Isto É
Como o eleitor vai escolher
O eleitor brasileiro sempre votou com o bolso e o coração. Mais maduro e pragmático do que antes, contudo, é provável que desta vez a razão prevaleça. Pesquisas apontam que, com a economia estabilizada e o desemprego em queda, temas como saúde e segurança passaram ao topo das preocupações do cidadão. Os debates, a opinião de familiares e amigos, assim como notícias jornalísticas e o trabalho dos partidos e seus cabos eleitorais também influenciam na escolha, mas em menor grau. “O voto, mesmo sendo individual, reflete uma complexa combinação de anseios e constatações”, diz o presidente do Datafolha, o sociólogo Mauro Paulino.
Uma pesquisa do Vox Populi aponta ainda que, dentre as qualidades que o eleitor sempre procura num político, a honestidade está em primeiro lugar. Ela é seguida da capacidade em entender os problemas do povo, ter condições de resolver esses problemas e ideias novas para o Brasil. Em último lugar no ranking de características está a experiência administrativa e política, que pelo visto saiu de moda. “Se aquele que não tinha curso superior e ‘nunca tinha sido nada’ deu tão mais certo que um dos mais ilustres intelectuais de sua geração, o problema é o critério”, diz o diretor do instituto, Marcos Coimbra.
Por que tudo deu certo
Dilma Rousseff entrou na disputa presidencial com o aval de um governo muito bem avaliado e do presidente mais popular da história do Brasil. Ainda na fase da pré-campanha, construiu um leque de apoio com uma amplitude jamais obtida pelo PT desde a sua fundação, em 1981. Esses já são ingredientes que poderiam explicar o êxito da campanha. Mas eles não são suficientes para justificar o tamanho da vantagem de Dilma sobre o oposicionista José Serra (PSDB), segundo os dados revelados pelos institutos de pesquisa. O que os especialistas apontam e até os adversários admitem é que Dilma surpreendeu. Os tucanos esperavam encontrar uma adversária frágil quando distante do presidente Lula, dona de um temperamento explosivo que não resistiria a provocações e, acima de tudo, despreparada para o debate. Mas não foi nada disso que Dilma transmitiu durante a campanha. Além de todos esses ingredientes, ela apresentou-se para o eleitorado enumerando propostas concretas para os próximos anos, trouxe uma mensagem de continuidade e se contrapôs a uma candidatura oposicionista incapaz de apresentar projetos para as diversas áreas do governo.
Me diga como acabou assim?
Se as pesquisas de intenção de voto para presidente da República forem confirmadas nas urnas no domingo 3, o candidato do PSDB, José Serra, sairá da disputa eleitoral bem menor do que entrou. Em dois meses de campanha – e pouco mais de 40 dias de horário eleitoral gratuito – os institutos de pesquisa indicam que o tucano perdeu mais de 15 milhões de eleitores. Em 30 de junho, um dia antes do início oficial da campanha, Serra aparecia empatado com Dilma Rousseff, com 35% das intenções de voto, segundo o Ibope. Na pesquisa de 17 de setembro, Serra equilibra-se em 25%, enquanto sua concorrente é a preferida por mais de 50% dos eleitores. Para os especialistas em eleições, o bom momento econômico e a alta popularidade do presidente Lula não são suficientes para explicar como os tucanos conseguiram perder quase 190 mil votos por dia, desde o início oficial da corrida pelo Planalto. “O PSDB não se preparou para o pós-Lula”, diz o cientista político Marcos Figueiredo, diretor do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj). “Foram muitos os erros. Um papel vexatório”, afirma o sociólogo Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise. “O Serra não soube e não sabe o que falar para o eleitor”, diz.
