ISTOÉ
Campanhas na UTI
Em vez de se concentrar na análise da biografia e na plataforma política dos aspirantes ao Senado, os eleitores paulistas passaram a debater a saúde dos candidatos. Na segunda-feira 6, o ex-governador Orestes Quércia (PMDB) renunciou à disputa porque está com câncer. O peemedebista vem sendo tratado no Sírio-Libanês, na região central de São Paulo, mesmo hospital em que o senador Romeu Tuma (PTB) foi internado na UTI para cuidar de uma afonia. Os correligionários de Tuma, no entanto, garantem que ele não desistirá da campanha. Ainda que o petebista tenha forças para continuar no páreo, apenas o espólio de Quércia – 23% das intenções de voto, de acordo com o Ibope – é grande o suficiente para fazer os adversários se engalfinharem.
O cantor e vereador Netinho de Paula (PCdoB) ameaçou entrar com recurso na Justiça para que o tempo de tevê e rádio de Quércia não seja repassado integralmente a Aloysio Nunes (PSDB), como deseja o PMDB. Analistas ouvidos por ISTOÉ dizem que a ausência de Quércia pode embolar a disputa ao Senado. Nesse caso, Netinho sairia prejudicado. Uma pesquisa feita pelo Ibope, no início de setembro, mostra Marta Suplicy (PT) em primeiro lugar, com 36% das intenções de voto. Netinho aparece atrás da petista, com 26%, tecnicamente empatado com Quércia. “O perfil dos eleitores do Quércia é parecido com o dos eleitores do Tuma e do Aloysio. São pessoas mais velhas e mais conservadoras”, afirma Mauro Paulino, diretor-geral do Instituto de Pesquisas Datafolha. “Se ficar claro que Quércia apoia o Aloysio, é provável que muitos votos migrem para ele.” Na sondagem feita pelo Ibope, Tuma e Aloysio seguem colados – com 13% e 12%, respectivamente.
Ataque inútil
No comando da campanha de José Serra (PSDB) houve uma discreta comemoração na terça-feira 7, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ocupou o horário eleitoral reservado ao PT para fazer uma espécie de manifesto em defesa da ex-ministra Dilma Rousseff sobre os vazamentos de dados sigilosos da Receita Federal. Os tucanos chegaram a avaliar que os ataques promovidos nas últimas semanas, responsabilizando o PT e a candidata Dilma pela quebra dos sigilos fiscais de familiares de Serra e de líderes do PSDB, estavam surtindo algum efeito eleitoral. “Se eles colocaram o presidente para defender a candidata, é porque o ataque está funcionando”, disse um deputado do PSDB, que trabalha no comando da campanha tucana. A animação durou pouco. No dia seguinte, os serristas receberam o resultado de pesquisas internas mostrando que Dilma continuava a crescer. Perdia alguns poucos votos apenas em São Paulo.
No QG de Dilma, desde o início da semana, a análise era bem outra. A entrada de Lula no programa eleitoral era encarada como uma tentativa de avançar ainda mais em busca da vitória no primeiro turno. Os levantamentos eleitorais que se seguiram confirmaram que aquela que seria a bala de prata da campanha tucana, capaz de ferir de morte a candidatura de Dilma, não passou de um tiro de festim. No embalo do crescimento econômico e beneficiada pelo alto grau de satisfação popular com o governo, Dilma não só mantém folgada dianteira nas pesquisas de opinião como ainda é apontada como favorita para liquidar a fatura no primeiro turno. As pesquisas revelam que a maioria da população já decidiu como e por que vai votar. No dia 3 de outubro, não estará decidindo sobre responsabilidades de quebra de sigilo. O que está em jogo para o eleitor é o governo que ele vai levar ao poder. E aí a opção pela continuação da administração atual vem sendo acachapante.
