Veja
O Brasil já chegou ao futuro
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, 60 anos, tem mais horror de rótulos do que de recessão. A atual, diz ele, está sendo vencida pelo Brasil justamente porque a política econômica não é mais um cabo de guerra entre correntes de pensamento discordantes: “Essa discussão sobre se determinada medida é ortodoxa ou heterodoxa acaba sendo bobagem. Você tem de tomar as medidas que são mais eficientes para o país naquele momento – e ponto”. Como um bom petista histórico, Mantega acredita que na política os conceitos de esquerda e direita continuam tendo validade. Mas em economia só atrapalham – pelo menos para quem tem a missão de formular políticas econômicas. Satisfeito com os resultados de seu pragmatismo, ele falou a VEJA.
Quando o senhor discutia as ideias econômicas do PT nos anos 80, seria levado a sério alguém que dissesse que a verdadeira revolução brasileira viria pela estabilidade econômica e pela criação de uma nova classe média?
Seria uma surpresa ainda maior se essa pessoa dissesse que isso ocorreria em um governo do PT. O que importa mesmo é termos conseguido atingir nossos objetivos históricos. Eles nunca mudaram. Sempre foram elevar a qualidade de vida de todos os brasileiros, em especial daqueles com maiores carências, fortalecer a democracia, modernizar ainda mais a economia, tornar o Brasil um país menos dependente, menos vulnerável e fortemente respeitado no exterior. Nossa passagem pelo governo e a maneira como enfrentamos as crises externas e internas me permitem dizer o que todo mundo repete lá fora: para o Brasil o futuro, finalmente, chegou. O sinal mais evidente disso é estarmos caminhando para mais uma eleição presidencial e, desta vez, sem dar chance aos especuladores de explorar riscos reais e imaginários como no passado. Espero que saia vencedora nossa candidata, a ministra Dilma Rousseff, mas, seja quem for o novo presidente eleito em 2010, ele não terá como mudar radicalmente os rumos do país. Não vai desfigurar a política econômica, tampouco a social. Se relaxar no combate à inflação, estará em apuros. Se acabar com o Bolsa Família, correrá o risco de ser deposto.
Em 2002, o mercado se apavorou com Lula e o risco-país bateu em 2 400 pontos, um recorde. A desconfiança foi exagerada?
Isso foi em outubro de 2002. Lula liderava as pesquisas e havia um acúmulo de percepções negativas sobre como se comportaria a esquerda brasileira, que pela primeira vez chegava ao poder em nível federal. Muita gente falava que haveria quebra de contratos, de princípios, e que nós não iríamos respeitar as instituições. Somava-se a isso a própria fragilidade da economia brasileira naquele momento. O nível de reservas internacionais estava muito baixo, os investimentos estrangeiros diretos tinham despencado e, para piorar, o país ainda sentia os impactos de uma grave crise de energia. Então, por mais que reafirmássemos nosso compromisso com a responsabilidade na condução da economia, as percepções negativas se mantiveram. Elas só se dissiparam mesmo quando começamos a governar e não quebramos um contrato sequer, adotamos uma política fiscal mais vigorosa do que a do governo anterior, reforçamos a luta contra a inflação e continuamos arrumando o país.
Continuaram…? Mas, então, o mundo não começou no dia da posse do Lula?
Ironias à parte, fomos nós que demos a grande virada no país ao incentivar o crescimento. Demos a virada por nossos próprios méritos, principalmente pelo fato de o presidente Lula ser um político conciliador e avesso a rupturas e por sabermos aproveitar a excelente situação da economia externa que vigorou até o ano passado. Mas é óbvio para qualquer um que é obra também de governos passados o fato de dispormos atualmente da democracia mais funcional e das instituições mais avançadas entre todos os principais países emergentes, chamados de Brics por alguns. Nós construímos em quinze, vinte anos instituições sólidas no país. Hoje não se aceita mais que as políticas públicas sejam feitas sem ouvir os trabalhadores e sem que elas visem a diminuir a pobreza e a concentração de renda. O Brasil era um país vergonhoso. Agora há um consenso em torno de pontos vitais, e, repito, seja qual for o próximo governo, ele vai continuar acumulando reservas, diminuindo a vulnerabilidade externa, vai manter a inflação sob controle e dar continuidade aos programas sociais. As diferenças entre um e outro candidato sempre existirão, mas dificilmente elas serão tão profundas a ponto de tirar o país do caminho que está trilhando com tanto sucesso.
O Brasil passou com louvor pelo teste político de ser governado pela esquerda. O senhor diria que a crise financeira mundial foi a grande prova para a economia e também fomos aprovados?
