Época
Ajuda de pai para filho
Ao ser escalado para relatar o Orçamento da União de 2011, o senador Gim Argello (PTB-DF) chegou ao topo da carreira política iniciada em 1998, quando se elegeu deputado distrital em Brasília. Em 2007, ele assumiu no lugar de Joaquim Roriz, que renunciou ao Senado para fugir de um processo de cassação. Presidente do PTB do Distrito Federal, Gim era suplente de Roriz e ganhou sete anos e seis meses de mandato. Desde o começo, ele se aproximou de caciques do Congresso, como José Sarney (PMDB-AP) e Renan Calheiros (PMDB-AL), e se tornou um interlocutor do Palácio do Planalto. No mês passado, Gim sofreu um revés ao ser acusado de destinar dinheiro do Ministério do Turismo para entidades de fachada. Em consequência, perdeu o cargo de relator. Depois do escândalo, Gim sumiu do Senado. Antes, porém, apresentou as emendas a que tinha direito no Orçamento. Uma delas destina R$ 3 milhões do Ministério das Cidades para obras de infraestrutura na Cidade Ocidental, município goiano de 55 mil habitantes que fica a 50 quilômetros de Brasília.
A família Argello tem importantes investimentos imobiliários na Cidade Ocidental. ÉPOCA descobriu uma ação judicial apresentada com o objetivo de definir os limites de uma propriedade rural de 151 hectares no município (1 hectare equivale aproximadamente a um campo de futebol). O filho mais velho de Gim, Jorge Argello Júnior, de 20 anos, é um dos autores do processo. Em junho de 2008, então com 17 anos, o rapaz comprou parte do terreno em parceria com Tarik Faraj Vieira, empresário filiado ao PTB em Brasília. De acordo com os registros do cartório, o negócio foi de R$ 330 mil. Atualmente, existe uma plantação de soja na propriedade, usada por um produtor rural. Sejam quais forem os planos de seus donos para o imóvel, a definição dos limites do terreno é o primeiro passo para qualquer empreendimento. A região onde até há pouco tempo havia apenas fazendas e chácaras vive acelerada expansão urbana, impulsionada pelo boom imobiliário que ocorre em áreas dentro do Distrito Federal. A eventual construção de obras de infraestrutura terá como efeito direto uma valorização ainda maior da área. Proprietários de terras na Cidade Ocidental ouvidos por ÉPOCA afirmam que o assédio imobiliário no local é intenso e que a atividade agropecuária tem os dias contados. O lugar parece estar em preparação para uma era de grandes condomínios. “Tudo valorizou exageradamente”, diz o produtor rural Fábio Corrêa de Oliveira, morador há 20 anos da região. Gim tem papel importante na transformação sofrida pelo município. Em companhia do aliado político e prefeito da Cidade Ocidental, Alex Batista (PR-GO), Gim anunciou recentemente projetos de habitação para construir por lá 30 mil casas e apartamentos com recursos do programa federal Minha Casa Minha Vida.
Salvador ladeira abaixo
Sem o apoio político do governador Jaques Wagner, do PT, abandonado pelo próprio partido, o PMDB, isolado na Câmara Municipal e sem dinheiro nem para pagar os prestadores de serviço, o prefeito de Salvador, João Henrique Carneiro, começou o ano mergulhado na mais grave crise de sua administração. Não bastasse ter de preparar a cidade para ser uma das sedes da Copa do Mundo de 2014 e colocar nos trilhos um metrô de 6 quilômetros, cuja obra se arrasta há quase 12 anos, Carneiro corre o risco de enfrentar um impeachment. Na quinta-feira, durante a tradicional Lavagem do Bonfim, Jaques Wagner perguntou ao líder do PT na Câmara, Henrique Carballal, se havia clima para o impedimento do prefeito. “Clima se cria”, disse Carballal. “Se a gente não apoiar, ele cai.” Carneiro não foi à festa do Bonfim. Aparentemente, não havia clima para ele por lá.
