1997. Luiz Inácio Lula da Silva ainda sonha ser presidente. Os petistas se reúnem, em seu XI Encontro Nacional, no antigo Hotel Glória, no Rio. De calças justas e um cinto largo, com detalhes em metal, Rosemary Noronha cruza o saguão aos gritos. Vai ralhar com um repórter que, inadvertidamente, recolhera de uma mesa cópias das teses que seriam debatidas pelo partido.
Rose, como é conhecida, tinha a função de secretária da presidência do PT, na época exercida por José Dirceu, recém-condenado a dez anos e dez meses de prisão no escândalo do mensalão. Foi para Dirceu que ela ligou, na manhã do último dia 23, para pedir ajuda, quando a Polícia Federal amanheceu em sua casa para fazer uma busca ao deflagrar a Operação Porto Seguro.
Dirceu ficou furioso, contaram seus interlocutores. Rose ligou, também, para o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para reclamar que os agentes da PF haviam entrado na residência e estavam recolhendo papéis, computadores e o que mais parecesse suspeito. Cardozo não atendeu.
– O que ela esperava? Que nós fôssemos parar porque ela estava falando com o nosso chefe? – ironiza uma delegada da Polícia Federal.
Rose podia mesmo esperar que o ministro a ajudasse. Desde os tempos de secretária do PT, a ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo coleciona desafetos porque reina, ou tenta reinar, absoluta nos bastidores do enclave petista. Tem relação muito próxima com o ex-presidente Lula.
Em agosto de 1997, uma cena de gentileza explícita de Lula chamou a atenção em um ensaio da Mangueira, do qual participava a cúpula petista. Servido pelo garçom, Lula se levantou da mesa onde estava para levar uma bandeja de salgados até Rose.
Desde 2003, quando foi nomeada por Lula para trabalhar na Presidência, Rose fez 24 viagens ao exterior na comitiva presidencial. Ela tinha direito a passaporte diplomático. A volta ao mundo não impediu que quase brigasse com Paulo Vieira, ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) acusado de chefiar a quadrilha de corrupção e tráfico de influência. O motivo da discussão foi simplório: ela queria fazer um cruzeiro entre Santos e Rio com a presença da dupla sertaneja Bruno e Marrone.
No gabinete da Presidência, Rose foi ganhando cada vez mais espaço. Gostava de ser chamada de “madame”, de dar ordens e de usar coisas que considerava chiques. A ex-bancária, hoje com 57 anos e duas filhas, adorava ostentar poder. Arrumava confusão com porteiros e seguranças do prédio do Banco do Brasil onde fica o escritório da Presidência.
Vieira, um enriquecimento rápido e suspeito
Um salário de R$ 6,9 mil mensais como analista da Controladoria Geral da República (CGU), órgão de combate à corrupção vinculado à Presidência da República, e um patrimônio de R$ 135 mil (dos quais R$ 39 mil ainda precisavam ser pagos) era o que tinha o baiano Paulo Rodrigues Vieira em 2004, quando se candidatou a vereador de Gavião Peixoto, município de quatro mil habitantes, em São Paulo.
Na época, reforçar os vínculos com o PT, partido ao qual se filiou no ano anterior, parecia-lhe mais interessante do que passar os quatro anos seguintes cuidando da pequena cidade; não à toa, Paulo Vieira obteve apenas 55 votos. Tinha, na época, 31 anos de idade.
Era uma época em que ele era destacado para inspecionar, em nome do governo brasileiro, a gestão da Companhia Docas de São Paulo (Codesp), vinculada ao Ministério dos Transportes. Era também encarregado de procurar desvios éticos, como assessor especial de controle interno do Ministério da Educação.
Ele discutiu, em seminário, a importância da atuação do Tribunal de Contas da União (TCU) no setor portuário. E até representou o país em congresso internacional de ouvidores, no Canadá.
“Eu vou escrever minha tese de mestrado de Filosofia sobre esse caso do Demóstenes. Tava pensando aqui, vou discutir essa questão do conceito de ética, como é que a sociedade tá (sic) enfrentando isso no momento contemporâneo. Esse caso dele é simbólico demais, parece que ele criou uma dupla personalidade, né?”, comentou Vieira com o irmão Rubens, em ligação interceptação telefônica interceptada pela PF em maio deste ano, citando o caso do senador de Goiás que era conhecido como defensor da ética e foi cassado pelo Senado quando foi descoberta sua relação com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Ligação com poder permitiu obter benefícios para ‘clientes’
Com a intermediação de Rose, apelido da então chefe do gabinete da Presidência em São Paulo, Vieira obteve seu cargo na ANA e também um posto para o irmão, Rubens Vieira, na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), entre outros favores. O canal com o poder lhe permitia agir em nome de seus interesses e de seus clientes em órgãos como Ministério da Educação, Advocacia-Geral da União, Secretaria dos Portos e Correios. Entre os beneficiários da ação de Vieira estão, segundo a PF, os donos da Tecondi, empresa que atua na área do Porto de Santos, e o ex-senador Gilberto Miranda, que desejava regularizar seus negócios em ilhas.
