IstoÉ
Congresso financia campanha
O uso indevido da verba indenizatória é alvo constante de polêmica na Câmara, mas os deputados não se cansam de extrapolar os limites de utilização desta cota, bancada pelos cofres públicos. Neste ano eleitoral, a verba de gabinete, criada para dar suporte à atividade parlamentar, vem sendo usada descaradamente para financiar campanhas. Foi o que revelou levantamento feito por ISTOÉ no portal da Câmara. Os gastos dos parlamentares com as rubricas relativas à divulgação do mandato e aluguel de jatinhos pularam de R$ 4,5 milhões, entre janeiro e junho de 2009, para R$ 9,6 milhões, no primeiro semestre de 2010.
O caso do deputado Carlos Willian (PTC-MG) é emblemático. Candidato à reeleição, ele não havia gasto nenhum centavo no primeiro semestre de 2009 com frete de jatos ou divulgação. Valeu-se da verba indenizatória apenas para custear despesas inerentes ao mandato, como as com combustíveis, alimentação e manutenção de escritório. Já neste ano de eleição, Willian gastou R$ 89,1 mil com o aluguel de aeronaves para percorrer cidades de Minas Gerais. Só no mês de fevereiro pagou R$ 39,9 mil à empresa de aviação Abelha Air. “O Estado é grande e o deputado ficou traumatizado depois de ser vítima de um acidente de carro no início do ano”, justificou sua assessoria. Já o deputado Wilson Santiago, aspirante a uma cadeira no Senado, de 2009 para 2010 elevou de R$ 9 mil para R$ 62,5 mil suas despesas com gráficas, publicidade e fretamento de aviões.
As sete vidas do coronel Roriz
Ao rejeitar por 7 votos a 1 a intervenção na capital do País, o Supremo Tribunal Federal deixou nas mãos dos eleitores a responsabilidade pelo futuro de Brasília. Caberá ao povo, nas urnas, separar o joio do trigo e escolher o que for melhor para a cidade. Entretanto, a considerar as atuais pesquisas de opinião, não haverá mudanças mais profundas nos quadros políticos do DF. Ao contrário, tudo indica que Joaquim Roriz deu a volta por cima e poderá sentar na principal cadeira do Palácio Buriti pela quinta vez em sua longa vida política. Bateria, assim, o recorde que divide com Miguel Arraes, que foi quatro vezes governador de Pernambuco. No momento, Roriz (PSC e mais nove partidos) lidera as pesquisas com 42% dos votos contra apenas 22% do petista Agnelo Queiroz, ex-ministro do Esporte. “Vou ganhar no primeiro turno, pois as pesquisas são feitas por domicílio e não ouvem quem mora no entorno de Brasília. Lá tenho mais de 80% dos votos”, afirmou Roriz à ISTOÉ.
A própria oposição está conformada com a volta ao poder da velha raposa, de 72 anos e há mais de 40 na política. Sabe que, embora enfrente a rejeição da classe média que vive no Plano Piloto e nas casas dos Lagos Sul e Norte, Roriz é praticamente imbatível nas cidades-satélites que criou. “Brasília, este ano, viveu o pior escândalo de sua história. A população deveria aproveitar para fazer uma enorme limpeza na classe política do Distrito Federal”, afirma, resignado, o deputado distrital Antônio Reguffe (PDT), que se destacou nas denúncias ao governo Arruda. Nos meios políticos, comenta-se que o petista Agnelo Queiroz, após aliar-se ao PMDB, teria feito um acordo com Roriz, pelo qual serão evitados ataques pessoais na campanha.
A voz de Serra na UNE
Logo após o golpe da madrugada de 1º abril de 1964, a União Nacional dos Estudantes (UNE) foi posta na alça de mira dos militares que tomaram o poder. Os generais enxergavam na entidade um braço político do governo João Goulart. E avançaram com virulência sobre os universitários. A UNE era presidida por José Serra, então com 22 anos e hoje candidato do PSDB à Presidência da República. Ele cursava o último ano da Escola Politécnica da USP e, assim como os outros nove diretores, passou a ser caçado pelos quatro cantos do País. Acreditavam os golpistas que a UNE recebia ajuda financeira da União Soviética. “Era pura mistificação. As verbas da UNE eram verbas oficiais, e o relator do Orçamento era, inclusive, um deputado da UDN e amigo do general Castello Branco”, nega Serra. Mas, numa das primeiras ações repressivas da ditadura, a sede da UNE na Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro, foi invadida em busca do “ouro de Moscou”. Só encontraram um cofre enferrujado, coberto pela bandeira de Cuba. Mas o ódio à UNE era tão grande que atearam fogo ao prédio histórico.