Carneiro chegou à atual situação depois de firmar e dissolver sucessivas alianças e romper com praticamente todas as lideranças políticas baianas importantes. “Ele é o principal fator de instabilidade de seu governo”, afirma o cientista político Paulo Fábio, da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Carneiro se elegeu em 2004 pelo PDT. Rompeu com o partido e, em 2007, filiou-se ao PMDB. Aproximou-se do então ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), opositor do governador Jaques Wagner no Estado. Geddel foi fundamental para a reeleição de Carneiro à prefeitura, em 2008, e esperava que o prefeito retribuísse o apoio político na disputa ao governo do Estado, em 2010. No entanto, a adesão do prefeito à campanha de Geddel não aconteceu. O mal-estar tornou-se crise partidária depois que Carneiro anunciou uma inesperada reforma de secretariado e demitiu os últimos apadrinhados de Geddel da administração. Em seu blog, Geddel comparou Carneiro ao “menino maluquinho” e chamou a prefeitura de “manicômio”. “O modo de agir do senhor prefeito é uma coisa errática, sem rumo definido. Hoje é uma coisa, amanhã é outra. Isso não é administração coisa nenhuma. É coisa de doido”, escreveu Geddel.
Por que somos solidários
Era dia de sol no feriado de São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro. Mal a quinta-feira amanheceu, a estudante de enfermagem Caroline Martins, de 21 anos, acordou e saiu de casa. Seu destino não era a praia. Uma hora e meia depois, ela estava entre os mais de 100 voluntários que trabalhavam no Ginásio Poliesportivo Pedro Jahara, no centro de Teresópolis, uma das cidades com mais mortos e desabrigados pela tragédia das chuvas no Estado. Munida de cuidado e paciência, ela fazia a triagem de toneladas de roupas que chegaram ali por meio de doações. As arquibancadas, que têm capacidade para 5 mil pessoas, estavam lotadas. Seu primeiro trabalho era separar o que servia. Muita coisa chegava rasgada ou mofada. Depois, dividia entre masculino, feminino, infantil e ainda calçados e acessórios. O material era enviado a outro grupo, que, na quadra central, o separava por tamanho e tornava tudo disponível para as famílias que procuravam o local. “Nessas horas, ajudar dá mais prazer do que se divertir”, diz Caroline. Ela subiu a serra para integrar alguma equipe de saúde, já que está no 6º período da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Minha vida após a tragédia
As chuvas do verão passado provocaram centenas de mortes e deixaram marcas profundas na vida de milhares de moradores do Rio de Janeiro. Há um ano, as águas arrasaram Angra dos Reis. O desmoronamento da pousada Sankay, em Ilha Grande, tornou-se símbolo da catástrofe. Em abril, foi a vez da capital e de Niterói sofrerem com a fúria das águas. Elas deixaram um rastro de destruição e expuseram as falhas dos poderes públicos na tomada de ações preventivas para impedir a ocupação de áreas de risco. O resultado do balanço das três grandes tragédias do Rio em 2010 foi mais de 250 mortes e milhares de desabrigados.
O que aconteceu com as famílias sobreviventes? Para onde foram? Que tipo de ajuda receberam? Estão mais seguras agora? ÉPOCA foi atrás de algumas vítimas das tragédias passadas para tentar responder a cada uma dessas perguntas. O resultado é desalentador.
É hora de afrouxar?
A maior tragédia natural da história do Brasil virou munição para os ambientalistas que se opõem à alteração da lei de florestas. O chamado Código Florestal, criado em 1965, mas nem sempre cumprido à risca, é o conjunto de normas que trata da ocupação do solo. Entre outras coisas, ele proíbe o uso de topo de morros, restringe obras em terrenos em declive e estabelece a distância mínima de 30 metros para edificações perto de rios. No ano passado, o deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP) começou a liderar um movimento para mudar essa lei. Sua proposta, em trâmite na Câmara, propõe anistiar quem derrubou floresta e afrouxar as regras para ocupação e novos desmatamentos. O objetivo, diz, é regularizar milhares de agricultores que, antes de 1965, já produziam em áreas agora vetadas.
Os ambientalistas consideram a proposta de Rebelo, apoiada pela bancada de ruralistas do Congresso, uma afronta à manutenção das florestas. Com a catástrofe do Rio de Janeiro, essa turma aumentou a carga contra a revisão do Código. O argumento é que o poder público ficaria sem o aparato legal para reivindicar a desocupação de áreas irregulares. Os ambientalistas dizem ainda que o abrandamento da lei incentivaria mais ocupações perigosas.