Em conversa com uma funcionária da Secretaria do Patrimônio da União em abril deste ano, Vieira chega a reclamar da maneira como era tratado e relembra sua origem humide.
“Não vou ficar sendo babá de rico, não. Eu nunca fui, nasci pobre, toquei a minha vida inteira sozinho e não vou fazer mais”, desabafou, lembrando que naquela ocasião estava “cheio de rico” querendo paparicá-lo. “Mais ou menos não vai fazer diferença”, afirmou.
Suas relações com o poder se estendiam ao Legislativo, em especial ao círculo de influência do ex-deputado federal Valdemar da Costa Neto (PR), flagrado ao telefone centenas de vezes com ele. A proximidade era tal que Vieira trabalhou até na definição das estratégias de defesa do parlamentar no julgamento do mensalão, concluído na última semana pelo Supremo Tribunal Federal. A três meses do julgamento, ele discutiu com o irmão Rubens detalhes da defesa de Valdemar, e se disse preocupado com o risco de condenação por lavagem de dinheiro.
Grupo tenta desemperrar reforma política na Câmara
Dispostos a enfrentar o ceticismo que há anos ronda a votação da Reforma Política, um grupo de deputados, capitaneado pelo relator da proposta nesta legislatura, Henrique Fontana (PT-RS), tenta mobilizar a Câmara para a apreciação pelo plenário de pelo menos quatro pontos do tema. A despeito do incansável empenho do relator, quase quixotesco como dizem os colegas, líderes partidários já admitem que as chances de avanços ainda este ano são mínimas. E se ficar para 2013, véspera de ano eleitoral, as possibilidades ficam ainda mais reduzidas. O grupo, no entanto, conseguiu uma vitória: o presidente Marco Maia (PT-RS) pautou a reforma política para discussão no plenário na próxima quarta-feira.
– Não dá para falar em produzir uma grande reforma, mas há temas que, voltando das eleições municipais, sensibilizaram parlamentares. Por exemplo, o fim das coligações nas eleições proporcionais e a coincidência das eleições. E mesmo, embora polêmico, o financiamento público de campanhas. É grande o desgaste de a cada dois anos buscar contribuições de campanhas – afirmou Marco Maia, que marcou para terça-feira uma reunião de líderes sobre o assunto.
Desde o início desta legislatura, em 2011, Maia montou uma comissão especial, designou Henrique Fontana como relator e, no final do ano passado, fez apresentar um relatório aos deputados.
Manter regra contra nepotismo é o desafio de Joaquim no CNJ
No comando do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, tem pela frente um grande desafio: tentar manter a regra que proíbe o nepotismo em tribunais de todo o país. A norma está sob ameaça. Na análise de recursos de servidores, depois de dois votos no CNJ para flexibilizar a regra, houve pedido de vista, e o assunto pode voltar à pauta.
Em 2005, o CNJ baixou resolução proibindo os tribunais de contratarem parentes de juízes ou servidores para cargo de confiança. No entanto, começaram a chegar ao Conselho processos de pessoas dispensadas pelos tribunais questionando a abrangência da norma. Em junho de 2011, o conselheiro Jorge Hélio levou ao plenário o caso de uma funcionária dispensada do Tribunal de Justiça gaúcho. Jorge Hélio votou contra o pedido. O ministro Cezar Peluso, que presidia o Conselho, pediu vista. Em abril deste ano, Peluso voltou o caso ao plenário e votou a favor da servidora. O conselheiro Carlos Alberto Reis de Paula, ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), pediu vista. Devolveu o processo em outubro, com voto igual ao de Peluso.
Punição de juízes e debate sobre salários em discussão
Boa parte dos integrantes do CNJ já sinalizou que pretende abrir brechas à resolução que vetou o nepotismo no Judiciário. Mas um grupo de conselheiros aposta que Joaquim Barbosa conseguirá reverter a tendência.