Surpreendente arrancada na reta final
A candidatura da senadora Marina Silva entra na última semana de campanha colhendo um resultado que estava represado. As pesquisas mostram que em uma semana ela angariou 2,6 milhões de votos. Segundo pesquisa Datafolha divulgada na quarta-feira 22, a candidata do PV subiu de 11% para 13% nas intenções de votos. A preferência por Marina cresceu principalmente entre os eleitores que têm curso superior e os de ensino médio com renda intermediária, que ganham acima de dois salários mínimos. Exatamente o grupo de maior peso na composição do eleitorado. Ela empolga porque trouxe para o centro do debate um tema que está em voga e galvaniza a atenção: o da sustentabilidade. Entre os eleitores que ganham entre cinco e dez salários mínimos, por exemplo, ela subiu de 16% para 24%. Marina começa a colher agora o que plantou durante a campanha. Qualquer que seja a voz das urnas, a ex-ministra do Meio Ambiente sairá desta eleição maior do que entrou. Fez uma campanha propositiva e não entrou em bate-bocas eleitoreiros. “A Marina deve ultrapassar a votação do Ciro Gomes em 1998, que teve 11,4% dos votos”, prevê o sociólogo Antonio Lavareda. “Ela está se credenciando para ser um dos nomes fortes nas próximas disputas presidenciais.”
Promessas de campanha
Em um país marcado pelo sincretismo ideológico, as discussões dessas ideias misturadas, projetos e visões de mundo têm se tornado irrelevantes em tempos de eleição. Nesta não foi diferente. Raros foram os casos em que os principais candidatos à Presidência da República divergiram de forma aguda sobre temas centrais para o Brasil, como a condução da política econômica, os programas sociais ou mesmo o papel que o Brasil deve ter no cenário internacional. Cada um deles até pode ter visões distintas e particulares de temas tão importantes, mas foram poucos os momentos em que elas vieram à tona na corrida pelo Planalto. Com a aprovação recorde do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, todos, de uma forma ou de outra, entraram em uma batalha midiática para convencer os eleitores sobre seu empenho em dar continuidade ao governo atual. “A sensação que fica deste processo eleitoral é a de que, no atacado, todos os candidatos estão prometendo a mesma coisa”, diz o cientista político Gaudêncio Torquato.
As carências do Brasil
Poucas vezes na entrecortada história da democracia brasileira os eleitores foram às urnas escolher um novo presidente tão confiantes de que o futuro reserva momentos melhores para o País como agora. Independentemente de quem seja o eleito ou a eleita no dia 3 de outubro, pouca gente duvida que os próximos anos serão de crescimento econômico, inflação sob controle, melhor distribuição de renda e uma generalizada melhoria na qualidade de vida. Ao longo da última década e meia, com alguns sustos e tropeções no caminho, tem sido assim e, ao que parece, os tempos do voo de galinha ficaram no passado. O Brasil avançou em todos os indicadores socioeconômicos, do acesso à tecnologia à distribuição de renda, da expectativa de vida à mortalidade infantil e em outras dezenas de índices que mostram um país cada vez mais igualitário.Tudo isso, no entanto, ainda está longe de ser o suficiente para colocá-lo no seleto e desejado clube das nações desenvolvidas. Áreas fundamentais para o desenvolvimento do País como saneamento básico, segurança e infraestrutura ainda registram indicadores de uma nação subdesenvolvida e mostram que o próximo presidente da República terá que olhar para eles com atenção especial se quiser elevar o Brasil à condição de país desenvolvido.
A lavanderia do ex-ministro
Investigado por causa de um acordo que, segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), provocou um prejuízo de R$ 169 milhões na Telebrás, o ex-ministro das Comunicações e candidato do PMDB ao governo de Minas, Hélio Costa, é agora apontado como suspeito de participar de um esquema de lavagem de dinheiro. Os indícios que comprometem o ex-ministro estão relacionados em um documento entregue na última semana ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Trata-se de um relatório elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do Ministério da Fazenda, emitido como resposta a uma consulta feita pelo procurador Marinus Marsicus. Ele está apurando o desvio dos R$ 169 milhões da Telebrás e pediu que o Coaf investigasse as movimentações financeiras do ex-ministro e de mais sete pessoas (uma jurídica) ligadas a ele: Ana Catarina Figueiredo Xavier Costa, mulher de Hélio Costa; Eugênio Alexandre Tollendal Costa, filho do ex-ministro; Jorge da Motta e Silva, ex-presidente da Telebrás; Manoel Elias Moreira, assessor da Telebrás; Uadji Moreira e Jaciara Menezes Moreira. O Coaf constatou a existência de indícios de lavagem de dinheiro nas movimentações financeiras realizadas por diversas pessoas listadas pelo procurador Marsicus. Há movimentações financeiras atípicas de algumas pessoas indicadas, registra o documento. O procurador-geral não se manifestou sobre detalhes do caso, por se tratar de investigação sob sigilo, mas uma nova frente de apuração será aberta na Procuradoria-Geral da República.
