Veja
Capa: Escândalo, pó e morte
A história é tão antiga quanto a humanidade, mas todo mundo continua a acompanhar com emoção a trama de poder, fama, traição e vício que uniu Susana Vieira e Marcelo Silva, depois os separou e por fim o levou à overdose fatal em companhia da nova e bela namorada. Dava um livro, um filme – e, claro, uma novela
O pacote de alívio fiscal para a classe média
Existe no Brasil uma cruel concentração do fardo tributário sobre poucos que pagam em favor de muitos que são isentos ou sonegam. Somente um em cada dez trabalhadores paga imposto de renda. Os outros nove são formalmente isentos ou tiram seus proventos do mercado de trabalho informal. É notadamente do esforço desses 10% de brasileiros que o governo extrai boa parte do óleo que lubrifica a máquina oficial e alimenta os programas sociais, assim como os parcos investimentos públicos. Esse contingente de contribuintes trabalha em média cinco meses por ano apenas para pagar impostos, diretos ou indiretos. Diante dessa anomalia, surge como um alívio, ainda que marginal, a opção feita pelo governo para estimular o consumo por meio de corte de impostos. A equipe econômica anunciou na semana passada a redução do imposto de renda (IR) das pessoas físicas, do imposto sobre produtos industrializados (IPI) cobrado nos automóveis novos e do imposto sobre operações financeiras (IOF) que incide nas compras a prazo e no uso do cheque especial.
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Corrupção: o Brasil entre os líderes mundiais
Uma pesquisa divulgada pela ONG Transparência Internacional na semana passada colocou o Brasil, mais uma vez, na lista dos países mais corruptos do mundo. O estudo, que ouviu executivos com negócios em 22 das nações mais ricas do planeta, revela que o Brasil ocupa a quinta colocação entre os países onde o suborno é mais difundido. Só perde para Índia, México, China e Rússia, campeã isolada do ranking da propina. Mesmo em um país habituado a freqüentar esse tipo de lista, porém, o que se viu agora foi assustador. No Espírito Santo, o presidente do Tribunal de Justiça, a mais alta corte do estado, foi parar na cadeia. Ele e outros três juízes, também presos, são acusados de transformar o tribunal em um balcão para a venda de sentenças. Em São Paulo, um dos réus no escândalo do mensalão foi preso no aeroporto com 361 000 euros escondidos até na cueca. Em Brasília, a bandalha promovida na Fundação Nacional de Saúde (Funasa), órgão federal que deveria cuidar de comunidades carentes, agora avança até sobre a verba destinada à construção de sanitários. O festival de trapaças causa a impressão de que a corrupção é uma praga indestrutível.
Estados Unidos: Governador é preso vendendo vaga no Senado
Falta pouco mais de um mês para que o presidente eleito Barack Obama se instale na Casa Branca, mas é como se seu governo já tivesse começado – para o bem e para o mal. Diante da notícia de que só em novembro os Estados Unidos perderam meio milhão de empregos, Obama, tal como um presidente no exercício do cargo, prometeu lançar o mais ambicioso plano de obras públicas dos últimos cinqüenta anos, com o objetivo de reanimar a economia. Coisa fina, que não se limita a remunerar gente consertando ponte e estrada. Sua idéia é modernizar, abrindo vagas tecnológicas e ecológicas. Na semana passada, outra vez como se fosse presidente, Obama recebeu duas más notícias. A primeira foi a rejeição pelo Congresso do plano de 14 bilhões de dólares para salvar a indústria automobilística. GM e Chrysler podem ir à lona antes da posse de Obama – a Ford, que completa a tróica de gigantes, diz que ainda consegue respirar sem ajuda oficial. A recessão americana é uma preocupação para Obama, e para o mundo, mas é um desastre herdado do governo Bush. A má notícia capaz de lhe tirar o sono e encolher sua estatura política ainda antes da posse é outra, e foi produzida no seu domicílio eleitoral e por seus correligionários: trata-se do espetacular caso de corrupção do governador de Illinois, Rod Blagojevich, de 52 anos
Istoé
Capa: Eles venceram na crise
Crises – sejam elas pessoais, profissionais, eleitorais, administrativas ou financeiras – podem ser encaradas tanto como uma barreira aos projetos quanto como um trampolim para melhores dias. O time dos cinco brasileiros do ano de 2008 escolhidos para esta tradicional homenagem da revista ISTOÉ soube enfrentar os momentos decisivos para aumentar a distância que os separa da média. Foi com um salto de exatos 7,04 metros que Maurren Maggi capturou o primeiro ouro olímpico individual de uma brasileira e deixou para trás 30 meses de suspensão por doping e um redemoinho na vida pessoal que quase a derrubaram da carreira.