– Eu tenho esperança de que o ministro Joaquim Barbosa possa, com a capacidade e a liderança dele, brecar essa pauta corporativa. O CNJ a duras penas construiu a sua imagem. Ele não pode agora jogar por água abaixo essa imagem – disse o conselheiro Bruno Dantas, indicado pelo Senado para compor o órgão.
– O combate à corrupção passa pela diminuição da nomeação de parentes – concordou Jorge Hélio, representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho.
Joaquim ainda não declarou quais serão suas prioridades na condução do CNJ e encontrará ainda um órgão dividido: enquanto parte dos integrantes quer priorizar o julgamento de processos disciplinares contra juízes, outros preferem que a instituição se dedique a cuidar de pleitos da corporação, como aumento de salário.
DF faz contrato milionário, sem licitação, com firma de Cingapura
A decisão do governo do Distrito Federal de contratar, sem licitação, uma empresa de consultoria do governo de Cingapura, na Ásia, para projetar o desenvolvimento da Região Metropolitana de Brasília nos próximos 50 anos gerou controvérsia e levantou suspeitas. O Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) e parlamentares do DF pediram a imediata suspensão do contrato de R$ 8,6 milhões, assinado no último dia 3 de outubro, em Cingapura. O caso será julgado pelo Tribunal de Contas local.
Por 3 votos a 1, o tribunal rejeitou liminarmente o pedido de suspensão formulado pelos senadores Cristovam Buarque (PDT) e Rodrigo Rollemberg (PSB). Em seu voto, o conselheiro-relator Manoel de Andrade chegou a sinalizar que não vê irregularidades no contrato. Mas os conselheiros deram prazo de 15 dias ao governo do DF e à Jurong Consultants, como é chamada a autarquia de Cingapura, para que se manifestem antes do julgamento de mérito.
Mais cidades desenvolvidas no país
A vida nas cidades brasileiras melhorou, e muito, na última década. Em dez anos, o país mais do que dobrou o número de municípios com os níveis moderado e alto de desenvolvimento: de 30,3% (1.672 cidades) para 67,4% (3.719). No outro extremo, minguou a presença de municípios de baixo desenvolvimento, de 18,8% (1.039) para apenas 0,1% do total (6). Salto de qualidade que está no Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM) – que faz, a partir do tripé emprego e renda, saúde e educação, um retrato anual de todos os 5.565 municípios do Brasil e dá notas de 0 a 1 a cada uma deles (quanto mais perto de um, melhor).
Com transformações movidas por uma economia aquecida, o Brasil encerrou 2010 com um IFDM de 0,7899 – nota 32% acima dos 0,5954 de 2000. Mas, como o índice faz um perfil olhando pelo retrovisor, o cenário de agora já não é o mesmo de outrora. Especialistas dizem que esses avanços, conquistados por um mercado de trabalho em ebulição, fiquem estacionados – ou regridam – em decorrência de uma crise global que já fez estragos no Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto de bens e serviços produzidos no país) de 2012, levando analistas a prever crescimento em torno de 1% este ano.
O Estado de S. Paulo
Pajero de R$ 55 mil usado por Rose pertencia a esquema de Paulo Vieira
Relatório da Operação Porto Seguro indica que o Mitsubishi Pajero TR4 de Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo, pertenceu à organização que negociava pareceres técnicos desmantelada pela Polícia Federal e que era comandada pelos irmãos Vieira, ex-diretores de agências reguladoras. Os e-mails e documentos obtidos pela investigação sugerem que despesas do veículo podem ter sido pagas por Paulo Vieira, apontado pela PF como chefe do esquema. Em um capítulo dedicado aos bens associados a Paulo Vieira, o relatório descreve um Pajero fabricado em 2010 e registrado em nome de Patricia Baptistella, funcionária da faculdade em Cruzeiro (SP) pertencente à família do ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA). Em e-mail de 2 de maio de 2011, Rose cobra de Vieira a transferência do veículo para seu nome e a quitação de despesas como seguro e licenciamento.
“Estou muito preocupada com a questão da Pajero. Fiz todos os trâmites necessários do Controlar. E o seguro, licenciamento, vc (sic) fez?”, pergunta Rose. “Vc renovou o seguro? Quando pretende passar o carro para o meu nome?” Em 26 de abril de 2012, os investigadores checaram o registro do veículo no Infoseg, sistema integrado de informações de segurança pública. O Pajero está em nome de Rosemary Noronha. O relatório não diz quando ocorreu a transferência. Não há, nos e-mails interceptados pela PF, menções a pagamentos ou compra e venda do Pajero. Pela tabela Fipe, o carro vale hoje cerca de R$ 55 mil. Em maio de 2011, o preço estimado era de R$ 61 mil. Um modelo zero-km sai por R$ 73,4 mil.
