Thomaz Pires
Juntar forças em busca de novos caminhos para tornar a felicidade um direito constitucional. A fórmula segue firme entre as entidades envolvidas na discussão da PEC da Felicidade. A proposta, que busca por meio de emenda à Constituição reforçar as obrigações do Estado com a garantia dos direitos sociais básicos, reúne um número cada vez maior de adeptos.
Atento aos debates sobre cidadania e justiça social, o Instituto Vladimir Herzog decidiu abraçar a ideia. De acordo com o presidente da entidade, Ivo Herzog, o movimento + Feliz – do qual nasceu a proposição da PEC da Felicidade – despertou o interesse do instituto por reforçar a ligação entre as condições básicas de vida oferecidas ao cidadão comum e o bem-estar da população, ou seja, a felicidade.
“A felicidade está relacionada a todas as questões relacionadas com a justiça social. É a manifestação mais clara e direta do bem-estar, e precisa ser amparada pela nossa legislação. Percebemos que poderíamos ser colaboradores nesse processo para ajudar nessa longa jornada de alteração constitucional”, explica o presidente, filho do jornalista Vladimir Herzog, morto pela ditadura militar nos anos 70 e um dos símbolos da luta pelos direitos humanos no Brasil.
Dia + Feliz
A primeira colaboração concreta do Instituto Vladimir Herzog com o objetivo de levar a PEC da Felicidade adiante ocorrerá no próximo sábado (3). A entidade organizou, em parceria com o movimento + Feliz, o primeiro Encontro Musical Brasileiro pela Democracia, Educação e Felicidade. A iniciativa reunirá grandes nomes da música nacional para chamar atenção para a discussão no Congresso.
“Será uma oportunidade ímpar para destacar todos os pontos que estão sendo tratados. Tenho certeza de que isso vai colaborar em muito para avançarmos na mobilização em torno da proposta. Muita gente ainda não tomou conhecimento do assunto e passa a ser colaborador imediato após observar a importância do tema”, destaca Ivo.
O show será realizado na Sala São Paulo, no centro de São Paulo, com a regência do maestro João Carlos Martins. No palco, também estarão presentes outros artistas que apoiam a proposta, como o músico Sergei Eleazar de Carvalho, a cantora Fafá de Belém, a bateria da Escola de Samba Vai-Vai, a Orquestra Filarmônica Bachiana (Sesi-SP) e o Coro do projeto “A Música Venceu”, formado por crianças da comunidade de Paraisópolis (SP).
“Mais do que festejarmos as conquistas e os projetos realizados pelo instituto, nosso objetivo é celebrar a justiça social, passando pelo debate e a importância da PEC da Felicidade. Estamos empenhados em contagiar todos com essa nova empreitada”, destaca Ivo Herzog.
A proposta altera o artigo 6º da Constituição, acrescentando a expressão “essenciais à busca da felicidade” antes da descrição dos principais direitos sociais brasileiros. Com a mudança, o texto fica com a seguinte redação: “São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
Para que a proposta seja apresentada oficialmente e comece a tramitar no Senado, é necessário o apoio de 27 senadores. A coleta das assinaturas está sendo feita pelo senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
A iniciativa segue o exemplo de diversos países que tornaram a busca da felicidade objetivo fundamental da ação do Estado. A mudança possibilitará reforçar a implementação de direitos sociais negados na prática à parte da população e estabelecer um novo parâmetro – ou seja, a felicidade (leia-se, o bem-estar das pessoas) – para avaliação de políticas públicas.
Mobilização social
Presidente do movimento + Feliz, o publicitário Mauro Motoryn avalia que a colaboração de entidades sociais, a exemplo do Instituto Vladimir Herzog, é fundamental para avançar na mobilização em torno da PEC da Felicidade. Segundo ele, as redes sociais da internet também podem contribuir muito para fazer o debate sobre o assunto avançar.
“Já temos disseminado o debate por meio da página do nosso movimento. Mas a ideia é usar todas as ferramentas, como Twitter, Facebook, Orkut e comunidades para lançar perfis oficiais para a PEC da Felicidade”, explica.
Na avaliação de Mauro Motoryn, a discussão em torno da PEC da Felicidade é o próximo assunto legislativo a tomar conta das ruas. “O último grande debate que tivemos foi a proposta de iniciativa popular do ficha limpa. Ela mobilizou quase 2 milhões de pessoas com a coleta de assinaturas. No nosso caso, contamos apenas com as assinaturas dos parlamentares, mas certamente vamos atingir mais de 10 milhões de interessados sobre o assunto”, destaca.
“Ideia genial”
Diversos países atribuem ao Estado responsabilidade constitucional pela busca de meios para a garantia do direito de ser feliz. A Declaração de Direitos da Virgínia (EUA, 1776) outorgou aos cidadãos o direito de buscar e conquistar a felicidade. Na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789), há a primeira noção coletiva de felicidade, determinando que reivindicações dos indivíduos sempre se voltarão à felicidade geral.
As Constituições do Japão e da Coreia do Sul também determinam que todas as pessoas têm direito à busca pela felicidade, devendo o Estado empenhar-se na garantia às condições para atingi-la. Os responsáveis pelo movimento + Feliz, uma campanha de caráter apartidário e não governamental, entendem que só a mobilização da sociedade permitirá juntar o Brasil a essa lista de nações.
Uma das entidades que endossaram o movimento, é a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Seu presidente, Antonio Carlos Bigonha, diz que uma das funções do Ministério Público é exatamente fazer a sociedade mais feliz.
“Nós vamos iniciar uma ampla campanha para conseguirmos avançar. Já temos recebido um retorno muito positivo. Tenho certeza que com as entidades e o dinamismo da internet conseguiremos uma ampla mobilização”, avalia.
Anos de chumbo
Jornalista, professor da Universidade de São Paulo (USP) e teatrólogo, Vladimir Herzog morreu nos porões do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações e Centro de Operações de Defesa Interna) e abriu as feridas do período que passou a ser chamado de “anos de chumbo”.
Na noite do dia 24 de outubro de 1975, o jornalista de 38 anos se apresentou na sede do DOI-Codi , em São Paulo, para prestar esclarecimentos sobre suas ligações com o PCB (Partido Comunista Brasileiro). No dia seguinte, foi encontrado morto. Segundo a versão oficial da época, ele teria se enforcado com o cinto do macacão de presidiário. Porém, de acordo com os testemunhos de Jorge Benigno Jathay Duque Estrada e Rodolfo Konder, jornalistas presos na mesma época no DOI/Codi, Vladimir foi assassinado sob torturas.
A morte de Herzog foi um marco na ditadura militar (1964-1985), paralisou as redações de todos os jornais, rádios, televisões e revistas de São Paulo e aumentou a pressão popular contra o regime militar. O instituto foi criado no ano passado para preservar a memória de Vlado. O jornalista também dá nome a um dos principais prêmios do jornalismo brasileiro, o Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, instituído em 1979.
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