Época
O poder e a influência do ex-diretor da Petrobras preso pela polícia
Como a PF prendeu o homem dos políticos na estatal – e quem é o novo lobista que pode levar a investigação ao caixa dois das campanhas eleitorais
Ao chegarem ao luxuoso condomínio Rio Mar IX, na Barra da Tijuca, na manhã da segunda-feira (17), os agentes da Polícia Federal no Rio de Janeiro provavelmente não sabiam que bateriam à porta de um dos homens mais poderosos da política brasileira. Para eles e os delegados que haviam obtido um mandado de busca e apreensão para vasculhar aquele nobre endereço, o engenheiro Paulo Roberto Costa era apenas mais um beneficiário – ainda que um beneficiário importante, por ter sido executivo da Petrobras – de um esquema de lavagem de dinheiro que movimentara cerca de R$ 10 bilhões nos últimos anos. Os policiais haviam descoberto que Costa era um cliente VIP de Alberto Youssef, um dos principais doleiros do país, apontado como chefe da organização criminosa desmontada, nos últimos dias, pela operação batizada pela PF de Lava-Jato.
Mas Paulo Roberto Costa não era apenas mais um ex-executivo da Petrobras. Ou um mero cliente de Youssef – doleiro ligado historicamente ao PP, um dos partidos da base aliada do governo Dilma, que lavou dinheiro para os deputados da sigla durante o mensalão. Entre 2004 e 2012, Costa foi o mais influente diretor da Petrobras. Não no Rio, onde funciona a sede da empresa. Mas em Brasília, onde funciona a sede do poder. Especificamente, naquele nicho em que dinheiro e política se combinam para conduzir os destinos do país. Costa era o principal elo da Petrobras com esse mundo. Comandava a área de abastecimento e refino da estatal. Controlava operações de compra e venda de combustível e obras em refinarias. Negociava contratos para a construção de novas usinas e para reparos nas antigas.
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Funcionário de carreira da Petrobras, Costa chegara ao cargo por indicação do PP, num momento em que o doleiro Youssef já lavava dinheiro para deputados do partido, com o aval do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, do PT. Com a crise do mensalão, Costa não caiu. Ficou ainda mais forte. O segredo? Entender – e atender, segundo seis pessoas próximas a ele, entre amigos, políticos e parceiros de negócios – as necessidades de Brasília. Passou a ter o apoio não apenas do PP e do PT. Mas também da turma do PMDB do Senado, a turma mais poderosa do PMDB. Com o tempo e o acúmulo de favores prestados aos políticos, ganhou a confiança do então presidente Lula, com quem mantinha uma linha direta de comunicação. Nunca recusava um pedido político.
Para os políticos, a diretoria de Costa na Petrobras era uma Disneylândia, repleta de ricas possibilidades. Quão ricas? Nos próximos quatro anos, a Petrobras pretende gastar US$ 39 bilhões nessa área. Supera a soma dos orçamentos de todos os ministérios comandados pelo PMDB. E a Diretoria de Abastecimento sempre apresentou uma vantagem essencial. Embora tenha um orçamento ligeiramente menor que a Diretoria de Exploração, concentra mais oportunidades de fazer dinheiro. Costa não precisava de autorização de mais ninguém para fechar centenas de contratos milionários de compra e venda de combustível. E tinha permissão de Lula para tocar os contratos bilionários de construção – todos com indícios de superfaturamento, segundo o Tribunal de Contas da União – das refinarias que a Petrobras ergue, bem lentamente e com sucessivos atrasos, no Brasil. A presidente Dilma Rousseff, que não gostava de Costa, tentava derrubá-lo desde o começo de seu governo. Encontrava resistências de todos os políticos, mesmo indiretamente, de Lula. Conseguiu apeá-lo apenas em 2012, para desespero da base aliada.
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O Brasil pede água
O país tem chuvas abundantes, os maiores rios do mundo, a maior quantidade de mananciais do mundo, litoral extenso – e vive sob o espectro de falta de água e energia. O que fazer para sair dessa?