Dilma se afasta do Irã
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tornou o Irã numa espécie de símbolo de como sua política externa era mesmo independente. Enquanto a comunidade internacional condenava o governo do presidente Mahmoud Ahmadinejad por violar direitos humanos, financiar terroristas e conduzir um programa nuclear de intenções para lá de suspeitas, Lula resolveu se aproximar do Irã. Seu argumento era que isso teria efeitos positivos no comércio do Brasil com os países do Oriente Médio. Ele recebeu Ahmadinejad no Brasil e chegou a se engajar numa negociação para tentar evitar novas sanções contra o Irã, acusado de tentar fabricar uma bomba atômica. Em maio de 2010, Lula viajou para Teerã com líderes turcos para negociar um acordo – que fracassou. Agora, a presidenta Dilma Rousseff dá os primeiros sinais de afastamento do Irã.
Cadê a universidade anunciada aqui?
O governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o que mais expandiu o acesso às universidades federais na história do país. Em oito anos, foram anunciadas 14 universidades e 125 campi novos. Juscelino Kubitschek foi o único presidente a se aproximar dessa marca, com 11 universidades em cinco anos. Lula ampliou também o alcance das unidades já existentes no mais ambicioso programa de crescimento do setor: criou mais de 80 mil vagas, 70% de aumento em relação a 2003. Lula foi pessoalmente lançar e inaugurar grande parte dessas universidades, ocasiões em que se vangloriava sobre como o presidente sem diploma foi o que mais trabalhou pelo ensino superior. “De todos os presidentes que o Brasil teve, uma parte foi advogado, outra foi professor. Eu, torneiro mecânico, já sou o presidente que mais fiz universidades”, disse na inauguração da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, em Minas Gerais. Os números e as imagens foram largamente propagandeados na campanha eleitoral da presidenta Dilma Rousseff, em 2010. Foram citados também no último pronunciamento à nação, quando Lula se despediu em cadeia nacional no rádio e na TV com um discurso de balanço do governo. Nem Dilma nem Lula, porém, revelaram como as universidades conseguiram operar o milagre da multiplicação.
O retorno do ditador
Quando alguém diz que as coisas podem sempre piorar um pouco mais no Haiti, não duvide. Depois de um terremoto e de um surto de cólera no ano passado, o mais novo capítulo da trágica sina do país mais pobre das Américas foi o regresso do ex-ditador Jean-Claude Duvalier, de 59 anos. Exilado na França desde 1986, quando um levante popular encerrou seu governo ditatorial de 15 anos, ele causou espanto na maioria dos haitianos ao desembarcar no aeroporto de Porto Príncipe no dia 9. Vinte e cinco anos depois, voltava à mente dos haitianos o brutal “reinado” dos Duvaliers (leia no quadro abaixo) , iniciado em 1957 com o pai dele, o médico François, chamado Papa Doc, e herdado pelo filho, apelidado Baby Doc. “Vim para ajudar meu país”, disse o ex-ditador. No momento em que o Haiti vive um impasse por conta do adiamento do segundo turno das eleições presidenciais, é difícil imaginar como uma figura que traz à memória tempos sombrios poderia contribuir para tirar o país do caos. Trouxe, sim, ainda mais incertezas.
Carta Capital
O discreto estilo de Dilma Rousseff
Primeira mulher a comandar o País, a presidenta se veste de forma sóbria. Um pouco conservadora, há quem diga. Nas roupas, opta pelos tons café, terracota e bege. A maquiagem é discreta e as joias, pouco chamativas. “Ser mulher presidenta não é fácil. Para os homens é mais simples, basta sair com uma camisa e uma gravata. O que fiz foi me adaptar às agendas, porque era complexo ter sempre comigo um par de sapatos diferentes se saía a campo ou um vestido, se tinha de comparecer a algo mais formal”, declarou a presidenta. Não, não foi Dilma Rousseff quem disse isso, mas sua colega Laura Chinchilla, que tomou posse em maio do ano passado na Costa Rica.
