Guillermo Rivera
Com um atraso de 450 dias, a CPI dos Grupos de Extermínio no Nordeste concluiu ontem seus trabalhos, com a aprovação do relatório do deputado Luiz Couto (PT-PB). O petista apontou o envolvimento de políticos, policiais, promotores, juízes e desembargadores com o crime organizado na região. O texto será enviado agora ao presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP) que, por sua vez, deverá encaminhá-lo aos governos estaduais e ao Ministério Público, para que tomem as devidas providências.
A CPI concluiu que, apenas entre 2001 e 2002, 588 pessoas foram vítimas de ações de grupos de extermínio em todo o Nordeste. As vítimas, em sua maioria, são jovens entre 15 e 25 anos, negros e pobres. Na época, pelo menos outras 600 apareciam como marcadas para morrer.
O relatório final estava pronto para ser votado desde agosto do ano passado, mas, por pressões políticas, teve sua análise adiada por 15 meses. Ainda assim, só foi aprovado depois que o relator acatou o pedido do deputado José Carlos Araújo (PL-BA) para a retirada de quatro nomes de autoridades baianas citadas no texto.
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Foram excluídos do documento os nomes do senador César Borges (PFL), ex-governador da Bahia, da ex-secretária estadual de Segurança Pública Kátia Alves e dos deputados estaduais Pedro Alcântara (PL) e Rogério Andrade (PFL). "O relatório avalia que essas pessoas podem estar envolvidas em algum ato ilícito, mas não existe nenhuma confirmação disso", justificou Araújo.
Providências
A CPI decidiu relacionar o nome de cerca de 250 suspeitos, entre delegados, policiais, vereadores, informantes, prefeitos, promotores, presidiários e agentes penitenciários. Há 48 recomendações de indiciamento ao Ministério Público. Os parlamentares também sugerem 50 ações de combate aos grupos de extermínio.
Uma das sugestões está no fim da prescrição da pena para o crime de homicídio doloso. Outra mudança é a tipificação do crime de extermínio no Código Penal, com agravante no caso de envolvimento de policiais ou servidores públicos. O castigo maior tem uma explicação: 80% dos crimes promovidos pelos grupos de extermínio no Nordeste têm participação de policiais ou ex-policiais.
O texto final também recomenda a abertura de inquéritos já instaurados e abandonados, o cumprimento de mandados de prisão de condenados foragidos e a federalização dos crimes de extermínio. A comissão também solicita a criação de uma força-tarefa com um delegado especial para investigar crimes atribuídos aos grupos de extermínio que atuam nas divisas dos estados.
Boicote interno
Por causa do desinteresse dos integrantes da comissão em votar o relatório final, por pouco as conclusões da CPI não foram parar no arquivo. Em outubro de 2004, Luiz Couto já denunciava ao Congresso em Foco o boicote à votação do seu parecer (leia mais).
O relator fez 11 pedidos de prorrogação justamente para evitar que a CPI fosse arquivada. A comissão foi criada em 24 de setembro de 2003. Ao todo, foram concedidos cerca de 610 dias a mais de prazo para a comissão concluir seus trabalhos. “Se nós não votássemos este relatório nesta legislatura, ele ficaria arquivado, mas não poderia ser utilizado na próxima. Todo o trabalho que nós fizemos seria prejudicado”, observa. “Ela foi esvaziada desde o início. Nós tivemos um problema para sua instalação. Primeiro houve uma decisão de não instalar, porque o fato não era determinado”, completa.
Luiz Couto conta que recorreu e, com o apoio da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) e de organizações de direitos humanos, conseguiu instalar a CPI. Mas os problemas não pararam por aí. “Uma vez instalada a comissão, as indicações feitas pelas lideranças eram, em sua maioria, de deputados que não tinham nada a ver com a realidade do Nordeste, e que não compareciam às reuniões”, afirma.
Esses parlamentares, segundo ele, só apareciam quando eram feitos requerimentos para convocar autoridades denunciadas em seus respectivos estados. “Algumas pessoas que foram acusadas como mandantes ou protetores têm vinculações com parlamentares desta Casa”, acusa o relator.
O presidente da comissão, Bosco Costa (PSDB-SE), concorda que houve um esvaziamento da CPI “No percurso da CPI, houve algumas obstruções por parte de alguns partidos, que não tinham interesse – e não me pergunte por que, que eu não sei – em ouvir alguns depoimentos”, diz o tucano.
O relatório final da comissão é resultado de nove reuniões administrativas, 21 audiências públicas e seis reservadas. A CPI ouviu, ao todo, 81 pessoas, entre convidados e depoentes. Também foram realizadas diligências em quatro estados: Alagoas, Bahia, Paraíba, Pernambuco e Sergipe.
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