Edson Sardinha
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Os aliados que se cuidem. Depois das eleições, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai cobrar pessoalmente maior empenho e fidelidade dos partidos que compõem a base governista no Congresso, alerta um dos vice-líderes do governo na Câmara, o deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF). Apostando na vitória dos partidos governistas nas eleições municipais, o petista critica a falta de compromisso dos líderes aliados com o governo. “Não adianta ser da base para receber as benesses e adotar uma posição de conflito quando as ações do governo não lhes são convenientes. Essa não é uma posição correta”, diz. Lula estaria descontente com a conivência das lideranças partidárias com os parlamentares que não acompanham a orientação da bancada. Leia também Nesta entrevista ao Congresso em Foco, Sigmaringa cobra dos demais partidos governistas punição para os deputados que não votarem com o governo. “Se o parlamentar não se submete a uma decisão majoritária da bancada, ele tem de ser punido. Esse critério deveria ser adotado por todos os partidos”, considera. O vice-líder do governo aconselha o presidente Lula, de quem é amigo íntimo há 25 anos, a conversar mais com os aliados e a participar diretamente das negociações com o Congresso. “Ele talvez não esteja encontrando o momento de fazer isso. O presidente tem mais experiência política do que eu, sabe o que precisa fazer e, certamente, o fará. Isso aqui é o Parlamento. É preciso conversar, buscar entendimento”, avalia o deputado. Há nove anos no PT, depois de passar pelo PMDB e pelo PSDB, Sigmaringa considera que “o vício arraigado do discurso oposicionista”, ainda mantido por parte dos petistas, prejudica o diálogo do Planalto com os adversários no Congresso. “O governo não tem de brigar com a oposição. A oposição é que tem de brigar com o governo. Se ela tiver razão, é preciso procurar atendê-la. Mas, às vezes, isso não acontece”, acredita. Defensor da política econômica do ministro Antonio Palocci, o deputado enaltece os indicadores econômicos do governo e diz que o país vai dispensar, em breve, os empréstimos concedidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
Sigmaringa Seixas – Há divergências naturais em determinadas questões, mesmo nos partidos da base aliada. A dificuldade também existe porque a oposição está fazendo obstrução por ser este um ano eleitoral. Ela não quer que o governo aprove as propostas de seu interesse encaminhadas para cá. Isso é compreensível e faz parte do jogo político. Apesar disso, vamos tentar votar na próxima semana. Não será simples, porque a eleição está muito próxima. No último esforço concentrado, conseguimos reunir um número significativo, mas não tão expressivo a ponto de não precisar de entendimento com a oposição para aprovar as proposições. A tendência é o próximo esforço também fracassar? Estamos a menos de um mês das eleições, vamos enfrentar a obstrução da oposição e temos onze medidas provisórias trancando a pauta. A principal, que não conseguimos votar no último esforço, é a mais polêmica. É aquela que diz respeito a modificações no processo de desapropriação de terras e dos títulos da dívida agrária. Na ocasião, não conseguimos um acordo com a base ruralista, que está tanto na oposição como na base aliada. Esse é um exemplo típico de matéria que divide a base aliada. Mas é muito pouco tempo para se chegar a um entendimento e aprovar essa proposição. Se votarmos a primeira, votaremos as outras. "Estamos a menos de um mês das eleições, vamos enfrentar a obstrução da oposição e temos onze Há algum entendimento em torno da nova Lei de Falências? Já estamos num processo de discussão. O problema é que não adianta sentar para discutir a votação de um projeto quando temos onze medidas provisórias na pauta. No Senado, vamos tentar aprovar o projeto das PPPs (Parcerias Público-Privadas), que é importante para a política de investimento do governo. Nós queremos investir fortemente em infra-estrutura, mas não podemos investir só com recursos públicos. Precisamos dos recursos privados proporcionados por essas parcerias. Acho que é