Imagine um futuro assim: em 2044, o Brasil celebra uma nova redução no número de mananciais poluídos. A grande seca que afetou o Sudeste entre 2013 e 2016 mudou para sempre as políticas públicas. A cada eleição, os candidatos debatem como cuidarão da água. Há anos, avançam por todo o país projetos de despoluição de rios, lagos e represas, assim como o reflorestamento de suas margens. Os depósitos subterrâneos estão protegidos. Quase toda a população conta com água limpa e serviço de saneamento. Não há mais paranoia a respeito dos perigos de exportar água. Como cuida bem de seus mananciais, o país tem água mais que suficiente para produzir a carne, os grãos e as frutas que vende ao mundo. Estudos internacionais confirmam: ao fazer isso, o Brasil beneficia o meio ambiente global e os próprios brasileiros. A exportação evita que países mais pobres em água esgotem seus poucos mananciais. Em paz e alimentadas, nações mais ameaçadas por secas fecham acordos e investem em tecnologia. Conseguem baratear cada vez mais a dessalinização da água do mar. Vários países africanos em rápido desenvolvimento se beneficiam desse avanço. Agora, imagine outro futuro.
Em 2044, o Brasil lamenta um novo aumento no número de mananciais poluídos. Mais de dois terços dos rios, lagos e represas têm agora água ruim ou péssima, que exige tratamento caro e demorado antes de ser usada. Governo, empresas e cidadãos se ressentem dos erros de décadas. O país se tornou um pesadelo de favelas sem saneamento, reservatórios contaminados e água cara demais. O sistema de represas da Cantareira, em São Paulo, nunca se recuperou da grande seca de 2013 a 2016. Por causa das críticas da sociedade e da atuação de políticos e da Justiça, torna-se difícil destinar mais água à produção agrícola. E mais difícil ainda exportar essa água sob a forma de carne, grãos e frutas. Esse medo encontra eco na situação global. Na Ásia e na África, nações trocam ameaças e se engalfinham em guerras por causa de mananciais cada vez mais ressequidos.
Ambos os futuros, neste momento, são igualmente possíveis. O Brasil é uma potência da água. Não precisa sustentar nem 3% da população mundial, mas abriga 12% da água doce disponível no globo. Essa parcela aumenta para 18%, se contarmos a água que flui dos países vizinhos para o território nacional. Como um país desses pode comemorar o Dia da Água (22 de março) mergulhado numa crise energética e à beira do racionamento nas torneiras? A resposta está no mau uso do recurso.
Como o ministro Gilberto Occhi se envolveu num processo em que a Caixa foi condenada
Graças ao novo ministro das Cidades, o banco teve de indenizar uma cliente por empurrar produtos bancários e constrangê-la
Na noite de segunda-feira da semana passada, a maquiadora Sheila Góis, moradora de Aracaju, em Sergipe, repetia maquinalmente, como tantos brasileiros, seu ritual diário de lavar a louça após o jantar. O hábito envolve deixar a TV ligada no Jornal Nacional, de modo a se distrair com as notícias do dia. Quando Sheila ainda acabava de retirar a louça da sala, ouviu, a caminho da cozinha, que a presidente Dilma Rousseff dera posse a seis ministros naquele dia, em mais uma daquelas tediosas cerimônias no Palácio do Planalto. Escutou que um deles, Gilberto Occhi, assumiria o Ministério das Cidades. Sheila estacou, perplexa. Largou o prato que segurava e correu para a frente da televisão. “Não é possível que esse homem tenha virado ministro. Estou decepcionada com a presidente e com nojo da política”, disse ao marido. A 280 quilômetros dali, em Maceió, Alagoas, o empresário Márcio Coelho também assistia ao Jornal Nacional. Ao saber da mesma notícia, tomou um susto. E se revoltou. “Entregaram o ouro para os bandidos”, pensou, segundo disse a ÉPOCA.
Tanto Sheila quanto Márcio conheceram Occhi quando ele era apenas um burocrata da Caixa Econômica Federal no Nordeste. Ambos acusam Occhi – que ingressou na Caixa no início dos anos 1980 – de obrigá-los a contratar serviços bancários para que pudessem conseguir um financiamento. O nome dessa prática condenável é “venda casada”. Até dois anos atrás, ela era crime. Na semana passada, ÉPOCA conversou com os dois e teve acesso a documentos do Ministério Público, da Justiça Federal e de uma representação feita na Polícia Federal em Alagoas em junho de 2010. Eles apontam irregularidades cometidas por Occhi em sua passagem nos cargos de superintendente da Caixa em Sergipe e Alagoas.
