Época
Eles merecem ganhar tanto? (É você quem paga)
Um elefante incomoda muita gente. Dois elefantes incomodam, incomodam muito mais. Quando são gordos, movimentam-se com dificuldade. E, quando param no meio do caminho, impedem que os outros sigam em frente. Gigante e ineficiente, o Estado brasileiro é frequentemente comparado a um elefante. Talvez o paralelo mais correto fosse compará-lo não com um, dois, três ou quatro, mas com uma manada inteira, cujo peso se fez sentir, em toda a sua portentosa tonelagem, nas últimas semanas.
Primeiro, na maior onda de greves de funcionários públicos desde que o Partido dos Trabalhadores assumiu o poder, em 2003 – os elefantes que param no meio do caminho e impedem que o país siga em frente. Extremamente bem tratados no governo Lula, quando ganharam aumentos salariais bem acima dos obtidos pelos trabalhadores da iniciativa privada, os servidores se tornaram pesados demais para o país carregar. A ponto de o próprio Lula ter reconhecido isso publicamente, apoiando a presidente Dilma Rousseff em seu esforço para enfrentar as greves. Embora algumas categorias ligadas ao Executivo federal, em especial os professores, não tenham recebido aumentos tão polpudos na era Lula, a maioria não tem do que reclamar.
Leia também
Segundo, na grita dos sindicatos ligados ao setor público – e na enxurrada de ações judiciais que eles promoveram – para tentar evitar a divulgação dos salários nominais do funcionalismo. Esses são os elefantes gordos. As ações conseguiram travar a abertura dos vencimentos de funcionários de várias categorias, como no caso dos servidores do Congresso Nacional. Outras categorias não ofereceram resistência à medida ou foram derrotadas em seus pleitos na Justiça, com base na Lei da Transparência, em vigor desde maio. Entre as listas divulgadas em todo o país, uma das mais controvertidas foi a que revelou os maiores salários pagos pelo governo do Estado de São Paulo.
Leia tudo sobre a Lei de Acesso
Leia tudo sobre supersalários
As provas contra o BMG
Em março de 2006, o então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, enviou ao Supremo Tribunal Federal a denúncia do mensalão. Nela constavam 40 acusados de participar do esquema. Dois bancos haviam abastecido o mensalão, mas apenas os dirigentes de um, o Rural, haviam sido denunciados. A cúpula do BMG não fora incluída entre os réus porque o Ministério Público queria investigar melhor as relações do banco com o governo petista. Apesar disso, Antonio Fernando apontou como o BMG participara do mensalão: “Buscando o recebimento de ganhos indevidos do governo federal, o que de fato ocorreu, os dirigentes do BMG injetaram recursos milionários na empreitada delituosa, mediante empréstimos simulados”. Pelo menos um ganho, segundo Antonio Fernando, ficara comprovado: “O BMG foi flagrantemente beneficiado por ações do núcleo político-partidário, que lhe garantiram lucros bilionários na operacionalização de empréstimos consignados de servidores públicos, pensionistas e aposentados do INSS, a partir do ano de 2003”.
Antonio Fernando enviou as informações da investigação do mensalão a seus subordinados em Minas Gerais ainda em 2006. Em dezembro daquele ano, a Procuradoria da República denunciou quatro diretores do BMG por gestão fraudulenta e falsidade ideológica. Na peça – inédita até hoje e a que ÉPOCA teve acesso –, Ricardo Guimarães, João Batista de Abreu, Márcio Alaôr de Araújo e Flávio Guimarães, os diretores do BMG, são acusados pelo Ministério Público Federal de liberar mais de R$ 43 milhões “mediante empréstimos simulados” ao PT e às empresas de Marcos Valério. Foram cinco operações, entre fevereiro de 2003 e julho de 2004. A Procuradoria também processa por falsidade ideológica os petistas José Genoino e Delúbio Soares, Marcos Valério, sua mulher, Renilda Fernandes de Souza, e seus sócios nas empresas, Ramon Hollerbach Cristiano de Mello Paz e Rogério Tolentino. O processo corre em segredo de Justiça – a Justiça Federal aceitou a denúncia contra todos os réus e diz que o caso está pronto para ser julgado.
