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Joaquim Levy se prontificou a comparecer ao Senado nesta terça para adiar a votação do projeto que dá ao governo federal 30 dias para repactuar as dívidas dos estados e municípios, reduzindo o seu indexador. Levy acertou com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e líderes partidários, o adiamento da votação, que estava marcada para a última quarta-feira (25), para que pudesse detalhar as medidas do ajuste fiscal. Mas, caso não convença os parlamentares da eficácia de suas iniciativas, Renan promete submeter a proposta ao plenário no mesmo dia, em regime de urgência.
“Grande equívoco”
A situação é delicada para o governo. Assim como ocorreu na Câmara, senadores aliados e até do PT se articulam com a oposição para aprovar a medida, considerada inviável pela presidenta Dilma. A mudança, segundo estimativas atribuídas ao Ministério da Fazenda, pode gerar uma perda de R$ 3 bilhões ao governo federal neste ano.
“Na verdade, ninguém está conseguindo entender [o pedido de Levy]. Acho que foi um grande equívoco. Temos de ter preocupação com o ajuste fiscal, mas temos de ter outra preocupação, com o crescimento econômico”, disse ao Congresso em Foco o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Para ele, a derrota do governo neste caso é certa e a ida de Levy à CAE só aumenta o desgaste político. “No resultado primário, a soma é zero, mas com um impacto político gigantesco”, acrescentou. Segundo Lindbergh, o governo deveria se preocupar em aliviar estados e prefeituras para que consigam financiamentos para aumentar seu investimento num período de recessão, em vez de sufocá-los economicamente.
Descontentamento geral
O pacote de Levy é questionado por representantes dos trabalhadores e do empresariado, governadores e prefeitos. Todos se queixam do preço que terão de pagar pelo ajuste fiscal. No caso dos trabalhadores, as críticas recaem sobre as medidas provisórias (MPs 664 e 665) que restringem o acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários, como o seguro-desemprego, o abono salarial, a pensão por morte e o auxílio-doença. Com apoio de petistas, as centrais sindicais reivindicam a revogação das duas medidas provisórias.
Um dos parlamentares com mais mandatos pelo PT, o senador Paulo Paim (RS) ameaça deixar o partido, que ajudou a fundar em 1980, por causa das MPs. “Talvez meu tempo no PT esteja acabando”, disse Paim.
Já os empresários reclamam do aumento da contribuição sobre faturamento para 59 setores da economia a partir de junho. A MP 669/15, que tratava do assunto, foi rejeitada de pronto por Renan, na condição de presidente do Congresso. Mas o Executivo insiste na proposta e incorporou seu conteúdo em um projeto de lei (PL 863/15), enviado este mês à Câmara.
Sem voto na Câmara
O desafio mais imediato para Joaquim Levy – e pelo qual se ofereceu a ir ao Senado – é o Projeto de Lei Complementar 37/2015, aprovado semana pela Câmara, com 389 votos favoráveis e apenas duas abstenções. Juntos, petistas e peemedebistas deram 106 votos (53 cada um) a favor da proposta, apresentada pelo líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), um dos aliados mais próximos do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Na prática, o projeto acaba com o argumento do governo de que falta regulamentação para implementar o novo indexador das dívidas dos estados e municípios com a União. O texto dá 30 dias, a contar da manifestação do devedor, para a assinatura dos aditivos contratuais com o novo indexador dos débitos. Pelo projeto, após esse prazo, o devedor poderá recolher, a título de pagamento à União, o montante devido.
O novo indexador está previsto na Lei Complementar 148/2014, que prevê a substituição do atual, o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Além disso, os juros serão reduzidos dos atuais 6% a 9% ao ano para 4% ao ano. Quando a fórmula IPCA mais 4% ao ano for maior que a variação acumulada da taxa Selic (taxa básica de juros), a própria taxa básica de juros será o indexador. Isso evita que a soma dos encargos fique muito acima dos juros vigentes no mercado.
Desajuste verbal
A situação do ministro da Fazenda com a presidenta Dilma também não é das mais confortáveis. Há um mês Levy foi repreendido pela presidenta por ter chamado de “brincadeira” e um “negócio muito grosseiro” o programa de desonerações da folha de pagamento adotado no primeiro governo da petista. Dilma foi a público para chamar de “infeliz” a declaração do ministro.
No sábado, o site da Folha de S.Paulo divulgou áudio de uma conversa de Levy com acadêmicos da Universidade de Chicago, onde estudou. “Acho que há um desejo genuíno da presidente de acertar as coisas, às vezes não da maneira mais fácil, mas… Não da mais efetiva, mas há um desejo genuíno”, afirmou, em inglês.
Em nota emitida em “caráter pessoal”, a assessoria de Levy informou que a declaração não continha nenhuma crítica à presidenta: “O ministro sublinha que os elementos dessa fala são os seguintes: aqueles que têm a honra de encontrarem-se ministros sabem que a orientação da política do governo é genuína, reconhecem que o cumprimento de seus deveres exige ações difíceis, inclusive da Exma Sra. Presidente, Dilma Rousseff, e eles têm a humildade de reconhecer que nem todas as medidas tomadas têm a efetividade esperada”.