Quem disser que esta crise não foi o maior “stress test” do século estará mentindo ou desinformado. Foi um teste brutal, e o Brasil está se saindo muito bem até agora. Saiu-se bem em relação a si mesmo, pois provações bem menos vigorosas no passado nos deixaram de joelhos. Saiu-se bem também em comparação com os demais países emergentes e em comparação com as economias mais maduras. Para completar o quadro positivo, houve um reconhecimento quase universal do nível de preparo do Brasil para enfrentar situações internacionais adversas. Isso é um prenúncio de que, quando a crise amainar ainda mais, começará a haver uma sobra de capital, uma liquidez enorme no mundo, que vai procurar um lugar seguro e promissor para investir. Posso afirmar sem medo de errar que uma porção substancial desse capital virá para o Brasil.
Com relação à crise mundial, pode-se dizer que ela está no fim, no começo do fim ou apenas no fim do começo?
A fase mais aguda da crise já foi deixada para trás. Isso é consenso mesmo nos países avançados que foram o epicentro de tudo e agora começam a experimentar uma melhoria gradual. Mas talvez seja tarde demais para salvar 2009 da recessão. Ela será forte em quase todos os países, com raras exceções. O Brasil é uma dessas exceções. Nossa economia vai se sair melhor do que as da Inglaterra, da União Europeia, do Japão e dos Estados Unidos. Esses países e regiões estão prevendo variações do PIB fortemente negativas. O Brasil não apresentará o mesmo resultado brilhante dos dois anos passados, mas os dados mostram que podemos chegar ao fim do ano com um resultado mais próximo do positivo do que do negativo.
À sombra da Constituição
Há meio século, quando o presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira inaugurou Brasília, um coro de descontentes fez-se ouvir. Nada contra a arquitetura de gosto duvidoso da nova capital federal. O que se temia era a possibilidade de que, uma vez isolados no interior do país, longe da vigilância próxima e permanente dos cidadãos de uma metrópole como o Rio de Janeiro, antiga sede do governo, os políticos perdessem de uma vez a compostura e passassem a comportar-se como senhores feudais, acima das leis. Infelizmente, os descontentes revelaram-se proféticos. Brasília tornou-se uma ilha da fantasia para deputados e senadores, que usam seus cargos de representantes do povo para locupletar-se e obter vantagens para seus apaniguados. O corolário evidente é que a capital se transformou numa imagem de pesadelo para os que pagam a conta: nós, os milhões de contribuintes; nós, as dezenas de milhões de pessoas comuns. É tal o resumo da ópera brasiliense – eles, os poderosos, os “incomuns”, se lixam cada vez mais para a opinião pública, para os bons modos, para a Constituição. Minam, assim, a crença na democracia e os alicerces de uma nação que almeja a civilização.
Esse espetáculo deprimente teve outra cena triste na semana passada. Seu protagonista: o presidente Lula. Desde que se viu na contingência política de ter de defender os crimes dos seus partidários envolvidos no mensalão, Lula teve de entregar a bandeira da ética – que ele empunhou com desenvoltura antes de chegar ao Palácio do Planalto. A rendição do presidente se deu naquela célebre entrevista concedida em Paris, em 2005, nos tempos em que a corrupção causava ainda algum constrangimento. Sem os corretivos vindos de cima, a turma do baixo, do médio e do alto clero da base aliada sentiu-se mais livre do que nunca. Sempre que um de seus integrantes está prestes a se afogar, eis que surge o presidente, solidário, oferecendo o conforto de suas palavras amigas. Nem precisa ser compadre de pitar cigarrilha, como o leal companheiro Delúbio Soares, estrela do mensalão. Pode ser do PMDB, do PP ou do PTB. Pode até ser, vá lá, um “grande ladrão”, adjetivo com o qual Lula descrevia o senador José Sarney quando este era presidente da República. Há cinco meses o Congresso Nacional enfrenta uma infindável onda de escândalos. Ela envolve parlamentares e altos funcionários com mordomias, nepotismo e suspeitas de corrupção. Aos 79 anos de idade, 54 de política, Sarney, o mais longevo e experiente dos políticos brasileiros, é apontado como mentor e beneficiário da máquina clandestina que operava a burocracia do Senado. Inerte diante das denúncias, o senador tentou defender-se no plenário, com argumentos tão frágeis quanto os azulejos portugueses de São Luís. Do Cazaquistão, onde se encontrava em visita oficial, Lula atirou-lhe a boia. “O senador tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum”, disse o presidente. E continuou: “Não sei a quem interessa enfraquecer o Poder Legislativo no Brasil. Quando o Congresso foi desmoralizado e fechado, foi muito pior para a democracia”.