Da agência bancária ao Palácio de Versalhes
“A Rose não quer”, alegou um assessor do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que informou ter recebido a orientação da chefe de gabinete do escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary Nóvoa de Noronha. Ainda de acordo com o funcionário, Rose afirmou que Lula “não gostava de fogos de artifício”.
Alguém correu para avisar o prefeito Luiz Marinho (PT), amigo do ex-presidente desde os anos de sindicalismo e cuja equipe havia organizado a comemoração. “Não vai ter o c…. a Rose não manda nada!”, devolveu Marinho, irritado. A queima de fogos ocorreu e não há registro de Lula ter reclamado.
A cena compõe relatos envolvendo a ex-assessora da Presidência, feitos por petistas ao Estado no decorrer da semana passada. A história de São Bernardo ilustra a avaliação difundida entre quadros do partido sobre a forma de Rose atuar: era uma servidora arrogante, que tratava mal seus subordinados, mas simpática e acessível a quem lhe interessava. Não trocava muitas palavras com os vereadores e prefeitos que recorriam ao escritório da Presidência, mas esbanjava simpatia com os ministros que por lá passavam.
De gerente de banco na agência onde Lula tinha conta na região do ABC paulista, no começo dos anos 90, Rose chegou ao alto escalão do funcionalismo e passou a ser paparicada pela burocracia de Brasília, que compreendeu que ela se tornara uma peça importante no xadrez do poder.
Depois de conhecer Lula, Rose foi levada pelo ex-presidente para trabalhar no diretório nacional do PT com José Dirceu, então secretário-geral do partido. Organizada, diligente e eficiente, cuidava das agendas, marcava reuniões e fazia contatos políticos. Vestia-se de maneira austera e não era militante petista. Com formalidade, tratava a todos por “senhor” e “senhora”.
PT movimenta R$ 1 bi na eleição e bate PMDB
O PT foi o partido que mais movimentou dinheiro nas eleições municipais deste ano. As arrecadações de candidatos, comitês de campanha e diretórios petistas somam mais de R$ 1 bilhão, segundo prestação de contas divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com isso, o PT ultrapassou o PMDB, campeão de arrecadação nas eleições de 2008.
É provável que haja dupla contagem de parte desses recursos, por causa da maneira como é feita a prestação de contas eleitorais. Partidos, comitês e candidatos arrecadam e repassam recursos entre si e para outros partidos e candidatos, tornando impossível saber quem doou quanto para quem. De qualquer modo, a dupla contagem tende a existir para todos os partidos.
Do R$ 1,012 bi movimentado pelo PT em 2012, R$ 602 milhões foram direto para as contas dos candidatos petistas. O restante foi arrecadado de forma indireta: R$ 146 milhões foram captados por comitês eleitorais e R$ 264 milhões foram doados aos diretórios do partido.
O PT é a legenda que mais concentra doações na cúpula: 26% do que o partido arrecadou passou pelas mãos dos dirigentes petistas – o que só aumenta o seu poder interno.
Em 2012, o PT abocanhou uma fatia maior do bolo movimentado pelos partidos. Sua parte cresceu de 14% para 16% do total, em comparação a 2008.
ACM Neto só perde para Haddad e Serra em arrecadação
ACM Neto, eleito prefeito de Salvador (BA) pelo DEM, foi o terceiro candidato que mais arrecadou nas eleições de 2012. Perdeu apenas para Fernando Haddad (PT) e José Serra (PSDB), que concorreram pela Prefeitura de São Paulo na disputa mais cara do País. O neto de Antônio Carlos Magalhães conseguiu R$ 21,9 milhões em doações, ante R$ 42 milhões de Haddad e R$ 33,6 milhões de Serra.
O DEM investiu pesado na campanha de ACM Neto. Foram R$ 19,6 milhões gastos pelos diretórios nacional e estadual do partido na campanha municipal do deputado, 90% das receitas totais. O alto investimento tem justificativa. Em 2011, o partido perdeu o comando da única capital onde foi eleito em 2008, depois que Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo, fundou o PSD e arrastou consigo parte dos quadros dos democratas. Após o baque, o DEM precisava de um nome de peso e do comando de uma grande cidade para manter a visibilidade e evitar ainda mais perdas para a sigla.
Apesar do terceiro lugar em arrecadação individual, o DEM não tem o que comemorar. Partido que mais caiu em número de eleitos e de votos, o DEM foi também o único que perdeu arrecadação em relação a 2008. Foram R$ 51 milhões a menos.
