Após meses de especulações, a novela da reforma ministerial pode chegar ao fim esta semana com a indicação da ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PT) como ministra das Cidades. A previsão é de um dos principais interlocutores do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), ex-secretário de Habitação da capital paulista na gestão de Marta (2001-2004).
Segundo Paulo, a indicação será confirmada mediante um pacto pelo qual a ex-prefeita se compromete a não antecipar o debate sobre a sucessão presidencial antes de 2009. É que Marta é apontada como uma das principais opções do PT para a Presidência da República em 2010. “O presidente tem um cálculo político muito apurado. E ninguém vai conseguir precipitar a sucessão", garante o deputado, que também foi presidente da Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo durante a gestão petista em São Paulo.
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Paulo Teixeira não minimiza os problemas decorrentes da nomeação da colega com a base aliada, bem como da saída compulsória do PP da pasta pretendida por Marta, já que o partido do ministro Marcio Fortes está no comando das Cidades desde julho de 2005. Mas não foge da polêmica ao lembrar que as articulações em torno da ex-prefeita começaram após um encontro do presidente com os líderes do PSB, já fechados, segundo ele, no nome de Ciro Gomes para 2010.
“Eu creio que o presidente começou a sentir pressões externas de colocar alguém no governo com um processo de 2010. Eu não creio que, no caso da Marta, tenha isso. Foi mais uma pressão da imprensa e a tensão dos demais concorrentes”, considera.
Para ele, Marta é o “nome natural” do PT para a prefeitura de São Paulo em 2008. Na avaliação dele, nem o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), nem o atual presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), têm cenários tão favoráveis para concorrer ao cargo que comanda o terceiro maior orçamento do país.
Advogado com mestrado em Direito Constitucional, Paulo Teixeira começa o primeiro mandato federal com a experiência de quem foi vereador e deputado estadual em duas legislaturas. Aos 45 anos, o deputado também promete aumentar a polêmica sobre a descriminalização do uso das drogas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Titular da CCJ, o petista diz que vai defender a legalização da maconha como medida de combate ao narcotráfico. Paulo vai sugerir à comissão que convide o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), para explicar suas posições sobre o tema.
"Você tem que quebrar o tráfico de drogas pelas costas. Eu acho que a maconha deveria ser legalizada e que devemos migrar para um processo em relação às demais drogas", diz o deputado.
Nesta entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, Paulo também responsabiliza o Banco Central pelo pífio crescimento econômico. “Tem um erro aí nessa calibragem. O erro está no Banco central. A calibragem entre a política de juros e a política cambial está criando problemas para o Brasil”, afirma. “Nós queremos crescimento com controle da inflação, e o Banco Central precisa entender essa mensagem”, completa.
Leia a íntegra da entrevista:
Congresso em Foco – Como o senhor vê a polêmica em torno da nomeação da ex-prefeita Marta Suplicy no novo ministério?
Paulo Teixeira – A impressão que eu tenho é que ela tem qualidades para ser ministra do governo Lula. Foi prefeita de São Paulo, a maior cidade do Brasil, e deputada federal, além de ser preparada tecnicamente. Entrou o ingrediente eleitoral nesse debate de 2010. E aí as impressões de todos aqueles que também desejam ser candidatos começaram a vir à tona. Quando aconteceu o primeiro ruído? Quando o presidente esteve com o PSB, que tem uma clara articulação em torno de Ciro Gomes. Aí começou a dar problema e o presidente começou a utilizar um outro cálculo. Que o é seguinte: “eu tenho que ter um novo governo em que a variável da sucessão só seja discutida lá na frente e não agora, eu não posso deixar essa variável me impedir de governar”. Eu creio que o presidente começou a sentir pressões externas de colocar alguém no governo com um processo de 2010. Eu não creio que, no caso da Marta, tenha isso. Foi mais uma pressão da imprensa e a tensão dos demais concorrentes.
Mas ela vem para o governo ou não?
Eu creio que sim.
Em qual pasta?
Eu acredito que ela venha para ser a nova ministra das Cidades.
Mas, assumindo o cargo agora, ela não contraria a vontade do presidente e entra de vez na sucessão de 2010?
