O contingenciamento de emendas parlamentares é uma hipótese viável para o corte proposto pela equipe econômica do governo, que se reúne hoje (9) com integrantes da Comissão Mista do Orçamento para decidirem quais são os projetos prioritários para 2008, ou seja, livres da tesoura. Para compensar a perda da CPMF, o governo quer reduzir R$ 20 bilhões em gastos nos três poderes, uma economia que deve atingir as emendas parlamentares.
Se prevalecer a lógica dos cortes nas emendas do orçamento de 2007, a tesoura vai poupar as emendas individuais, utilizadas pelos deputados e senadores inclusive como mote eleitoral em suas bases.
No ano passado, 52% das emendas individuais deixaram de existir, porque sequer foram empenhadas até 31 de dezembro – índice que significa R$ 857 milhões. Já as emendas coletivas sofreram um corte maior, de 65%, ou R$ 8,63 bilhões. O total não empenhado foi de aproximadamente R$ 9,5 bilhões – quase a metade do que o governo quer economizar para enquadrar o orçamento deste ano à nova realidade sem a CPMF. Os dados foram extraídos de levantamento da assessoria do DEM na Câmara.
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TABELAS COMPLETAS
Emendas empenhadas – Emendas pagas
Para o líder do DEM, deputado Onyx Lorenzoni (RS), a possibilidade de novos cortes nas emendas não assusta a oposição. “Acho que o problema maior será para a base governista, que vai ver os recursos diminuírem. A oposição já recebe muito pouco. Quem é oposição não trabalha com a idéia de emendas individuais”, disse o deputado ao Congresso em Foco.
O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), acredita que o governo pode “perfeitamente” usar a experiência do ano passado para fazer ajustes. “Isso deve ter sido feito [em 2007] com um custo político não tão grande, porque não houve esse desmoronamento da base”, ponderou o peemedebista. “Cabe ao governo reavaliar a experiência dele.”
Aliança rentável
Na análise do orçamento de 2007, os parlamentares da base governista se beneficiaram, em detrimento dos que fazem oposição ao Palácio do Planalto, segundo os dados da assessoria do DEM. Os pagamentos das emendas de deputados e senadores somaram R$ 1,9 bilhão. Já os empenhos (reservas para pagamento posterior) foram de R$ 5,5 bilhões. A maior parte das emendas individuais beneficiou parlamentares governistas.
Os partidos alinhados ao Planalto tiveram R$ 48,3 milhões pagos para suas emendas, um índice de execução de 4,23%. Ao contrário, a oposição ficou com quatro vezes menos – R$ 12,1 milhões –, valor que representa apenas 2,41% de tudo o que os deputados e senadores solicitaram ao orçamento.
As emendas de parlamentares sem partido receberam R$ 1 milhão (6,87% de execução). As emendas coletivas (de bancadas estaduais, de comissões e de relatorias) somaram R$ 1,89 bilhão (13,80%).
Mesma lógica
A mesma lógica de beneficiar os aliados e minguar os recursos para a oposição é observada nos empenhos das emendas. Os governistas tiveram R$ 612,7 milhões empenhados. Esse valor representa 53,70% de todo o dinheiro que eles pediram. Na outra ponta, a oposição conseguiu empenhar apenas R$ 182,6 milhões, o que representa só 36,38% de reserva do que DEM, PSDB, PPS e Psol pediram.
O índice é menor até do que a média de empenhos de todas as parlamentares, que foi de 36,58%. “É uma forma discricionária que o governo utiliza para punir a oposição”, lamenta o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), que sofreu na pele o problema. Dos R$ 500 mil que ele colocou no orçamento, nada foi empenhado. “Tem que ter um critério que não pode ser político”.
Deputados e senadores sem partido empenharam exatos R$ 6 milhões, o que representa 38,10% do que solicitaram. As emendas coletivas somaram R$ 4,67 bilhões em empenhos.
O PMDB teve o maior volume empenhado com um total de R$ 147 milhões, seguido pelo PT, com R$ 142 milhões. Já o Psol, o Prona (agora incorporado ao PR), o PSDB e o DEM estão entre os últimos na fila dos partidos que, percentualmente, menos recursos conseguiram empenhar em relação ao que solicitaram. “O PMDB sempre teve suas emendas empenhadas porque sempre vai dar sustentabilidade ao governo, seja ele do PT ou do PSDB”, disse à reportagem o vice-líder do partido no Senado, Wellington Salgado (MG).
Oposição 100%
Garibaldi diz que o benefício a alguns partidos na liberação das emendas é perceptível, como o do PMDB: “Ninguém vai tapar o sol com a peneira, não”. Mas o presidente do Senado acha “simplista” a idéia de que os governistas são sempre protegidos e os oposicionistas, discriminados. “Isso não é como se procura dizer. Há parlamentares sem ligação com o governo que têm suas emendas empenhadas”, defendeu Garibaldi.
Exemplos não faltam. Pelo menos cinco parlamentares do PSDB tiveram 100% de empenho de suas emendas: o senador Eduardo Azeredo (MG) e os deputados Carlos Alberto Leréia (GO), Nárcio Rodrigues (MG), Gervásio Silva (SC) e Nilson Pinto (PA).
Do lado governista, Olavo Calheiros (PMDB-AL) conseguiu empenhar 100% de suas emendas. Mais, ele foi o campeão em emendas nos valores absolutos. Conseguiu garantir R$ 5,6 milhões em emendas – como os R$ 4,8 milhões destinados a melhorar a infra-estrutura de universidades federais e hospitais universitários de Alagoas. Outro que conseguiu a façanha dos 100% foi o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA).
Longe do cargo, mas sempre pelos corredores do Congresso, o ex-deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), acusado de ser um dos líderes da máfia das ambulâncias, também empenhou todos os R$ 4 milhões pedidos por ele. Desse valor, R$ 1,8 milhão será destinado à “estruturação de unidades de atenção especializada em saúde” no estado de Rondônia.
Zero
Até um deputado governista com livre acesso ao presidente não conseguiu empenhar nada, assim como o senador Flexa Ribeiro. O ministro das Relações Institucionais, deputado José Múcio Monteiro (PTB-PE), não conseguiu garantir os R$ 50 mil solicitados no orçamento do ano passado. O mesmo aconteceu com os senadores governistas José Sarney (PMDB-MA) e Cristovam Buarque (PDT-DF), o ex-senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) e os “rebeldes” Mão Santa (PMDB-PI) e Mozarildo Cavalcante (PTB-RR).
Cristovam diz que a culpa não é sua. Para ele, faltou mobilização por parte do governo do Distrito Federal e das entidades da área da cultura e educação que, segundo o senador, seriam contempladas com os recursos das emendas que tiveram dotação de R$ 2,1 milhões. “Eu não fico pedindo para o governo federal que aprove minhas emendas. Acho que faltou mobilização daqueles que receberiam os recursos”, disse Cristovam ao Congresso em Foco.
Tesoura
Os donos do orçamento (notadamente o Executivo e o Judiciário) passaram a tesoura nas emendas dos parlamentares. Dos quase R$ 15 bilhões de emendas solicitados por eles no orçamento de 2007, mais da metade (63%) foi contingenciado, porque sequer foi empenhado até 31 de dezembro passado, perdendo sua validade.
Dos cerca de R$ 5,5 bilhões empenhados, R$ 1,9 bilhão foi pago. A diferença fica para ser paga neste ano ou nos próximos exercícios financeiros, os chamados “restos a pagar”, na linguagem burocrática.