Preso nesta segunda-feira (26), na 35ª fase da Operação Lava Jato, o ex-ministro Antonio Palocci já foi cotado para ser o candidato do PT à sucessão do presidente Lula, antes mesmo de Dilma Rousseff, e deixou o governo duas vezes, na condição de um dos homens mais poderosos da República, pela porta dos fundos em meio a uma série de denúncias. O ex-prefeito de Ribeirão Preto (SP), hoje com 56 anos, ganhou notoriedade nacional em 2002, quando coordenou a campanha vitorioso de Lula. Após aquela eleição, assumiu posto importante antes mesmo da posse do colega de partido, ao coordenar a equipe de transição, que acompanhou os últimos dias do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
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Com sólidos conhecimentos na área econômica, o médico assumiu o Ministério da Fazenda mesmo sem ser formado em economia. Dono de um estilo conciliador, com bom trânsito entre vários partidos, inclusive da oposição, logo confiança e prestígio do mercado e de Lula, que passou a enxergar nele um potencial candidato para sucedê-lo, possibilidade que se tornou mais concreta com a queda do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, cassado pela Câmara devido ao seu envolvimento com o mensalão, em 2005.
Mas a primeira passagem de Palocci pelo governo federal acabou interrompida em 27 de março de 2006, antes do fim do primeiro mandato de Lula. O então todo-poderoso ministro foi alvejado por uma série de acusações. Em 2004, o ex-secretário de Palocci em Ribeirão Preto Rogério Buratti teve seu nome associado a uma denúncia de extorsão para a renovação de contrato entre a empresa GTech e a Caixa Econômica Federal. Segundo a GTech, Buratti dissera que agia a mando de Palocci.
No ano seguinte, Buratti acusou o então ministro de receber, entre 2001 e 2004, R$ 50 mil mensais de propina da empresa Leão&Leão, em troca de favorecimentos em licitações da prefeitura. O dinheiro, segundo o ex-secretário, tinha como destino o caixa dois de candidatos do PT. A quebra de sigilo telefônico de Buratti, feita pela CPI dos Bingos, apontou diversas ligações entre o ex-secretário e o então ministro da Fazenda, em 2004.
Casa do lobby
PublicidadeMas a situação do ministro ficou mesmo insustentável com a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa, que havia declarado, em depoimento à CPI dos Bingos, que Palocci frequentava uma mansão para reuniões de lobistas acusados de interferir em negócios de seu interesse no governo Lula. O local era utilizado, segundo a denúncia, para a divisão de dinheiro e a realização de festas animadas por garotas de programa. O caso também resultou na queda do então assessor de imprensa de Palocci e do presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso. Com a demissão do ministro, quem assumiu a Fazenda foi Guido Mantega, preso por algumas horas na Operação Lava Jato na semana passada.
Palocci voltou a Brasília, de maneira mais discreta, ao se eleger deputado federal em 2006. Em fevereiro de 2008, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou o então deputado ao Supremo Tribunal Federal (STF) por quebra de sigilo bancário no episódio envolvendo o caseiro. Mas, em agosto de 2009, por cinco votos a quatro, os ministros rejeitaram a denúncia por entenderam que as evidências apresentadas pelo MPF contra Palocci não comprovavam o seu envolvimento com a quebra do sigilo.
Ressurreição
A absolvição deu novo protagonismo ao petista, que assumiu a coordenação da campanha que resultou na eleição de Dilma, em 2010. Como reconhecimento da presidente, ganhou o comando da poderosa Casa Civil. Mas sua segunda passagem pelo governo foi ainda mais breve que a primeira: durou apenas cinco meses. Em 7 de junho de 2011 Palocci pediu demissão após enfrentar denúncia de improbidade administrativa e tráfico de influência. Reportagem publicada pela Folha de S.Paulo semanas antes mostrou que o patrimônio dele havia crescido 20 vezes entre 2006 e 2010.
Ele atribuiu o enriquecimento a ganhos de sua empresa de consultoria, a Projeto, mas se negou a revelar a lista de clientes para os quais trabalhava, alegando cláusula de confidencialidade. “Não existe nenhum centavo que se refira a política ou campanha eleitoral, nenhum centavo”, declarou o petista.
Sua permanência, no entanto, ficou insustentável após movimento no Congresso para criar uma CPI para investigar a evolução patrimonial do chefe da Casa Civil. “(Palocci) considera, entretanto, que a continuidade do embate político poderia prejudicar suas atribuições no governo. Diante disso, preferiu solicitar seu afastamento”, disse a nota distribuída na ocasião pelo Palácio do Planalto ao anunciar a saída do ministro.
Lava Jato
Em 2015, outra reportagem da Folha mostrou que a empresa de Palocci faturou R$ 34,9 milhões entre 2007 e 2010, quando ele era deputado federal. Ainda no ano passado, o petista se tornou alvo de inquérito que apura sua eventual participação no recebimento de R$ 2 milhões para a campanha de Dilma em 2010. O nome do ex-ministro foi citado pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa em sua delação premiada. De acordo com o delator, o doleiro Alberto Youssef lhe contou que Palocci pediu essa quantia da cota de propinas do PP para gastos eleitorais da candidata a presidente.
A nova fase da Lava Jato, que levou Palocci à prisão, também mira acordo entre o grupo Odebrecht e o ex-ministro para tentar aprovar mudanças na MP 460/2009. Conforme a Polícia Federal, essas alterações resultariam em imensos benefícios fiscais, aumento da linha de crédito junto ao BNDES para um país africano com a qual a empresa tinha relações comerciais, além de interferência em licitações da Petrobras para a compra de 21 navios-sonda para exploração da camada pré-sal.
Em abril deste ano, a empresária Monica Moura, esposa do publicitário João Santana, responsável pelas campanhas de Dilma em 2010 e 2014, disse em depoimento a procuradores federais, em uma tentativa de acordo de delação premiada, que Palocci e o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto indicaram a ela executivos de empresas para fazer pagamentos pelos serviços eleitorais. De acordo com a empresária, os recursos não passaram por contas oficiais do PT e não foram declarados à Justiça eleitoral.
Outros dois assessores próximos de Palocci foram presos nesta segunda. Juscelino Dourado, que acompanhava o petista desde sua gestão em Ribeirão Preto, foi chefe de gabinete do ex-ministro no Ministério da Fazenda. Branislav Kontic trabalhou com Palocci na Casa Civil e na Câmara.