Não Sim, o não é a palavra que você mais vai ouvir pelo centro do poder em Brasília. Não! Não pode visitar o Palácio! Não! Sem crachá não entra! Não, só de terno e gravata. Não, mas se ligar para um deputado… Não! Não pode estacionar aqui. Fotografar também não. A não ser que o Sr. fale com algum senador. Não! Não! Não! Sim, em Brasília o poder a todos contamina. Cada um quer o seu pequeno naco de poder. Não! Aqui não! Aqui mando eu. Aliás, o Sr. não pode ler este texto aqui!
Nely Nenhuma outra morte de um animal em Brasília causou tanta comoção quanto a da elefanta Nely, o primeiro exemplar a habitar o nosso zoológico, com a cidade ainda em construção, em 1957. Presente do embaixador da Índia para JK, que logo a passou adiante. Nely faz parte do imaginário de várias gerações de brasilienses. Por longos 37 anos foi a principal atração, tendo morrido de artrose em 1994. A elefanta continua encantando a todos, mas agora no museu do zoológico, onde está exposto o seu esqueleto.
Niemeyer Niemeyer buscou inspiração nas curvas da mulher brasileira para dar beleza, sinuosidade e leveza às suas obras. Queria chegar (e chegou!) aos 102 anos para poder virar superquadra, pois não há a 101, como bem disse o jornalista Carlos Marcelo.
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Noite Em vez da claridade solar dos horizontes abertos de Brasília, Wagner Hermusche prefere a noite. Sua arte é um visível não à cidade-luz, um não ao cartão-postal. E um sim à cidade-sombra, escura, misteriosa, como nosso inconsciente, como nossos sonhos. Hermusche desenha uma noite impressionista, elétrica e cinematográfica, estilhaçada, por onde perambulam seres estranhos, nossos espelhos. Nessa noite impera o traço visceral, o esboço, o inconcluso, os desenhos errados numa cidade certinha demais. Na noite do artista pulsa uma tensão psíquica na qual ninguém dorme e todos sonham. Sonham que estão sonhando o sonho das telas de Hermusche.
Nome O sobrenome do fundador – Kubitschek – vem do tcheco Kubicek, formado a partir do nome Jakub, equivalente a Jacó em português, cujo apelido é Kuba. O sufixo icek em tcheco é um diminutivo. Portanto, Kubicek, ou a versão germânica Kubitschek, quer dizer pequeno Kuba, ou seja: Jacozinho.
O Fundador Não fosse pelas fotos e pelos depoimentos de Juscelino Kubitschek de Oliveira, pensariam, no futuro, tratar-se de uma figura mitológica. Foi o nosso maior presidente e certamente imbatível em charme e simpatia. O folclore político em torno da sua figura é imenso. Certa vez um correligionário se aproximou: “Presidente, quando é que eu sei que começou a campanha pela sua reeleição?” ”Quando você me vir dançando com mulher feia, é porque começou a campanha!”. Outra: na inauguração de um estádio, anunciaram a presença de JK e todos o vaiaram. Por longos minutos JK esperou que a vaia chegasse ao fim e foi ao microfone: “Feliz o povo que pode vaiar seu presidente”. E foi aplaudido! Deve o sucesso da sua carreira política a uma combinação de perseverança, fé e muita sorte. E oportunismo, no melhor sentido da palavra. Um fato não muito divulgado na sua biografia foi ter votado, juntamente com o então também deputado Israel Pinheiro, na Constituinte de 1946, pela instalação da futura Capital no Triângulo Mineiro, nas proximidades de Tupaciguara, perto de Uberlândia. Sua grande obra, Brasília, foi o momento em que o Brasil respirou entre duas ditaduras: a de Vargas e a militar. Com seu entusiasmo contagiante (e, admitamos, um pouco de megalomania), tornou possível a criação desta fantástica cidade, verdadeira epopeia, saga das mais ousadas da história do homem, motivo de orgulho para todos os brasileiros no final dos anos 50, momento maior da afirmação da nossa capacidade criativa, da nossa ousadia. Os criadores de Brasília, excessivamente generosos ou demasiadamente ingênuos, queriam construir uma cidade socialista dentro de um país capitalista. Claro que aí fica difícil para qualquer utopia. Outro