VEJA
Espiões fora de controle
Documento obtido por Veja mostra que STF foi espionado. O Palácio do Planalto investiga escuta clandestina na ante-sala de Lula.
Nos últimos anos o Brasil vem demonstrando uma excessiva tolerância diante das violações à liberdade e à privacidade das pessoas em nome do combate à corrupção. A espionagem clandestina, uma praga histórica no país, está deixando de ser uma atividade de bandidos para transformar-se em rotina institucional que não poupa ninguém – nem o presidente da República. Há um ano, uma reportagem de VEJA revelou a atmosfera de preocupação que envolvia os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – alguns deles convictos de que eram alvo de escutas ilegais patrocinadas pela polícia com o propósito de intimidação. Partindo de onde partiu, a simples suspeita, por si só, já seria de uma monumental gravidade. Agora, descobre-se que as desconfianças não eram produto de paranóia. O gabinete do presidente do STF, Gilmar Mendes, foi alvo de um monitoramento criminoso. Um documento reservado obtido com exclusividade por VEJA mostra que espiões, instalados do lado de fora do tribunal, usaram equipamentos para tentar interceptar as conversas do ministro e de seus assessores dentro da mais alta corte de Justiça do país. Que tenham tentado já é um evento sem precedentes e de conseqüências funestas se não for esclarecido – e contido. Caso tenham conseguido realmente ouvir as conversas dos ministros, está-se diante de um grave e inaceitável ataque à democracia.
A localização da escuta foi feita durante uma varredura eletrônica de rotina realizada pela secretaria de segurança do tribunal em 10 de julho passado – um dia depois de o ministro Gilmar Mendes ter concedido o primeiro habeas corpus que liberava da prisão o banqueiro Daniel Dantas, detido dias antes por uma operação da Polícia Federal. Utilizando um aparelho rastreador, os técnicos do STF identificaram uma freqüência de rádio de forte intensidade na sala 321, onde despacha o assessor-chefe da presidência. A sala também é usada por Gilmar Mendes em reuniões com auxiliares quando se ocupa de prolatar sentenças. O aparelho rastreou o local por cerca de duas horas e dez minutos e acusou a presença de sinais eletromagnéticos comumente associados ao uso de espionagem eletrônica. Tudo o que se falava ali estava sendo captado e transmitido para o lado de fora do STF. Não foi possível identificar a origem exata da intromissão clandestina, mas suspeita-se, pela natureza da freqüência medida, que os espiões estivessem com seus equipamentos em um estacionamento próximo. "O sinal captado é altamente suspeito, e vinha de fora do STF", descreve o relatório, assinado por Ailton Carvalho de Queiroz, chefe da seção de operações especiais da secretaria de segurança do tribunal. E o documento conclui: "O que nos leva a suspeitar de um possível monitoramento, que pode ter ocorrido nas proximidades do edifício-sede".
Com sabor de vingança
O ministro da Justiça, Tarso Genro, tem uma tremenda capacidade de se envolver em barulhentas e inúteis polêmicas. A última delas, na semana passada, conseguiu interromper o descanso de dezenas de militares, que trocaram o pijama por terno e gravata e se reuniram para protestar contra a idéia do ministro de retomar a discussão sobre a possibilidade de punição para os torturadores do regime militar. Reunidos no Rio de Janeiro, os militares classificaram a iniciativa como extemporânea, imoral e fora de propósito. "Foi um desserviço prestado ao Brasil", diz uma nota conjunta dos aposentados. Se o ministro estivesse falando em nome do governo, a discussão teria ingredientes suficientes para desembocar numa bela crise. Tarso, porém, já foi desautorizado pelo presidente Lula, criticado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, e não contou sequer com o apoio formal de colegas do partido, inclusive de alguns que conheceram de perto as masmorras da repressão.
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