O desafio de crescer e preservar
Conciliar desenvolvimento e conservação da natureza é o dilema do mundo neste século. Para o Brasil, é mais do que isso, é uma equação com variáveis muito mais complexas do que a da média mundial. Para início de conversa, o país abriga 60% da Amazônia, a maior floresta tropical do planeta e o maior repositório de espécies animais e vegetais ainda desconhecidas, um tesouro genético de extraordinário significado para a sobrevivência e o bem-estar das futuras gerações. Essa preciosidade biológica insubstituível tem sido queimada para abrir espaço para a pata do gado, como lenha para carvão sem valor algum. A incineração da floresta de clima amazônica, ecossistema que uma vez perdido não pode ser reposto artificialmente, é ainda mais perversa por jogar volumes gigantescos de gases que aumentam o ritmo do temido aquecimento global. Sem uma única chaminé de fábrica, só queimando seu tesouro vegetal, a Amazônia brasileira coloca o Brasil na quarta posição na lista dos maiores emissores de CO2. Essa acima é a Amazônia que é a insônia do mundo e precisa ser conservada.
Sobre o mesmíssimo território instala-se uma outra Amazônia que quer e precisa ser desenvolvida. Nela vivem mais de 20 milhões de brasileiros. São pessoas com carteira de identidade, família para alimentar, filhos na escola, televisão na sala e uma vontade enorme de imitar em tudo o estilo de vida de seus conterrâneos das cidades grandes do Sul. Essas duas dezenas de milhões de almas têm com a floresta uma relação de rapina que nenhuma ONG ambientalista enxerga, por cegueira ou comodismo. Essa população, quase o dobro da existente na cidade de São Paulo, vive da destruição indiscriminada dos recursos naturais à sua volta. Árvores raras e animais selvagens são diariamente mortos e trocados por bens de consumo imediato, principalmente a fonte de energia mais barata disponível, o óleo que vem do Sul, de navio, e é usado para tocar o gerador que alimenta o televisor. Nesse mundo, uma tartaruga vale dois capítulos da novela.
A locomotiva dá o exemplo – portal paulista da transparência
As autoridades brasileiras são pródigas em encontrar justificativas para escamotear seu gasto do dinheiro público. O argumento da segurança nacional é esgrimido para explicar por que boa parte das compras feitas com cartões corporativos da Presidência da República não é divulgada. No Congresso, “empecilhos técnicos” de todo tipo impedem que se lance luz sobre as contas de um poder mergulhado em escândalos (ver reportagem). No campo da transparência, o bom exemplo veio da prefeitura de São Paulo. Na semana passada, ela divulgou todas as suas despesas em um portal da internet (deolhonascontas.prefeitura.sp.gov.br). Nele, estão listados os 19 500 pagamentos mensais feitos a fornecedores. Foi incluída também a quantia que cada servidor recebe por mês. A regra só não foi aplicada à Guarda Civil Metropolitana, para evitar que seus integrantes sofressem ameaças de bandidos.
A divulgação dos ganhos foi uma medida corajosa. Os funcionários – entre eles, o prefeito Gilberto Kassab – tiveram expostos não apenas os salários, mas os vencimentos integrais, que incluem benefícios como vale-transporte e penduricalhos como gratificações e jetons. Pelo site, é possível saber agora a remuneração de um professor que costuma cabular aulas e a dos servidores que ganham acima do teto do funcionalismo. A medida expôs quem estava nessa situação – mas a chiadeira não se restringiu a esse grupo. Na semana passada, sindicatos de servidores recorreram à Justiça para evitar que os vencimentos fossem divulgados. Três obtiveram liminares nesse sentido. Duas delas já foram cassadas.
O argumento de que revelar os ganhos de um indivíduo fere sua intimidade e pode causar constrangimentos tem sua lógica e deverá ser analisado nos tribunais. Restringir a divulgação aos salários altos, aos cargos comissionados e aos funcionários incumbidos de fazer pagamentos (aqueles que podem se sentir tentados a negociar sua assinatura em troca de propina) já seria uma medida de impacto considerável – mas não radical. Pois o fato é que nada blinda tanto os cofres públicos contra a corrupção e os maus gastos quanto a transparência. Daí o mérito incontestável da iniciativa paulistana, que deveria ser copiada em todo o Brasil.
IstoÉ
Onde estão os éticos?
