Um grupo de juízes protocolou nesta quinta-feira (27) no Conselho de Ética do Senado uma representação contra o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), por quebra de decoro parlamentar. A iniciativa é uma reação às declarações feitas por Renan na última segunda-feira (24), quando o peemedebista reclamou da ação autorizada pelo juiz da 10ª Vara Federal de Brasília Vallisney de Souza Oliveira, que autorizou a prisão de policiais legislativos no âmbito da Operação Métis – investigação sobre esquema que, segundo o Ministério Público, consistiu em uso de dinheiro público pela Polícia do Senado para atrapalhar a Operação Lava Jato.
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“Um juizeco de primeira instância não pode, a qualquer momento, atentar contra um poder. É lamentável que isso aconteça em um espetáculo inusitado, que nem a ditadura militar fez, com a participação do ministro do governo federal que não tem se portado como um ministro de Estado. No máximo, tem se portado como um ministro circunstancial de governo, chefete de polícia”, enfatizou Renan, sem citar Vallisney nominalmente e estendendo as críticas ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes.
As declarações de Renan revoltaram as entidades da magistratura brasileira e tiveram como resposta, entre outras, uma reprimenda pública da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, para quem as reclamações do senador também a ofendem. Mas nem as diversas reações de contrariedade pareceram demover Renan de sua ofensiva contra o Judiciário – ele que responde a 11 inquéritos no STF, a maioria por suspeita de envolvimento no petrolão.
Aém disso, o peemedebista reforçou a fala contra o juiz Vallisney, em que também classificou como “fascistas” os métodos utilizados pela Polícia Federal na condução das investigações da Lava Jato. “Nesta fase da experiência democrática, não mais se toleram mecanismos intimidadores”, disse Renan.
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Ao protocolar a representação contra Renan, o juiz Luiz Gomes da Rocha Neto, da 1ª Vara de Execução Penal de Pernambuco, explicou os propósitos da pedido. Embora tenha dito que o objetivo é o exame sobre a fala do senador, o magistrado requer a arguição sobre quebra de decoro parlamentar – que, como punição máxima, leva à perda de mandato e dos direitos políticos por oito anos, e consequente enquadramento na Lei da Ficha Limpa.
“Nosso objetivo aqui, o foco, é a adjetivação que foi formulada [por Renan]. Ofende, diminui, agride desnecessariamente. Da mesma forma que os senhores senadores, o Senado, devem respeito ao Judiciário, o Judiciário também deve respeito ao Senado e aos senhores senadores. O que esperamos é que o Conselho [de Ética] aprecie o nosso pedido, examine-o e dê todas as oportunidades para que vossa excelência [Renan] tem para justificar o ato dele. Até porque a esta altura dos acontecimentos não estamos tratando de um só fato, mas de uma fala, de uma adjetivação, e depois de uma segunda entrevista, de uma reafirmação do que teria sido praticado”, ponderou Luiz acompanhado de quatro colegas de toga.
O magistrado disse ainda que a ida deles ao Senado nada tem a ver com a decisão do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, que suspendeu os efeitos da Operação Métis – a da prisão dos policiais legislativos – e a remissão dos autos do processo para a instância máxima da Justiça, o próprio Supremo, em razão do envolvimento de senadores (foro privilegiado) na investigação. A decisão de Teori foi festejada por Renan, que parabenizou o ministro por meio de nota. “Essa matéria está toda devolvida ao Judiciário. Há juízes competentes para resolver. Seria até uma irresponsabilidade nossa tocar nesse viés, nesse assunto”, acrescentou.
A partir de agora, depois do protocolo na Secretaria-Geral da Mesa, a demanda dos juízes segue para a Corregedoria da Casa, onde será analisada pelo senador titular, Sérgio Petecão (PSD-AC). O exame preliminar serve para a declaração de admissão da denúncia, que pode não ser anunciada. Depois dessa etapa regimental, e em caso de recepção do pedido, a representação segue para outra análise prévia já no Conselho de Ética, que dará início aos trabalhos, com escolha de relator, caso o colegiado considere haver fundamento legal na acusação.