Crise, no caso a do cinema nacional, foi o que conheceu Bruno Barreto, desde que escolheu essa profissão, mas nem por isso deixou de realizar 18 filmes, incluindo o de maior bilheteria da história do Brasil. Crise foi o que herdou o governador Sérgio Cabral, que agora festeja os maiores investimentos públicos e privados da história do Rio nas últimas duas décadas.
Se não soubesse transformar desafios em trampolins, Gilberto Kassab não teria pulado sobre a popularidade inicial de Geraldo Alckmin e Marta Suplicy na disputa pela Prefeitura de São Paulo. E Henrique Meirelles tampouco seria o único presidente do Banco Central a ter conseguido deixar o Brasil de pé diante de uma tempestade financeira internacional – feito ainda mais notável porque coube a ele domar a pior de todas as crises. Nas próximas páginas, descubra quais são os segredos destes cinco brasileiros de 2008 para superar dificuldades.
Favela sem traficantes
Os degraus da escada do Morro Dona Marta hoje só assustam pela quantidade: são cerca de 800, da rua São Clemente, uma das principais do bairro de Botafogo, na zona sul do Rio, até a Ladeira Mundo Novo, o topo da favela, de onde se tem uma vista deslumbrante da Lagoa Rodrigo de Freitas, do Corcovado e do Pão de Açúcar. O percurso foi feito pela equipe de ISTOÉ, parte a pé e parte de bondinho, na quarta-feira 3, com tranqüilidade. Esses mesmos degraus assustavam, até recentemente, por outros motivos: homens ostensivamente armados controlavam as bocas-de-fumo localizadas nessa favela, que já foi um dos principais postos de abastecimento dos consumidores de drogas das classes média e alta cariocas. Dez dias antes, repórter e fotógrafo teriam que pedir autorização aos traficantes ou escolta policial – em ambos os casos, nada garantiria que sairiam ilesos da visita. O motivo da tranqüilidade: o morro está ocupado permanentemente por 50 PMs – número que subirá para 120 no ano que vem.
Gaiolas de ouro
O Brasil tem espalhados pelo mundo 120 embaixadas, 63 consulados e vice-consulados e outros 16 escritórios para auxiliar os cidadãos. Algumas embaixadas são suntuosas, como a de Roma, no Palazzo Doria Pamphili, na Piazza Navona. Do R$ 1,8 bilhão gasto pelo Itamaraty em 2008, R$ 1,3 bilhão foi com as representações no Exterior. Segundo a Ong Contas Abertas, só cinco embaixadas põem suas contas no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi). Uma das representações mais dispendiosas é o Consulado-Geral de Nova York, que neste ano gastou R$ 5 milhões só de aluguel. A embaixada de Buenos Aires gastou R$ 2 milhões também com aluguel. Mas, quando os brasileiros precisam de ajuda de suas representações diplomáticas, ficam quase sempre a ver navios. Na semana passada, essa letargia do Itamaraty ficou mais uma vez explícita durante a ocupação do aeroporto de Bangcoc (Tailândia) por manifestantes. Um guia da agência de turismo carioca Transmundi foi à embaixada do Brasil para pedir orientação sobre a retirada do país de 54 turistas brasileiros que faziam escala em Bangcoc e estavam ilhados em um hotel. “A embaixada nos avisou que nada poderia fazer e ficamos muito apreensivos”, contou à ISTOÉ o dono da Transmundi, Luys Pradines, que acompanhou as negociações do Rio de Janeiro. Enquanto isso, mais de 400 espanhóis foram retirados do país por aviões fretados pelo governo de Madri em 48 horas. “A palavra que traduz meu sentimento em relação ao embaixador brasileiro na Tailândia é decepção, pois você se sente desamparado pelo seu próprio país”, diz Padrines.