Um relatório aponta desvio de verba na Fundação José Sarney
O memorial de Jango no terreno dos pracinhas
IstoÉ
Seca e apagão entram na campanha
Crise energética no país e problemas no abastecimento de água em São Paulo antecipam debates eleitorais e estimulam candidatos de oposição
Risco de racionamento de energia, contas de luz mais caras e o perigo da falta de água. Esses temas já esquentaram o debate político em outras ocasiões, mas poucas vezes influenciaram tanto uma campanha eleitoral como agora. O temor dos comitês de PT e PSDB é que a crise energética e os problemas no setor de abastecimento de água se transformem no calcanhar de aquiles tanto do governo como da oposição. Em São Paulo, a reeleição do governador Geraldo Alckmin, uma das principais lideranças do PSDB, corre risco de ser afetada pela falta de água causada pela seca do Sistema Cantareira, que atingiu a marca preocupante de 16% dos reservatórios sem que medidas preventivas fossem adotadas. No plano nacional, os oposicionistas a Dilma Rousseff ganharam um rosário de argumentos para questionar sua capacidade de gestora e especialista em sistema elétrico. Não bastasse a polêmica compra da refinaria de Pasadena, que contou com o aval de Dilma, gerando um prejuízo ao erário de R$ 1 bilhão, a possibilidade de racionamento de energia tem grande potencial para prejudicar a imagem da presidenta às vésperas das eleições. Em pronunciamentos públicos, nas últimas semanas, Dilma dedicou-se a afastar a hipótese de apagão energético, como o que castigou a população em 2001. Mas o cenário é preocupante.
O Plano Decenal de Energia afirma que, para evitar o apagão no Brasil, seria necessário investir R$ 21 bilhões por ano até 2022. O governo federal, entretanto, vem gastando menos da metade desse valor. As consequências ficaram evidentes. Os reservatórios das usinas hidrelétricas – responsáveis por quase 80% da geração energética do País – atingiram os níveis baixos e operam em sistema de alerta. Índices como o atual só foram registrados em 2001. Nos últimos dias, Dilma também vem colhendo os efeitos negativos da decisão de reduzir a conta de luz dos consumidores em 20%. A medida foi tomada em 2012 e desde então vem sangrando os cofres públicos. O maior problema é que o efeito será inverso para os consumidores e haverá aumento na conta de energia depois das eleições. A decisão já contabiliza prejuízo superior a R$ 22 bilhões somente no ano passado e vai levar o governo a gastar outros bilhões para socorrer as distribuidoras em crise. “O setor foi desestruturado pelo intervencionismo do governo e decisões populistas. Estamos vivendo um racionamento sim. A previsão de aumentar a conta de luz nada mais é do que uma medida para inibir o consumo e adiar o apagão”, criticou o senador e presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG). O pré-candidato do PSB ao Planalto, governador de Pernambuco, Eduardo Campos, também questionou a capacidade gerencial de Dilma.
A confissão do coronel
O militar Paulo Malhães revela como, quando e por que sumiu com o corpo do deputado Rubens Paiva durante a ditadura
Às vésperas dos 50 anos do golpe militar de 1964, respostas perseguidas há anos pelos familiares dos mortos e desaparecidos políticos da ditadura começam a aparecer. Na quinta-feira 20, o coronel reformado do Exército Paulo Malhães revelou ao jornal “O Dia” que ele foi um dos chefes da operação militar montada pelo Ministério do Exército em 1973 para desaparecer com o corpo do deputado federal Rubens Paiva, assassinado nos porões do DOI-Codi-Rio em 1971. O militar, um dos mais atuantes agentes do Centro de Informações do Exército (CIE), afirma na entrevista que as atrocidades cometidas por ele e por seus pares foram feitas com o conhecimento prévio dos generais do regime. Ele revela também que, para evitar o risco de identificação dos militantes mortos, os militares arrancavam as arcadas dentárias e os dedos das mãos dos presos políticos assassinados pelo regime. Eleito parlamentar pelo PTB em 1963 e cassado dez dias após o golpe, Paiva – agora sabe-se – foi enterrado duas vezes, uma no Alto da Boa Vista, zona norte da capital carioca, e posteriormente nas areias da praia do Recreio dos Bandeirantes, zona oeste da cidade. “Recebi a missão para resolver o problema, que não seria enterrar de novo. Procuramos até que se achou (o corpo). Levou algum tempo. Foi um sufoco para achar. Aí seguiu o destino normal”, disse Malhães ao jornal. “Normal” era o mar como cemitério. A confissão do militar vem à tona 43 anos após o assassinato de Paiva e quatro dias depois de o jornal “O Globo” revelar que a ordem de dar um fim definitivo à ossada do parlamentar partiu, em 1973, do gabinete do ministro do Exército Orlando Geisel, irmão do ex-presidente da República, o general Ernesto Geisel.
