Miguel Ignatios*
Não fosse a crise financeira americana, a pior desde a Grande Depressão, de 1929, falar em Proer (o bem-sucedido programa de recuperação de bancos brasileiros, adotado na primeira gestão de FHC), hoje, faria pouco sentido. No entanto, em razão da interligação dos sistemas financeiros e bancários internacionais, promovida pela globalização, e do seu inquestionável efeito dominó, o tema voltou a ser debatido como uma das soluções possíveis para socorrer instituições financeiras em dificuldades.
Para recordar, o Proer foi feito com recursos dos próprios bancos e – claro – dos titulares dos depósitos à vista existentes em todo o sistema bancário brasileiro. O Banco Central (BC), para garantir a liquidez dos bancos, recolhe compulsoriamente um percentual, variável de acordo com prioridades da política monetária, do total diário de todos os depósitos à vista.
Parte desses recursos foi emprestada pelo BC, com juros à taxa Selic da época, aos bancos que, de repente, tiveram falta de caixa para honrar seus compromissos. Isso começou a ocorrer, com certa freqüência, de meados de 1994 em diante, quando foi adotada a paridade de nossa moeda em relação ao dólar americano. Tal medida foi batizada, na época do lançamento do Plano Real, de “âncora cambial”.
Isso significa dizer que o Proer foi posto em prática com recursos do BC, dos bancos, brasileiros ou estrangeiros, autorizados a captar depósitos à vista e a prazo (investimentos e poupança) do público; e com parte dos recursos dos depositantes.
Apesar das críticas do PT, dizendo que o governo estava emprestando recursos públicos aos bancos, o programa foi um sucesso. Tanto que, em meados de 2007, quando a atual crise financeira já apresentava seus primeiros sinais, o presidente Lula aconselhou Bush a fazer um Proer americano!
Acontece que as críticas da sociedade à ajuda oficial aos bancos, nos Estados Unidos, onde a crise é mais grave; e, na União Européia, onde ela já se instalou, em velocidade alarmante, são exatamente sobre a mesma questão: por que socorrer com recursos públicos, provenientes da arrecadação de impostos, especuladores irresponsáveis?
Europeus querem a punição dos responsáveis pela quebra de bancos. Americanos pedem, além disso, que os empréstimos sejam, posteriormente, devolvidos, com juros, ao Tesouro, ou, alternativamente, transformados em participação acionária nas instituições financeiras que receberam ajuda do governo.
Economistas americanos, como, por exemplo, o ex-presidente do Banco Mundial Joseph Stiglitz, ganhador de recente Nobel; e Paul Krugman, dentre outros, têm feito sérias restrições à falta de controle da especulação financeira globalizada. Em resumo, eles dizem o seguinte: a globalização comercial e industrial é um sucesso, mas a financeira é problemática. Prova disso seriam as sucessivas crises ocorridas ao longo das duas últimas décadas.
O mérito da atual e das outras crises foi acelerar a formação de um consenso mundial sobre a necessidade de controlar a especulação financeira globalizada. Este tem sido tema freqüente nas reuniões de cúpula de autoridades monetárias americanas, européias e asiáticas.
Em outras palavras, cansados de turbulências e crises financeiras (em geral, causadas por transferências instantâneas de bilhões de dólares) e de especulações financeiras de todo o tipo (Bolsas de Valores, derivativos, mercadorias, petróleo, etc.), empresários e investidores do setor produtivo globalizado anseiam por um novo Keynes, ou, ao menos, por nova onda neokeynesiana.
O britânico John Maynard Keynes tirou os Estados Unidos da Grande Depressão, iniciada em 1929, após a quebra da Bolsa de Nova York, com a política do “New Deal”, posta em prática por Franklin Roosevelt; criou o novo sistema de paridades cambiais, que passaram a valer depois da 2ª Guerra Mundial; e, por fim, implantou o Bird (Banco Mundial) e o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Para terminar, deixo aqui uma pergunta aos leitores: se Keynes fosse vivo, teria feito um Proer, em escala planetária, para conter a especulação financeira global? Capacidade para tal, com certeza, não lhe faltaria.
* Miguel Ignatios é presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB).
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