Pronta para outra
Com um largo sorriso no rosto, a senadora Roseana Sarney (PMDB-MA) cantou os versos em inglês da canção London, London, de Caetano Veloso. “Grama verde, olhos azuis, céu cinza, Deus abençoe a dor silenciosa e a felicidade”, diz a tradução da letra. Não havia nem uma semana que ela descobrira que tem um aneurisma de seis milímetros na região cognitiva do cérebro, uma pequena bomba que pode estourar a qualquer momento. Nem de longe desesperou-se. Na festa de confraternização de fim de ano na casa da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), fez duo com a anfitriã. Ao violão, estava o ministro da Coordenação Política, José Múcio Monteiro. O episódio resume a atitude otimista da senadora diante do problema que lhe renderá nada menos que sua 21ª cirurgia. “Eu sempre opto pelo otimismo. Nunca encaro nada na minha vida, seja pessoal, seja profissional, com pessimismo”, disse Roseana à ISTOÉ na tarde da terça-feira 2 em sua casa, no Lago Sul, em Brasília, enquanto, serena, comia com gosto uma rabada.
Cidadãs de segunda classe
Quando a escritora americana Jean Sasson foi trabalhar na administração de um hospital de Riad, na Arábia Saudita, em 1978, não desconfiava que aquele era o início de sua transformação em porta-voz mundial da situação feminina nos países do Oriente Médio. Diante das agressões físicas e psicológicas que presenciou por parte dos homens sobre suas esposas, filhas e irmãs, ela decidiu que não se calaria. Especialmente após se tornar amiga de uma princesa, chamada por ela apenas de Sultana (nome fictício), que lutava pelos direitos das mulheres árabes. A americana relatou a vida de Sultana no livro Princesa, lançado em 1992, que vendeu seis milhões de cópias. Com a obra, criou um gênero de literatura que não existia até então: histórias de mulheres árabes e os problemas que elas enfrentam em sua sociedade. Sete livros e 14 milhões de cópias depois, Jean é uma das conferencistas mais respeitadas da atualidade. Seu último livro, Amor em terra de chamas – a corajosa luta de Joanna do Curdistão (Ed.BestSeller), relata a saga de uma jovem que vive no Iraque e batalha para livrar o povo curdo da perseguição dentro do país de Saddam Hussein. Jean já prepara duas outras obras. Em 2009 contará as percepções de uma mulher que nunca tirou o véu, nem nos lugares permitidos. Logo depois, escreverá sobre uma afegã. A autora conversou com ISTOÉ de sua casa, no extremo sul dos Estados Unidos (ela não revela o lugar exato em que vive por causa das ameaças).
Carta Capital
No banco dos réus
O Brasil até hoje não definiu uma posição clara sobre a punição aos militares e policiais que mataram e torturaram no período da ditadura, apesar da presença de diversos militantes de esquerda no governo. Há setores no Executivo que condenam torturadores, e outros que defendem. O presidente Lula equilibra-se entre as posições divergentes e deixa em situação desconfortável ministros como Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Para piorar a situação, organismos internacionais ligados ao tema têm aumentado a pressão para que o País puna os responsáveis pelo terrorismo de Estado que vigorou durante o regime militar.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) acaba de concluir um relatório, obtido com exclusividade por CartaCapital, devastador. Segundo a comissão, o Estado brasileiro “deteve arbitrariamente, torturou e desapareceu” com os corpos de 71 militantes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e de camponeses que participaram da Guerrilha do Araguaia, no sul do estado do Pará, entre 1972 e 1975.
O Brasil progressista
A idéia conservadora de que os direitos humanos protegem apenas bandidos e não servem lá para muita coisa entrou em descrédito no Brasil. Aos poucos, a população mostra-se mais aberta às políticas públicas de promoção da igualdade, de redução das disparidades de gênero e raça e das estratégias de combate à violência não voltadas exclusivamente à intensificação do aparato repressivo, mas também às ações de prevenção e desenvolvimento social. A tendência é indicada por uma ampla e inédita pesquisa de opinião, que acaba de ser divulgada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.