O grupo de nove senadores auto-intitulados “éticos” programou um almoço para a última terça-feira 16 no gabinete de Tasso Jereissati (PSDB-CE). Posariam diante dos holofotes como os responsáveis por tentar livrar a instituição do fosso profundo em que se encontra desde o início do ano, quando eclodiu o escândalo do pagamento de horas extras aos servidores em pleno recesso e o das diretorias fantasmas destinadas a acomodar afilhados políticos e garantir mordomias.
Mas tão logo vazou a notícia sobre o encontro nos corredores do Senado, o celular de Jereissati não parou mais de tocar. “Vai ter reunião dos éticos? Também quero ir”, repetiram mais de 15 senadores. “Eu fui convidado”, fez questão de dizer o senador Almeida Lima (PMDB-SE) e outros que eram questionados sobre o assunto em plenário. Resultado: o almoço foi cancelado. Em vez de uma mesa farta, houve uma reunião austera, no dia seguinte, no gabinete de Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE). A pressão da maioria dos senadores descaracterizou o convescote dos “éticos”.
Dali surgiu um documento com propostas para combater a crise, subscrito por Tasso, Jarbas e mais Sérgio Guerra (PSDB-PE), Cristovam Buarque (PDT-DF), Tião Viana (PT-AC), Renato Casagrande (PSB-ES), Arthur Virgílio (PSDB-AM), Demóstenes Torres (DEM-GO) e Pedro Simon (PMDB-RS). Entre as medidas, a demissão imediata do atual diretor-geral Alexandre Gazineo e uma auditoria externa para analisar os contratos celebrados com empresas privadas.
Mas algumas perguntas são inevitáveis: onde estavam os éticos do Senado quando vários desmandos foram cometidos pelo ex-diretor-geral, Agaciel Maia, que ficou 14 anos no cargo com a bênção de seguidas mesas diretoras? Não sabiam que pode chegar a mil o número de atos secretos baixados nos últimos dez anos, que serviram para nomear apadrinhados de senadores e de diretores, aumentar salários, criar cargos, contratar empresas, proteger servidores envolvidos em maracutaias?
Serra faz a sua hora
No confortável gabinete instalado no segundo andar do Palácio dos Bandeirantes, o governador paulista, José Serra, atende de cinco a seis telefonemas por dia com apelos para que oficialize sua candidatura à sucessão presidencial. Os interlocutores, na grande maioria, são líderes nacionais e regionais do PSDB e do DEM. Alguns do PMDB. A eles, o governador responde como mineiro. Não nega o desejo de se mudar para Brasília, mas afirma que não chegou a hora de agendar a sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E, dependendo de quem esteja do outro lado da linha, prolonga a prosa por alguns minutos, especulando sobre possíveis palanques nos Estados. O diálogo é sempre finalizado com Serra dizendo que há muito a fazer por São Paulo. O governador, no entanto, já está em campanha. E caberá exclusivamente a ele definir a hora em que colocará as bandeiras nas ruas. “O político deve ter o faro e a argúcia para traçar o timing exato de suas ações”, diz o sociólogo Antônio Lavareda, especialista em pesquisas eleitorais.
Faro e argúcia são atributos que não faltam a José Serra. Nos últimos meses, ele tem conseguido ser candidato sem lançar candidatura. “Aonde quer que Serra chegue, todo mundo sabe que ele é candidato”, confirma à ISTOÉ o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). De fato, todos sabem que Serra é candidato, mas, como ele não se declara candidato, não pode ser oficialmente tratado como candidato. Trata-se de uma pensada estratégia da indecisão, que tem rendido bons frutos. Um bom exemplo foi o acordo selado na segunda-feira 15, com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pelo qual a União elevou o nível de endividamento do Estado de São Paulo de R$ 10,2 bilhões para R$ 11,6 bilhões. Desse total, já foram investidos R$ 5 bilhões e os R$ 6,6 bilhões restantes serão contratados até 2010.
Ao firmar o compromisso com Mantega, Serra fez questão de ressaltar sua boa convivência com o presidente Lula, com quem havia acertado os detalhes do empréstimo em audiência em Brasília. “Temos tido uma relação de cooperação com o governo do presidente Lula, em matéria administrativa, muito boa. Não tem tido nenhuma discriminação em relação a São Paulo. Há uma interação positiva”, destacou. Se Serra fosse candidato declarado, certamente seria mais difícil a obtenção do empréstimo ainda em 2009.