Uma coisa é se eleger presidenta. Outra é livrar-se da abordagem “feminina” (alguns diriam fútil) do fato de uma mulher ter chegado lá. Nem Ângela Merkel, a dama de ferro alemã, se livrou de ter a maneira de vestir discutida, o que talvez desminta a ideia de que seria provincianismo nosso explorar batons, marcas de roupa, bolsas e sapatos da mulher que chegou à Presidência. Ora a imprensa alemã caçoava da imagem da candidata pescando ao lado do marido, metida em uma calça de agasalho e camisa masculina, ora fazia troça do inusitado decote da já primeira-ministra em uma noite na ópera de Oslo, em 2008. E que, diga-se de passagem, deixava à mostra um belo colo de mulher aos então 53 anos de idade.
Dilma propõe corte de impostos em folha de pagamento
Com o objetivo de incentivar o aumento dos empregos formais no País a presidenta Dilma Rousseff vai propor redução de contribuição à previdência na folha de pagamento das empresas. De acordo com a reportagem publicada nesta sexta-feira 21, no jornal Folha de S.Paulo, a proposta será enviada ao Congresso em fevereiro.
Inicialmente seria feito um corte de dois pontos percentuais na taxa de contribuição e, ao longo dos próximos anos, haveria um total de 14% de redução na taxa.
A estimativa da proposta, além de beneficiar as empresas, é de que a longo prazo aumente o número de funcionários com registro em carteira.
Os males do serrismo
Não há partidos ou movimentos políticos exclusivamente bons ou unicamente ruins, se os considerarmos em seu tempo e lugar. Na vida real das sociedades, eles são uma mistura de coisas boas e más, de acertos e erros (salvo, é claro, exceções como o nazismo).
Tudo é uma questão de proporção, do peso que o lado ruim tem em relação ao bom. São bons os movimentos políticos e os partidos (bem como as tendências que existem no interior de alguns), cuja atuação tende a ser mais positiva para o País, seus cidadãos e instituições. São os opostos aqueles que fazem o inverso, que agem, na maior parte das vezes, de maneira negativa.
Tome-se o serrismo, um fenômeno pequeno, do ponto de vista de sua inserção popular, mas relevante no plano político. Afinal, não se pode subestimar uma tendência tucana que conseguiu aprisionar o conjunto de seus correligionários, mesmo aqueles que não concordavam com ela (e que eram maioria), e os levou a uma aventura tão fadada ao insucesso quanto a recente candidatura presidencial do ex-governador José Serra. E que tem, além disso, tamanha super-representação na mídia, com simpatizantes espalhados nas redações de nossos maiores veículos.
Por menor que seja sua base social e inexpressiva sua bancada parlamentar, o serrismo existe. E atrapalha. Muito mais atrapalha que ajuda.
Neste começo de governo Dilma, recém-completada sua primeira quinzena, o serrismo já mostra o que é e como se comportará nos próximos anos. Os sinais são de que será um problema para todos, seja no governo, seja na própria oposição.
Vem da grande imprensa paulista (uma insuspeita fonte na matéria), a informação de que seus integrantes estão revoltados com a trégua que outras correntes do PSDB estariam dispostas a oferecer à presidenta. Em vez da “colaboração federativa” buscada pelos governadores tucanos e as bancadas afinadas com eles, os serristas querem “partir para o pau”.
Deploráveis distorções
Da imprensa nativa há quem faça diariamente, em meu exclusivo proveito, algo assim como um clipping oral: seleciona o que é indispensável averiguar. Janeiro é, porém, impiedoso comigo. Reparem: CartaCapital é produzida por 11 profissionais, incluídos dois sediados em Brasília, um no Rio e um em Paris. Neste momento, quatro estão de férias, a começar pelo redator-chefe que também desempenha o papel de clipeiro. Donde a súbita obrigação de ler os jornais antes de partir para a faina costumeira.
Na primeira página do Estadão de terça 18 leio a chamada de primeira página: “O fiasco do economista-cartola”. Não me permiti ler o texto correspondente na seção de esportes. Conheço a história e me bastou o título. Luiz Gonzaga Belluzzo, protagonista do enredo, é meu eterno companheiro de mil aventuras, inclusive CartaCapital. Não é somente professor de economia, um mestre em matéria e mais algumas, mas também ousado sonhador. Imaginem que pretendeu demonstrar a possibilidade de se dirigir um clube de futebol sem ser cartola.
