Época
Congresso tem farra paga com nosso dinheiro
A reportagem feita pela revista tem base os 16 CDs em poder do Ministério Público Federal (MPF), obtidos graças a uma investigação sobre os abusos cometidos pelos deputados federais na emissão de passagens aéreas, entre janeiro de 2007 e outubro de 2008. Os registros fornecidos pelas companhias aéreas revelam que políticos de todos os partidos e tendências ideológicas têm como hábito usar suas cotas de passagem para bancar viagens particulares, aqui e no exterior, deles mesmos, de parentes e de amigos. Durante o período investigado, a Câmara gastou R$ 2,5 milhões com viagens a passeio de deputados e seus convidados ao exterior. A farra no Senado foi ainda maior. Os 81 senadores gastaram, em 2008, R$ 2,8 milhões passeando mundo afora, quatro vezes mais que os 513 deputados federais. Essa conta não inclui as viagens a serviço, que não são pagas com a cota individual dos parlamentares.
Um dos decanos entre os deputados brasileiros – ele exerce sucessivos mandatos desde 1971 –, o líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), embarcou com a mulher e dois filhos para uma temporada em Miami, em julho de 2007. As viagens da família Alves não pararam por aí. Até onde se sabe, foram pelo menos 13 para o exterior e custaram cerca de R$ 30 mil. O líder do P-SOL, deputado Ivan Valente (SP), aguerrido oposicionista de esquerda e um dos paladinos da “ética” no Congresso, gastou cerca de R$ 12 mil para emitir quatro bilhetes, de ida e volta, entre São Paulo e Paris. Na lista do Ministério Público, o campeão nos presentes aéreos foi o líder do PP, deputado Mário Negromonte (BA). Foram pelo menos R$ 60 mil em viagens para Nova York entre 2007 e 2008. A mulher e as três filhas viajaram em sua cota parlamentar. Para o MPF, os abusos estão relacionados à falta de controle e transparência na emissão e no uso das passagens aéreas pelos parlamentares. O descontrole é tão grande que, suspeita-se, há um mercado paralelo de venda de passagens. A suspeita ganhou força depois que dois ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes e Eros Grau, apareceram como beneficiários de bilhetes. Eles provaram que fizeram viagens com passagens pagas com dinheiro do próprio bolso. O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), abriu uma sindicância para apurar o golpe.
A revista frisa a participação do Congresso em Foco na revelação do escândalo com as passagens. “O escândalo da farra com as passagens aéreas no Congresso tornou-se público graças, em grande parte, ao trabalho de um site especializado na cobertura das notícias do parlamento e do poder em Brasília. Em funcionamento há cinco anos, o site Congresso em Foco foi responsável pela revelação de que passagens aéreas da cota do deputado Fábio Faria foram usadas para financiar viagens de Adriane Galisteu, de sua mãe, Emma, e outros artistas. O furo dos repórteres Lúcio Lambranho, Edson Sardinha e Eduardo Militão foi seguido por outras revelações, também feitas pelo site, sobre o mau uso das passagens pelos parlamentares.”
Teria Valério blefado novamente?
O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza é um especialista em manipular segredos e versões. Um dos principais articuladores do mensalão, o esquema de compra de apoio de deputados pelo governo, descoberto em 2005, Valério de vez em quando ameaça contar tudo o que sabe. Recentemente, ele voltou a usar a estratégia como reação a uma suposta agressão. A vários interlocutores, Valério afirmou ter sido espancado dentro da penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo, onde ficou detido 86 dias. Seus algozes seriam presos, contratados a mando do PT, com o objetivo de forçá-lo a entregar um suposto DVD em que contaria fatos inéditos do escândalo do mensalão. Para sustentar o que dizia, Valério mostrou marcas de uma cirurgia feita na boca para reconstituir dentes quebrados e até um exame de corpo de delito. Um mês depois, a cortina de fumaça criada por ele está se desvanecendo. Na semana passada, a revista teve acesso a documentos oficiais de uma investigação feita pela Secretaria de Assuntos Penitenciários do Estado de São Paulo para apurar a denúncia de Valério. A direção da penitenciária ouviu os quatro companheiros de cela de Valério, reuniu suas fichas médicas e fez um inventário das visitas e atendimentos que ele recebeu. Em um relatório de sete páginas, a diretora da penitenciária, Claudionéia Aparecida Veloso Santos, afirma que não há nenhuma indicação de que ele esteja falando a verdade. Os depoimentos mais contundentes contra a versão de Valério foram prestados por seus companheiros de cela. Eles dizem que Valério era calmo, simpático e que tiveram um bom relacionamento com ele. Eles dizem não ter testemunhado nenhuma agressão e que, quando foi libertado, Valério tinha os dentes em perfeito estado.
José Antonio Toffoli recuperou R$ 255 bilhões para a União
Quando o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva terminar, em dezembro de 2010, o advogado José Antônio Dias Toffoli terá 43 anos de idade e uma das mais detalhadas memórias sobre os processos de decisão no governo Lula. Afinal, antes de se tornar ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), cargo que ocupa desde março de 2007, ele foi subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, na equipe do ex-ministro José Dirceu, e o advogado de Lula em três campanhas presidenciais – 1998, 2002 e 2006. Entre ações para cobrar tributos devidos e outras para deixar de pagar diferenças cobradas por contribuintes, a conta a favor do governo nos tribunais foi de R$ 255 bilhões em 2007 e 2008. Seu contato inicial com o PT, além dos militantes de rua, era com o deputado Arlindo Chinaglia (SP), ex-presidente da Câmara.