Segundo o militar, ele recebeu a missão de “dar um fim” ao corpo do parlamentar cumprindo uma ordem da Seção de Operações do Centro de Informações do Exército (CIE), acostumado, diz a reportagem, a “consertar cagadas” de militares de outros órgãos da repressão. O militar, ouvido pelo jornal carioca, contou que montou uma equipe de 15 homens que, disfarçados de turistas, passaram 15 dias abrindo buracos na praia, escondidos dentro de uma barraca, até encontrarem a ossada ensacada. “De lá, ele (o corpo) seguiu de caminhão até o Iate Clube do Rio, foi embarcado numa lancha e lançado no mar. Estudamos o movimento das correntes marinhas e sabíamos o momento certo em que ela ia para o oceano”, disse. O oficial admite que sabia de quem era o corpo procurado. “Eu podia negar, dizer que não sabia, mas eu sabia quem era, sim. Não sabia por que tinha morrido nem quem matou. Mas sabia que ele era um deputado federal, que era correio de alguém”, conta.
Malhães diz que estava investigando uma guerrilha no sul do Brasil durante a prisão do deputado. Só ao receber a missão é que foi informado de que o corpo tinha sido inicialmente enterrado em 1971 no Alto da Boa Vista. Mas, na ocasião, os militares temiam que obras na avenida Edson Passos acabassem revelando o cadáver. Então, o corpo foi retirado do local no mesmo ano e novamente enterrado na praia do Recreio dos Bandeirantes. Em 1973, o coronel conta que o CIE resolveu dar uma “solução final”.
O cartel não parou
Cade analisa documentos apreendidos e conclui que esquema tucano em São Paulo funcionou até 2013
Ao analisarem documentos apreendidos pela Polícia Federal na sede de 13 companhias acusadas de montar um cartel durante governos tucanos, técnicos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) concluíram que o esquema não teve freio. Ao contrário do que se imaginava até agora, a máfia dos trilhos não lesou os cofres públicos do Estado de São Paulo apenas entre 1998 e 2008. Foi além. Com base em e-mails e outros documentos, o Cade afirmou que o cartel bilionário se perpetuou “até, pelo menos, o momento da realização das operações de busca e apreensão, em julho de 2013”. Isso quer dizer que as empresas continuaram a agir na atual gestão do governador Geraldo Alckmin (PSDB). As provas apresentadas, além de depoimentos feitos ao Ministério Público, trazem informações arrebatadoras. Todas as cinco linhas do Metrô de São Paulo teriam sido alvo de alguma fraude, e a maior parte dos contratos firmados pelas empresas investigadas com a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) apresenta sobrepreço.
Segundo o Cade, para evitar rusgas futuras, diretores das empresas envolvidas chegaram até a assinar e guardar um acordo – uma espécie de contrato de gaveta – para repartir duas licitações da CPTM, a dos trens série 2100 e série 3000. Subscrito por executivos de Alstom, Bombardier, CAF e Siemens em 2002, o “memorando”, apreendido pela PF na sede da CAF, prevê desde o percentual de cada uma delas nos contratos até a quem caberá pagar os impostos pelos serviços prestados. O acórdão firmado entre as empresas fica evidenciado em uma troca de e-mails de executivos da multinacional espanhola CAF. Na mensagem, eles dizem que tentaram ampliar a participação nos “serviços de manutenção de 48 trens da série 2100 da CPTM”, mas enfrentaram dura resistência. A Alstom e a Bombardier, segundo os e-mails, foram contrárias a qualquer alteração. Já a consultoria Procint, do lobista Arthur Teixeira, mostrou claramente o seu papel na formação do cartel, ao lembrar “que existia um acordo assinado pela alta direção das empresas e que este tinha de ser mantido”.