A minha opinião é que muita água vai passar embaixo do rio. Por exemplo, é natural que o nome dela entre na disputa para a prefeitura de São Paulo. Então vai haver a tentação dela de voltar para São Paulo. Então 2010 ainda é longe. Amanhã é longe.
O que é mais importante na sua opinião para ser discutir no congresso que o PT realizará em julho?
Eu acho que o PT precisa debater temas que o cotidiano da ação institucional não permite discutir. O primeiro é um projeto Brasil. Para garantir um desenvolvimento autônomo e com forte conteúdo tecnológico e de distribuição de renda.
O senhor é da corrente desenvolvimentista na área econômica?
Sou.
E o que o senhor acha que precisa mudar na política econômica?
Eu acho que a calibragem na política de juros está sendo aquém da necessidade do país. Eu já não sei se é um problema de calibragem ou de equívoco mesmo. Tem um erro aí nessa calibragem. O erro está no Banco central. A calibragem entre a política de juros e a política cambial está criando problemas para o Brasil.
Mas isso está concentrado na figura do presidente do Banco Central?
Eu acho que é um novo mandato e poderia haver um novo pacto na condução do Banco Central. Não acho que é uma questão do presidente do Banco Central, mas teria que ter metas de crescimento. A inflação do último ano ficou abaixo da meta. Então, a calibragem foi errada. Evidentemente que a gente não quer a volta da inflação, mas uma calibragem correta, que tenha crescimento. O PAC é essa mensagem. Nós queremos crescimento com controle da inflação, e o Banco Central precisa entender essa mensagem.
Qual é o futuro político do PT no segundo mandato?
O presidente Lula está focado na formação do novo ministério e na aprovação das medidas do PAC. Depois, o segundo foco dele será no monitoramento e gestão dessas obras. E na calibragem de medidas que vão ter que ser aprofundadas no PAC. Eu acho que ele também já está tratando do problema da reforma tributária. Esta semana, quando o governo coloca o tema da cobrança de impostos de valor agregado no consumo, já está pensando nisso.
Então a reforma tributária será prioridade para o governo?
Seria um terceiro passo do presidente, depois do PAC. A resistência política da reforma tributária seria dos governadores. O governo trabalha numa proposta para apresentar aos governadores na próxima reunião marcada para esta semana. Depois vem o enfrentamento da reforma política.
E o PT, como fica nisso?
Eu creio que o PT aprendeu que não deve nacionalizar as eleições municipais. Você não pode fazer nessas campanhas uma avaliação do governo federal. Não se pode crer que o PT será vitorioso apenas se eleger um determinado número de prefeitos. Essa foi a grande crise na nossa na campanha de 2004, que gerou todo esse problema da crise aqui. Nós tínhamos a idéia de que era preciso eleger muitos prefeitos, fizemos muitas alianças. Eu interpreto que a natureza da crise foi de financiamento eleitoral.
Os empréstimos e as dívidas que o partido contraiu?
Tudo isso.
O senhor está projetando uma eleição municipal…
Municipal. Financeiramente municipal. Considerando que o país é pobre e os municípios também.
E depois disso?
É o debate sobre a sucessão de 2010, o que deve acontecer só em 2009.
Mas se a prefeita Marta vier mesmo para o Ministério das Cidades, como o senhor está prevendo, não será impossível segurar o processo de sucessão do presidente Lula?
Eu concordo, mas acho que o presidente pode fazer um pacto com ela para não haver esse ingrediente. Creio que o presidente vai conduzir esse debate somente para ser feito em 2009. O presidente tem um cálculo político muito apurado. E ninguém vai conseguir precipitar a sucessão.
E qual será o papel do ministro Tarso Genro no segundo mandato?
Tenho ouvido muito dele pela imprensa, mas onde ele ficar, vai ficar bem.
Como senhor vê a reforma política, o recuo de Tarso Genro nessa questão e a proposta da OAB?
Eu creio que esse projeto encaminhado pela OAB tem um conteúdo muito positivo. Eu concordo até mais com esse projeto do que com o projeto da subcomissão da reforma política que já tem um relatório final para ser votado. Porque ele busca aperfeiçoar o sistema representativo, incrementa a democracia direta e o sistema participativo. Agora, como o projeto da OAB mexe com questões institucionais como o voto para suplente de senador e diminui o mandato de senador, creio que ele deva sofrer resistências no Senado. Eu não creio que haja recuo, mas eu acho que as entidades vão assumir mais fortemente a proposição.