Ação popular – Depois de dirigir a União Estadual dos Estudantes em São Paulo, Serra foi eleito presidente da UNE em julho de 1963, para um mandato de um ano, num clima de turbulência política. Metade da chapa encabeçada pelo atual tucano era composta pela Ação Popular (AP), organização que nasceu nos movimentos católicos e da qual Serra fazia parte. A outra fatia pertencia a militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partidão. A esquerda estava unida, reforçando a tendência das eleições de Aldo Arantes em 1961 e Vinícius Caldeira Brant em 1962. O hoje senador Marco Maciel (DEM-PE) chegou a se lançar em uma chapa alternativa pela direita em 1963, mas desistiu diante do amplo favoritismo de Serra, que foi consagrado com a chapa única. “Na época da UNE, eu já tinha o hábito de não dormir e conversava com todos, por isso, fui eleito”, disse Serra na quinta-feira 1º.
Vários caciques e um índio
A novela em torno do vice na chapa de José Serra ao Palácio do Planalto fez com que caciques de PSDB e DEM protagonizassem cenas de trapalhadas raramente vistas na política brasileira. A trama envolveu pressões pouco ortodoxas exercidas por dois irmãos senadores e mostrou de forma cristalina como dois minutos na tevê foram mais importantes do que plataformas políticas na composição da chapa.
A escolha do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) gerou uma crise na parceria de caciques do PSDB com o DEM. Diante da reação, os tucanos não tiveram outra escolha senão aprovar a substituição de Dias pelo até então pouco conhecido deputado Índio da Costa (DEM-RJ). O desastrado episódio, porém, deixou sequelas e expôs a maneira improvisada com que a campanha vem sendo tocada. A solução encontrada, segundo líderes do PSDB ouvidos por ISTOÉ, não tem eficácia eleitoral e demonstrou que a grande força do DEM não está em seus quadros políticos, mas no tempo a que a legenda tem direito no horário eleitoral gratuito. “Foi um desgaste desnecessário. O PSDB entrou numa briga de irmãos e colocou em risco um projeto nacional”, disse o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO).
Nanicos & família em campanha
Eles não movimentam multidões de cabos eleitorais, correligionários em profusão, batalhões de marqueteiros ou potentes equipes de propaganda. Os nanicos – candidatos de partidos pequenos que têm em comum o ódio por esta designação – contam com tempo de televisão reduzido, orçamento baixo e mais simpatizantes pessoais que militantes. Sonham em bolar um jargão do tipo “Meu nome é Enéas”, que tornou famoso o médico barbudo das eleições passadas. E, na falta de uma marca como esta, capaz de garantir-lhes expressão nacional, agitam mesmo as próprias famílias. Parente de nanico não descansa em época de eleição.
Na luta por mais votos, os candidatos nanicos invariavelmente acabam dando trabalho a seus familiares. Julyane Helena Silva, 26 anos, estudante de publicidade, é um caso exemplar. A cada quatro anos, desde que nasceu, ela vê o pai disputando eleições – sem nunca ter ganhado nenhuma. Agora, prestes a se formar, é ela quem dá o tom da campanha de Oscar Silva, do PHS, emprestando seus conhecimentos publicitários à candidatura do pai à Presidência da República. Além de opinar sobre jingles, material impresso e propaganda na internet, ela tenta organizar, com o irmão, encontros com eleitores indecisos. “Participo só nos bastidores”, diz Oscar Silva Júnior, filho do candidato.
Época
A crise do vice vai atrapalhar Serra?
José Serra não foi candidato em 2008. Mesmo assim, terminou aquele ano aclamado como um dos grandes vencedores das eleições municipais e um sagaz estrategista político. Gilberto Kassab (DEM), até então seu pouco expressivo afilhado, derrotara na disputa pela prefeitura de São Paulo Marta Suplicy (PT), apoiada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o ex-governador Geraldo Alckmin, candidato do PSDB, o partido de Serra. “Dedico a ele esta vitória”, afirmou Kassab durante a festa de comemoração.O padrinho agradeceu ao pupilo, mas, comedido, desconversou sobre a autoria da estratégia de sucesso.
