Renata Camargo
CONGRESSO EM FOCO – Por que o senhor decidiu não se candidatar nas próximas eleições?
FERNANDO CORUJA – Não estou com muita vontade de disputar uma nova eleição porque estou sentindo que o nosso mandato está um pouco inútil. Ele não está dando resultado, e mesmo a ação parlamentar não dá mais tanto prazer. Dá mais dissabor do que prazer. Então, ficar numa atividade em que você não se sente útil e está sentindo menos prazer do que sabor, é melhor dar uma parada.
O senhor está em seu terceiro mandato. Esse sentimento é de agora ou já vem de outras legislaturas?
É um sentimento crescente na política. A importância do poder político tem diminuído muito. O poder político, de maneira geral, tem se tornado cada vez menos importante na sociedade. E o poder político do Legislativo ainda mais. Isso faz a gente começar a refletir. Deu-se muito espaço ao poder econômico, e as discussões dentro do Legislativo não são discussões que tratam mais de política, de prioridades, de educação, de saúde. Elas se resumem muito a discutir para onde vai o dinheiro. Aí, é uma discussão que começa a ter muitos interesses, e são interesses que não são populares. Daí, você começa a se sentir um pouco inútil. Mas não estou cansado nem desgostoso. É uma reflexão mais racional. Eu teria energia para um novo mandato, porque eu faço muita coisa. Durante o mandato, eu fiz mestrado e doutorado em Direito e continuei trabalhando no consultório médico. Mas acho que sou mais útil em outra atividade. Não é porque estou cansado.
O senhor fala que está se sentindo inútil. Por quê?
Inútil para mudar a sociedade, para melhorar a sociedade, avançar. Enfim, fazer alguma coisa que tenha importância. Tem hora que você cansa de discutir só requerimento para convocar e requerimento para retirar de pauta uma convocação. Isso tem algum deleite, mas não leva a muita coisa. Você pode gastar energia em uma atividade mais importante. Acho que o poder político é importante. Também não estou saindo da política. Eu só não vou disputar esse mandato. Eu posso disputar um próximo mandato ou outro cargo. Posso ou não.
Nesta reflexão, o que o senhor avalia sobre o papel do Legislativo nesse processo?
O Poder Legislativo, do ponto de vista da compreensão histórica, já se sabe que ele enfraqueceu. Até com razão, porque aquela supremacia do Legislativo, que se tinha com as primeiras constituições, deu lugar à supremacia da Constituição. A Constituição é hoje mais importante, o que fortalece o papel do Judiciário. O que é um processo natural, que fortalece a sociedade. Não estou dizendo que o Legislativo tem que voltar a ser o que era. Pela natureza dele, ele está frágil. É outro momento histórico. A supremacia da Constituição desloca o eixo de força para o poder Judiciário e para o Executivo, que tem a capacidade de dispor dos orçamentos. O papel do Legislativo, mesmo aquele papel tradicional de fiscalizar e elaborar leis, está sendo substituído muito pela imprensa, pela organização da sociedade. A imprensa hoje tem sido mais capaz de fiscalizar do que o Legislativo.
A interferência de outros poderes no Legislativo – com excesso de envio de MPs ao Congresso ou mesmo o Supremo editando normas – tem contribuído para reduzir o papel do Legislativo?
Acho que isso é da natureza dos poderes. Hoje, estamos em outro momento, o poder Legislativo tem que dar poder a outros. O principal papel do Legislativo hoje não é legislar nem fiscalizar, é estar aberto para a população. É um local onde o povo consegue externar sua indignação. É uma estrutura que permite a abertura popular, que dá voz à sociedade. E, nesse sentido, o Legislativo é mais importante do que a própria imprensa. A imprensa seleciona quem ela ouve. A questão é que o Legislativo diminuiu muito a sua capacidade de intervenção nos problemas. O Congresso não consegue fazer uma CPI, não consegue aprovar um requerimento para convocar um ministro. Quando convoca vem outros e aprovam um requerimento para desconvocar. Há um processo brutal de maiorias esmagando as minorias. Você percebe que a tua energia pode ser gasta com outras coisas.
O que o senhor quer dizer com “processo brutal de maiorias”?
Existe uma capacidade muito grande dos Executivos no sentido de cooptar, não só no Congresso, mas em assembléias legislativas, câmara de vereadores. Todas elas, o Executivo coopta. Uma espécie de reação a isso foi a decisão sobre fidelidade partidária. Eu, por exemplo, não concordo muito com esse instrumento, mas acaba sendo um mal necessário para coibir outro mal. É tanta cooptação que é preciso ter uma obrigação de fidelidade partidária para evitar que todo mundo mude para a base do governo. As maiorias obstruem e não deixam que nada ande. Você instala a CPI, por exemplo, mas a maioria impede convocação, impede que se aprove um requerimento. Depois daquela CPI dos Correios, nada andou.
O que o senhor pretende fazer quando terminar o mandato?
Vou continuar a minha atividade de médico. Nunca larguei a atividade médica. Atendo toda a sexta, sábado, domingo e segunda. Isso foi uma coisa que desde o começo coloquei na minha cabeça. Para poder sair da política, você precisa ter alguma segurança profissional. Eu também dou aulas na universidade.
Para os que pretendem entrar na política, que recado que o senhor daria?
Todo mundo quando entra na política entra com uma espécie de visão ideal. E se deve entrar com essa visão. Mas deve-se tomar cuidado na caminhada exatamente para não perder isso. Todo principiante tem uma visão mais idealista. Tem que tomar cuidado para não perder esse idealismo. Se acha que vai perder, então é melhor sair.
O senhor perdeu a sua visão idealista?
Não, não perdi. O que eu digo é que você tem que tomar cuidado para não começar a se influenciar por outros caminhos. A política é cheia de rolo e confusão, se você começar a se meter nisso, você pode perder esse idealismo.
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