Um manual para os eleitos
O Brasil tem motivos para comemorar. Um retrato do País recém-divulgado reflete uma coleção de avanços socioeconômicos, a começar pelo pouco impacto da turbulência econômica internacional no cotidiano brasileiro. “Apesar da crise no mundo, a renda per capita do brasileiro cresceu 2,04%”, diz o economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas. “Mais do que isso, a renda dos 40% mais pobres aumentou 3,15%, contra 1,09% dos 10% mais ricos.” A façanha diz respeito ao desempenho da economia nacional entre setembro de 2008 e o mesmo mês do ano seguinte, objeto da mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). Enquanto o mundo enfrentava instabilidades de todos os gêneros, o Brasil conseguiu manter a trajetória favorável de seus principais indicadores. Nesse percurso, conviveu, porém, com ritmos distintos. O Brasil que depende do setor privado avança de forma mais rápida do que aquele vinculado exclusivamente à máquina do Estado. Realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pesquisa aponta resultados tão contundentes que deveria servir como referencial para aqueles que saírem das próximas eleições com a missão de administrar os Estados e o País.
Na sequência da queda da desigualdade social e do aumento da renda, houve uma explosão do consumo e do acesso a serviços. O setor privado cumpriu a sua parte. Não faltou produto no mercado. Mais de dois milhões de domicílios passaram a ter telefone – móvel ou fixo – em 2009. Numa edição que incorpora entre as novidades a investigação do uso de celular e internet, a PNAD revelou ainda que o uso da telefonia móvel aumentou quatro vezes em cinco anos. No mesmo período, o acesso à internet quase dobrou. Entre os mais de 20 milhões de residências brasileiras com computador, 16 milhões usam a rede mundial. Além de mais equipadas em termos de informática, as casas brasileiras ficaram mais confortáveis, por causa do aumento do consumo de geladeiras, máquinas de lavar, televisões e aparelhos de DVD. A posse de carros e motos também aumentou em todo o País.
Sem conexão
Inspirada na campanha do presidente americano, Barack Obama, a candidata Marina Silva, do PV, apostava em levantar muito dinheiro pela internet. Obama recebeu doações de mais de três milhões de eleitores, com uma arrecadação que atingiu US$ 500 milhões. Primeira candidata da história da política brasileira a tentar arrecadar dinheiro no mundo virtual, Marina não conseguiu convencer as pessoas físicas que acessam seu site. No último balanço da campanha, entregue ao Tribunal Superior Eleitoral na sexta-feira 3, o PV informou ter arrecadado R$ 74 mil. Longe de atingir as metas traçadas inicialmente, Marina empacou em um dígito nas pesquisas de opinião e enfrenta dificuldades para financiar os candidatos do PV nos Estados com as doações de pessoas físicas. “Nos Estados Unidos há uma cultura de contribuição individual e isso pegou na internet. Mas no Brasil não existe essa cultura, por isso ocorreu esse fiasco na campanha da Marina”, diz Antônio Queiroz, do Diap. Nem mesmo a candidata líder nas pesquisas teve bom desempenho nessa seara. Dilma Rousseff chegou a montar quiosques em seus comícios, mas foram poucos eleitores que entraram no site da petista. Na segunda-feira 6, Dilma arrecadou apenas R$ 500 nos computadores instalados em Valparaíso (DF), onde fazia comício.
Indecisão carioca
As eleições para o Senado no Rio de Janeiro sempre foram disputadas palmo a palmo. Em 2006, por exemplo, Francisco Dornelles (PP) ultrapassou Jandira Feghali (PCdoB) na última semana de campanha. Esse quadro está se repetindo agora. O carioca, pelo visto, já tem sua preferida para a Presidência da República, que é Dilma Rousseff (PT) e já escolheu seu candidato para governar o Estado: o atual governador Sérgio Cabral (PMDB). Mas ainda não se definiu na eleição para o Senado. Nos últimos dias, foi registrado o forte avanço do ex-prefeito de Nova Iguaçu Lindberg Farias (PT) e do deputado estadual Jorge Picciani (PMDB). A última pesquisa Ibope mostrou um crescimento de 4 pontos percentuais de Lindberg, que ostenta agora 28% de apoio, emparelhando com o ex-prefeito do Rio Cesar Maia (DEM), com 30%, e o senador Marcelo Crivella (PRB), com 34%. Picciani, por sua vez, chegou a 22%, o dobro do início da campanha. “Mantidas as condições atuais, podemos ter os quatro candidatos tecnicamente empatados”, diz o presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisas Sociais, Geraldo Tadeu Monteiro.