Na semana passada, no entanto, Serra protagonizou, na escolha do candidato a vice-presidente de sua chapa, uma lambança capaz de levantar dúvidas nos que o consideram um engenhoso articulador político. Serra cometeu falhas justamente na composição com seus aliados do DEM, terreno que o PSDB julgava totalmente aplainado. Ao escrever os últimos capítulos da novela em torno de seu vice, Serra viu-se obrigado a rifar o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), que ele escolhera como companheiro de chapa, perdeu horas importantes de campanha enfurnado em reuniões estéreis, abriu uma temporada de tiroteio interno em sua coligação e acabou escolhendo, sob pressão, o pouco conhecido deputado federal Indio da Costa (DEM-RJ), de 39 anos, para a vaga.
O segundo Dirceu
José Carlos Becker de Oliveira e Silva aparenta ser mais novo que seus 32 anos. É alto, cerca de 1,90 metro, magro, tem os cabelos claros, é solteiro e pai de uma filha. José Carlos é um bem articulado candidato a deputado federal pelo PT no Paraná. Ele mantém um blog, um programa semanal de rádio chamado Caminhos do noroeste, faz política intensamente pelo Twitter e comparece todos os dias a eventos em cidades do noroeste do Paraná. Mas não gosta de entrevistas. “Eu não sou uma figura nacional. Meu pai é quem é”, disse José Carlos a ÉPOCA há duas semanas, em um seminário sobre agricultura familiar em Paranavaí. “Meu mundinho é isso aqui.” José Carlos é conhecido como Zeca Dirceu, filho do ex-ministro José Dirceu. Mas o “mundinho” de Zeca Dirceu é mais vasto do que ele gostaria de admitir.
Ex-prefeito de Cruzeiro do Oeste, cidade de 20 mil habitantes do noroeste paranaense, Zeca Dirceu é apontado pelos concorrentes como um candidato forte a deputado. Por um motivo simples: mesmo sem ter broche espetado na lapela do terno, gabinete ou assento na Câmara, em Brasília, Zeca tem mais acesso a ministros e burocratas influentes no governo federal que muitos deputados. Durante seu mandato como prefeito de Cruzeiro do Oeste, Zeca obteve cerca de R$ 14 milhões em verbas federais – valor significativo para um município pequeno. Zeca é conhecido na região por ajudar outros prefeitos a chegar aos gabinetes em Brasília. Só no ano passado, segundo aliados, Zeca obteve R$ 13 milhões em verbas federais para 37 cidades da região. “Mesmo não sendo deputado, ele tem muito acesso em Brasília, nos ministérios”, afirma Edno Guimarães, prefeito de Cianorte, cidade três vezes maior que Cruzeiro do Oeste. “Não sei se é apoio do pai, mas ele consegue (verbas).” Segundo Guimarães, Zeca o levou a encontros com os ministros Reinhold Stephanes (Agricultura), Paulo Bernardo (Planejamento), Alfredo Nascimento (Transportes) e Hélio Costa (Comunicações). Como obter verbas é fundamental para a sobrevivência de um deputado, Zeca está no caminho certo.
A ordem que confunde
Quando tomou posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em abril, com a missão de comandar as eleições 2010, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou em seu discurso que a Justiça deveria ter papel coadjuvante no processo. A política deveria ser a protagonista. Na semana passada, essa ideia desandou. Com duas decisões, a Justiça criou insegurança nos partidos para a propaganda eleitoral e abriu uma brecha na recém-criada Lei da Ficha Limpa às vésperas do prazo final do registro das candidaturas, neste dia 5.
Aprovada há menos de um mês, a Lei da Ficha Limpa proíbe que os condenados em decisões judiciais de segunda instância possam se candidatar. Condenado pelo Tribunal de Justiça do Piauí por suposta promoção pessoal com dinheiro público quando foi prefeito de Teresina nos anos 1990, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) não poderia se candidatar. Fortes recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas o julgamento não acabou antes do prazo de registro das candidaturas. Na semana passada, o ministro Gilmar Mendes concedeu uma liminar para que Fortes registre sua candidatura até o julgamento. Outra liminar foi concedida pelo ministro Dias Tóffoli a uma deputada estadual do PDT de Goías. As medidas poderão abrir precedentes para outros que queiram driblar a Lei da Ficha Limpa.
Uma decisão do TSE criou dúvidas sobre as regras da propaganda eleitoral. Em resposta a uma consulta feita pelo PPS, o TSE afirmou que candidatos a governador ou a senador não podem usar a imagem do candidato à Presidência de seu partido se eles estiverem coligados no Estado a um partido que apoia outro candidato presidencial.