A conexão paraibana
Uma denúncia de desvio de dinheiro público para cofres petistas, que por anos mofou nos escaninhos da burocracia brasileira, virou um novo inquérito aberto pela Polícia Federal (PF). O esquema investigado guarda semelhanças, muitas semelhanças, com o modus operandi do publicitário Marcos Valério, pivô e réu do mensalão. O caso envolve uma agência de publicidade ligada ao PT, um contrato milionário com uma estatal repleto de irregularidades e nenhuma comprovação dos serviços prestados.
O alvo da PF é a relação entre a Infraero, a empresa pública encarregada de administrar aeroportos, e a agência de publicidade Signo Comunicação. Fundada em 2000 por Anderson Tavares Pires, então integrante do diretório do PT de João Pessoa, a agência fez a campanha petista ao governo da Paraíba em 2002. Sem expressão nacional e sediada na Paraíba, a Signo ganhou, em 2004, um contrato da Infraero que rendeu R$ 26,9 milhões até 2007. Entrou na disputa com a bênção do PT e sagrou-se vencedora com a ajuda de um erro. No edital lançado pela Infraero, a proposta de melhor qualidade se sobrepunha ao menor preço. Um dos critérios decisivos na concorrência era o item “ideia criativa”. A empresa com maior inspiração na peça publicitária podia alcançar o máximo de 20 pontos. A Signo conseguiu a façanha de obter 21. Esse ponto extra e fora do limite, segundo uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), fez com que a Signo vencesse a concorrência, passando à frente da Bates Propaganda e Produções, na época controlada pelo publicitário Roberto Justus, e de uma das grandes do setor, a Lew Lara. Funcionários da Infraero argumentaram ao TCU que houve “uma confusão” no momento de atribuir as pontuações. Por isso, dizem, a Signo recebeu uma nota acima do limite.
Istoé
Quem são os grevistas que desafiam o Brasil
Nos últimos três meses, o País vem enfrentando uma onda de greves que paralisa boa parte dos serviços públicos federais. Na contabilidade dos grevistas, 350 mil trabalhadores já cruzaram os braços – na sexta-feira 24, estimava-se que 200 mil permaneciam sem dar expediente – para reivindicar principalmente aumento salarial, no que já é considerada a maior greve da história do serviço público brasileiro. Nem as paralisações na gestão Fernando Henrique Cardoso, as mobilizações no início do primeiro mandato de Lula e protestos setorizados, como os de controladores de voo em 2006, se comparam ao movimente atual, seja em duração, grau de planejamento e senso de oportunidade – ou oportunismo. A greve que começou pequena em maio, com professores universitários, logo absorveu os servidores administrativos das universidades e, em poucas semanas, abarcou dezenas de categorias. No fim de junho, quando aderiram à onda os funcionários das agências reguladoras, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, além dos auditores fiscais, o governo se deparou com uma situação dramática. A greve atingiu serviços fundamentais e estratégicos, como a aduana, a vigilância sanitária e a segurança de fronteiras. O prejuízo até agora ultrapassa R$ 1 bilhão, mas os danos sociais são incalculáveis.
Um exemplo dessas perdas está na retenção de mercadorias no Porto de Santos. Os funcionários da Anvisa impediram que milhares de remédios essenciais contra o câncer e reagentes para o diagnóstico da gripe H1N1 chegassem aos hospitais. A escassez de kits sorológicos também obrigou alguns hospitais públicos a descartar milhares de bolsas de sangue que perderam a validade. Em outro efeito colateral do movimento grevista, a suspensão da fiscalização em rodovias e aeroportos serviu como espécie de sinal verde ao crime organizado. Na terça-feira 21, policiais rodoviários afixaram na Ponte da Amizade, em Foz do Iguaçu (PR), uma placa com a frase: “Passagem livre para tráfico de drogas e armas.” Dentro do governo, a ação foi interpretada como um perigoso sinal de radicalização.