ÉPOCA
Outro governador preso
Na sexta-feira, a Polícia Federal prendeu 18 suspeitos de desviar aproximadamente R$ 300 milhões de programas federais para a melhoria da educação. A operação, desencadeada em quatro Estados, foi batizada como Operação Mãos Limpas. Na lista de políticos, empresários e servidores públicos presos estão algumas das principais autoridades do Amapá: o governador Pedro Paulo Dias (PP), candidato à reeleição, o ex-governador Waldez Góes (PDT), que disputa uma vaga no Senado, o secretário de Segurança Pública, delegado federal Aldo Alves Ferreira, e o presidente do Tribunal de Contas do Estado, conselheiro José Júlio Miranda. Dias é o segundo governador no exercício do cargo preso por corrupção no Brasil. O primeiro foi José Roberto Arruda (ex-DEM), do Distrito Federal, que em fevereiro trocou a residência oficial por uma cela especial na superintendência da Polícia Federal em Brasília, a mesma cela reservada sexta-feira para o governador Dias.
De acordo com a Polícia Federal, as licitações eram fraudadas para que vencessem empresas escolhidas pelos acusados. A Secretaria de Educação do Amapá, por exemplo, firmou contrato emergencial com uma firma de vigilância por três anos, com pagamentos mensais superiores a R$ 2,5 milhões. Segundo a PF, há evidências de que parte do dinheiro era repassada, como propina, para as autoridades envolvidas no esquema.
Mudança na reta final
O ex-governador Orestes Quércia, em campanha no bairro da Liberdade, na capital, em agosto. A partir de agora, só tratamento. A desistência do ex-governador de São Paulo Orestes Quércia (PMDB) da eleição para o Senado criou aquilo que, no jargão da política, costuma ser chamado de “fato novo”: algo imprevisível, capaz de mudar o curso natural da disputa.
Quércia, de acordo com as pesquisas, estava na terceira posição, tecnicamente empatado com Netinho de Paula (PCdoB), o segundo colocado. Como há duas vagas, suas chances eram grandes, principalmente por causa do apoio do tucano Geraldo Alckmin, o líder na disputa pelo governo. No dia 6, porém, Quércia, de 72 anos, anunciou ser vítima de um câncer de próstata e preferiu se dedicar apenas ao tratamento da doença, que já teria atingido outros órgãos. Numa estratégia arrojada, ele não indicou um substituto, mas declarou apoio ao tucano Aloysio Nunes Ferreira. Em São Paulo, diferentemente do que ocorre em âmbito nacional, peemedebistas estão com os tucanos, contra o PT.
ÉPOCA Debate: Como o Estado deve atuar na economia?
Equipamento de perfuração da Petrobras no Rio de Janeiro. O governo criou outra estatal para atuar no setor, a Pré-Sal. Todo dia, esteja em casa, no trabalho ou se divertindo, o brasileiro anda aos esbarrões com um sócio grandalhão. O cidadão tem com o sócio um contrato: entrega a ele parte substancial do dinheiro que ganha e, em troca, espera que seja limpo o caminho para buscar a prosperidade. O sócio deveria garantir muita facilidade para o cidadão comprar, vender, poupar, planejar, investir, empreender, negociar, contratar. Atualmente, porém, em diversas situações o brasileiro não pode contar com a ajuda desse sócio – o Estado, uma organização formada por cerca de 540 mil funcionários, divididos por uma infinidade de repartições, departamentos, secretarias e autarquias, cujo dirigente máximo é o presidente da República.
O relacionamento entre o cidadão e seu sócio indesejado é conflituoso. Interessa a todo governante que o Estado seja o mais poderoso possível e que sofra um mínimo de cobranças; ao cidadão interessa o oposto: que o Estado seja tão frugal quanto possa, ao cobrar impostos, e extremamente eficiente, ao retirar os entraves do caminho para a prosperidade individual. Por isso, uma das difíceis opiniões que todo eleitor precisa formar é sobre o papel e o peso do Estado no desenvolvimento econômico. Esse será o tema do quinto encontro da série ÉPOCA Debate, na segunda-feira (13/9), na sede da Editora Globo (que publica ÉPOCA).