A queda foi sentida nas contas dos comitês eleitorais, cujos volumes se reduziram de R$ 79 milhões para R$ 28 milhões. Já a arrecadação dos candidatos do partido ficou estável em R$ 198 milhões, enquanto as receitas de todas as outras siglas cresceram. No PT, por exemplo, dobrou e atingiu R$ 602 milhões.
Haddad foi o maior arrecadador petista. Depois dele, o candidato que conseguiu mais doações pelo PT foi Patrus Ananias, candidato derrotado em Belo Horizonte pelo atual prefeito, Marcio Lacerda (PSB). Ananias arrecadou R$ 17,4 milhões. Lacerda fechou a conta com R$ 21,5 milhões, a quarta maior receita do País, e levou a disputa.
Mensalão leva 13 réus a penas em regime fechado
Após 49 sessões e mais de 300 horas de julgamento, o Supremo Tribunal Federal concluiu na semana passada o cálculo das penas dos 25 condenados no processo do mensalão. Somadas, as penas aos réus chegam a 282 anos de prisão, além de multas num total de R$ 22,7 milhões, valores que ainda poderão ser corrigidos pela inflação.
Para o tribunal, ficou comprovada a existência do esquema de compra de apoio político no Congresso a fim de favorecer o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dos condenados, 13 começam a cumprir a pena em regime fechado, 10 no semiaberto e em apenas dois casos as sanções aplicadas foram convertidas em penas alternativas. O empresário Marcos Valério, responsável por operar o sistema de captação e distribuição de verbas para o pagamento de parlamentares, pegou a pena mais alta – 40 anos, 2 meses e 10 dias de prisão. Ele terá de cumprir regime fechado por pelo menos 6 anos e 8 meses. José Dirceu, apontado pela denúncia do Ministério Público Federal como “chefe da quadrilha”, teve pena total de 10 anos e 10 meses e terá de cumprir pelo menos 1 ano e 10 meses na cadeia.
STF tem mais 500 ações que envolvem políticos
Refúgio no passado para políticos processados criminalmente, o Supremo Tribunal Federal está prestes a concluir o julgamento do mensalão com a condenação de 25 réus a penas que superam 282 anos, imprime um novo ritmo para as cerca de 500 ações penais contra parlamentares e começa a mudar a cultura do foro privilegiado.
A condenação de seis parlamentares em 2010 e 2011 deu início à mudança do histórico de impunidade que envolvia o julgamento de inquéritos e ações penais no Supremo Tribunal Federal. A condenação de três deputados e sete ex-parlamentares, incluindo o ex-ministro José Dirceu, na maior ação penal que tramitou no tribunal, tem potencial para mudar o quadro histórico definitivamente e agilizar o julgamento dos cerca de 500 casos que envolvem parlamentares – conforme os últimos dados do STF.
Relator do processo e crítico do foro privilegiado, o ministro Joaquim Barbosa já confidenciou que um dos efeitos do mensalão pode ser uma mudança na Constituição. A avaliação comum entre alguns ministros do STF é de que a ação penal do mensalão jamais seria julgada se não fosse o foro por prerrogativa de função. Se ficasse a cargo da primeira instância da Justiça, o processo demoraria anos entre idas e vindas, recursos e manobras processuais até transitar em julgado.
Com o novo cenário no julgamento de ações penais, políticos pendurados no tribunal passam a ver o antigo refúgio como o fim da linha. A condenação no Supremo não é passível de recursos ou manobras protelatórias. As penas elevadas impostas aos réus do mensalão e a parlamentares condenados nos últimos anos também seriam motriz para uma eventual alteração.
Senado não cumpre papel na avaliação de nomes
Dono do direito de aprovar ou rejeitar nomes para os tribunais superiores, agências reguladoras, Embaixadas, presidência e vice do Banco Central, além dos integrantes dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público, o Senado tem sido controverso nessa tarefa.
Na maioria dos casos, aprova as indicações do governo sem se aprofundar nas qualificações do escolhido. E, quando rejeita, o faz por chantagem política ou vinganças.
Um dos casos mais polêmicos de indicação e aprovação de um diretor de agência foi o do advogado Paulo Vieira para uma diretoria da Agência Nacional de Águas (ANA). Em 2009, houve empate e a indicação foi rejeitada. Após pressão por parte do governo e do ex-ministro José Dirceu, cinco meses depois, já em 2010, o Senado anulou o resultado anterior e aprovou o nome de Vieira para o cargo.
Paulo Vieira é apontado pela Polícia Federal como chefe da quadrilha que vendia pareceres técnicos nos principais órgãos do governo. Preso no dia 23, durante a Operação Porto Seguro, foi solto na última sexta-feira.