O radicalismo como instrumento de negociação se tornou a principal marca do atual movimento grevista, que vem sendo conduzido por uma associação entre antigas lideranças do funcionalismo com uma nova geração de sindicalistas. Várias dessas estrelas emergentes têm pouca ou nenhuma tradição na luta sindical. Raramente saem de seus gabinetes para negociar e, por seus altos salários e perfil empresarial, ganharam da presidenta Dilma Rousseff a alcunha de “grevistas de sangue azul”. Esse grupo é considerado a elite do funcionalismo público, com salários de R$ 10 mil a R$ 25 mil, altamente qualificado, com cursos de pós-graduação, mestrado e até doutorado. Alguns sindicalistas andam de carro importado e usam as redes sociais da internet para definir estratégias de ação. Lideranças tradicionais, insatisfeitas com os controles de gastos e a estabilização no número de servidores do Executivo, aceitaram colocar-se a reboque da turma de “sangue azul”. Dessa maneira, tentam deter avanços que o governo vem implementando na gestão do funcionalismo público. A criação de fundos de pensão que reduzem privilégios de algumas castas de servidores foi tão mal recebida pelos sindicalistas quanto a legislação sobre transparência pública, que expôs os vencimentos de cada um deles.
Tesoureiros em apuros
Nos últimos anos, a reputação dos arrecadadores de dinheiro para campanhas eleitorais foi contaminada por suspeitas de negócios escusos. À medida que o julgamento do mensalão avança e documentos oficiais chegam à CPI do Cachoeira, a má fama dos tesoureiros só se agrava. Nesse cenário de descrédito, empresas hesitam em fazer doações. O resultado são arrecadações pífias e uma crise generalizada nos cofres dos partidos políticos. Para driblar a resistência à figura dos tesoureiros e o temor de os doadores se envolverem em novos escândalos, candidatos começaram a adotar estratégias emergenciais de sobrevivência financeira. Essas mudanças incluem a substituição do procedimento de captação de recursos e a escalação de ocupantes de cargos públicos para pedir dinheiro a empresários.
A candidatura de Patrus Ananias (PT) à Prefeitura de Belo Horizonte é um exemplo da preocupação com a conduta dos arrecadadores. O petista criou um grupo gestor composto por três pessoas para administrar a entrada e a saída das doações e desconcentrar o poder no processo. “Foi uma ideia para ninguém ficar com excesso de responsabilidade e poder”, explica Luiz Alberto Vieira, encarregado de fazer os pagamentos. O mesmo aconteceu em cidades como Salvador, Maceió e Porto Alegre. Em uma estratégia um pouco mais arriscada, outros candidatos optaram por abolir a figura do tesoureiro e nomear um grupo financeiro, com poderes formais de passar o pires. A coordenação desse grupo fica, geralmente, nas mãos de aliados que ocupam cargos públicos, acostumados a tratar de contratos e licitações com empresas privadas. “É uma forma de facilitar o percurso, já que a pessoa que contratou sabe as empresas que um dia já beneficiou”, diz um ex-tesoureiro tucano.
Mensalão foi com o nosso dinheiro
O julgamento do mensalão confirmou na semana passada a tese de que o esquema montado pelo empresário Marcos Valério para atender aos interesses do PT desviou pelo menos R$ 73 milhões do Banco do Brasil. A conclusão, anunciada numa surpreendente convergência entre os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, respectivamente relator e revisor do caso, elucida uma das maiores dúvidas que ainda rondavam esse processo e comprovam que as transações ilícitas cometidas pelos mensaleiros incluíram recursos públicos. Os ministros afirmam que perícias e laudos que constam nas mais de 50 mil páginas da ação penal não deixam dúvidas de que o então diretor de marketing do banco, Henrique Pizzolato, recebeu R$ 336 mil para autorizar pagamentos antecipados à DNA Propaganda. A agência pertencente ao empresário embolsou recursos do fundo Visanet, cujo principal acionista é o BB, com cerca de 32% dos recursos. “As provas mostram que os recursos que alimentavam esses contratos saíram, sim, do banco”, resumiu Lewandowski.A descrição sobre o caminho percorrido pelo dinheiro é a narrativa de uma sequência de contravenções montada por quem tinha influência e poder no governo Lula. Segundo os dois ministros, Pizzolato antecipou repasses milionários e aceitou documentos fraudados para justificar a apropriação indébita de recursos do fundo pela DNA. De acordo com os laudos periciais, a empresa de Marcos Valério se apropriou também de pelo menos R$ 2,9 milhões que deveriam ter sido repassados ao Banco do Brasil. O empresário declarou esses recursos como uma gratificação concedida a agências de publicidade pela veiculação de propagandas. “Todas as cobranças dos bônus deveriam ter sido restituídas ao Banco do Brasil por força contratual”, afirmou Joaquim Barbosa. “A apropriação dos valores pela DNA consistiu, portanto, crime de peculato.”
