“Presidente Mão Santa, Srs. Senadores.
Em uma sexta-feira, que geralmente é um dia de plenário vazio, eu venho para fazer um pronunciamento difícil e muito importante na minha história.
Subo a esta tribuna com um sentimento que não é só meu, acho que é o sentimento da maioria do povo brasileiro, que, neste momento, em relação ao Senado Federal, sente desilusão, sente, eu diria, descrença política. Esse não é um sentimento qualquer, é um sentimento sobre o qual temos de nos debruçar, é um sentimento que temos de compreender e reconhecer para buscar respostas para este cenário. Esse sentimento ficou muito consolidado a partir da decisão do Conselho de Ética de não aprofundar nenhuma investigação em relação a tantas denúncias que nós tivemos neste período.
Eu subo a esta tribuna com um sentimento a mais: o sentimento da frustração, a frustração de um homem público e do Líder de uma bancada que lutou, e eu lutei com todos os instrumentos e com a força que tinha para construir um caminho alternativo a esta crise do Senado.
Nunca aceitei o caminho fácil da condenação sem defesa, do pré-julgamento, do tribunal de exceção, porque esse não é o caminho da democracia, ainda que seja mais fácil do ponto de vista eleitoral – sempre é mais fácil.
Como dizia Tocqueville, a função fundamental do Parlamento é preservar as garantias e os direitos individuais seja de quem for, e não há garantia de direitos sem o devido processo, sem o direito de defesa e sem a apuração rigorosa das denúncias.
Disse, e a minha bancada sustentou, que o melhor caminho era a licença do Presidente Sarney, uma licença voluntária – num gesto de grandeza para preservar o Senado – e uma apuração rigorosa, especialmente daquilo que diz respeito ao Senado, que é a nossa maior responsabilidade. Quanto às denúncias que estão fora desta Casa, o Procurador Geral da República já disse: “Não há indícios para abrir uma investigação sobre o Senador José Sarney”. Ora, se o Procurador Geral da República, que está acompanhando todas essas denuncias e coordenando esse processo, faz essa afirmação em público, o Senado, evidentemente, tem de aguardar a conclusão dessas investigações. No entanto, os atos secretos violam o art. 37 da Constituição, o princípio da transparência e da publicidade.
O compromisso primeiro desta Casa é o respeito aos princípios constitucionais. Nós tínhamos de nos debruçar sobre essa questão e não nos enveredar pelo caminho fácil de que o único responsável é o Presidente José Sarney, ainda que ele tenha uma grande responsabilidade, já que é o seu terceiro mandato como Presidente desta Casa, e há mais de catorze anos isso vinha acontecendo. A apuração, a transparência e o rigor nessa matéria eram o caminho para o Senado ir a fundo em suas entranhas e se reformar profundamente como instituição.
É evidente que o Senado é fundamental para a República.
É evidente que o Senado é fundamental para a República, é só olhar para a história do Brasil. Em 183 anos nós não seríamos o que somos como Nação se não houvesse aqui algum equilíbrio entre os estados mais pobres e os estados mais ricos, como o meu estado. É isso o que faz os pequenos estados, pobres estados da Federação, manterem o equilíbrio desta Casa e deste país.
Mas o Senado, depois de 183 anos, acumulou vícios inaceitáveis para um país que se modernizou, para uma cidadania que se fortaleceu, um país que quer menos desperdício, mais rigor com o gasto público, mais austeridade, mais transparência, mais controle social. Essa é uma pauta de que não vamos escapar e da qual não temos o direito de escapar, porque nós temos de deixar esta Legislatura com um Senado reformado profundamente, modernizado, novo, para que, seja quem vier, nós passemos um Brasil melhor e esta Casa possa contribuir coma Nação.
Depois da decisão do Conselho de Ética fiz uma breve reunião com a minha bancada e disse a eles: o meu sentimento mais profundo, a minha vontade neste momento é de deixar a liderança, porque não tivemos força para construir um caminho alternativo. Esbarramos na maior bancada do Senado, que é o PMDB, que teve um papel fundamental nesse processo. Esbarramos, infelizmente, no apoio que o meu governo e a direção do meu Partido deram a essa resposta que foi dada e que não era a posição da nossa bancada, não foi nunca a minha posição. Conversei com o governo e conversei com o partido ao longo desse processo pedindo apoio para esse caminho, equilibrado, responsável… de uma apuração que não fosse, simplesmente, um objeto do interesse político-eleitoral da oposição, que evidentemente existiu em tudo isso. O alvo sempre foi o PT. O alvo é o presidente Lula, porque essa é a disputa maior que se avizinha para o ano que vem, mas o que acontece no Senado não é só um problema de disputa eleitoral. E aí, como senador, cada um de nós tem uma responsabilidade específica que nós não podemos deixar de considerar.
A bancada, o senador Tião Viana, o senador Paulo Paim, senador Suplicy, que adiou inclusive a ida dele para São Paulo para está aqui hoje e eu não consegui chegar mais cedo, agradeço muito toda a atitude que ele teve ao longo de todo esse processo, senador Augusto Botelho, que está aqui, agradeço, que também adiou a sua ida para poder estar aqui hoje, nesta manhã, senadores todos da nossa bancada, senadora Fátima Cleide, que me ligou e não foi à reunião, mas me dando apoio e solidariedade, senadores todos que estiveram ali, senadora Serys, senador João Pedro, que foi à reunião, todos eles que estavam lá falaram: Mercadante, não é esse o caminho, você tem que ficar com a Bancada, você tem que continuar na liderança.
Expressaram isso publicamente e pediram com muita sinceridade que eu ficasse, especialmente num momento muito difícil para a própria bancada, porque a Marina não é um quadro qualquer. Marina tem uma história de trinta anos comigo neste Partido e ela representa uma agenda importante para o Brasil, uma agenda que eu queria dentro do meu partido, porque ela existe dentro do meu partido. Mas, ela escolheu o caminho de fazer uma disputa eleitoral em cima de compromissos que ela sempre teve.
O senador Flávio Arns, que veio para o PT na última eleição e que contribuiu na nossa bancada – e, mesmo com as diferenças que nós possamos ter tido como bancada com ele, mas que contribuiu com a nossa bancada ao longo desse período – também, nesse episódio, encontrou o caminho para deixar o PT.
Deixar o PT nunca passou pelo meu coração nem pela minha cabeça. Eu sou petista antes de o PT existir. Quando lá estava, no Colégio Sion, em 1980, eu estava ali e éramos um grupo muito pequeno de brasileiros e de brasileiras, de sindicalistas, de uma esquerda que tinha resistido à ditadura, de lideranças de base das igrejas, de intelectuais que tinham sido exilados e resistido, como Florestan Fernandes, Paulo Freire e tantos que passaram pela nossa caminhada. Estávamos ali, com lideranças como Chico Mendes, alguns que foram assassinados pelos valores que defenderam ao longo da história, construindo uma utopia.
Ali, naquele momento da história, ninguém foi para o PT para ter um cargo, muito menos imaginando ter um mandato. Nós fomos por um compromisso com o Brasil, um compromisso muito profundo de vida e que, para muitos de nós, custou muito. Não foi fácil chegar aonde nós chegamos e percorrer o caminho que percorremos. Eu estou desde a primeira hora, fiz todas as campanhas do presidente Lula. Em 1982, eu andava com ele o estado de São Paulo inteiro. Em 86, eu coordenava a campanha dele, era um dos coordenadores da campanha para Deputado Federal quando ele foi o candidato mais votado. Fiquei 7 anos para fundar a CUT e construir uma central sindical e nunca imaginei disputar uma eleição.
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