Reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que a proximidade do poder, o partido e o sobrenome ajudam um grupo de parlamentares a obter a liberação de recursos para suas emendas ao Orçamento da União. De acordo com levantamento feito pelo Estadão com base nos relatórios da Comissão Mista de Orçamento do Congresso, a família Sarney e os irmãos Calheiros estão no topo da lista dos mais beneficiados durante todo o governo Lula. Eles aparecem à frente até de importantes lideranças petistas.
Entre 2003 e 2006 cada parlamentar apresentou R$ 13 milhões em emendas individuais ao orçamento, mas poucos conseguiram que o gasto fosse efetivamente autorizado pelos ministérios. Segundo a reportagem de Sérgio Gobetti, entre os privilegiados, o campeão é o senador José Sarney (PMDB-AP), um dos principais aliados do presidente Lula. Nos últimos três anos e meio, ele apresentou 43 emendas e conseguiu liberar R$ 10,49 milhões para cidades e projetos de sua escolha, como a instalação de bibliotecas públicas em municípios do Amapá.
O sexto na lista também é do clã. O deputado Sarney Filho (PV), apesar de ser da oposição, se beneficiou do sobrenome para obter R$ 9,39 milhões para propostas de sua preferência. A terceira integrante da família no Congresso é a senadora Roseana Sarney (PFL-MA), aliada do Planalto mesmo filiada a uma das principais siglas da oposição. Ela está em 71ª lugar na lista, com R$ 5,69 milhões.
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O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e os seus irmãos Olavo (PMDB-AL) e Renildo (PCdoB-PE), ambos deputados, estão entre os 14 mais beneficiados. Cabeça do clã, Renan já amealhou R$ 9,14 milhões dos R$ 13 milhões que pediu entre 2003 e 2006. Os deputados Olavo e Renildo obtiveram, respectivamente, R$ 8,75 milhões e R$ 7,51 milhões.
Um dos principais destinos das emendas de Renan e Olavo é sua cidade natal, Murici (AL). O prefeito é José Renan Vasconcelos Calheiros Filho, herdeiro do presidente do Senado. Com seus 22.132 habitantes, Murici foi beneficiada com a liberação de pelo menos R$ 2 milhões de emendas.
Aliado dos Calheiros e parte de uma das famílias mais tradicionais de Alagoas, o senador Teotônio Vilela Filho, é um dos poucos tucanos que se destacam na lista dos beneficiados. Em média, parlamentares tucanos liberaram R$ 2,83 milhões por cabeça entre 2003 e 2006, mas Teotônio obteve três vezes mais: R$ 7,89 milhões.
As verbas destinadas pelo governo a pedido de Teotônio levaram Barra de Santo Antônio, um paraíso no litoral norte de Alagoas, famoso por seus coqueiros (um dos negócios da família do senador), para o primeiro lugar no ranking das prefeituras beneficiadas por emendas. Em três anos e meio, Barra recebeu o equivalente a R$ 506,81 por habitante, enquanto a capital paulista obteve R$ 4,03, diz o Estadão.
Outro tucano de sobrenome importante na lista é o deputado mineiro Bonifácio de Andrada, descendente do Patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada e Silva. O governo empenhou R$ 10,3 milhões para emendas do deputado, mas apenas R$ 645 mil foram pagos. "O governo não paga porque sou de oposição. Isso está me prejudicando eleitoralmente, porque meus prefeitos dizem que consegui pouco dinheiro para eles", diz Bonifácio.
Aliados recebem mais verba do que oposição
Segundo levantamento do Estadão, parlamentares dos partidos aliados ao presidente Lula conseguiram liberar pelo menos R$ 1,5 bilhão de emendas ao orçamento desde 2003, o que representa 62% do total que apresentaram. Esse índice é quase duas vezes maior que o registrado pela oposição, onde também se destacam como beneficiários os parlamentares que geralmente votam com o governo.
É o caso do deputado Lael Varela (PFL-MG), famoso entre seus colegas por seguir a orientação do governo de plantão, destaca o repórter Sérgio Gobetti. Entre 2003 e 2006, o deputado, que faz emendas para uma fundação que controla em Muriaé, obteve R$ 9,84 milhões – maior valor individual no PFL. Varela quase foi expulso do partido, em 2004, por ter ajudado o governo a derrubar na Câmara o reajuste do salário mínimo que a oposição havia conseguido emplacar no Senado.
"Quem vota a favor do governo, mesmo sendo da oposição, recebe tratamento especial do governo. Isso caracteriza o balcão do fisiologismo, que não foi só o mensalão", diz o deputado Pauderney Avelino (PFL-AM) ao Estadão.
O subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil, Marcos Lima, nega que na liberação de emendas o governo dê preferência para quem vota a seu favor. "Nós não distinguimos entre base de apoio e oposição. Emenda não compra voto, mas o não pagamento delas cria muita tensão", diz Lima. Segundo ele, os deputados mais experientes têm maior chance de liberar recursos porque apresentam emendas dirigidas para áreas mais necessitadas ou privilegiadas pelo próprio governo.
É o caso do saneamento, que recebeu prioridade no ano passado, ou da saúde, que todo ano tem um limite mínimo de gasto. "Quem sabe as prioridades do governo se dá melhor", argumenta, mostrando que os líderes na Câmara do PSDB, Jutahy Magalhães (BA), e do PFL, Rodrigo Maia (RJ), estão na lista dos 50 maiores beneficiários.
Na prática, a influência pessoal é decisiva para obter liberação de emendas. Tanto que no PT o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (SP) é o mais bem atendido, com R$ 7,48 milhões, seguido do ex-relator do orçamento Carlito Merss (SC), com R$ 7,44 milhões.
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