Um a menos
No início da tarde da sexta-feira 24, o ex-governador Joaquim Roriz surpreendeu a população de Brasília. Irritado com a indecisão do Supremo Tribunal Federal, que adiou a decisão do julgamento sobre a aplicação da lei dos fichas sujas, Roriz retirou sua candidatura pelo PSC e lançou sua mulher, Weslian Roriz, para a disputa do governo do DF, pelo mesmo PSC. O ex-governador se descontrolou ao saber que o STF, após um empate de 5 votos a 5, no julgamento de seu recurso, iria adotar a sugestão apresentada pelo ministro Dias Toffoli de aguardar a nomeação do 11º ministro do STF para a decisão final. “Se meu recurso vai ficar nas mãos de um ministro a ser nomeado pelo presidente Lula, não vou jogar meu futuro nas mãos de um adversário”, disse Roriz a assessores. “Não vou sangrar em público.” Mesmo com a desistência do candidato, a foto que deverá aparecer na urna em Brasília será a de Roriz, uma vez que já expirou o prazo para a mudança.
Injeção de capital
Uma das maiores empresas do mundo na competitiva e globalizada indústria do petróleo, a Petrobras protagonizou nesta última semana a maior operação de venda de ações da história do capitalismo. Ao todo a companhia arrecadou R$ 120 bilhões, dinheiro que será utilizado nos pesados investimentos que a estatal precisará fazer para tornar viável a exploração dos campos de petróleo localizados na camada do pré-sal, a mais de seis mil metros de profundidade. Até esta semana, a maior operação de capitalização da história pertencia à empresa de telefonia japonesa, a NTT, que havia levantado US$ 38,8 bilhões em 1987.
Época
O presidente e o futuro
Nas seis eleições presidenciais disputadas desde a redemocratização do país, Luiz Inácio Lula da Silva foi candidato em cinco. Na sexta, o nome de Lula não apareceu na urna eletrônica. Paradoxalmente, a campanha presidencial de 2010 entra, porém, para a história como aquela em que seu protagonismo na política brasileira atingiu o auge. Lula impôs a seu partido, o PT, uma candidata totalmente inexperiente em disputas eleitorais, transformou-a em favorita – transpondo, em muitas ocasiões, os limites da lei e das boas práticas republicanas – e agora está muito próximo de elegê-la como sucessora. Navegando em índices quase escandalosos de popularidade, próximos dos 80% de aprovação, Lula viu a própria oposição, de forma canhestra, tentar se associar a seu sucesso.
No exterior, Lula, cada vez mais, é comparado a Nelson Mandela, o estadista que liderou a África do Sul na superação do regime do apartheid. Em comum, Lula e Mandela têm trajetórias míticas que se confundiram com as aspirações das sociedades que governaram – a história da ascensão de Lula, de retirante nordestino a presidente da República, espelha o sonho de milhões de brasileiros. A aura mitológica que cerca a figura de Lula (leia a reportagem) explica, porém, apenas em parte o fenômeno político do “lulismo”. O mito não teria ganhado força se não estivesse fundamentado numa base sólida. Sob a presidência de Lula, o Brasil termina a primeira década do século XXI como uma força emergente no mundo
O presidente e o mito
Um pai, um líder, o maior estadista do mundo, o melhor presidente do Brasil. Um amigo, um fenômeno, um enviado de Deus, um anjo, um assombro. O pai dos pobres, o pai celestial. Em Pernambuco, Estado natal do presidente da República e onde ele recolhe os mais altos índices de aprovação a seu governo (88%), esses são alguns dos termos escolhidos pela população para se referir a Luiz Inácio Lula da Silva. Escolhida por Lula para ser a candidata do PT a sua sucessão, a ex-ministra Dilma Rousseff virou em Pernambuco “a mulher”, “a mulher do homem”, “a mulher de Lula”, “a menina de Lula”, “a mulher do presidente”. No Estado, segundo pesquisa do instituto Datafolha feita na semana passada, a mineira Dilma acumulava 66% das intenções de voto para presidente, seu mais alto índice em todo o país.
