Rodolfo Torres e Mário Coelho
As assinaturas de deputados num panfleto produzido pelo Ministério da Cultura poderão fazer com que 336 parlamentares (65,49% da Câmara) – incluindo o presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP) – tenham de se explicar na Justiça por campanha eleitoral antecipada e improbidade administrativa. (Confira a lista, dividida por estados)
O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), avalia que o episódio é grave e promete encaminhar denúncia ao Ministério Público Federal (MPF). “É preciso respeitar a lei. Esse é um folhetim criminoso”, disparou Demóstenes.
O senador goiano participou ontem de uma audiência pública com o ministro da Cultura, Juca Ferreira, que foi ao Senado defender o projeto do vale-cultura (benefício de R$ 50 reais mensais para que trabalhadores de baixa renda possam adquirir produtos culturais). A matéria já foi aprovada na Câmara e agora tramita no Senado.
Na ocasião, foi distribuído o panfleto “Vota Cultura”, com o seguinte recado: “Apoie o parlamentar do seu estado que vota pela cultura”. Para Demóstenes, o fato caracteriza uso indevido de dinheiro público e antecipação da campanha do próximo ano.
Ele lembrou que, durante a audiência, o ministro da Cultura negou que houvesse dinheiro público na confecção do material. Depois, ao ser pressionado pelos parlamentares, supôs que provavelmente seria obra da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cultura.
Mais tarde, porém, o ministro telefonou para o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). Ao peemedebista, Ferreira revelou que o panfleto realmente havia sido confeccionado pelo ministério.
O tema causou polêmica no plenário do Senado. Parlamentares da base e da oposição criticaram o material. Até o líder do PT na Casa, Aloizio Mercadante (SP), afirmou que “o panfleto é totalmente descabido”. “Cabe uma ação legal para apurar as responsabilidades e tomar as devidas providências”, afirmou.
Para outros senadores, além de ser propaganda antecipada, a confecção do material coloca uma pressão indevida nos parlamentares. “Essa é uma ameaça àqueles que não votarem favoravelmente no projeto”, atacou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
Investigação
Demóstenes, ao pedir a investigação de todos os deputados, disse que é preciso saber se “eles entraram de gaiato” ou se tiveram parte na confecção do material. Se o MPF conseguir provar que os parlamentares ajudaram a fazer o panfleto, eles podem ser indiciados por improbidade administrativa e propaganda eleitoral antecipada.
Caso não fique provada a participação ativa deles, mesmo assim os deputados podem ser punidos pela propaganda antecipada, sendo condenados a pagamento de multa.
O Congresso em Foco procurou pelo menos dez parlamentares que tiveram seus nomes impressos. Todos eles desconheciam o material. Preocupados com a possibilidade de serem condenados por propaganda antecipada, destacaram que somente após tomar conhecimento do teor do panfleto é que se manifestariam.
Sobre a lista
A lista suprapartidária de deputados tem algumas curiosidades. Dois parlamentares já falecidos aparecem como apoiadores da cultura: Adão Pretto (PT-RS) e Ricardo Izar (PTB-SP).
O material ainda mostra que deputados que venceram pleitos municipais no ano passado e, por consequência, renunciaram ao mandato parlamentar, ainda figuram entre os que apoiam a proposta.
São eles: Carlito Merss (PT), prefeito de Joinville (SC); Silvinho Peccioli (DEM), prefeito de Santana de Parnaíba (SP); e Tarcisio Zimmermann (PT), prefeito de Novo Hamburgo (RS).
O ex-deputado Frank Aguiar (PTB), vice-prefeito de São Bernardo do Campo (SP), também está na relação. Até o atual ministro da Previdência e deputado licenciado, José Pimentel (PT-CE), está na lista.