Valmir Ribeiro
Especial para o SOS Concurseiro/Congresso em Foco
A divulgação dos salários e demais rendimentos dos servidores públicos divide opiniões dos concurseiros: alguns defendem a total transparência em respeito à aplicação do dinheiro público e outros se posicionam contrários sob a perspectiva do mau uso dos dados e da ameaça pessoal dos servidores públicos. A publicação é determinada pela Lei de Acesso a Informação (Lei 12.527/2011), que entrou em vigor há pouco mais de dois meses.
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O candidato ao Ministério das Relações Exteriores, Alessandro Gusmão Borges, 23 anos, concorda com a legislação: “É muito justo que todos os cidadãos saibam para onde está indo o dinheiro pago com impostos e isso inclui os salários dos servidores. Não me sentiria nem um pouco incomodado se fosse nomeado e minhas informações fossem divulgadas. Afinal, meu trabalho estaria voltado ao público”.
Já concurseira Maria Cláudia Menezes, 27 anos, não concorda com o colega. “É uma exposição desnecessária e arriscada”, defende. A administradora está se preparando para o concurso da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e acredita que a divulgação é negativa para a privacidade e segurança dos agentes públicos. “A divulgação nominal dos salários pode ser usada por bandidos e pessoas de má índole e em prejuízo à segurança dos servidores e de suas famílias”, defende.
A posição de Maria Cláudia é semelhante à do servidor público do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), Francisco Eduardo Gomes Viana. Ele é favorável à publicidade total de informações que envolvam dinheiro público, porém, considera injusta e arriscada a divulgação dos salários com a identificação nominal de cada servidor. “Não vejo nenhum ponto positivo na divulgação dos nomes dos servidores públicos, pois o que aparece são salários brutos e não contabilizam descontos. Além disso, gera desconforto, pois muito se fala em segurança e, quando se colocam nomes junto a salários, acredito que a marginalidade pode se aproveitar de alguma forma disso”, argumenta.
Transparência
O secretário-geral do Contas Abertas, Gil Castello Branco, teme que a não divulgação nominal dos salários, explicitando cada benefício adicional (férias, auxílios, abonos, despesas com viagens, gratificações, horas extras, entre outras despesas que possam ocorrer) pode tornar e Lei de Acesso à Informação ineficiente à fiscalização de possíveis abusos cometidos com dinheiro público. Para ele, o não detalhamento das informações pode trazer outros problemas: “A prefeitura de São Paulo, em 2009, teve que retirar seu site do ar por ordem da Justiça, justamente porque estava trazendo os vencimentos englobados e gerando confusão. A partir do momento em que a prefeitura passou a colocar as informações em colunas individualizadas por servidor e por tipo de benefício, a Justiça não criou mais objeções e esse site está no ar há três anos”, disse.
Segundo Gil, o exemplo serve, também, para rebater os argumentos de possíveis riscos à segurança do servidor público com a divulgação nominal de salários e outros benefícios. “Há três anos a prefeitura paulista divulga essas informações com detalhamento minucioso e, até então, não se têm notícias do aumento na incidência de sequestros relâmpagos ou qualquer outro tipo de violência contra os servidores daquele órgão”. E reforça o argumento com experiências estrangeiras: “Internacionalmente, o acesso às informações públicas é considerado um direito do cidadão, tal como numa empresa privada, em que todos os patrões sabem o quanto ganha cada um de seus funcionários. No caso do Estado, os patrões somos nós”, conclui.
O advogado e professor de Direito Constitucional da Vestconcursos, Max Kolbe, concorda que os órgãos públicos devem fornecer detalhadamente todas as informações relativas aos salários e aos benefícios recebidos por servidores públicos. “A não divulgação dos nomes desses agentes públicos, no meu entender, fere o princípio constitucional da publicidade, pois o cidadão, na acepção jurídica da palavra, não pode ter o seu direito restringido por meras elucubrações por parte de alguns que temem por suas integridades físicas, pois esses fatos são meras suposições, nada de concreto”, disse o professor.
Quando indagado sobre o que faria se tivesse poderes para alterar a lei a fim de torná-la mais moderna e adequada à realidade brasileira, o professor Max foi enfático: “Não alteraria absolutamente nada. Se eu tivesse algum poder vetaria qualquer projeto de emenda à Constituição ou projeto de lei que fosse tendente a beneficiar apenas uma pequena parcela da população com supersalários”.
E conclui com o que espera da postura dos servidores público. “Entendo, particularmente, que os servidores deveriam parar com essa discussão [sobre risco a segurança, por exemplo] e pleitearem, como cidadãos que são, punições mais severas para aqueles que usurpam ilicitamente o dinheiro do povo em benefício próprio, talvez, com pena máxima de 30 anos em regime integralmente fechado, sendo, inclusive, crime hediondo. O povo brasileiro precisa ser respeitado,” conclui.
Supersalários
Uma das situações que a divulgação das remunerações explicitou foi a existência na administração pública dos chamados supersalários: servidores que recebem mensalmente valores que extrapolam o teto constitucional, de R$ 26,7 mil, o vencimento pago aos ministros do Supremo Tribunal Federal. Como o Congresso em Foco vem mostrando desde o ano passado, os supersalários são pagos a servidores dos três poderes. Segundo levantamento do site, existiriam pelo menos 3,9 mil servidores públicos recebendo supersalários.
Com base em auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), o Congresso em Foco publicou a relação dos servidores do Senado que, em agosto de 2009, ganhavam mais que o teto constitucional. Por patrocínio do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo (Sindilegis), 43 dos servidores que faziam parte da lista entraram com ação contra o site. Até agora, o Congresso em Foco foi absolvido em todas ações. Os juízes entenderam que a divulgação dos vencimentos que extrapolam o teto é de interesse público, que prevalece sobre um eventual interesse privado.
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