dado curioso é que muitos arquitetos e urbanistas estrangeiros quase sempre falam no fracasso de Brasília. Pura inveja. É porque Brasília não foi construída na Europa, nem nos Estados Unidos, nem no Japão, o chamado Primeiro Mundo. Mas foi construída com muito sacrifício aqui no Brasil, então um “país em desenvolvimento”! Voltando ao nosso Fundador: sensível e inteligentíssimo, e também um homem prático, soube se cercar de grandes intelectuais, tendo como seu melhor ghost writer o poeta e empresário Augusto Frederico Schmidt, que criou o slogan “50 anos em 5” e escreveu suas melhores frases. Cassado, foi perseguido e humilhado pelos militares, que destacavam oficiais de baixa patente para interrogá-lo, chamando-o de “seu” Oliveira, ou “presidente do cerrado”. Perdeu apenas uma eleição na vida: para a Academia Brasileira de Letras, em 1971, pois os militares ameaçavam, se eleito, não autorizar um empréstimo para a construção de um edifício anexo à Academia. Ganhou o goiano Bernardo Élis. Faleceu em um acidente (que muitos garantem ter sido um atentado) na Via Dutra, em 1976, e seu enterro em Brasília ainda não foi superado por nenhum outro, seja em comoção popular, seja em número de pessoas acompanhando o caixão. Tiraram o corpo de cima do carro do Corpo de Bombeiros e diziam: “Deixa que o povo leva, o povo leva…” Essa participação popular, num claro desafio à ditadura militar, foi, para muitos historiadores, o início da nossa abertura política. Mesmo após sua morte, JK não teve sossego. Os governantes implicavam com a estátua de JK acenando para a cidade, no memorial construído em sua homenagem, pois sua sombra (!) no gramado reproduzia, segundo os militares, o símbolo da foice e do martelo! Todos os que chegam a Brasília de avião ouvem seu nome: “Atenção, senhores passageiros! Estamos nos aproximando do Aeroporto Internacional de Brasília Juscelino Kubitschek”. Olha, não sei você, mas eu, que nem sou mineiro, nem nasci em Diamantina, sinto um orgulho danado ao ouvir isso!
O Homem do Rio Aqui só nos interessa a parte onde aparece Brasília, em 1963. Um filme de aventura, ação e comédia. Curioso é notar que a mansão do vilão em Brasília é o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, que tem vista para a Esplanada dos Ministérios! Outra: os carros cantam pneu na terra vermelha do cerrado. E que poeirão! Bandidos perseguem o ator Jean-Paul Belmondo onde hoje é o Museu da República e a Biblioteca Nacional. Agora os cortes: o ator pula de um edifício no sbs (dá pra ver claramente que é a atual sede do brb) para a cobertura do Ed. Márcia, no scs. O final é hilariante: com os barracos da Vila Planalto ao fundo, entra de bicicleta e tudo no lago Paranoá, que se transforma num rio da Amazônia! Um belo desafio é tentar localizar as locações e compará-las com a Brasília de hoje. O filme foi um grande sucesso de bilheteria na época e acabou virando um belo documentário, verdadeira preciosidade, mostrando o Brasil no início dos anos 60, pois foi filmado também no Rio de Janeiro e na Amazônia.
Odette Ernest Dias Francesa, formou-se no Conservatoire National Supérieur de Musique de Paris, em flauta transversal, sua grande paixão. Chegou ao Rio de Janeiro em 1952, a convite do maestro Eleazar de Carvalho, para trabalhar na Orquestra Sinfônica Brasileira. Tocou com Pixinguinha, Tom Jobim e Francisco Alves, entre tantos outros. Ah, participou do primeiro disco de Maysa. (Sim, mas por que ela está neste livro? já deve estar perguntando o(a) inquieto(a) leitor(a) que não a conhece!. Chegaremos lá!). Em 1974 começou a dar aulas na UnB, onde se aposentou. Simpática, sorridente, com um carregado sotaque francês. Dos 6 filhos, 5 são instrumentistas: Carlos, Jaime, Elizabeth, Claudia e Andrea. Apenas Irene não seguiu carreira musical. E Odette está neste livro porque, além dessa bela biografia, ela tocou no Cabeças! Sim, madame Marie Therese Odette Ernest Dias tocou nos Concertos Cabeças! Vi e ouvi.