IstoÉ
Toque de recolher
O capitão paraquedista Luiz Fernando Ribeiro de Sousa está há quase dois meses proibido de sair de sua residência em uma vila militar na pacata cidade de General Câmara, a 80 quilômetros de Porto Alegre. Militar da ativa e oficial do Arsenal de Armas do Rio Grande do Sul, capitão Fernando, como é conhecido, está preso e sentará no banco dos réus nos próximos dias diante de um Tribunal Militar que poderá afastá-lo dos quartéis. Considerado inimigo do Exército brasileiro, ele fundou há dois anos um movimento, junto com outros capitães, batizado de Capitanismo – que defende a adequação das normas da caserna à Constituição Federal. Na prática, Fernando advoga pela reformulação do Estatuto e do Código Penal Militar, ambos anteriores à Carta Magna de 1988. “Defendemos a manutenção da hierarquia e da disciplina militar, mas as coisas mudaram nas últimas quatro décadas”, escreveu ele à presidente da República, Dilma Rousseff, ainda durante a campanha eleitoral.
Os fantasmas do Araguaia
Queria vê-lo uma única vez antes de morrer, meu filho.” Foi com esse apelo emocionado que Carmem Navarro, 80 anos, encerrou a carta que escreveu no final do ano passado a Hélio Luiz Navarro Magalhães. O ex-militante do PCdoB, codinome Edinho, é dado como morto desde março de 1974, um mês depois de ter sido preso por militares. A carta de Carmem foi entregue, por intermediários, a um oficial reformado da Marinha, que garante manter contato com o ex-guerrilheiro, que estaria vivendo há 40 anos com nova identidade. Dona Carmem não quis dar entrevista, mas o conteúdo da carta foi confirmado por seu advogado, Márcio Donnici. Magalhães não seria o único dos desaparecidos da guerrilha do Araguaia a desfrutar de uma vida clandestina. Luís René da Silveira, Antônio de Pádua Costa, Áurea Elisa Valadão e Dinalva Oliveira Teixeira também são apontados como “mortos-vivos” em relatório do Grupo de Trabalho Tocantins (GTT), formado por militares, pesquisadores e familiares de desaparecidos políticos. O núcleo foi criado pelo Ministério da Defesa para tentar encontrar as ossadas de 69 guerrilheiros mortos pelo Exército nos anos 70, na região de Xambioá (TO).
Dilma de ferro
A três dias da posse, sem fazer alarde, a presidente Dilma Rousseff sacou o telefone celular da bolsa e ligou para o presidente do PCdoB, Renato Rabelo. Na pauta da conversa, a candidatura do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) à presidência da Câmara. “Vocês não podem insistir com o nome do Aldo. Precisamos de consenso neste momento. Querem que isso seja interpretado como um movimento de oposição?”, questionou a presidente. Começava ali a operação comandada com mãos de ferro por Dilma destinada a mudar os rumos da eleição da Câmara, que prenunciava uma disputa fratricida de consequências imprevisíveis entre integrantes de partidos da base aliada ao governo. Desde então, os candidatos avulsos saíram, um a um, do páreo. Os resultados práticos da ação direta da presidente foram colhidos na última semana. Na quinta-feira 20, o candidato do PT e do governo ao comando da Câmara, deputado Marco Maia (RS), recebeu o apoio de dez partidos, entre eles o PCdoB, de Aldo e Renato Rabelo. Pela primeira vez, desde 2003, a eleição na Casa caminha para uma candidatura única. Para se ter uma ideia da dificuldade de consenso na Câmara, nem o peemedebista histórico, ex-deputado Ulysses Guimarães, expoente da redemocratização no Brasil, conseguiu ser aclamado pelos colegas. “Dilma teve um papel fundamental para a unidade na Câmara. A opinião dela pesou e as bancadas foram naturalmente convergindo para o consenso”, atesta Rabelo.