A operação limpeza do judiciário
A sede do Superior Tribunal de Justiça em Brasília entrou para a história da cidade como símbolo de obra faraônica. A preços de hoje, custou R$ 409 milhões. Mas há quem queira superar esse recorde. Uma cratera gigante no centro da capital tornou-se grande preocupação para a cúpula do Judiciário. Trata-se da nova sede do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), orçada em R$ 477 milhões. Cada um dos nove andares do prédio terá banheiros coletivos para homens e mulheres com 800 metros quadrados. Pelo projeto,todos os banheiros terão boxes para massagem com 60 metros quadrados. As lojas ocuparão 200 metros quadrados e o bicicletário, 100 metros. Diante de tamanho descalabro, o Conselho Nacional de Justiça embargou a obra, em maio, até que o presidente do TRF1, Jirair Migueriam, apresente um projeto mais econômico. Mas já foram gastos R$ 41,5 milhões na cratera, na base subterrânea, com superfaturamento pago de R$ 2,4 milhões.
A nova sede do TRF1 não é um caso isolado no Poder Judiciário. O CNJ está às voltas com dezenas de abusos pelo Brasil afora, que incluem superfaturamento de obras, contratações irregulares e muito engavetamento de processos. Em sua ação saneadora, o CNJ também tomou providência para aparar os excessos da nova sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Fechou acordo com o presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, depois que o Ministério Público Federal denunciou irregularidades nas obras. Britto concordou em reduzir o custo da armação de concreto, que já consumiu R$ 117 milhões. O valor total é de R$ 369 milhões. O Tribunal desistiu de construir uma “ponte elevatória”, espécie de elevador gigante para empilhar mercadorias também gigantes, um “carrinho de limpeza de fachada” e antenas de tevê a cabo. O TSE promete economizar R$ 18 milhões ao final da obra, mas o CNJ espera que a redução chegue a R$ 30 milhões.
Máquina de multas
Enquanto o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e os ruralistas se engalfinham na discussão acalorada em torno da legislação ambiental e da regularização fundiária da Amazônia, o Ibama trabalha em silêncio e transforma-se numa poderosa máquina de arrecadação. Os números, até agora mantidos a sete chaves pelo governo, são impressionantes: só entre 2007 e 2008, foram aplicadas 58 mil multas em todo o território nacional, somando R$ 6,35 bilhões. O valor é cinco vezes superior ao total de R$ 1,18 bilhão em multas aplicadas nos dois últimos anos do governo Fernando Henrique (2001-2002). Mas é exatamente esse o objetivo do órgão. “Nada mais educativo do que punir o contraventor”, defende o presidente do Ibama, Roberto Messias Franco.
A multiplicação das multas, segundo Franco, é resultado de avanços importantes na legislação e da contratação de mais funcionários. Em 2002, havia cerca de 500 funcionários na área de fiscalização. Esse número triplicou de lá para cá e subiu para 1.950 fiscais. Foi montada também uma megaestrutura de operações, com apoio da Polícia Federal, Abin, Embrapa, Força Nacional de Segurança e Ministério Público (MP).
“Hoje contamos até com satélite que fura nuvem”, comemora Messias, para quem o “papel de polícia administrativa do Ibama ainda é incompreendido”.
O intérprete de Lula
Entre um chope no Bracarense, no Leblon, e o vôlei de praia em Ipanema, o carioca Sérgio Xavier sempre rezou pela cartilha da esquerda. Com parentes perseguidos pela ditadura militar, dedicou-se ao movimento sindical, à construção do PT no Rio de Janeiro e abraçou causas sociais, como a campanha contra a fome liderada por Hebert de Souza, o Betinho. Aos 42 anos, formado em comunicação social, resolveu arriscar uma virada na vida. A oportunidade surgiu num jantar oferecido pelo então presidente do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, a mais de 100 ONGs internacionais, durante a ECO-92, a conferência sobre meio ambiente. Ofereceu-se para traduzir o discurso do então sempre candidato da legenda ao Palácio do Planalto. Lula gostou do resultado e, dois anos depois, levou o intérprete para um encontro com o líder africano Nelson Mandela. Hoje, Xavier é o intérprete oficial da Presidência da República. A rotina carioca do chopevôlei deu lugar a uma agenda repleta de compromissos oficiais e coquetéis com chefes de Estado.