Veja
Virou agência de viagem
No Brasil, ao contrário, alguns políticos ainda se comportam como se estivessem na pré-história do desenvolvimento moral e, sem nenhum pudor, promovem uma verdadeira farra com os recursos recolhidos do contribuinte. Flagrados, não se constrangem, mentem e inventam desculpas estapafúrdias para tentar minimizar o caso. Fora os eleitores potiguares, pouquíssima gente já tinha ouvido falar do deputado Fábio Faria, do PMN. Jovem, rico e boa-pinta, ele está no Congresso desde 2007 e, na semana passada, credenciou-se como o mais novo membro do clube da patuscada. Com uma atuação parlamentar insignificante, Faria era conhecido apenas pelo excelente desempenho com belas modelos e atrizes famosas. O jovem deputado também tinha o hábito de usar passagens aéreas da cota de seu gabinete para deliciosos passeios – um deles, a Miami, em companhia da apresentadora de televisão Adriane Galisteu, então sua namorada. Bom moço, o parlamentar também descolou passagem para a futura sogra.
Denunciado pelo portal Congresso em Foco, o deputado teve a reação típica: primeiro negou, depois disse que não havia nada de ilegal e, por fim, devolveu 21 000 reais – o valor correspondente às passagens dos artistas, da sogra e de alguns amigos que pegaram carona na farra. Com relação aos sete bilhetes que emitiu em favor de Adriane Galisteu, Fábio Faria disse que não via necessidade de devolver o dinheiro, já que a apresentadora era sua companheira e não havia nada de mais em a Câmara bancar as viagens dela no Brasil e no exterior.
O uso de passagens oficiais para fins pessoais é mais um capítulo do festival de malandragens que alguns parlamentares dos mais diferentes partidos promovem com o nosso dinheiro. O deputado João Paulo Cunha (PT-SP), por exemplo, foi para Bariloche, na Argentina, com a mulher e a filha. Seu colega Inocêncio Oliveira (PR-PE), que até o início do ano era o corregedor da Câmara, uma espécie de fiscal do bom comportamento dos outros, pagou viagem da mulher, das filhas e de uma neta para os Estados Unidos e a Europa. Para pegar o bonde, ou melhor, o avião do Congresso, nem precisa estar no exercício do mandato. Três deputados que estão licenciados para ocupar o cargo de ministro – José Múcio, das Relações Institucionais, Geddel Vieira Lima, da Integração Nacional, e Reinhold Stephanes, da Agricultura – viajaram 64 vezes à custa da Câmara em companhia da mulher, filhos e parentes, isso apesar de terem à disposição jatinhos da Força Aérea Brasileira.
Quem mandou parar?
A CPI dos Grampos, apesar de ainda não ter encerrado os trabalhos, já prestou um enorme serviço ao país. Através dela foi possível implodir alguns pilares do estado policial que começou a fincar suas bases no coração da democracia brasileira. O próximo passo seria identificar todos os responsáveis pela montagem dessa unidade acima da lei que agiu como se fosse um estado paralelo. O governo, porém, acha que as investigações foram longe demais. Na semana passada, emissários do Palácio do Planalto mandaram recados aos integrantes da comissão – e tudo começou estranhamente a mudar de rumo. O deputado petista Nelson Pelegrino anunciou que pretende apresentar o relatório final do caso na próxima quinta-feira. A CPI tem prazo legal de funcionamento até o dia 14 de maio.
Istoé
Mercado paralelo
A crise no Congresso Nacional não tem fim. Na última semana vieram à tona relatos de abusos na distribuição de passagens aéreas de deputados e senadores. Foi revelado que é prática comum fornecer passagens para parentes e amigos de parlamentares. O que parecia ser um vício administrativo está ganhando conotação muito mais grave. A Procuradoria da República no Distrito Federal investiga a existência de um mercado paralelo de passagens da Câmara dos Deputados. Inquérito da Polícia Legislativa da Câmara constatou que funcionários de gabinetes de deputados vendem passagens para particulares, com descontos. Ainda não se sabe o tamanho do rombo que o esquema provocou no orçamento do Congresso. Mas certamente é grande, pois em 2008 a Câmara gastou R$ 78 milhões em passagens aéreas. A procuradora da República Anna Carolina Rezende, que investiga os gastos da Câmara com passagens, apresentou a denúncia para pedir o ressarcimento ao Erário. Pelas declarações colhidas na investigação, a procuradora concluiu que tem havido na Câmara “um verdadeiro comércio em torno das verbas destinadas aos deputados para transporte aéreo”. Paralelamente à esfera criminal, o caso das passagens aéreas já havia se transformado em escândalo nacional. Um dos principais personagens do festival de viagens à custa do dinheiro público é o deputado-galã Fábio Faria (PMN-RN), que usou passagens da Câmara para levar sua namorada, a atriz Adriane Galisteu, e três atores ao Carnaval fora de época em Natal. No Senado o tema foi tratado com ironia.
As ossadas do Araguaia
a sala da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, no anexo do Ministério da Justiça, guarda mais do que prontuários. Num armário, em caixas de papelão, estão arquivadas pelo menos dez ossadas ainda não identificadas. Deteriorada pelo tempo, a maioria dos esqueletos, sob a responsabilidade da Secretaria Especial de Direitos Humanos, é proveniente de sepulturas abertas há quase duas décadas no cemitério de Xambioá, em Tocantins. Segundo pesquisadores e integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara ouvidos pela revista, tudo leva a crer que os restos mortais sejam de integrantes do PCdoB que lutaram na Guerrilha do Araguaia e foram dados como desaparecidos, caso de Paulo Rodrigues, João Carlos Haas Sobrinho e Bérgson Gurjão Farias. Procurado pela reportagem, o presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Antonio Barbosa, demonstrou que o assunto não é considerado prioritário pelo governo.
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