Istoé
Marajás de jaleco
Há três anos, em meio ao escândalo dos atos secretos, o presidente do Senado, José Sarney, contratou uma auditoria da Fundação Getulio Vargas (FGV) para melhorar a gestão. Em seu relatório, os auditores propuseram várias medidas saneadoras. Entre elas, a extinção do Departamento Médico do Senado, considerado pouco eficiente ante a estrutura semelhante à de um hospital de pequeno porte. O relatório da FGV foi para a gaveta e, em vez de ser extinto, o serviço cresceu. Este ano, mais dez médicos passaram a integrar o corpo de 103 funcionários concursados.
Esses profissionais, que trabalham quatro horas por dia, em plantões montados de acordo com o tempo livre de cada um, embolsam mensalmente uma média de R$ 20,9 mil. Em alguns casos, o salário pode chegar a R$ 40 mil, somado a gratificações pouco justificáveis. Não bastasse toda a mordomia, ISTOÉ descobriu que vários desses médicos, além dos vencimentos oficiais, também recebem como terceirizados do próprio Senado.
A terceirização funciona da seguinte maneira: uma insuspeita entidade de classe denominada Associação dos Médicos de Hospitais Privados do Distrito Federal recebe do Senado e repassa os valores para as clínicas onde trabalham os médicos do próprio Senado. Em 2011, a entidade fechou contrato com a Casa parlamentar no valor de R$ 55 milhões para “intermediação no pagamento dos honorários relativos à prestação de serviços complementares à saúde, aos beneficiários do plano de assistência do Senado”. O contrato foi feito sem licitação.
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Bispo best-seller
Acusações de charlatanismo, curandeirismo e enriquecimento com a exploração da fé dos mais humildes não impediram a Igreja Universal do Reino de Deus de se transformar em um dos maiores fenômenos religiosos das últimas décadas. Nem mesmo a prisão de seu principal líder interrompeu o crescimento da denominação evangélica criada por Edir Macedo há 35 anos e hoje presente em 182 países. Certamente o contingente de fiéis conquistados pela IURD é que levou seu fundador a ser o principal protagonista de outro fenômeno que vem ocorrendo no Brasil desde 30 de agosto e na semana passada começou a ecoar também no Exterior. Trata-se de um fenômeno editorial.
“Nada a Perder”, primeiro livro da trilogia autobiográfica de Edir Macedo, lançado pela Editora Planeta há menos de três meses, já vendeu mais de 350 mil exemplares e ostenta o título de livro mais vendido no Brasil em 2012, de acordo com o portal Publishnews, referência para o mercado editorial. A biografia do bispo superou o best-seller mundial “50 Tons de Cinza” e deixou para trás as biografias de Eike Batista, Danuza Leão e Steve Jobs.
Sem nenhum compromisso com a cronologia dos fatos, o bispo conta pela primeira vez que sofreu bullying na infância em razão de um problema físico nas mãos. Seus dedos indicadores são tortos, os polegares finos e todos se movem pouco. “Muitas vezes senti um certo complexo de inferioridade, me considerava o patinho feio da escola e até da família. Sempre fui motivo de zombaria. Muitos adultos e meninos da minha idade me chamavam de dedinho.”
Joaquim vai peitar o congresso?
Na tarde da quinta-feira 22, cerca de duas mil pessoas estiveram no Supremo Tribunal Federal para assistir à posse do ministro Joaquim Barbosa na presidência da corte. Não ocorria ali apenas uma troca de comando. A solenidade era a representação de um avanço da sociedade brasileira, com a ascensão do primeiro negro ao mais importante posto do Judiciário. Mas as cerimônias também estavam carregadas de uma forte expectativa institucional: a de que soprem novos ares sobre a Justiça do País. Ou uma verdadeira ventania, a julgar pela determinação, o estilo corrosivo, o ar desafiador e o rigor com que Barbosa tem atuado no julgamento do mensalão.
Pelos planos de Barbosa, o primeiro – e talvez mais explosivo – capítulo dessa transformação ocorrerá com o Congresso Nacional. A presença pífia de políticos na cerimônia de posse serviu de termômetro para os embates que estão por vir. Já nos próximos dias, o novo presidente do STF pretende conduzir uma votação para retirar do Parlamento a prerrogativa de cassar seus integrantes mesmo depois das decisões definitivas do STF.
Outro embate de Joaquim Barbosa será travado com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A amigos, Barbosa afirmou que uma de suas primeiras medidas à frente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) será enfrentar a advocacia de filhos e cônjuges de magistrados de tribunais superiores. Na condição de presidente do colegiado, o ministro vai tentar convencer os 15 conselheiros a proibir essas práticas. Entre os atingidos pelas mudanças na regra estão filhos do atual corregedor do CNJ, ministro Francisco Falcão. A OAB, no entanto, deve reagir.
A pizza de Cachoeira
Um contraventor reincidente, um senador que liderava a bancada da ética e uma empreiteira de porte nacional. Começou assim o escândalo envolvendo o bicheiro Carlinhos Cachoeira e seus tentáculos no poder público. Em abril, após a divulgação de escutas telefônicas pela Polícia Federal, a Câmara e o Senado instalaram a CPI mista que deveria avançar além das apurações feitas pela PF nas operações Monte Carlo e Vegas. Com Cachoeira preso e o senador Demóstenes Torres acuado, a CPI só trabalhou para acalmar a voz das ruas, que pedia a cabeça do parlamentar amigo do bicheiro.
Três meses depois da criação da comissão, o senador foi cassado e os trabalhos começaram a fazer água. As informações sobre os tentáculos da empreiteira Delta em órgãos públicos e sua influência junto a autoridades cresciam a cada dia, mas a maioria dos integrantes da comissão decidiu ignorar as evidências. Depois de firmarem um pacto de não agressão, os parlamentares esvaziaram a CPI. A promessa de pizza foi concretizada na quarta-feira 21, no relatório do deputado Odair Cunha (PT-MG).
Os trabalhos da comissão terminaram e 638 requerimentos de convocação e quebras de sigilo nem sequer foram analisados. O esperado documento final do relator chegou sem informações novas sobre a teia de corrupção de Cachoeira, envolvendo parlamentares, integrantes do Judiciário e gestores municipais. O desfecho da comissão ocorreu no mesmo dia em que Cachoeira foi solto do presídio da Papuda, em Brasília, onde ficou encarcerado por nove meses. O relator não foi econômico nos indiciamentos. Apontou 34 pessoas que estariam envolvidas com Cachoeira em seu parecer.
Muitos dos nomes, no entanto, já constavam de denúncias do Ministério Público. De novo no relatório está o indiciamento de algumas autoridades e o pedido de investigação contra o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. O governador de Goiás, Marconi Perillo, o ex-senador Demóstenes Torres e o deputado Carlos Leréia (PSDB-GO) abrem a lista de 12 acusados de usar a influência de cargos públicos para obter vantagens do esquema do contraventor.