O pedigree petista do contador
O contador Antonio Carlos Atella Ferreira gosta de dizer, em tom de galhofa, que se filiou ao Partido dos Trabalhadores graças a uma combinação de bebida e paquera. De acordo com seus relatos, em 2003, ele participava de uma festa de petistas de Mauá, na Grande São Paulo, quando se encantou por uma moça que tinha a incumbência de engrossar as fileiras do partido. Na tentativa de conquistar a militante, Atella diz que assinou sua ficha de filiação e, de tão embriagado, teria errado até a grafia do próprio sobrenome: escreveu Atelka, em vez de Atella.
A versão descompromissada do contador que usou procurações falsas para acessar dados fiscais sigilosos da filha e do genro do candidato tucano à Presidência, José Serra, coincide com a versão do PT paulista. De acordo com o Diretório Estadual do partido, a filiação de Atella não fora aceita justamente por esse erro de grafia. Tal versão, porém, não durou dois dias. O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo reafirmou que Atella se filiou ao PT em 20 de outubro de 2003 e, desde então, nunca pediu desfiliação.
A peneira da Receita
De um computador colocado sobre uma mesa de canto, numa sala no piso superior da agência em Mauá, São Paulo, saiu uma das maiores crises da história da Receita Federal. A máquina era usada pela auxiliar de informática Adeildda Ferreira Leão dos Santos. Há quase três meses, Adeildda é uma das investigadas pela sindicância interna que apura o vazamento de dados sigilosos de personalidades ligadas ao PSDB. Documentos da sindicância examinados na semana passada revelam que no computador dela foram feitos 2.949 acessos a dados de contribuintes entre agosto e dezembro do ano passado. Sozinha, Adeildda teria sido responsável por 24,3% de todos os acessos da agência.
Foi de lá que brotaram os dados fiscais sigilosos de seis personagens ligados ao PSDB e ao candidato à Presidência José Serra. Só no dia 8 de outubro, foram cinco: Veronica Serra, filha de Serra, Eduardo Jorge Caldas Pereira, o vice-presidente do PSDB, Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-arrecadador de Serra, Gregório Marin Preciado, empresário aparentado de Serra, e Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro. Na semana passada, surgiu mais um. Os dados fiscais do empresário Alexandre Bourgeois, casado com Veronica, também foram devassados pela máquina de A-deildda. A consulta foi entre 10h43 e 10h46 do dia 16 de outubro de 2009.
Afinal, quem vai governar?
A escolha pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva do nome de Dilma Rousseff como candidata do governo ao Palácio do Planalto despertou dúvidas desde que foi revelada, há pouco mais de dois anos. Desconhecida do público e sem intimidade com o mundo político, Dilma entrou na corrida eleitoral guiada por Lula, dono de uma popularidade próxima a 80%. Lula traçou a estratégia de alianças federais e estaduais, indicou os principais integrantes do comando de campanha e desafiou a legislação eleitoral para tornar sua pupila conhecida. A evidente ascendência de Lula sobre Dilma produziu a suspeita de que, se eleita, ela continuaria dependente da atuação política do ex-chefe. Os movimentos feitos nas últimas semanas reforçaram a impressão de que, mesmo fora do Planalto, Lula exercerá forte influência em um eventual governo Dilma.
Na terça-feira, feriado de 7 de setembro, o programa de Dilma no rádio e na TV exibiu um veemente depoimento de Lula, bem no estilo peça de campanha. Em dois minutos e 15 segundos de aparição, Lula acusou o candidato do PSDB, José Serra, de “baixaria” na disputa e de pertencer à “turma do contra”. “Tentar atingir com mentiras e calúnias uma mulher da qualidade de Dilma é praticar um crime contra o Brasil e, em especial, contra a mulher brasileira”, afirmou Lula em horário nobre para milhões de eleitores. Sua presença ostensiva no programa eleitoral foi uma resposta às denúncias de violação do sigilo fiscal de personalidades próximas a Serra.
VEJA
Exclusivo: o polvo no poder
Propina dentro do Palácio do Planalto
Sob legenda: “Corrupção – Erenice: filho lobista”
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