O estudo ouviu 2.011 brasileiros, em 153 municípios de 25 unidades da federação, e revela avanços inegáveis. Apenas 15% dos entrevistados encaram os direitos humanos de forma negativa, como um privilégio exclusivo de infratores ou grupos sociais específicos. Os dados também apontam para uma inclinação de a população apoiar políticas afirmativas, como a reserva de vagas para negros em universidades (apoiada por 58% dos entrevistados) e a ampliação de direitos aos homossexuais, a exemplo da permissão para casais do mesmo sexo adotarem filhos, medida com 48% de aprovação e 36% de rejeição.
A sabotagem do BC
De Washington a Pequim, os bancos centrais do mundo cortam agressivamente os juros básicos e alguns dos mais importantes, incentivados pelo próprio FMI, tomam decisões inéditas para estimular o crédito, o consumo e o investimento e tentar impedir que a economia global se atole em uma longa depressão.
Mas o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de Henrique Meirelles agiu outra vez como se existisse apenas para defender os ganhos dos credores da dívida pública, os interesses do mercado financeiro e uma ortodoxia monetarista de manual já sepultada em todo o Hemisfério Norte, com o luxo e as pompas fúnebres às quais não tinha direito. Na reunião de 10 de dezembro, manteve o juro no altíssimo patamar de 13,75%. Age de maneira a agravar tanto quanto possível o contágio do Brasil pela recessão mundial.
Pelas áreas continuístas
Apesar de o julgamento não ter sido oficialmente concluído, já é certo que os indígenas foram os vencedores no julgamento da demarcação da Reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Os sete votos proferidos na sessão da quarta-feira 10 seguiram, na essência, o voto do relator, ministro Carlos Ayres Britto, lido em agosto. “O núcleo da decisão foi o de que o procedimento demarcatório da Raposa foi todo ele jurídico, obedeceu rigorosamente aos parâmetros legais e constitucionais”, afirma Britto. A maioria dos onze ministros julgou que a demarcação será mantida no formato atual, em área contínua, sem a presença de não-índios, contrariamente à reivindicação dos fazendeiros da área e governo estadual. Também foi consensual que o fato de a reserva estar na fronteira do País não ameaça a soberania nacional, como argumentaram produtores rurais e setores das Forças Armadas.
A conclusão do caso foi mais uma vez adiada, graças a novo pedido de vista, desta vez do ministro Marco Aurélio Mello, que incluiu em sua solicitação a análise da ação cautelar, apesar de a maioria também ter decidido pela cassação da liminar que garante a permanência dos fazendeiros até a análise do mérito. Com o pedido, o julgamento será reiniciado em 2009, quando o governo poderá, publicada a súmula, retirar os não-índios. Além de Mello, faltam votar Gilmar Mendes e Celso de Mello. Durante a sessão, Mello deixou explícito o seu descontentamento com a postura do ministro Britto, que insistiu para a liminar ser cassada durante a sessão, dada a maioria. Na entrevista a seguir, Britto comenta o caso, as condições sugeridas por Carlos Alberto Direito e as rusgas com o outro colega de tribunal.
O julgamento do século
Na entrada de uma das três tendas de lona erguidas em Guantánamo está escrito Camp Justice. Nela funciona, desde 5 de junho, uma Corte Militar ad hoc, ou seja, instituída para julgar cinco acusados de prepararem os ataques de 11 de setembro de 2001, com 2.972 mortes.
A corte de exceção é composta de doze juízes militares e a pena de morte só pode ser aplicada em caso de decisão unânime. O presidente da corte castrense é o coronel Ralph Kolmann e dez observadores. Em um telão instalado na barraca vizinha foram escalados para acompanhar as sessões de julgamento. Detalhe: o som e as imagens chegam com 20 segundos de atraso, tempo estabelecido pela Corte como necessário a eventual censura nas transmissões.
Na segunda-feira 8, a corte teve uma surpresa com Khaled Sheikh Mohammed, apontado como a “mente” idealizadora do trágico 11 de setembro. Igual surpresa, mas com vinte segundos de atraso, tiveram os observadores e o grupo de jornalistas da terceira tenda. Khaled, que, sob tortura, confessara na fase pré-processual o preparo do atentado, “de A a Z”, apresentou um requerimento solicitando a abreviação do julgamento: “Uma audiência imediata para anunciar a confissão e para colocar fim a este jogo. Não queremos perder mais tempo”. Ao se referir aos defensores dativos, Khaled arrematou: “Todos os senhores são pagos pelo governo americano e eu não tenho confiança em nenhum americano”.
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