Eduardo Militão
O líder do PR na Câmara, Sandro Mabel (GO), tem atualmente 25 funcionários em seu gabinete parlamentar, que dividem uma verba de gabinete de R$ 60 mil. No dia 15 de outubro do ano passado, ele, porém, declarou à Polícia Legislativa da Câmara um curioso desconhecimento do funcionamento de seu próprio gabinete.
No depoimento, ao qual o Congresso em Foco teve acesso, ele declarou que não conhecia o paradeiro funcional de cinco funcionários, justamente aqueles que acabaram de alguma forma envolvidos no golpe da creche, o esquema de desvio de recursos públicos que já rendeu um prejuízo de R$ 2 milhões à Câmara. Quatro tinham sido contratados, mas ele negou que fossem suas as assinaturas nos atos de nomeação. Disse que desconhecia os quatro colaboradores.
O quinto havia sido exonerado. E era ninguém menos que Francisco José Feijão, o Franzé, apontado como o chefe da quadrilha que aplicou o golpe da creche. O problema é que Franzé era ninguém menos que o motorista particular de Mabel. Mais do que isso, Mabel chegou a ajudá-lo a comprar um carro, um automóvel que eventualmente era usado pelo próprio deputado. Quando Mabel prestou depoimento à Polícia Legislativa da Câmara, Franzé estava exonerado há um mês e meio. E o deputado disse ignorar a saída dele.
O líder do PR também ajudava, durante um ano, a chefe de gabinete Maria Solange Lima a bancar a prestação de R$ 1.970 de um outro automóvel, segundo depoimento da funcionária à polícia.
Os depoimentos de Mabel e de Solange foram prestados à Polícia em um dos 20 inquéritos que investigam o golpe da creche, noticiado pelo Congresso em Foco desde novembro. O deputado e a chefe de gabinete não estão indiciados, ao contrário de outras 67 pessoas. O golpe consistia em incluir servidores fantasmas e laranjas na folha de pagamento e repartir os salários deles entre uma quadrilha, que, segundo as investigações, é liderada por Franzé e por sua mulher, Abigail Pereira.
O líder do PR na Câmara só reconheceu uma assinatura como sua. As outras eram até parecidas: “Afirma, entretanto, que as demais assinaturas se assemelham à sua, mas não são de sua lavra”, diz o depoimento. Na mesma data, a polícia colheu três páginas de autógrafos de Mabel para serem periciados pelo Instituto Nacional de Criminalística.
“Foi embora”
Mabel disse que, até o dia 14 de outubro, Franzé “estava trabalhando normalmente”. Mas a portaria 7696/2009, de 1º de setembro de 2009, exonerou o motorista do gabinete. Mabel não sabia.
“QUE o FRANCISCO estava trabalhando normalmente com o depoente até a data de ontem, sendo que [sic] o que depoente não tinha ciência de que FRANCISCO estava exonerado desde o dia 31/08/2009”
O deputado afirmou que estava em viagem ao exterior desde 30 de setembro. Mas, no dia 14, afirmou ter conversado com Franzé sobre o golpe. O ex-motorista teria admitido a contratação dos funcionários, mas apenas em benefício de terceiros.
“QUE conversou com FRANCISCO na data de ontem este lhe disse que havia feito com o intuito de ajudar pessoas e negou ter ficado com qualquer parcela do dinheiro desviado irregularmente”
O líder do PR disse nunca ter percebido aumento no patrimônio de Franzé. Afirmou que ele ganha R$ 2 mil por mês e que Mabel ajudou o motorista a comprar seu carro, “em razão de que [sic] este veículo era utilizado para transportar eventualmente o próprio depoente”.
As verdadeiras assinaturas de Mabel
Deputado forneceu autógrafos para serem periciados pelos policiais. Clique para ver
Modo de trabalho
Mabel contou aos policiais que as contratações de funcionários são feitas sempre pela chefe de gabinete, Maria Solange, por meio da assinatura do deputado nos documentos. Ele disse Franzé nunca teve funções administrativas. Mabel disse crer que não existe “qualquer possibilidade” de Solange ter participado do golpe da creche.
Em depoimento prestado em 11 de dezembro, Solange disse crer que a assinatura de Mabel foi falsificada pelo ex-motorista. Para ela, Franzé usava a conta dos laranjas para pagar despesas. “Aduziu que FRANZÉ estava utilizando a conta corrente de uma pessoa que foi contratada irregularmente para o gabinete, provavelmente com o uso de assinatura falsificada do deputado para o pagamento de diversas contas.”
Onze perguntas
Franzé e Abigail não prestaram nenhuma declaração à polícia quando foram intimados a esclarecer os fatos. Procurados várias vezes pelo Congresso em Foco, eles não concederam entrevista. Solange afirmou ao site que só poderia falar na terça-feira (2).
A reportagem enviou por escrito ao deputado Sandro Mabel 11 perguntas sobre a maneira como ele controla o trabalho de seus funcionários de gabinete. Por meio de sua assessoria, ele disse: “Todas as respostas a estas perguntas estão no inquérito, inclusive o pedido grafotécnico de assinaturas, que explicam como os funcionários foram contratados”.
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