Impeachment abre disputa de narrativas
O impeachment de Dilma Rousseff, a primeira mulher a comandar o país e o segundo governante pós-redemocratização a cair, é um fato histórico. Na quarta-feira, 31 de agosto, ocorreu um episódio inédito: o Brasil teve num só dia três presidentes – Dilma, Temer e Rodrigo Maia.
O afastamento definitivo de Dilma Rousseff do poder não acaba com o confronto verbal em torno da narrativa do impeachment. Ao contrário, acirra ainda mais a guerra verbal em busca pela hegemonia da versão que ficará para a história.
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Assim que foi conhecido o resultado da votação, todas as atenções se voltaram para as primeiras manifestações dos principais protagonistas. As de Dilma foram a promessa de fazer a “mais firme, incansável e enérgica oposição que um governo golpista pode sofrer”. Temer assumiu o cargo pedindo pacificação, mas sacou palavras bélicas ao avisar que não levará desaforo para casa, numa clara mudança de tom: “Vamos contestar a partir de agora essa coisa de golpista; golpista é você que está contra a Constituição”.
Rodrigo Maia, que assumiu a presidência com a viagem de Temer à China, chegou adiantado na Base Aérea e, bem-humorado, brincou com um interlocutor que não se incomodaria se ele quisesse ficar dez dias na China.
Fatos de grande relevância e impacto social como o impeachment fazem com que a exposição, conduta e as declarações dos principais atores despertem a máxima atenção. Exatamente por isso é bom lembrar que a prudência é amiga do porta-voz e os manuais de atuação recomendam coerência e bom senso. A regra de conduta verbal é simples e remete à frase do arquiteto alemão naturalizado americano Mies van der Rohe: “Menos é mais”.
Crise pessoal de Ela Wiecko e os reflexos negativos para a imagem do MPF
“Número 2” do Ministério Público Federal, a vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko Volkmer de Castilho, pediu exoneração do cargo com a publicação, no site da Veja, de vídeo em que aparece em ato público em Portugal contra o governo do presidente interino Michel Temer. Em entrevista por telefone, ela disse ter ido ao ato “como cidadã”, e não como procuradora. E não deixou dúvidas sobre sua posição: “Eu acho que, do ponto de vista político, é um golpe, é um golpe bem-feito, dentro daquelas regras”.
Mesmo depois da publicação de sua dispensa no Diário Oficial da União, reforçou que estava de férias, em um curso como estudante. “Não posso pensar nada? Não posso ter liberdade de manifestação? Isso é um pouco exagerado. Fui discreta, estava junto e não tive protagonismo maior”.
O episódio é exemplar para relembrar um aprendizado fundamental: cabe ao porta-voz institucional preservar e defender a imagem do órgão público e, nessa condição, não lhe cabe emitir opiniões pessoais. Ao assumir uma função pública, deve esquecer o CPF e assumir o CNPJ da instituição. Tudo o que um porta-voz diz impacta a imagem e a reputação do órgão público ao qual pertence. Os próprios colegas da vice-procuradora-geral avaliaram que o episódio é um fato que atinge a imagem da instituição.
[+] entrevista de Ela Wiecko à revista Veja
Novas pesquisas desmontam conceitos sobre ser bem informado
Descobertas recentes de campo de estudos que congrega ciência política, cognição e psicologia social estão derrubando a ideia de que o acesso a mais informação significa que as pessoas ficarão mais bem informadas. As revelações mostram que quando o assunto é política, ocorre uma inversão: o ser humano tende a reforçar ainda mais suas convicções, mesmo quando exposto a evidências que provem o contrário.
Essa conclusão está se tornando cada vez mais aceita na academia. Segundo o coordenador de pesquisas da USP sobre os protestos contra o impeachment, Pablo Ortellado, esse processo está ficando mais claro: “Quando se discute algo relacionado com um valor importante para uma pessoa, a reação natural é que ela só saia mais convencida da sua certeza anterior”.
Os estudos tendem a confirmar o que muitos já suspeitavam: a política pode emburrecer as pessoas. E quanto mais escolarizadas forem, mais chances têm de engolir dados falsos.
Para ministro do TCU, desfecho das pedaladas seria outro se fosse Lula
Num desabafo surpreendente, o ministro José Múcio Monteiro, do TCU, responsabilizou a ex-presidente Dilma pelo seu próprio destino. “Foi temperamento”, disse, reforçando: “Foi vaidade. Foi soberba, foi falta de humildade, foi excesso de autoridade”. As opiniões foram proferidas em entrevista à uma emissora de rádio, e o próprio entrevistado reconheceu: “Não sei nem se eu devia dizer”.
Este é mais um caso clássico do que no jargão da imprensa se chama “sincericídio”. Significa falar a verdade quando não se deveria. Dizer verdade que tem potencial para criar problema. Intemperança verbal deve ser evitada, sempre, por qualquer porta-voz.
O impeachment “meme a meme” nas redes sociais
A insatisfação popular com a impunidade que costumava acompanhar o desfecho de muitas CPIs no Congresso gerou o bordão de que Comissões Parlamentares de Inquérito costumam “acabar em pizza”.
Em tempo da ubiquidade das redes sociais tudo acaba em meme, e foi o que não faltou no impeachment de Dilma Rousseff.
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