Oi Poema Coletivo de poetas. Coleção de livros lançada em 2010, formada por Amneres Santiago (Diário da poesia em combustão), Angélica Torres Lima (Luzidianas), Bic Prado (Poemas de um livro verde), Cristiane Sobral (Não vou mais lavar os pratos), Luis Turiba (Meiaoito) e este escriba (O bagaço da laranja). O grupo Oi Poema realizou recitais em vários pontos culturais da cidade, com destaque para a Barca Poética no lago Paranoá. Trouxe o seu poema salva-vidas?
Oitocentos metros Após a aprovação do traçado do Plano Piloto de Brasília, os arquitetos da novacap alteraram o ponto de encontro dos eixos, deslocando-o para leste, em direção ao lago, em 800 metros. Portanto, no risco original, a Rodoviária hoje estaria onde fica a ligação norte-sul da Via W3.
Onde está Coutinho? Nome de um blog que, aproximadamente entre 1998 e 2002, seguia os passos do arquiteto José Carlos Coutinho, professor da Universidade de Brasília de 1968 a 2005. O blog era uma brincadeira dos seus alunos. Muito bem informado, Coutinho é presença assídua nos melhores eventos culturais da cidade, sempre elegante, de fala compassada e com um leve sotaque gaúcho. Se você, por acaso, encontrar o Coutinho em algum evento, fique certo: o acontecimento merece suas ilustres presenças.
Oriente-se Brasília é a expressão maior do totalitarismo da racionalidade em todos os tempos. Tudo tão lógico que chega a nos confundir. Para se orientar, imagine uma cruz. A linha horizontal curvou-se um pouco por questões de estética e de topografia. É o famoso Eixão. O que está na parte leste, em direção ao lago, são as quadras pares, indo das 200 até as 800. Por isso o Colégio Setor Leste, onde estudei, fica abaixo do Eixão. Na parte de cima do Eixão, o lado oeste. Lá estão as quadras com centenas ímpares, indo de 100 a 900. E o Eixo Monumental divide a cidade em norte e sul. Os dois eixos se encontram na Rodoviária, formando a cruz de que eu falei no início. As superquadras vão de 2 até 16, nas duas asas. Por isso, se você estiver na 402 e quiser ir pra 902, basta subir, atravessando o Eixão, sempre pela passagem subterrânea. Se você está na 113 e quer ir pra 413, basta descer. Tão simples que não dá pra acreditar.
Original Observe bem o primeiro mapa do Plano Piloto, aquele apresentado por Lucio Costa à Comissão que escolheu o melhor projeto para a nova capital. O Plano Piloto foi empurrado 800 m em direção ao lago. O aeroporto ficaria onde hoje é a Vila Telebrasília. As casas individuais seriam onde hoje existem os Setores de Embaixadas Sul e Norte (o Lago Norte e o Lago Sul não estavam planejados, por isso não constam da área tombada pela Unesco). Foram acrescentadas as faixas das 700, com casas geminadas, nas duas asas. As faixas das 900 também, e a faixa das 400 com blocos mais populares (os famosos apartamentos JK – janela e kitinete, nas 400 Sul). O Jardim Botânico seria onde hoje é o Setor Gráfico e parte do Sudoeste. O Zoológico onde hoje é o Setor Esportivo, englobando o autódromo, indo até o atual bairro Noroeste. Houve uma visível ampliação da área central, tanto que as primeiras superquadras sumiram – por isso todas começam pelo número dois: 102, 202, 302, 402… certo? Curiosidades da nossa surpreendente Brasília!
Óxente, que barbaridade, uai! Existe um sotaque brasiliense? Como é essa pronúncia peculiar? Dá para distingui-lo andando por Brasília? Quando começou a se formar esse sotaque? Gente, deixem o sotaque de Brasília em paz! O mesmo acontece com a tal identidade cultural. Como definir um brasiliense? Existe uma poesia brasiliense? Falar de blocos e eixos é falar de uma literatura brasiliense? Levam-se séculos para se formar uma identidade cultural. E essa identidade, sempre em formação, é algo que se constrói no dia a dia de uma cidade.
Ozanan Francisco Ozanan Correia Coelho de Alencar, cearense de Barbalha, agrônomo e jardineiro. Plantou árvores, cuidou dos jardins, semeou flores. Um romântico. Por muitos anos tomou conta do nosso verde. Tornou Brasília habitável e este livro possível.