Atacadas nos vagões
Série de casos de mulheres vítimas de violência sexual no transporte público de São Paulo revela a crescente onda de compartilhamento de imagens desse tipo de assédio em sites criminosos. Mas as iniciativas para coibir esse crime ainda são insuficientes
Nos últimos dias, vieram a público seis casos de assédio sexual no trem e no metrô de São Paulo que chocaram a população. Na segunda-feira 17, um estudante universitário foi preso em São Paulo por tentativa de estupro contra uma mulher que utilizava a Linha 7 – Rubi da Companhia de Trens Metropolitanos (CPTM). O homem foi acusado de cercá-la em um canto do trem, torcer seu braço, colocar o órgão genital para fora da calça e ejacular nas pernas da vítima. Detido e levado pela Delegacia de Polícia do Metrô, o criminoso foi autuado em flagrante por estupro. Dias depois, na quarta-feira 19, dois jovens foram presos apalpando as nádegas de duas adolescentes na estação Sé. Na quinta-feira 20, mais três homens foram autuados pela Delegacia de Polícia do Metropolitano (Delpom) de São Paulo. Os atos foram considerados importunação ofensiva ao pudor. Ao todo, 23 pessoas foram detidas por esse delito na capital paulista este ano. Casos de abusadores que se aproveitam da superlotação do transporte público urbano para praticar assédio sexual ocorrem há décadas. As últimas denúncias, no entanto, jogaram luz sobre uma série de páginas em redes sociais e sites criminosos que reúnem grupos que praticam esse tipo de violência e publicam fotos e imagens do momento da violação, os chamados encoxadores. A ONG Safer Net Brasil, que atua contra crimes na rede, registrou apenas na semana passada 19 denúncias sobre páginas de abusadores que cometem atos ilícitos no metrô e nos trens. “Com a popularização dos smartphones, a internet passou a ser uma vitrine para atos de violência cotidiana”, afirma Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da ONG.
Carta Capital
Dilma enfrenta o “blocão” e os boatos
A presidenta encarou a mais forte crise provocada por um partido da própria base política, o PMDB. Não foi um confronto qualquer
Dilma enfrentou e superou a mais forte crise provocada por um partido da própria base política. Não foi um confronto qualquer. Ela bateu-se com o PMDB, o maior e mais influente aliado da base de apoio governista no Congresso. Falou-se até mesmo, para susto nos mais ingênuos, em rompimento da aliança.
A presidenta pagou um preço pela pacificação. Principalmente aos deputados. Relutante, como de outras vezes, entregou um naco da administração, liberou verbas parlamentares e recuou em alguns pontos para resgatar a votação do Marco Civil da Internet. Tudo isso e algo mais, dentro das distorcidas regras das alianças políticas e do inchaço de uma administração com 39 ministérios. Assim diluiu gradualmente o chamado “blocão” de governistas e oposicionistas. Por onde passou um boi passou, em seguida, toda a boiada.
Alguns fanáticos da base governista chegaram a acreditar que muito mais gente, além deles próprios, romperia com a presidenta. Blefe. Quem desafiaria até o fim uma candidata que tem enorme chance de se reeleger?
Tentaram alguns golpes baixos. Não terá sido por coincidência a simultaneidade do grande debate no Congresso na quarta-feira 19, sobre a compra, pela Petrobras, da refinaria de Pasadena (EUA) com o boato de que a pesquisa Ibope, a ser divulgada no dia seguinte, apontava uma queda de 8 pontos nas intenções de voto para ela. Houve quem ganhou dinheiro com isso. Era especulação do mercado.
Dilma já não é o delfim
Porque no caminho da reeleição da presidenta, Lula não poderá desempenhar o mesmo papel que lhe coube em 2010
É da percepção até do mundo mineral que a campanha para as eleições de outubro de 2014 começou faz muito tempo. CartaCapital entende ser correto definir seu apoio a um dos candidatos, como sempre fez, somente quando começarem horário gratuito e debates diretos. Para tanto falta bom tempo, obscurecido neste momento por dúvidas ponderáveis.
Pelo caminho, surge o fantasma da Copa, amoitado nas carências da infraestrutura e nos andaimes das obras inconclusas. Está claro que o Mundial da bola funcionará como um mostruário do Brasil atual aos olhos do mundo. O que, sejamos claros, implica alguns riscos. Sem excluir a possibilidade, melhor, a probabilidade, de manifestações à sombra do torneio similares àquelas do ano passado. Ou mesmo mais acirradas.
Há outras pedras no percurso. No Fórum Brasil, realizado por CartaCapital nos dias 18 e 19 passados, a principal estrela do evento, o Prêmio Nobel Paul Krugman, no quadro de uma ampla análise dos efeitos da crise global, afirmou a “invulnerabilidade” do Brasil. Fez-lhe de contraponto o professor Delfim Netto, para lembrar que,graças aos juros “mais altos do mundo” praticados pelo Brasil, somente a Santa Casa de Misericórdia é mais caridosa com a especulação internacional.
