Andrea Vianna
Se uma das PECs vier a ser aprovada, formalizará a segunda alteração no rito das medidas provisórias, desde a criação do instrumento pela Constituição de 1988. Em 1990, uma medida provisória por pouco não causou uma convulsão social. Por meio desse instrumento, o recém-empossado presidente Fernando Collor confiscou as contas correntes, poupanças e aplicações financeiras superiores a US$ 1.250 por 18 meses. Collor justificou à nação que se tratava de um “tiro de canhão para acabar com a inflação”.
Dez anos depois, para evitar novos traumas como o Plano Collor, os parlamentares uniram-se em torno de uma proposta de emenda constitucional para reformar a legislação das MPs. Assim, a Emenda 32, de 11 de setembro de 2001, proibiu o confisco de bens, poupança ou de qualquer outro ativo financeiro por meio de medidas provisórias. Foi a primeira alteração desde a criação das MPs pela Constituição de 1988.
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Antes dessa emenda constitucional, as medidas provisórias eram reeditadas sucessivamente pelo governo federal, de 30 em 30 dias, até que fossem votadas pelo Congresso Nacional. As reedições eram inesgotáveis. Para se ter uma idéia, a MP 2.172, de agosto de 2001, foi reeditada 32 vezes, ou seja, durante quase três anos, uma vez por mês, até ser finalmente votada.
De 5 de outubro de 1988, promulgação da Constituição, até a publicação da Emenda 32/2001, foram editadas 619 medidas provisórias, das quais, 5.491 foram reeditadas, totalizando 6.110 medidas. Desse total, 469 foram aprovadas ou convertidas em lei. Após 11 de setembro de 2001, foram editadas 232, das quais 195 foram convertidas em lei.
Na prática, 1,07 medida provisória era editada ou reeditada por dia. A quantidade das medidas reeditadas, 5.491, corresponde a 8,87 vezes o das editadas originariamente. Se considerarmos apenas as medidas editadas, a periodicidade de sua produção, no período, foi da ordem de uma MP para cada 13,1 dias.
A reedição de medidas provisórias era a regra adotada por todos os governos, até a aprovação da Emenda 32/2001, porque, de um lado, não havia uma limitação para as reedições até que o Congresso conseguisse convertê-las em lei e disciplinar as relações jurídicas delas decorrentes; de outro lado, porque a regra constitucional em vigor estabelecia que essas MPs perdiam a eficácia, desde a edição, se não fossem convertidas em lei no prazo de 30 dias.
As constantes reedições provocaram um efeito cumulativo sufocante e de crescente impacto sobre os trabalhos do Congresso, que não conseguia mais se desincumbir de uma de suas prerrogativas fundamentais nesse campo, que é a de converter em leis as medidas provisórias, além de disciplinar as relações jurídicas decorrentes de sua aplicação.
A Emenda 32/2001 proibiu a reedição das MPs. Atualmente, elas passam a vigorar, a partir da publicação no Diário Oficial, por 60 dias, podendo ter sua eficácia prorrogada uma única vez por igual período se o Congresso Nacional não convertê-las em lei no prazo inicial da vigência.
A alteração do rito das MPs em 2001 foi eficaz para reduzir o número de MPs editadas. No período pós-emenda 32/2001, de 11 de setembro de 2001 até 31 de dezembro de 2004, houve 1.206 dias corridos, período no qual foram editadas 232 medidas provisórias. Isso representa, em média, a edição de seis MPs por mês.