16 anos de evolução
FHC avançou mais nas condições de moradia, bens de consumo e alguns itens sociais. Lula vence em economia, combate à pobreza, trabalho e renda. Há, em toda escolha humana, uma margem para preferências subjetivas. Uma eleição democrática não é diferente. Inclinações ideológicas, interesses, carisma, histórias pessoais e um sem-número de outros fatores influem na decisão que cada brasileiro toma diante da urna. A realidade, porém, é um dado fundamental para que essas escolhas se revelem boas. A obrigação de quem quer escolher bem, portanto, é entender a realidade de cada proposta política e como ela se traduz na prática. Mas qual seria a melhor e mais objetiva forma para avaliar essa realidade? Como medir, da forma mais precisa possível, os oito anos do governo Lula?
Em linhas gerais, há três métodos possíveis. Politicamente, o mais adequado seria o contraste entre o plano de governo e os resultados obtidos na administração. Mas nem sempre é possível fazer esse tipo de exercício. Na disputa entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), nenhum dos dois apresentou programas detalhados de governo. Eles fizeram promessas avulsas em palanques, mas não estabeleceram compromissos formais. Dificilmente será possível avaliar o desempenho do futuro presidente em 2014 por meio da checagem de seus compromissos.
Carta Capital
A última marcha
A pouco mais de uma semana das eleições, o núcleo da campanha do candidato do PSDB, José Serra, debatia-se com a possibilidade ou não de usar, no horário gratuito da tevê, um vídeo de terror eleitoral criado no melhor estilo do cineasta Zé do Caixão para fazer de cada eleitor brasileiro uma Regina Duarte em pânico. Na peça, veiculada na internet, pergunta-se se Dilma Rousseff será capaz de segurar os radicais do PT, “o partido que não gosta da imprensa”, representados por cães da raça rottweiler. Um dos pontos altos da propaganda mostra um exemplar da revista Veja em chamas.
A dúvida sobre a exibição não era só de ordem “marqueteira” (ataques desse naipe funcionam ou não?), mas jurídica. A lei eleitoral proíbe “efeitos especiais” na campanha, entre eles colocar atores para interpretar personagens reais – no caso Lula e Dilma.
O comercial tucano coroa um momento singular da vida política brasileira. Após o presidente da República reclamar do comportamento da mídia (reportagem à pág. 40), que, segundo ele, age como partido político, uma reação capitaneada pelos meios de comunicação fez lembrar as marchas que clamavam pelo golpe militar em 1963 e 1964. O mais badalado evento, um ato na Faculdade de Direito do Largo São Francisco precisou arregimentar alunos às pressas para formar um quórum de 150 participantes e propiciar a foto que os jornais estampariam no dia seguinte.
Voto a favor, voto contrário
A democracia é o único regime que permite ao cidadão ser contra, dentro da lei. Os demais regimes recusam ou reprimem esse direito e permitem ao cidadão apenas ser a favor ou neutro, jamais o ser contra. Portanto, para funcionar bem, a democracia precisa garantir ao cidadão aquilo que a distingue dos demais regimes, o direito legal de ser contra.
Eleições no mundo todo são feitas somente com o voto a favor e não há como distinguir a democracia da ditadura, pois esta também permite o voto a favor. Muitos ditadores do mundo se submeteram a eleições e foram “reeleitos”, sempre com votos a favor. Pinochet, Stroessner, Sadam, Tito, Salazar, Franco e inúmeros latinoamericanos, africanos e asiáticos são exemplos de governantes anti-democráticos que foram eleitos com votos…a favor.
No Brasil, há muitos políticos que, embora rejeitados por muitos, acabam sendo eleitos por poucos, lamentavelmente com votos suficientes para ganhar o cargo. O voto a favor, sozinho, não garante a democracia.
Veja
A nova edição da revista ainda não está disponível na internet.
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