Ex-diretor atuou para ‘anistiar’ dívida de R$ 120 mi de empresa com porto
O ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira, indiciado na Operação Porto Seguro, atuou para aprovar uma “anistia” a uma empresa que operava um terminal no Porto de Santos. Então presidente do Conselho Fiscal da Companhia Docas de São Paulo (Codesp) em 2005, Vieira articulou um acordo que previa um aditivo ao contrato da Libra Terminais que perdoaria quase 85% da dívida – cerca de R$ 120 milhões.
A Polícia Federal deflagrou a Porto Seguro após o auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Cyonil Borges ter dito que Vieira lhe encomendou por R$ 300 mil um parecer para beneficiar a Tecondi, que também opera no porto. Para a PF, o ex-diretor da ANA comandava uma quadrilha que vendia pareceres públicos.
A negociação com a Libra teve o apoio do então presidente da Codesp, José Carlos Mello Rego, indicado pelo deputado Valdemar Costa Neto (PR), com o aval do então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento (PR). Na época, a Codesp era institucionalmente ligada a esse ministério.
Correio Braziliense
As agências desreguladas
Um setor que deverá fiscalizar pelo menos R$ 200 bilhões em investimentos nos próximos anos teve sua fragilidade escancarada com a deflagração da Operação Porto Seguro pela Polícia Federal. A prisão de dois diretores de agências reguladoras — Paulo Vieira, da Agência Nacional de Águas (ANA), e Rubens Vieira, da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) —, que comandavam um esquema de venda de pareceres jurídicos, expôs os problemas de entidades criadas para regular os serviços prestados ao cidadão brasileiro.
Indicações políticas de pessoas sem o mínimo conhecimento técnico para as funções que exercem, falta de independência orçamentária para executar o trabalho, ausência de transparência nas decisões tomadas e diretores que acabam sendo, posteriormente, capturados pelo mercado que deveriam fiscalizar são alguns dos problemas levantados pelo Congresso e por órgãos de controle externo, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU).
Criadas durante o governo Fernando Henrique Cardoso, as agências foram perdendo autonomia ao longo dos anos. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva determinou que os cargos técnicos fossem preenchidos por servidores de carreira, concursados e bem remunerados. Mas são os postos de diretores que se tornaram alvo de disputa entre os partidos políticos.
Adormecidos na gaveta
Dois projetos que propõem alterações nas agências reguladoras hibernam nos escaninhos do Congresso Nacional sem perspectiva de serem colocados em votação. Um deles é o substitutivo à Lei Geral das Agências Reguladoras, encaminhado pelo Planalto ao Legislativo em 2004, cujo relator é o deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ). “Espero que, com esse escândalo da Operação Porto Seguro, a Câmara se sensibilize para aprovar esse texto”, disse Picciani ao Correio.
A matéria estava sendo relatada por Picciani, mas ele se licenciou em 2007 para assumir a Secretaria Estadual de Habitação no governo de Sérgio Cabral (PMDB), no Rio de Janeiro. O projeto foi encaminhado ao então deputado Ricardo Barros (PP-PR), que também apresentou um substitutivo. Como Picciani retornou ao Congresso, retomou o assunto, que está pronto para ser analisado pelo plenário. “O projeto define novas normas de transparência, de vacância nos cargos e de sabatina no Senado Federal”, completa Picciani.
Concessão dos portos não zarpou
Assim que a Operação Porto Seguro foi deflagrada, desbaratando uma quadrilha que vendia pareceres jurídicos e técnicos para empresários que atuavam nas agências reguladoras, a primeira preocupação do Palácio do Planalto foi assegurar que não haveria prejuízo no projeto de concessões dos portos. A presidente Dilma Rousseff mantém a intenção de anunciar o pacote, que prevê investimentos entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões ainda nesta semana, depois de sucessivos atrasos no cronograma.
Duas preocupações permearam os últimos dias. A primeira delas foi explicar que o ex-número dois da Advocacia-Geral da União (AGU) José Weber de Holanda — um dos indiciados na Porto Seguro — não participava das discussões palacianas sobre o novo modelo de concessão. A outra foi manter a sinalização para os investidores, principalmente os estrangeiros, de que o governo não recuaria da decisão de promover mudanças no setor.
