Acusado de ordenar a série de atentados que aterrorizou São Paulo em meados de maio, o preso Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, admitiu a existência de uma rede de proteção à população carcerária, sustentada financeiramente por bandidos que estão soltos. Em depoimento à CPI do Tráfico de Armas, ao qual teve acesso o jornal O Globo, Marcola admitiu que pagou advogados com o dinheiro arrecadado em dois de seus assaltos a bancos.
Durante as quatro horas de contato com os deputados, no presídio de Presidente Bernardes (SP), no último dia 8, Marcola negou sistematicamente ser o líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), principal facção criminosa paulista. Ele disse que, à exceção dos “presídios mais miseráveis”, todo preso que ingressa no sistema recebe proteção dos bandidos, incluindo assistência às famílias. “A gente procura ser solidário”, disse o bandido.
Marcola perdeu a linha quando foi pressionado pelo presidente da CPI, Moroni Torgan (PFL-CE), a confessar que seria o chefe da facção criminosa e que a organização achacaria os presos. “Os coitados dos presos têm de sair às ruas para trabalhar para ela (a facção). Têm que ser criminosos”, acusou Torgan.
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Irritado, Marcola reagiu: “E o que os deputados fazem? Não roubam também?”. O bate-boca foi o momento mais tenso do depoimento. Antes de insultar os parlamentares, Marcola pediu que Moroni diminuísse o tom de voz ao interrogá-lo. O deputado advertiu que o preso seria indiciado por desacato.
O assaltante contou que uma facção rival, que acredita ter o controle de 5% da população carcerária de São Paulo, teria interesse em eliminá-lo. “Eles querem me matar no seguinte sentido: não querem matar o Marcos Willians Herbas Camacho. Eles querem matar esse símbolo.” “Símbolo de quê, Marcos?”, cobrou Moroni Torgan. “Símbolo desta organização que vem sendo veiculada como se eu fosse o líder”, respondeu.
Marcola evitou citar nomes, a não ser de bandidos já mortos ou de seus adversários notórios, e informações sobre esquemas de tráfico de drogas e contrabando de armas. E acusou José Márcio Felício, o Geleião, ex-chefe do PCC de ser radical por defender a prática de atentados terroristas. “Ele queria explodir a Bolsa de Valores (de São Paulo)”, disse.
O líder do PCC tentou passar a imagem de que sua facção criminosa se preocupa essencialmente com o bem-estar da população carcerária, que, em São Paulo, chega a 125 mil presos. Ele disse que a organização surgiu em 1993 e se consolidou dois anos depois para enfrentar problemas como o estupro e a epidemia de crack que tomava conta das prisões paulistas.
Marcola admitiu que, após o início dos atentados, foram feitos contatos com autoridades do governo para cessar os ataques. Informou à CPI que um telefonema dado do presídio de Presidente Bernardes por outro comparsa, Luiz Henrique, o LH, pôs fim às rebeliões nas prisões.
A ligação aconteceu dois dias após o início dos motins, quando a advogada Iracema Vasciaveo esteve em Presidente Bernardes acompanhada por representantes do governo do estado e da polícia. Iracema teria entrado no presídio com dois celulares e ofereceu um deles para LH telefonar para um detento que estava em outro presídio rebelados. Com a informação de que Marcola estaria bem, as rebeliões foram encerradas.
Acusado de ordenar a morte do juiz Antônio José Machado Dias em março de 2003 (Presidente Prudente), ele culpou um ex-comparsa, Bandeijão, já morto. Os integrantes da CPI perguntarem sobre as razões de seu apelido, Marcola: “Quando criança, cheirava cola na Praça da Sé, de onde veio o apelido, mistura de Marcos e cola”.