O líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), dava entrevista nas dependências do Senado quando foi interpelado por motoristas de transporte por aplicativo, como Uber e Cabify, insatisfeitos com o Projeto de Lei da Câmara 28/2017, que vai a voto em plenário nesta terça-feira (31). Assunto que divide senadores, a proposição já foi aprovada pelo deputados e, entre outras disposições, pretende regulamentar a atividade, vista como concorrência desleal por taxistas.
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Autor do texto aprovado na Câmara, Zarattini fala justamente sobre a aprovação da matéria na Câmara quando foi interrompido. “O fato é o seguinte: esse projeto foi discutido durante e um ano e meio na Câmara. Foram ouvidos todos os lados, tanto os taxistas como a empresa Uber. E se chegou a um projeto que foi resultado de votações. Portanto, de maioria na Câmara. O que veio para cá [Senado] foi amplamente discutido e votado”, ponderava o petista, defendendo que o presidente Michel Temer, “que tem uma rejeição popular brutal”, sancione o que Câmara e Senado decidirem, com base no texto da primeira votação.
“O projeto do Uber foi derrotado. A gente tem que se democrático! Aqui…”, acrescentava o deputado, quando já discutia com representantes do setor.
“Então! Ser democrático é dar a chance pra gente defender, aqui, no modelo de regulamentação…”, questionou um dos motoristas de aplicativo.
“Vocês perderam na Câmara! Não foi votado lá? Recuperem a votação, vocês perderam. E vão perder aqui também”, vaticinou Zarattini, arriscando-se à previsão do resultado no Senado.
Emendas
Senadores favoráveis às mudanças nos serviços de transporte por aplicativo, muitos deles alinhados à categoria dos taxistas, defendem o projeto aprovado na Câmara. O fato é que, se o plenário aprovar o substitutivo, a matéria tem que retornar para nova jornada de debates e votações na Câmara, retardando a decisão final. Por outro lado, na hipótese de que o projeto original seja aprovado, o texto segue para sanção presidencial.
Depois de reunião de líderes ainda em curso, o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), declarou que há a possibilidade de apresentação de emendas para excluir do projeto, por exemplo, dispositivos como o que determina obrigatoriedade de placa vermelha e o que obrigado o condutor a ser dono do veículo utilizado no serviço por aplicativo. Ambas foram aprovadas pelos deputados.
“Outras emendas serão aprovadas, mas não há uma decisão ainda em relação ao mérito dessas emendas. O plenário é que vai decidir sobre elas. O consenso que foi criado é em torno desses dois pontos”, resumiu o tucano, assegurando que a matéria será de fato votada hoje (terça, 31), segundo decisão das lideranças partidárias.
“Não sendo aprovadas [as emendas] pelo plenário, o projeto será encaminhado para sanção presidencial”, afirmou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), instantes depois do colega tucano, complementando o relato sobre o acordo de líderes.
A matéria tramita com urgência, quando deixa de ser debatida em comissões temáticas. Enquanto Uber e Cabify afirmam que a celeridade na tramitação impede o debate com a categoria e com a população, além de atender aos interesses dos taxistas, por outro lado os motoristas de táxis afirmam que as empresas não dão garantias trabalhistas e tentam “exterminar uma categoria centenária”.
Entre outras medidas, o projeto prevê que os veículos usados por esses serviços passem a ter taxímetros físicos e placas vermelhas como as dos táxis, além de dar às prefeituras a prerrogativa de conceder permissão e proibir os aplicativos a qualquer tempo. Com as previsões do PL, os aplicativos não poderão funcionar até que os municípios criem suas próprias regulamentações, além de impedir que o motorista circule em um município vizinho, podendo ser autuado por transporte ilegal de passageiros. Em um exemplo prático, um motorista não poderá levar um passageiro que queria ir do centro de São Paulo ao aeroporto de Guarulhos, um trajeto de cerca de 30km, se a Prefeitura de Guarulhos não tiver criado sua regulamentação.
Iminência de confronto
A votação ocorre em meio a muita tensão no Senado. As duas categorias, principalmente a dos taxistas, ocupam os arredores do Congresso há semanas, em manifestações que incluem fogos de artifício e protestos com palavras de ordem. Do lado de dentro do Parlamento, motoristas autorizados a acompanhar a votação se multiplicam em conversas com parlamentares.
A divisão dos motoristas na área externa se repete dentro do Congresso: até agressões físicas são registradas nas dependências da Casa. Em um dos episódios, um taxista interrompeu com um tapa no rosto a entrevista que um motorista da Uber concedia ao repórter de um site com sede na Espanha.
O jornalista disse ao Congresso em Foco que o taxista, após a estupefação inicial provocada pelo tapa, em seguida foi perseguido pelos corredores do Senado por motoristas de aplicativo, que queriam levá-lo à polícia legislativa. Mas o homem conseguiu deixar o local sem ser detido, depois de um dos seguranças da Casa ter avisado aos demais motoristas que, se eles deixassem o prédio, não mais poderiam voltar. Há um forte aparato de segurança nas cercanias do Parlamento.
Depois da agressão, o motorista da Uber que foi agredido foi à delegacia da polícia do Senado fazer o relato sobre o episódio. Em seguida, segundo a assessoria do aplicativo, ele deixou o Senado para fazer exame no Instituto Médico Legal (IML).
O Uber se manifestou sobre a agressão no transcorrer do dia. “A Uber acredita que todos têm liberdade e autonomia para protestar. No entanto, considera inaceitável o uso de violência e repudia o episódio ocorrido nesta terça-feira, dia 31, no Senado, no qual seu diretor de comunicação, Fabio Sabba, foi violentamente agredido por um representante do grupo de taxistas que fazia ato de protesto no local, enquanto concedia uma entrevista. O executivo, que passa bem, abriu um boletim de ocorrência na delegacia do Senado. Acreditamos que qualquer conflito deve ser administrado pelo debate de ideias entre todas as partes”, diz a empresa por meio de nota (atualização feita às 19h).
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