A bordo do Aerolula, Xavier conheceu mais países do que poderia sonhar e passou a conviver com líderes mundiais. Em maio, durante a reunião do G-20 em Londres, seu rosto ganhou as manchetes quando o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, chamou Lula de “o cara”. Coube a ele traduzir a gíria americana. Na semana passada, acompanhou o giro presidencial pela Suíça, Rússia e Casaquistão. Na reunião dos BRICs, além dos encontros pessoais, teve o desafio de fazer traduções simultâneas de cabine, do inglês para o português. Com a relevância da função, vem o assédio. Ao servir de boca e ouvidos do presidente Lula mundo afora, inclusive nas conversas particulares com autoridades estrangeiras, Xavier se tornou o interlocutor mais cobiçado de Brasília por assessores, ministros e jornalistas. Todos tentam arrancar do tradutor algum segredo de Estado. Mas, sempre discreto e fiel aos princípios da profissão, ele apenas sorri e desconversa. Quando pressionado, cala-se.
“Num regime de esquerda, seja em países orientais, seja em ocidentais, o intérprete oficial faz certas censuras, ou poderíamos dizer aparos, durante seu trabalho. Minha maior alegria é ser o que alguns colegas chamam de ‘a voz do Brasil’ ou ‘dublê’, como me qualificou o presidente ao me apresentar num evento nos EUA”, explicou, numa rara entrevista concedida à colega Tereza Braga, da American Translator Association (ATA).
Época
“Um soco no fígado” – Entrevista Sérgio Gabrielli
O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, define as denúncias da oposição contra a empresa como “socos no fígado” que enfraquecem a reputação da maior estatal brasileira. Na quinta-feira passada, a Petrobras recebeu um arranhão em sua reputação – mas o golpe não veio da CPI criada pelo Senado. Veio da Moody’s, conhecida agência internacional de risco. Ele ainda considera a Petrobras uma boa opção de investimento, mas a crescente dependência da empresa em relação ao governo levou a Moody’s a rebaixar uma de suas notas, alegando “risco político”. Em entrevista na véspera, Gabrielli ironizara as críticas à empresa. Disse que elas começaram em sua fundação, em 1954. Afirmou que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ajuda a Petrobras e negou que sindicalistas tenham excessivo poder interno.
O senhor diz que a CPI pode ter consequências muito negativas para a Petrobras. Por quê?
A Petrobras está para se tornar uma das cinco maiores empresas de energia no mundo. Nossa estratégia é que, além de grande, sejamos também a preferida de nossos públicos de interesse: investidores, empregados, governo, clientes, sociedade, fornecedores, o que é complicado, por envolver interesses contraditórios. Nessa situação, um valor muito importante é a percepção que nosso público tem de nós. Fomos considerados, por uma instituição internacional, a quarta empresa em reputação do mundo. A Transparency International nos considera a mais transparente entre as petrolíferas. Ataques sistemáticos prejudicam a imagem da companhia.
Dá a impressão de que vocês querem esconder alguma coisa errada.
Não estamos nos recusando a ir à CPI. Queremos transparência total. Até entramos num embate com a imprensa porque fizemos o blog para ter essa relação direta com o público. Mas uma CPI precisa ter fatos determinados. Muitos dos itens listados já são alvos de investigação, muitas com participação nossa. A Operação Águas Profundas está na Polícia Federal e no Ministério Público. Colaboramos. Até agora, demitimos dois (executivos) e suspendemos três.
E os superfaturamentos…
São problemas que envolvem discussões técnicas com o Tribunal de Contas da União. No caso da refinaria Abreu e Lima (o TCU aponta um superfaturamento de quase R$ 100 milhões na obra de terraplenagem), nossa resposta tem 10 mil páginas. Na questão da Receita Federal (a Petrobras optou por um cálculo que a poupou de recolher R$ 4 bilhões), há uma discussão normal entre um contribuinte e a Receita. Não é preciso uma CPI para discutir isso.
Se tudo é tão fácil de esclarecer, por que o governo quer impedir a CPI?
Não somos parlamentares, somos empresa. O que o Senado está fazendo não é nosso movimento. Fui ao Senado e propus: se vocês querem ir a fundo em qualquer assunto, estamos dispostos a vir aqui quantas vezes forem necessárias, digam o que temos de explicar. Mas uma CPI em que vale tudo cria um chamamento ao linchamento de tudo o que pode acontecer. Numa empresa do tamanho da Petrobras, com 40 mil contratos, que representa mais de 6% das exportações brasileiras, mais de 12% da arrecadação federal, mais de 25% da receita da maior parte dos Estados, com milhares de fornecedores e gerentes, você vai encontrar alguma coisa. E é preciso punir os desvios e melhorar os processos. Então vamos dar solução a esses problemas. É inevitável achar alguma coisa.
