Os números de investimentos apresentados pela equipe econômica do governo Lula são inferiores aos dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi). De acordo com levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo, um quarto dos investimentos que o governo Lula diz ter executado até agora não ocorreram ou não foram pagos.
Desde o início de 2003, os investimentos somam R$ 35,3 bilhões, pelo conceito de liquidação, mas apenas R$ 26,8 bilhões foram pagos até o fim de junho. No governo FHC também existiam discrepâncias, mas menores: 11%.
Entre os investimentos que o governo diz que fez mas não saíram do papel estão, por exemplo, as obras de transposição do Rio São Francisco, bloqueadas por ações na Justiça, diz o repórter Sérgio Gobetti. Pela propaganda governamental, o governo já teria investido R$ 408,9 milhões no programa de integração da bacia do rio, mas o que foi efetivamente pago são R$ 116 milhões, pelos projetos iniciais de planejamento e engenharia.
A confusão, explica a reportagem, é causada pela decisão da Secretaria do Tesouro Nacional de classificar automaticamente como “liquidado” todo gasto empenhado no fim do ano. O empenho corresponde a uma autorização inicial para contratar obra ou serviço, enquanto a liquidação, por lei, deve ser aplicada, só ao que é concluído. O Tesouro desconsidera essa regra.
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Em entrevista anteontem, o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi surpreendido pela sistemática do Tesouro. Ele achava que os números que estava divulgando eram de investimentos liquidados e concluídos, mas eram só empenhos.
No ano passado, por exemplo, o governo empenhou e “liquidou” R$ 17,3 bilhões para investimentos – mas pagou apenas R$ 5,9 bilhões. Em 2006, já foram pagos outros R$ 4,6 bilhões, somando R$ 10,5 bilhões – bem menos do que os números oficiais.
No governo FHC, essas diferenças inexistiam até o segundo mandato, quando o Tesouro passou a adotar o novo procedimento. Entre 1999 e 2002, o investimento pretensamente realizado somou R$ 41,7 bilhões, mas o pago não passou de R$ 37,1 bilhões.
A discrepância entre os valores contábeis e reais tende a crescer no fim do ano se o governo cumprir a meta de empenhar R$ 19 bilhões para investimentos, anunciada por Mantega. Até 30 de junho, pelos dados parciais do Siafi, o governo já autorizara R$ 7,9 bilhões. O que foi efetivamente realizado, entretanto, não passa de R$ 668 milhões, e o que foi pago, de R$ 527 milhões.
Além de serem usados politicamente pelo Planalto, esses números são repassados ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para calcular a taxa de investimento do setor público. O Estado procurou em março o IBGE para saber se era adotada alguma medida corretiva das informações do Tesouro.
A reportagem recebeu a informação de que a contabilização dos investimentos segue convenção internacional que determina que sejam usados os valores liquidados. Quando os valores liquidados não correspondem exatamente ao conceito legal de liquidação, o instituto pode conversar com o tesouro, mas não tem como mudar a metodologia ou os dados.