De novo no vermelho
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva costuma dizer, em variadas ocasiões, que vai deixar um país arrumado para seu sucessor. É verdade que o Brasil avançou em muitas áreas. Mas, do ponto de vista das finanças públicas, o sucessor de Lula não poderá ficar tranquilo.
Segundo divulgou a Secretaria do Tesouro Nacional na semana passada, o governo federal fechou suas contas de maio no vermelho, com um déficit de R$ 509,7 milhões. Foi o pior resultado para meses de maio desde o início da série histórica, em 1999, e o terceiro mês do ano em que houve déficit nas contas federais (os outros meses foram fevereiro e março). De acordo com o Banco Central (BC), que adota uma metodologia diferente, a situação seria ainda pior – um déficit de R$ 1,4 bilhão, o pior para maio desde 1991. Isso sem contar o pagamento dos juros da dívida pública federal, que atingiu R$ 993,1 bilhões em maio – uma alta de 75% desde a posse de Lula, bem acima da inflação de 52% no período.
Lavanderia de portas abertas
O Brasil passou a frequentar, nos últimos anos, algumas listas promissoras. É apontado como destaque na superação da crise financeira mundial, é um dos destinos preferidos dos investidores internacionais e é visto como uma das principais potências emergentes, ao lado de China e Rússia. Mas o mesmo Brasil também frequenta listas nada lisonjeiras. Um relatório concluído no fim de junho pelo Grupo de Ação Financeira (Gafi), organismo internacional que combate a lavagem de dinheiro, faz uma afirmação desanimadora: o país está longe de evitar que recursos amealhados com corrupção, tráfico de drogas e armas, sequestros, crimes financeiros, terrorismo e contrabando sejam absorvidos pela economia.
A lavagem de dinheiro é um fenômeno internacional. Estima-se que algo entre 3% e 5% do PIB mundial (US$ 1,4 trilhão e US$ 2,4 trilhões) seja “lavado” anualmente. O problema é como cada país a combate. Das 49 recomendações feitas pelo Gafi para coibir esse tipo de crime, o Brasil atende plenamente a apenas três. Os Estados Unidos atendem a 15. Os emergentes Rússia e China aparecem à frente do Brasil, com dez e oito, respectivamente. O presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), ligado ao Ministério da Fazenda, Gustavo Rodrigues, afirma que o Gafi está certo em boa parte das observações. “Mas o Gafi reconhece que avançamos”, diz. “Um exemplo é a criação de cortes especializadas no assunto. Não somos os melhores do mundo, mas também não somos o Irã quando o assunto é combate à lavagem de dinheiro.”
Um programa fora de sintonia
Era início da noite de segunda-feira 22 de julho de 1935, quando o locutor Luiz Jatobá interrompeu com sua voz grave a programação das 50 rádios que operavam no país. Estreava o Programa nacional, idealizado por um amigo de infância do então presidente, Getúlio Vargas, com o objetivo de propagandear as realizações do governo federal. Em 1939, quando Vargas já estabelecera no país a ditadura do Estado Novo, o programa, rebatizado como A hora do Brasil, tornou-se transmissão obrigatória pelas emissoras de rádio, sempre no horário das 19 horas. Durante a vigência de outra ditadura, a do regime militar, A hora do Brasil virou A voz do Brasil. Mudou de nome, mas manteve seu caráter compulsório e sua marca registrada: a abertura com os acordes de “O guarani”, a ópera de Carlos Gomes, e a voz de um locutor que anunciava: em Brasília, 19 horas.
Quando A voz do Brasil foi criada, o rádio era o principal meio de comunicação de massa, e não havia outros canais para os brasileiros das regiões mais longínquas se informarem sobre os fatos e acontecimentos da vida do país. Nesses 75 anos que nos separam da primeira transmissão do programa, o Brasil passou por grandes transformações. Urbanizou-se e deixou de ser um país de população eminentemente rural. Sua economia se industrializou e se modernizou a ponto de estar diante da perspectiva de virar, em breve, uma das cinco maiores do mundo. Há mais de 25 anos, o país é governado por um regime democrático pleno. O rádio também mudou e se adequou à concorrência de outros meios como a televisão e a internet. O anacronismo da obrigatoriedade de transmissão, às 19 horas, de A voz do Brasil por todas as emissoras de rádio do país, porém, permaneceu inalterado, apesar de os poderes públicos contarem hoje com uma monumental estrutura de comunicação. Esse aparato oficial inclui a TV Brasil (controlada pelo governo federal), a TV Câmara, a TV Senado, a TV Justiça e 648 emissoras de TV e rádio de caráter governamental ou educativo.
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