A ousadia da quadrilha do mensalão para maquiar o desvio do dinheiro do BB incluiu também a falsificação de notas fiscais. De acordo com o revisor da ação, foram mais de 80 mil notas fraudadas, em uma tentativa deliberada de dar aparência lícita aos recursos. “Marcos Valério apropriou-se de dinheiro público em conluio com Henrique Pizzolato para se locupletar de valores pertencentes ao Banco do Brasil por meio de notas fiscais fraudadas”, concluiu o revisor. Os argumentos de Lewandowski foram um desalento para advogados dos réus, que esperavam dele decisões mais benevolentes. O próprio ministro admitiu que sua ideia inicial era absolver o ex-diretor do BB do crime de peculato. Mas, na véspera, ele decidiu revisar seu voto ao perceber que as provas apresentadas pela acusação mostravam claramente que ele valeu-se do cargo para receber vantagens.
A PM matadora
Luís Henrique Casteluche andava feliz com o novo emprego, em uma empresa de reciclagem, e com a convocação para o Exército. O jovem franzino e brincalhão, de 17 anos, morador da Vila Maggi, zona norte de São Paulo, ia finalmente realizar dois sonhos: juntar dinheiro para comprar uma moto e seguir carreira militar. Às vésperas de se apresentar no batalhão, porém, morreu com oito tiros, um deles no peito. No boletim de ocorrência, consta que o jovem foi morto por resistir à prisão após participar do furto de um Vectra, com um colega. No entanto, o rapaz que acompanhava Henrique, e que também foi baleado, sobreviveu após 15 dias em coma para contar à Justiça uma versão bem diferente da oficial. De acordo com o jovem, nenhum dos dois estava armado e os guardas chegaram atirando com a clara intenção de matar. “Meu filho disse que eles não tiveram tempo nem de sair do carro”, conta a mãe do outro rapaz, que, por medo de represálias, pediu para não ser identificada. É nesse testemunho e em outros fatos por eles levantados que os pais de Luís Henrique depositam agora suas esperanças. “Não faz sentido o que estava no boletim de ocorrência. Se foi troca de tiro, por que não tem policial ferido? Nem marcas de bala na viatura?”, indigna-se o pai, o segurança escolar Enrique Casteluche. Ele e sua mulher, a professora Rosana Simone, recorreram à defensoria pública do Estado para tentar provar que o filho morto nunca foi criminoso e que houve abuso dos policiais. “O Luís Henrique não tinha passagem pela polícia, não tinha envolvimento com o tráfico e nunca andou armado”, afirma Rosana.
Luís Henrique faz parte de uma estatística preocupante: a de mortos pela polícia em São Paulo. Só no primeiro semestre, foram 154 pessoas, 16% a mais do que no mesmo período do ano passado. Esse número pode esconder outro problema: as verdadeiras causas dessas mortes. Assim como no caso de Luís Henrique e dos outros jovens desta reportagem, é comum encontrar nos boletins de ocorrência o termo “resistência seguida de morte”, sem que haja, todavia, a comprovação de que houve confronto. “Quando se faz esse registro, parte-se do princípio de que o policial agiu em legítima defesa e não se apura o ato”, diz Marivaldo Pereira, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Sem investigação, torna-se impossível saber se o que houve foi realmente um confronto ou se o PM realizou uma execução sumária. Com dois casos de falsos autos de resistência desmascarados nas últimas semanas, acendeu-se o sinal amarelo para a atuação da polícia paulista nos casos descritos como resistência seguida de morte. Tanto que o Ministério da Justiça, a pedido de organizações da sociedade civil, está elaborando uma proposta a ser enviada para o Congresso Nacional que extingue a declaração de “auto de resistência” – crime que, aliás, nem sequer consta do Código Penal.