Não é de hoje que surgem denúncias contra a Petrobras…
Vêm de 1954 (ano de fundação da empresa). A primeira tentativa de CPI foi no governo JK. Começou como um grande escândalo. A única conclusão foi que os gastos com publicidade estavam acima do que deveriam.
Já naquela época?
(Risos.) Que eu saiba, foi a única CPI instalada.
Denúncias chegaram a afetar a reputação da empresa?
Comparo ao boxe. O soco no fígado pode até não derrubar o lutador, mas vai enfraquecendo. Nos últimos quatro meses, todo grande jornal publicou uma grande denúncia no domingo. Dias depois, um parlamentar diz que isso também será investigado pela CPI. É sistemático.
O senhor disse que o blog daria mais transparência à relação com a imprensa. Mas recebeu muitas críticas…
É um debate, mas os leitores dos jornais apoiam.
O senhor acha realmente que o blog foi uma boa ideia? Por que a empresa voltou atrás?
É excelente. Não tem vazamento. Hoje publicamos as perguntas enviadas pelos jornalistas e nossas respostas à meia-noite. Antes publicávamos às sete da noite. Não voltamos atrás. A informação é da Petrobras, vocês estão reclamando propriedade intelectual da pergunta.
CartaCapital
Mais benefícios a Dantas?
Quatro das mudanças sugeridas pela Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, chefiada pelo ministro Roberto Mangabeira Unger, ao relator da Medida Provisória da Amazônia (458) beneficiam os interesses de Daniel Dantas, o banqueiro do Opportunity, na região, segundo informações publicadas em reportagem do site Congresso em Foco nesta sexta-feira (19).
Entre mudanças sugeridas por Mangabeira Unger, que esteve na folha de pagamentos da Brasil Telecom, então comandada por Dantas, entre 2002 e 2005 por prestação de consultoria jurídica, está a alteração do prazo para a constituição da ocupação de terras na Amazônia Local de 1° de dezembro de 2004 para 1° de fevereiro de 2009 e a exclusão de um parágrafo da MP que estabelecia a retomada de propriedade na região como punição por infrações ambientais.
Confira aqui reportagem do site Congresso em Foco que explica as quatro mudanças sugeridas pela Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos ao relator da MP 458
“As mudanças feitas pelos congressistas coincidem com interesses de grandes grupos do agronegócio instalados na região, como a Agropecuária Santa Bárbara, de propriedade de Daniel Dantas”, explica a reportagem assinada por Lúcio Lambranho e Renata Camargo.
A assessoria de comunicação da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos negou aos repórteres do site Congresso em Foco que as mudanças sugeridas pelo ministro Mangabeira Unger tenham sido feitas para atender aos interesses do banqueiro do Opportunity.
“A SAE ignora esta ou qualquer situação individual, beneficiada ou não por qualquer dispositivo legal existente ou proposto. De qualquer forma, um exame do que foi publicado pela imprensa sobre o assunto mostra que, aparentemente, o que se questiona sobre as terras do mencionado empresário seria alteração no uso da terra previsto no aforamento original”, explica a nota enviada como resposta aos questionamentos do Congresso em Foco. “O Ministro Mangabeira nunca foi representante legal de Daniel Dantas. No passado, prestou serviços profissionais de aconselhamento jurídico à Brasil Telecom. Desde que começou a participar do governo, nunca teve contato, direto ou indireto, com Daniel Dantas ou com qualquer pessoa de seu grupo. Nunca teve acesso a informações a respeito dos interesses de Daniel Dantas ou de seu grupo na Amazônia. Nem antes, nem depois de sua entrada no governo.”
O empresário Gilmar prospera
Assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) fez bem aos negócios de Gilmar Mendes. Desde que passou a ocupar o posto, sua escola, o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) expandiu o número de contratos com órgãos públicos. Todos sem licitação. Em 2007, quando Mendes ainda era só ministro do STF, o IDP faturou 216,3 mil reais com esses convênios. No ano passado, a quantia subiu para 577,8 mil. E no primeiro semestre de 2009, o Tesouro já empenhou 597,8 mil para pagar os cursos oferecidos pelo instituto.
Até a Polícia Federal, que, segundo o ministro, abriga “gângsteres”, virou cliente. Foram 17,4 mil reais para pagar cursos a dois delegados. O estranho é que o contrato, também sem licitação, não tem uma identificação clara no Siafi, o sistema eletrônico que lista as ordens de despesa do governo.