uma questão mais política e menos técnica. "Nós queremos investir fortemente em infra-estrutura, A oposição exige mudanças no projeto. É natural que a oposição queira modificar o projeto, mas ela tem de ter consciência de que ele é importante para o país. O governo pretende recuperar mais de sete mil quilômetros de estradas para que a produção possa escoar, já que não temos um sistema ferroviário eficiente. Além disso, vamos investir num programa de revitalização das ferrovias, que já foi apresentado. A recuperação das rodovias não é importante só para a economia, mas para a segurança das pessoas que viajam. O número de mortes nas estradas brasileiras é assustador. Outro projeto prioritário para o governo na Câmara é o que redefine o papel das agências reguladoras. Ele também terá a discussão adiada? É sempre mais difícil votar num ano eleitoral. Primeiro, porque a oposição obstrui a votação por razões políticas. Em segundo lugar, porque a própria base aliada, envolvida em campanha, não tem comparecido. Apesar disso, o governo está bem, a economia respondeu e estamos ultrapassando as expectativas mais otimistas. Isso vai se refletir nas eleições de outubro? Não há a menor dúvida de que isso ajuda. Estamos vendo a performance dos nossos candidatos. No início do ano, a oposição adotou como tática a crítica da política nacional, a federalização do debate. Hoje eles estão fugindo disso. Aliás, não sei se teriam sucesso mesmo se a economia não apresentasse os índices que exibe hoje. O PT será o partido da base que mais ganhará com isso? Acho que sim. É o maior partido e tem o maior número de candidatos. Vamos perder em alguns lugares, o que é natural, mas vamos aumentar significativamente o número de prefeitos e vereadores. Os demais partidos da base também vão sair ganhando. O resultado das urnas vai fortalecer a base aliada no Congresso? Isso aí nós temos de conversar seriamente. Tem de haver um entendimento político mais forte com os partidos da base. Volta e meia, encontramos dificuldade na falta de compreensão do papel que um deputado da base deve ter no Congresso Nacional. Os líderes dos partidos que integram a base têm uma responsabilidade muito grande nisso. Tem de haver uma participação maior do governo federal e do próprio presidente da República nesses entendimentos. Temos de saber quem é base e quem não é base. Não adianta ser base para receber as benesses e adotar uma posição de conflito quando as ações do governo não lhes são convenientes. Essa não é uma posição correta. “Não adianta ser base para receber as benesses Em que caso isso ocorre, por exemplo? Não quero citar exemplos, porque vou me lembrar de uns e esquecer-me de outros. O que está faltando aos partidos aliados, então? Tem de haver uma compreensão maior do que vem a ser um partido da base governista. É preciso fechar mais questões na discussão dos projetos? Claro. O PT faz isso. E quem não cumpre a decisão é punido. O PT expulsou três deputados que votaram contra uma questão fechada (reforma da Previdência). O processo de discussão interna é necessário e importante. Ninguém faz isso com tanta constância quanto o PT. Mas, depois que a bancada decide majoritariamente o caminho a seguir, os vencidos têm de apoiar. Eu mesmo, às vezes, tenho dúvidas em relação a determinados temas. Entretanto, se sou vencido internamente, tenho de acompanhar, a não ser que seja uma questão de consciência, como aborto, por exemplo. Se o parlamentar não se submete a uma decisão majoritária da bancada, ele tem de ser punido. Esse critério deveria ser adotado por todos os partidos. “Se o parlamentar não se submete a uma decisão majoritária da bancada, ele tem de ser punido. Está faltando pulso mais forte aos líderes dos partidos aliados? Está faltando um compromisso maior. Não estou atribuindo a responsabilidade apenas aos partidos aliados. O governo também tem responsabilidade nisso. Ele deveria ser mais exigente. E vai ser. Quando? Espera que você vai ver. Após as eleições? Não dá para discutir essa questão agora, em pleno processo eleitoral. Mas, depois, será preciso. A oposição feita pelo PFL e o PSDB difere daquela feita pelo PT? O PT fazia oposição de forma mais