Segundo apurou o Correio, o escândalo envolvendo Paulo Vieira (ex-diretor da Agência Nacional de Águas) e Rubens Vieira (ex-diretor da Agência Nacional de Aviação Civil) aumentou a vontade da presidente em criar um outro paradigma para a área. Muitas das irregularidades detectadas têm relação com o arrendamento de áreas para portos, como as autorizações de instalações do ex-senador Gilberto Miranda na Ilha das Cabras e no complexo Bagres-Barnabés. “A operação mostra que Dilma está certa ao criticar o modelo atual”, disse uma fonte que transita no setor aquaviário.
Filho de ministro e corregedor
Alvo de devassa da Polícia Federal (PF) na Operação Porto Seguro, as agências reguladoras voltaram aos holofotes políticos e são acusadas pela oposição de ineficiência e de serem usadas como cabides de emprego do governo federal. Na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), autarquia não atingida pela operação da PF, o filho do ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, ocupa o cargo de corregedor substituto da instituição. O advogado Leonardo Farias Passos é o responsável por procedimentos internos contra funcionários no órgão vinculado à pasta chefiada pelo pai.
Servidor público federal desde março de 2005, Leonardo é analista administrativo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em julho de 2006, período em que o pai esteve à frente do ministério pela primeira vez, ele foi requisitado pela ANTT, onde ganha R$ 14,3 mil por mês (salário bruto). A assessoria de comunicação do órgão nega que a nomeação de Leonardo tenha influência do pai e informa que ele foi indicado pela atual corregedora, Maria Carolina Pullen Arrais. Ela está no cargo desde 2002 e recebe praticamente o mesmo salário de Leonardo: R$ 14,5 mil. A nomeação “é questão interna da agência”, diz a assessoria.
A estreita relação entre Rose e Lula
O relatório da operação Porto Seguro, deflagrada pela Polícia Federal, traz um intricado roteiro de trocas de favores entre a ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Nóvoa de Noronha, e os chefes da quadrilha que negociava pareceres técnicos fraudulentos, Paulo e Rubens Vieira, ex-diretores da Agência Nacional de Águas (ANA) e da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), respectivamente. A polícia destrinchou, ano a ano, as vantagens concedidas e exigidas por Rosemary, mulher de 57 anos que transita no Partido dos Trabalhadores desde o início dos anos de 1990, quando trabalhava como secretária do então presidente nacional do PT, José Dirceu.
Para os investigadores, Rosemary era mais importante que o cargo que ocupava. A facilidade com que se movimentava dentro da quadrilha e do governo pode ser creditada a uma relação íntima com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o Ministério Público Federal, parceiro da PF nas investigações, Rosemary interferiu diretamente na nomeação dos nomes de Paulo e Rubens Vieira para as agências de regulação. Nos e-mails interceptados pelos investigadores, a ex-chefe de gabinete da presidência se coloca como mulher de trânsito direto com Lula e José Dirceu. Em março de 2009, Rosemary escreve a Paulo e diz: “O PR (presidente) falou comigo hoje e disse que na terça-feira, quando voltar dos USA (Estados Unidos) resolve tudo do seu caso”. Mais adiante ela pergunta: “Não vem para a festa do JD (José Dirceu)?”. Em outra conversa por e-mail, sobre o cargo na ANA, Paulo diz a Rosemary que um pedido pessoal dela a José Dirceu, “tratando a questão como de interesse pessoal” dela, “ganha muito mais força”, o que endossa que Rose não era apenas uma simples chefe de gabinete.
Partidos liberam bancadas na discussão dos royalties
Divididos por questões regionais, os partidos vão liberar suas bancadas para que conduzam da forma que for mais conveniente as discussões sobre as regras de divisão dos royalties do petróleo. Os vetos anunciados pelo Planalto ao projeto do Congresso, na noite de sexta-feira, separam os interesses entre estados e municípios produtores e não produtores, e as legendas não planejam intervir. Além dos vetos, os parlamentares também vão analisar a medida provisória que determina a aplicação dos recursos em educação. Cada deputado ou senador terá liberdade para conduzir o debate de acordo com os interesses e as pressões de seus estados.
O líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), por exemplo, é a favor da derrubada do veto, mas reconhece a dificuldade em definir um entendimento único na legenda. “Desde o início desse debate, não houve nenhuma posição fechada. O partido respeitou as posições locais e é o que vai seguir acontecendo”, explica.
A única sigla que firmou posição com relação ao tema é o PTB. “A alternativa para o partido é a derrubada do veto”, anuncia o líder na Câmara, Jovair Arantes (GO). A agremiação tem apenas um deputado do Rio de Janeiro, Walney Rocha, que será liberado. Aos demais, a orientação é pressionar para que o veto entre logo em votação.