Mas o ministro Tarso Genro defendia os plebiscitos, proposta em comum com a OAB e que gerou polêmica. Esse foi o motivo do recuo do ministro?
Não. O entendimento que eu tenho foi a reação ao projeto com relação às propostas do Senado. Eu não vejo que qualquer dificuldade de encaminhar o plebiscito, porque ele é um instrumento das democracias modernas. E não há a menor intenção de utilizar esse instrumento para a reeleição do presidente da República. É uma leitura equivocada. Então, como mexe nas questões do Senado, o governo preferiu ficar de fora um pouco. Não houve um recuo do governo, mas um distanciamento da proposta que é da OAB.
Outros dois nomes do partido começaram a ser cotados para disputa na capital paulista. O do presidente Arlindo Chinaglia e o do senador Aloizio Mercadante. O senhor não acha que, se estiver num bom momento, o presidente da Câmara não vai querer entrar nessa disputa?
O mandato de presidente da Câmara é de dois anos e, ao meu ver, vai ser incompatível com a disputa à prefeitura de São Paulo. Ele vai ter dificuldade dessa natureza. É um nome bom, com qualificação e competência, mas colide com o fato. E, afastando-se do cargo, ele deixaria a presidência da Casa para o PSDB.
E o senador Mercadante? Ele não teria mais chances na eleição municipal do que numa disputa para o governo estadual?
Eu quero declinar porque o nome mais natural à prefeitura de São Paulo é o da Marta. Porque o Aloizio, como senador, vai ter uma disputa em 2010. Ele pode ser tanto nosso candidato a governador de São Paulo como candidato à reeleição no Senado. Eu não sei se ele tem energia para entrar já numa nova disputa eleitoral.
O senhor acha que os problemas dele com relação ao caso do dossiê já estão superados?
Estão. Inclusive o depoimento do procurador-geral diz que não houve base jurídica para denunciá-lo. Ele é um bom nome para a prefeitura, mas deve passar por um planejamento de médio prazo. O único que estaria impedido seria o Arlindo em função da presidência da Câmara, mas também é um bom nome.
A Caixa Econômica Federal vem sofrendo, desde o início do governo, com casos como o da Gtech, a quebra do sigilo do caseiro e agora mais recentemente com as denúncias do senador Álvaro Dias sobre lavagem de dinheiro nas loterias. A imagem da instituição não está aranhada?
Eu não creio. A Caixa é uma das instituições que melhor funcionaram no governo Lula. Ela aumentou seu potencial, é outra instituição, e cresceu muito. Os três episódios que você está falando não criaram nenhum problema para a instituição. No caso da Gtech, a Caixa substituiu toda a tecnologia das loterias por tecnologia própria economizando R$ 300 milhões nesse contrato. A questão do caseiro não atingiu a instituição, afetou mais o ministro Palocci. Nessa história do senador Álvaro Dias, ele utilizou um ofício que a Caixa fez para o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras). É um processo que a Caixa está auditando e tomando todas as providências. Mas, de repente, o cara usa isso para dizer que a Caixa tem irregularidades. Tanto que já saiu da imprensa e aquele barulho já acabou. Creio que a imprensa entrou de gaiata nesse jogo. A própria Globo teve que mostrar depois que era uma providência da Caixa. Creio que deram muita credibilidade para ele nesse episódio que precipitou uma denúncia.
O senhor, que trabalhou com o setor de habitação no governo Marta, acha que a Caixa está com demandas demais?
Deveriam ser revistos esses contratos com os ministérios. O papel da Caixa é financiar a habitação e o saneamento, fazer os repasses do Bolsa Família, etc. Na minha modesta opinião, a Caixa deveria devolver as demais atribuições aos ministérios, que deveriam adotar um mecanismo de fiscalização que não fosse o dela. Mesmo tendo uma equipe muito competente, a Caixa pode não dar conta, pois vai ser pressionada cada dia mais a aprovar projetos habitacionais por causa do PAC. É muito investimento. A equipe da Caixa não pode ficar amarrada com atividades que não são dela.
Qual é sua visão sobre o processo de urbanização do Brasil considerando a questão agrária? É possível conter o êxodo rural ou isso é mesmo irreversível, mesmo com esse projeto do governo de reforma agrária?