Transparece a crítica a uma política econômica que, para manter o real em patamares irrealistas, representa um duríssimo golpe contra o empresariado brasileiro, mais feliz em outros tempos como exportador de manufaturados. No mesmo evento, o pré-candidato Eduardo Campos, ao sublinhar a longa vida do Brasil como exportador de commodities, desenvolveu a parábola de um país que remete minério de ferro ao exterior e recebe de volta os trilhos das suas ferrovias.
Veja
A Petrobras já foi solução para Dilma. Hoje é fonte de problemas
O uso ruinoso da estatal para segurar a inflação se soma, agora, a negócios nebulosos e denúncias de corrupção
O PT sempre usou a Petrobras como arma política. Nas duas últimas campanhas, seus candidatos diziam que o PSDB privatizaria a empresa se reconquistasse o poder. Acusados de mercadores do patrimônio nacional, os tucanos não tiveram repertório para responder aos ataques. A Petrobras foi usada como vitrine para alardear a competência administrativa de Dilma Rousseff — e, antes, a sorte de Lula pela descoberta em seu governo do “bilhete premiado” do pré-sal. Lula proclamou a autossuficiência do petróleo, sonho geopolítico histórico do Brasil. Em 2010, Lula defendeu a eleição da desconhecida ministra Dilma, apresentando-a como a responsável pelo novo modelo energético brasileiro, em que predominariam a oferta abundante de energia e a cobrança de tarifas cada vez menores dos consumidores. No palanque, ela foi a “Mãe do PAC”, gestora hábil, eficiente, a contraposição perfeita ao apagão de 2001, que foi vendido ao eleitorado como clara inépcia do governo Fernando Henrique. A estratégia funcionou em 2002, 2006 e 2010. Em 2014 pode funcionar, mas para os adversários. “A Petrobras virou a OGX da Dilma”, ironizou Aécio Neves, candidato a presidente pelo PSDB.
A área de energia se tornou um poço de piche de problemas. O Brasil importa petróleo. Antes de os poços do pré-sal renderem um centavo sequer, deles parecem jorrar apenas alcatrão e terebintina política. O risco de racionamento de eletricidade, antes inexistente no discurso oficial, foi reclassificado para “baixo” — mas é alto. As tarifas, comprimidas por ímpeto populista e estatizante, em breve vão obedecer às implacáveis leis econômicas, buscar seu patamar realista, e os brasileiros vão pagar a conta — seja pelo aumento de impostos para recompor as finanças públicas, seja pelos dígitos a mais nas contas de luz e na bomba de gasolina. Dilma e sua equipe econômica acreditam ter um dique capaz de segurar essas pressões inflacionárias e empurrar a encrenca para 2015. Pode até ser. Mas um desses problemas já escapou. É justamente o que vinha sendo a solução: a Petrobras.
A empresa de petróleo tem um ex-diretor preso pela Polícia Federal. O loteamento político já dá sinais de que minou sua eficiência. O uso da Petrobras para pagar o bilionário subsídio no preço da gasolina fez com que secassem recursos para áreas e atividades vitais — entre elas, a manutenção das plataformas marítimas, as quais, segundo os próprios responsáveis, que não conseguem se calar diante do descalabro, estão quase todas sucateadas.
Visto de fora, o quadro apresentado pela Petrobras também é horroroso. Ela perdeu 30 bilhões de dólares em valor de mercado, a maior queda entre as empresas brasileiras. A Petrobras vale hoje a metade do que valia antes de Dilma subir a rampa do Planalto. A estatal passou de pedra a vidraça, e os rivais já farejaram a fraqueza. A presidente acusou o golpe e, na semana passada, deflagrou uma operação de contenção de danos.
Um indicador infalível de que a coisa não está boa para um político é o fato de ele apanhar até quando faz a coisa certa. Dilma ficou em péssima luz durante toda a semana passada por uma avaliação equivocada de seu comportamento em 2006, quando presidia o conselho de administração da Petrobras e o órgão autorizou por unanimidade a compra de uma refinaria em Pasadena, Texas. O caso, revelado por uma reportagem de VEJA em 2012, tem contornos suspeitos — mas não por causa de Dilma e, tudo indica, até mesmo apesar dela.
O Cade investiga a atuação de cartel de trens em cinco estados e no governo federal
As UPPs sob ataque no Rio