aguerrida e competente – não estou comparando a qualidade dos parlamentares –, porque tinha muito mais experiência. O PFL, por sempre ter se mantido no poder, tem uma experiência maior de governo. O PT está aprendendo a governar. Por outro lado, o PFL também precisa aprender a ser oposição. Posso afirmar que isso não assusta o presidente Lula. Ele tem capacidade para entender esse papel da oposição e tentar dialogar em busca de apoio a questões que são de interesse do país. Àquilo que for de interesse só do governo cabe a ele (PFL) fazer oposição. O que fazer para melhorar a relação do governo com o Congresso? O próprio presidente deve participar mais. Claro que ele não vai participar de qualquer entendimento, mas ele deve conversar mais com o Congresso. O senhor levou essa sugestão a ele? Não preciso levar a sugestão porque o presidente sabe dessa necessidade. Ele talvez não esteja encontrando o momento de fazer isso. O presidente tem mais experiência política do que eu, sabe o que precisa fazer e, certamente, o fará. Isso aqui é o Parlamento. É preciso conversar, buscar entendimento. Nós, do PT, temos um pecado: o vício da oposição. Às vezes, alguns companheiros não percebem que nós estamos no governo. O governo não é oposição. O governo não tem de brigar com a oposição. A oposição é que tem de brigar com o governo. Se ela tiver razão, é preciso procurar até atendê-la. Mas, às vezes, isso não acontece. A gente vê na conduta de alguns parlamentares o vício arraigado do discurso oposicionista. A gente briga, então, com a gente mesmo. Qual o problema do governo hoje? Não é econômico. Tem sido político. “O governo não é oposição. O governo não tem O problema está na articulação do governo com o Congresso? Não digo isso. Vamos deixar passar a eleição, ver que mudanças teremos no cenário municipal e como os partidos terão se saído. Vamos analisar quem saiu fortalecido e quem se enfraqueceu. A partir daí, teremos de fazer uma rearrumação do quadro político. Não adianta aprofundar um entendimento político agora se não sabemos qual será o resultado das eleições. “Vamos analisar (após as eleições) quem saiu fortalecido e quem se enfraqueceu. A partir daí, teremos de fazer uma rearrumação do quadro político” O resultado das urnas pode mudar, de alguma forma, a condução da política econômica? Acredito que não. O governo está fazendo certo. Pegamos um país com crescimento real da inflação e o contivemos. Com juros de 27%, e os baixamos para 16%. Fizemos de forma gradual, com firmeza e segurança. Batemos recordes de exportação, tivemos superávit na balança comercial, coisa que há tempos não ocorria. Que crítica se pode fazer à economia se ela está dando certo? Mas dentro do próprio PT há críticas em relação à política social do governo? Temos muitos programas sociais em curso. Evidentemente que não vamos adotar o discurso da ditadura de que é preciso fazer o bolo crescer para depois dividi-lo. Nada disso. O problema é que só poderemos investir se tivermos recurso para isso. Para ter recurso, é preciso que a economia responda a isso. Tivemos no primeiro semestre deste ano a geração de mais de um milhão de empregos e o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). A nossa relação com o FMI (Fundo Monetário Internacional) mudou significativamente. Um diretor do FMI me contou que, quando Lula venceu a eleição, eles davam como certo um calote. Eles já se preparavam para isso. Nós os surpreendemos, e sem uma posição subserviente. Estamos negociando hoje de uma forma muito mais favorável do que o governo anterior e nos preparando para não precisar mais do FMI. Isso vai ocorrer em um tempo mais curto do que se possa imaginar. “Estamos negociando hoje de uma forma muito mais favorável do que o governo anterior e nos preparando Mas a proposta orçamentária para 2005 não dá grandes esperanças em termos de investimento. É um orçamento realista. O governo o preparou com seriedade. Antes, apresentava-se uma proposta que não podia ser executada. Não vamos fazer isso. Preferimos agir assim a criar uma expectativa que não será alcançada. É mais honesto e sincero com a sociedade. |
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