Sorriso da presidente
Enquanto o Rolls-Royce presidencial atravessava a Esplanada dos Ministérios em Brasília, no dia da posse da presidente Dilma Rousseff, uma cena curiosa chamou a atenção daqueles que acompanhavam a solenidade de perto. De repente, Dilma tirou os olhos da multidão, mirou para o lado oposto da pista e sorriu para um fotógrafo solitário que estava com os olhos inundados de lágrimas. Não era apenas mais um brasileiro emocionado com a ascensão da primeira mulher à Presidência da República. Tratava-se de Edison Castêncio, um ex-flanelinha que foi retirado das ruas de Porto Alegre por Dilma e seu ex-marido Carlos Araújo, no início da década de 80. Órfão de pai e mãe, Castêncio tinha 24 anos e dormia sob viadutos e sobre os bancos da rodoviária da capital gaúcha quando Araújo e Dilma, então assessora da bancada do PDT no Estado, mudaram o seu destino. Os dois simpatizaram com Castêncio, que sempre perambulava em volta da Assembleia, de extremo bom humor, mesmo com toda a adversidade. O casal deu-lhe um emprego informal de office-boy no gabinete de Carlos Araújo, na época deputado estadual. “Eu passava fome, tinha dia que eu comia só pão com água. Devo tudo à Dilma”, diz ele, que passou a ser chamado de “Sorriso”.
A dura vida numa região devastada
O movimento das nuvens ainda é acompanhado com apreensão. Em Nova Friburgo, a cidade mais afetada pelas enchentes que varreram casas e vidas na região serrana do Rio de Janeiro, olhar para o céu em busca de sinais de chuva virou coisa automática. No lugar, antes conhecido pelo ar puro, tornou-se comum o uso de máscaras que ajudam os moradores a respirar melhor, a se proteger do mau cheiro e da poeira que há poucos dias era lama e matou muita gente. Até a sexta-feira 21, tinham sido contados 762 mortos e mais de 400 desaparecidos. Em todos os sete municípios castigados pelo aguaceiro, entre os quais Teresópolis e Petrópolis, sumiram casas, lavouras, fazendas, pontes e ruas. Ainda há lugares sem luz e água, indústrias operam precariamente, hotéis estão fechados e comerciantes tentam recuperar suas instalações para voltar a funcionar. “Mesmo para quem não teve mortes na família a vida depois da enchente vai ser muito dura”, diz Elcio Machado, enquanto tira lama de sua loja de baterias de automóvel, que foi tomada pelas águas. Como recomeçar? Muita gente não consegue imaginar resposta para essa pergunta. “Minha casa foi arrasada, a lavoura onde meu marido trabalhava não existe mais. Não sabemos o que fazer”, diz Tatiana Janício, 19 anos. Por enquanto, Tatiana se concentra em embalar o sono da filha Giovana, de um ano e três meses, alojada numa escola que acolhe desabrigados. Em meio a um cenário desolador, a população ainda está longe de conseguir retomar sua rotina.
“A Maria da Penha me transformou num monstro”
O economista colombiano Marco Antonio Heredia Viveros chega sorrateiro. Pele bronzeada. Sorriso discreto. Testa alongada pela calvície. Puxa uma pequena mala preta de rodinhas apinhada de papéis. Na outra mão, traz uma pasta surrada estilo 007. Caminha de maneira altiva. Sem olhar para o chão. De camisa azul-clara – mangas compridas, poída, quase colada ao corpo – e calça bege, parece em forma. Declara ter 57 anos, apesar de documentos antigos apontarem sete anos a mais. Com sotaque carregado e depois de me dar um forte e inesperado abraço, Heredia pergunta: “Fez uma boa viagem?”. Durante as nove horas de entrevistas – somadas a uma sessão de fotos e a uma extensa troca de e-mails – ele tenta se mostrar cortês e inofensivo. Pensa em cada frase. Quando foge do script e escorrega nas palavras, respira demoradamente e sorri. Me chama de “meu anjo” e “querida amiga”. “Não sou o que as pessoas pensam”, afirma. “A Maria da Penha me transformou num monstro. Não tentei matá-la. O único erro que cometi foi ter sido infiel. Por isso, ela armou toda essa farsa. Essa mulher é um demônio.”
Nota da redação: a nova edição da revista Veja ainda não está disponível na internet.
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