O Brasil se urbanizou muito em relação à África, à China e à Índia. Os ciclos migratórios não são tão fortes, mas é preciso que preocupar com o crescimento de algumas metrópoles, especialmente na região Norte. E também prevenir o problema da habitação. O problema da habitação no Brasil chegou a um nível elevado, mas eu não creio que tenhamos que conter os ciclos migratórios. Você tem que fazer reforma agrária por outros motivos. Há uma parcela da população que não tem terra para trabalhar, muitos são filhos de agricultores. Mas é preciso fazer um esforço permanente de promover o acesso à terra com infra-estrutura para essas pessoas trabalharem. O Brasil se urbanizou de maneira violenta, mas não é a reforma agrária que vai conter isso. Existem outros “n” motivos para a reforma agrária. Como a concentração da terra em poucas mãos e o empobrecimento no campo.
O governo recebeu muitas críticas por não cumprir a própria meta de assentamentos. Agora parece que vai abandonar os números e focar na qualificação dos assentamentos. O que o senhor acha desse foco?
Com razão, o governo pensa na qualificação dos assentamentos. Não é só assentar o homem no campo, mas tem que dar assistência, melhores técnicas ou garantir a escolha da melhor cultura que se possa fazer na sua terra, além da comercialização da produção. Tem muito assentamento que precisa de casas, demanda energia elétrica, pavimentação de estradas e escolas. Eu creio que esse é um desafio do Brasil, mas ainda tem muita gente que precisa ser assentada.
O que o senhor espera do seu mandato como titular na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)?
Ali é um palco de debate acalorado e onde passam os interesses do governo. Estou querendo aprofundar minha participação no tema urbano e nas questões da cidadania e do meio ambiente.
O que o senhor pretende propor nessa questão urbana?
Aprofundar a discussão sobre a questão social da propriedade. Eu acho que você tem que fazer com que a propriedade urbana tenha sua utilidade, uma reforma urbana. Você poder cobrar do proprietário que ele utilize seu imóvel e que desempenhe uma função social pagando impostos. Hoje se o cara não paga imposto é uma ação própria de execução fiscal demorada. Agilizar o processo de cobrança de impostos e eventualmente colocar essa questão no âmbito da função social da propriedade.
No caso, o proprietário que não pagar seus impostos poderá perder o imóvel para o estado, uma desapropriação urbana?
Desapropriar com pagamento de títulos da dívida pública. Colocar o imposto progressivo no tempo e depois trabalhar com a hipótese de desapropriação. Já é assim, mas não para os imóveis que não pagam impostos. Também quero trabalhar num projeto de lei de uso e parcelamento do solo. Quero trabalhar a questão do tratamento de resíduos sólidos, da coleta seletiva e da reciclagem do lixo. A coleta, o tratamento dos resíduos sólidos e a reciclagem não têm nenhuma obrigatoriedade. Um terceiro tema é o das energias renováveis e de reuso de água, como nas chamadas casas verdes dos Estados Unidos. E também quero entrar nessa questão da legislação de drogas. Eu achei pertinente essa provocação do governador Sérgio Cabral.
O senhor, a exemplo do governador, é favorável à descriminalização das drogas?
Eu sou favorável à legalização de algumas drogas. Você tem que quebrar o tráfico de drogas pelas costas. Eu acho que a maconha deveria ser legalizada e deveríamos migrar para um processo em relação às demais drogas. Hoje o tráfico de entorpecentes afeta diretamente a segurança pública.
O senhor já pensa num projeto de lei nesse sentido?
Estou conversando com o presidente da CCJ para trazer o Cabral aqui numa audiência pública. Nós temos que estudar esse tema que ele propôs.
O tema é polêmico, o senhor não teme represálias?
É trabalhar o tema. O Brasil precisa discutir se quer continuar colocando pessoas na cadeia em razão desse tema. Eu acho que tem que endurecer o tratamento com o álcool e com o cigarro. A legalização das drogas não é uma permissão ou um incentivo ao uso. O problema é desconectar esse sistema da criminalidade. Ainda estou tateando antes de pensar num projeto de lei. O primeiro passo é saber se o governador do Rio de Janeiro quer vir aqui para debater.
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