Mário Coelho
“Isso vai pegar os cachorros grandes? Vai pegar o Renan Calheiros, e aquele garoto, o Lobão, o ministro de Minas e Energia?”. A provocação do apresentador e músico Lobão deu o tom do programa MTV Debate desta semana, que girou em torno de uma pergunta que não quer calar: “o ficha limpa vai acabar em pizza?”
“Renan Calheiros vai ser candidato ao Senado por Alagoas”, respondeu o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), um dos participantes do debate. “Ah, então não tem mais ficha limpa, acabou”, debochou Lobão.
Coube ao deputado do Psol ponderar que a proposta, aprovada há duas semanas pelo Congresso, não vai resolver todos os males da política brasileira, mas vai despertar no eleitor uma maior conscientização e inibir a ação de candidatos com problemas na Justiça.
“Calma, Lobão, você é um extremado. É um pequeno passo, não é reforma política. É como o telespectador disse: ‘levanta aí a bundinha da cadeira e corre atrás’. O ficha limpa não substitui o voto consciente do eleitor, não tira a responsabilidade dos partidos de fazer uma chapa de candidatos decentes. A maioria dos pilantras – a maioria não está condenada, tem muito pilantra oculto por aí – vai disputar a eleição, mas eles estão incomodados”, retrucou Chico.
O deputado prosseguiu: “Acho que a iniciativa popular é fantástica, mas não vamos criar ilusão. Meu querido amigo senador Pedro Simon disse ‘agora o país não será mais conhecido como o Brasil da impunidade’. Menos, menos, menos”. “Pode ser uma porcaria, mas pelo menos pega alguém”, disse Lobão, ao ser informado de que o ficha limpa vai impedir a candidatura de quem renunciou ao mandato para escapar do processo de cassação.
O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), que relatou o projeto no Senado, o advogado Irapuan Soares, a representante da Transparência Brasil Marina Atoii, Luciano Santos, representando o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), e Bernardo Ainbinder, representante da Nova Organização Voluntária Estudantil (Nove), também participaram do debate, exibido na noite da última terça-feira.
Veja o programa na íntegra
Um dos pontos mais debatidos foi a questão de que somente o trânsito em julgado determina que uma pessoa é culpada. Para Irapuan Soares, o projeto contraria a Constituição ao prever que políticos com condenação por órgãos colegiados não podem se candidatar. O argumento foi rebatido por Chico Alencar. “A Lei das Inelegibilidades, que o Congresso Nacional ampliou, diz o que a Constituição já indica: você ser candidato a representar a população pressupõe certos requisitos. Não é assim, qualquer um pode em qualquer ocasião. Agora, não substitui o partido, que às vezes dá legenda a qualquer um, e o eleitor, na outra ponta, que tem que votar consciente”, afirmou.
O deputado Índio da Costa (DEM-RJ), que foi um dos relatores da matéria na Câmara, ao participar ao vivo do programa, disse que a aprovação do ficha limpa prevê uma série de mudanças na legislação eleitoral. Lembrou que impedir a candidatura de políticos condenados por crimes ambientais foi uma briga dura. E ponderou que o projeto não é a salvação de todos os problemas, que só serão resolvidos com a reforma política. “É um passo num momento importante do Brasil, num momento em que a moralidade está em discussão no país”, disse.
O senador Demóstenes Torres reforçou que o ficha limpa pode retroagir e que a lei não condena ninguém, não estabelecendo pena. “Aquele que não for pego no registro, pode ser cassado depois. Olha só o que entrou: corrupção eleitoral, caixa dois”, citou. Para ele, haverá uma grande renovação na política em até cinco anos. “O ficha limpa acaba com discussão da potencialidade do crime. O que vale é a gravidade do fato”, disse.