No corpo docente do IDP, como se sabe, figuram, entre outros, procuradores da República, auditores fiscais e ministros dos tribunais superiores, inclusive do STF, como Eros Grau e Carlos Ayres Britto, Nelson Jobim (Defesa), Jorge Hage (Controladoria-Geral da União), Mangabeira Unger (Planejamento Estratégico) e José Antonio Toffoli (Advocacia-Geral da União) são alguns dos representantes do Executivo nos quadros do instituto. Sem ligar para o conflito, o IDP costuma ministrar cursos nestes tribunais e repartições.
O PT de São Paulo e a saída Ciro Gomes
Há dois meses o noticiário da imprensa paulista dava como quase certa a candidatura do deputado Antonio Palocci para o governo do Estado de São Paulo em 2010. Dizia-se que, se inocentado pelo STF no caso da invasão de privacidade do caseiro em Brasília, Palocci seria o favorito de Lula e da maioria das correntes internas do PT. Até aqui o Supremo não se manifestou, mas sumiram as defesas do nome do deputado por parte de lideranças petistas.
Outra opção do partido, a ex-prefeita Marta Suplicy manifestou-se publicamente, afirmando que não é candidata ao governo. Uma terceira hipótese discutida, o senador Aloizio Mercadante, parece se inclinar para a tentativa de reeleição ao senado.
Além destes três, considerados os nomes mais evidentes do PT para a disputa do governo, correm por fora as candidaturas do prefeito de Osasco, Emídio de Souza e do ministro da Educação, Fernando Haddad. O primeiro, ao que tudo indica, apenas para “marcar posição” e conseguir “moeda de troca” para sua corrente, liderada pelo deputado João Paulo. O segundo, para colocar o nome em evidência na mídia visando voos futuros ou uma vaga no parlamento, pois carece de apoio interno significativo dentro do PT.
O que une Palocci, Marta e Mercadante? A certeza de que esta, mais uma vez, é uma eleição para perder. Geraldo Alckmin, bem na frente das pesquisas, ou Gilberto Kassab, – na briga, mas sem declarar – parecem ter muito mais chances de êxito. O PT caminharia para amargar mais uma derrota. Como aconteceu em todas as disputas anteriores ao governo do Estado, com Mercadante, Genoíno, Marta, Zé Dirceu e Suplicy. E Lula, na primeira eleição pós ditadura, em 1982.
Por que uma eleição para perder?
1. Porque o partido ainda não conseguiu ter capilaridade pelo interior do Estado, nem nome forte, nem aliança para vencer o candidato do lado de lá. Que deve ter o PMDB ao lado.
2. Porque o PT não pode partir do principio que do esforço de Lula para transferir votos para Dilma por todo o Brasil vai sobrar tempo para fazer o mesmo em São Paulo, em favor de qualquer um dos candidatos.
3. Porque é em São Paulo que reside a grande força do governador Serra – que em caso de perspectiva de desastre na candidatura presidencial pode ter a opção da tentativa de reeleição
Mercadante, Marta e Palocci conhecem bem este quadro e se colocam diante de uma escolha: trocar uma cadeira certa para o parlamento por uma derrota certa para o governo valeria a pena? Só com muita negociação.
É este cenário que fez crescer nas últimas semanas a articulação pela candidatura do deputado Ciro Gomes, do PSB do Ceará. Unindo dirigentes do PT (o deputado Cândido Vaccarezza), do PDT, do PC do B e do próprio PSB, o movimento pela “importação” de Ciro é real. Aos jornais, ele reafirma que é candidato à presidência, mas que é obrigado a analisar a hipótese paulista em função da seriedade dos proponentes.
Enquanto ele analisa, a bancada do PT na Assembléia Legislativa fechou posição contra a alternativa, ciente de que a ausência de um candidato do partido prejudicaria a eleição de um número maior de deputados. “São Paulo não é o Amapá!”, gritam, em referência direta à trajetória do senador Sarney, hoje bastante na mídia. Mas nem a direção do partido, nem o ainda mais que influente José Dirceu, nem Mercadante descartam a saída Ciro, um cearense, mas, importante lembrar, nascido no interior paulista.
O fato é que o jogo petista está mais que embaralhado. Se a saída Ciro não prosperar, o mais provável é que Marta Suplicy seja pressionada pelo partido para assumir o sacrifício. Por uma simples razão: ela é a candidata petista em melhor posição nas pesquisas. Não teria o suficiente para se eleger, mas o suficiente para disputar um segundo-turno e alavancar a bancada petista para a Assembléia e dar palanque sólido para Dilma em São Paulo. Não eleita, ainda poderia apostar numa vaga num eventual ministério de Dilma.
Aguardemos os próximos lances, as fichas ainda não estão na mesa.
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