JK, a história revista
Ao lançar em 1982 o livro “Memorial do Exílio”, baseado nas memórias do ex-presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), o jornalista e romancista Carlos Heitor Cony não pôde esmiuçar o episódio sobre o qual tinha mais interesse: a morte de JK num desastre automobilístico cercado de mistério. Com os direitos políticos cassados após o golpe militar de 1964, a suspeita era de que Juscelino tivesse sido assassinado pela ditadura (nesse mesmo ano de 1976, morreriam João Goulart e a estilista carioca Zuzu Angel, também num acidente pouco explicado). A própria família do estadista deu o recado para Cony não se aprofundar em certos assuntos. A recomendação mais veemente veio da esposa, Sarah, pois havia a suspeita de que, momentos antes, o ex-mandatário teria se encontrado num hotel com a amante, Maria Lúcia Pedroso. Agora, 30 anos após a primeira edição da obra, a visão do político mineiro sobre o período posterior à sua saída do poder volta às livrarias, com o acréscimo desse ponto nebuloso do acidente. Cony não traz uma prova cabal de que o ex-presidente foi eliminado pelo regime militar. Apenas reúne indícios. Cabe ao leitor tirar as conclusões.
Essa edição revista ganhou o título “JK e a Ditadura” (Objetiva) e, assim como a original, é lançada sem festa e noite de autógrafos. Mas, enquanto na época o governo do general João Batista Figueiredo proibiu qualquer alarde, agora é a discrição do próprio autor que falou mais alto. Ele contou à ISTOÉ que Juscelino suspeitou de que morreria duas semanas antes do fatídico dia 22 de agosto de 1976. Em sua fazenda em Goiás, ele se sentiu profundamente amargurado depois que um boato dava conta de sua morte num acidente de carro numa viagem para Brasília. Para o escritor, essa morte anunciada teve outros sinais de que fora planejada, devido à rápida presença de militares no local da tragédia, quando o carro Opala que levava JK para o Rio bateu em uma carreta na via Dutra, próximo a Resende. O relatório da comissão de militares apontava um suposto encontro com a amante, momentos antes, fato que foi por ela desmentido. Cony esteve com Juscelino nesse dia, em São Paulo, e ressalta que não foi devidamente investigado o fato de a perícia ter constatado defeito na suspensão do Opala, um sinal claro de sabotagem: “Quem primeiro apareceu na cena do desastre foi o Guilherme Romano, eminência parda do regime.”
O homem de 133 bilhões de reais
Um prédio pequeno, sem placa à porta, na região central de Brasília, serve de gabinete improvisado para o economista Bernardo Figueiredo, alçado a posto-chave no governo Dilma Rousseff. Nomeado presidente da recém-criada estatal Empresa de Planejamento e Logística, a EPL, Figueiredo será uma espécie de superministro, encarregado de coordenar os investimentos em infraestrutura de transportes. Ele comandará projetos estimados em R$ 133 bilhões, dinheiro a ser investido por meio de parcerias do governo com a iniciativa privada em obras de rodovias e ferrovias. Eventualmente, a estatal será sócia nesses negócios. O valor dos investimentos poderá alcançar R$ 180 bilhões, com o anúncio, em breve, da segunda etapa de concessões de portos e aeroportos. “O número não está fechado, mas é uma estimativa, baseada nos investimentos necessários”, diz Figueiredo.
Mineiro de Sete Lagoas, 62 anos, o assessor de Dilma para negócios bilionários cultiva gostos extravagantes – segundo define ele mesmo –, como torcer pelo time do Bangu, no Rio de Janeiro, e pela Portuguesa, em São Paulo, além do Cruzeiro, em Minas Gerais. Não gosta de usar gravata. “Tento não usar: me sinto mal, como se fosse ser enforcado”, explica. Só quando o protocolo exige, Figueiredo põe terno e dispensa o figurino predileto, de homem da roça, apreciador de cigarros de palha e dedicado a cuidar de vacas e cavalos na fazenda de 500 hectares (cinco quilômetros quadrados), onde mora há mais de uma década, nos arredores da capital, com a segunda mulher e parte dos sete filhos. Foi na fazenda que o novo presidente da EPL passou os quatro meses de quarentena, após ter seu nome rejeitado pelo Senado para um segundo mandato à frente da Agência Nacional de Transportes Terrestres, numa derrota imposta à presidenta Dilma Rousseff por 36 votos a 31, em março. “Fiquei quatro meses escondidinho lá”, conta. Impedido legalmente de trabalhar, ele saía da fazenda para participar dos debates do grupo encarregado de mudar o rumo do governo na área de transportes, abatida por escândalos e baixo investimento. “Foi fácil me cooptar: é um desafio”, diz o executivo.