Estratégia de aprovação
De olho em uma prefeitura com uma “boa arrecadação”, o ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Rodrigues Vieira tentou se inscrever nas cotas para negros e afrodescendentes para concorrer ao cargo de procurador da prefeitura de Cubatão (SP). Em conversa telefônica interceptada pela Polícia Federal, ele disse ao irmão Marcelo Vieira que não havia estudado e essa era a única chance que tinha de ser aprovado. Paulo, no entanto, esqueceu de ler o edital com cuidado e perdeu o prazo de envio de cópia da certidão de nascimento.
“Não consegui me beneficiar, quer dizer, eu sou tão ligado nessas coisas e passou batido”, disse Paulo, no telefonema. A ligação é do dia 31 de março deste ano. Na listagem das vagas reservadas a afrodescendentes, o nome do ex-diretor da ANA consta entre as inscrições indeferidas.
Em memória dos perseguidos
Em 13 de dezembro de 1968, uma reunião realizada no Palácio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, entre integrantes do governo militar iniciava um dos períodos mais dolorosos da história do Brasil. Nascia, naquele momento, o Ato Institucional nº 5, que fechou o Congresso Nacional, cassou os direitos de cidadãos e parlamentares, principalmente os opositores da ditadura. Na quinta-feira, quase meio século depois, 173 deputados terão a devolução simbólica dos mandatos, que foram concedidos pelo povo, mas foram tirados pelo regime de exceção a partir do golpe militar.
O desfecho dos acontecimentos ocorreu no fim de dezembro daquele ano, quando o governo anunciou a primeira relação de pessoas que teriam os direitos políticos cassados. Eram 11 deputados federais, liderados por Márcio Moreira Alves (MDB-RJ). A decisão foi tomada pelo Conselho de Segurança Nacional (CSN), depois de uma reunião iniciada às 16h, que seguiu até as 19h. E, em uma nota lacônica, foi anunciado que os parlamentares, além de Carlos Lacerda, haviam acabado de perder os mandatos por uma década.
“Ao término dos trabalhos, o senhor presidente da República anunciou a decisão de decretar, nos termos do AI-5, a cassação dos mandatos e a suspensão dos direitos políticos, por 10 anos, dos deputados federais Márcio Moreira Alves, Hermano de Deus Alves, David José Lerer, Helio Henrique Pereira Navarro, Gastone Righi Cuoghi, Mateus José Schmidt Filho, Henrique Henkin, Maurilio Filgueira Ferreira Lima, José Lurtz Sabiá, Renato Bayma Archer da Silva e José Carlos Estelita Guerra”, anunciou o CSN.
Monitorados até longe da vida pública
Durante o regime militar, além de perderem os mandatos, os políticos tinham que dar satisfações sobre suas atividades, inclusive viagens internacionais. Diversos documentos do Arquivo Nacional mostram relatos da Polícia Federal sobre o paradeiro de deputados e senadores destituídos pela ditadura. Um deles, por exemplo, da Divisão de Segurança e Informação (DSI) do Ministério da Justiça, fala sobre o deslocamento de três ex-parlamentares, todos excluídos da vida pública.
O trio pertencia a partidos diferentes, inclusive um deles, o deputado Aluizio Alves, do Rio Grande do Norte, era da Aliança Renovadora Nacional (Arena), a legenda do governo. O parlamentar pretendia viajar para o Paraguai, assim como o colega Abelardo de Araújo Jurema (PSD-PB). O terceiro político era Luiz Fernando Bocayuva Cunha (PTB-RJ), que iria se deslocar para França, Estados Unidos e Inglaterra.
Sabatinas na berlinda
As sabatinas de candidatos a cargos de direção das agências reguladoras federais estão sob suspeita. O Senado tem o dever constitucional de avaliar o perfil e a competência dos nomes indicados pela Presidência da República, impedindo que os postos sejam ocupados na base da canetada e, teoricamente, reduzindo o impacto político das decisões desses órgãos.
Mas episódios recentes mostram que as habilidades técnicas e a idoneidade nem sempre são os critérios mais importantes adotados na hora de aprovar ou rejeitar as indicações que chegam à Casa. Foi o que ocorreu com Paulo Rodrigues Vieira. Candidato ao cargo de diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), ele teve o nome rejeitado em dezembro de 2009.
Houve pedido de anulação da primeira votação e a indicação de Paulo Vieira foi aprovada em abril de 2010. Indiciado pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro, ele é apontado como um dos chefes da quadrilha que negociava pareceres técnicos fraudulentos. Foi preso e acabou sendo afastado do cargo pela presidente Dilma Rousseff.