O ministro Edson Fachin, relator da ação direta de inconstitucionalidade que define se o Supremo Tribunal Federal (STF) pode afastar ou determinar medidas diversas de prisão a parlamentares sem a confirmação da Câmara ou do Senado, afirmou, nesta quarta-feira (11) que a Constituição atribuiu a Câmara e ao Senado a competência para decidir sobre prisão de parlamentar, no exercício do mandato, ocorrida apenas em flagrante. “A Constituição Federal se refere, inequivocamente, à prisão em flagrante”, ressaltou.
O ministro votou para que o tribunal possa afastar parlamentares, suspendendo-os do mandato, e impor outras medidas cautelares diferentes da prisão sem precisar de aval do Legislativo. Para Fachin, não se pode criar um estado de “inimputabilidade dos parlamentares” e as cautelares devem ser usadas para evitar que novos crimes sejam cometidos, além de garantir investigações sem que os congressistas as atrapalhem.
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Em seu voto, o magistrado destacou a impossibilidade de um chamado “abuso da imunidade parlamentar”. Frisou que existe, sim, o “princípio republicano” previsto na Constituição segundo o qual todos são iguais perante a lei. Neste julgamento, os 11 ministros do STF decidirão se a Casa Legislativa à qual pertence o parlamentar que seja alvo das medidas cautelares pode ou não avalizar suas decisões.
De acordo com Fachin, a imunidade parlamentar não deve ser confundida com impunidade. Ele explicou ainda que há diferença entre a decretação da perda de mandato e a afastamento temporário. “A perda de mandato é medida drástica e irreversível, por isso o Constituinte condicionou a cassação ao crivo do legislativo”, ponderou. Após o voto do relator, o julgamento foi suspenso e será retomado às 13h30 da tarde desta quarta-feira (11), com os votos dos demais ministros.
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Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5526/2016 foi proposta pelos partidos políticos PP, PSC e Solidariedade. Na ação, as siglas defendem que o Congresso decida, em 24 horas, se é cabível ou não a medida judicial aplicada contra um parlamentar. O objetivo é evitar que o Supremo aplique medidas cautelares contra deputados e senadores, exceto a prisão em flagrante por crime inafiançável, já previsto na Constituição Federal.
PublicidadeRetirado providencialmente da gaveta, esse julgamento definirá a situação do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que teve seu afastamento e recolhimento domiciliar noturno determinados pela Primeira Turma do tribunal em 26 de setembro. No Senado, os parlamentares logo se articularam para tentar reverter a decisão do Supremo, mas adiaram uma decisão sobre o caso Aécio para aguardar o julgamento de hoje (quarta-feira, 11). A rebelião no Senado após a decisão do Supremo sobre o tucano foi conduzida pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), recordista de investigações no Supremo e campeão de citações na Operação Lava Jato.
Durante seu voto, Fachin citou o caso do afastamento do então deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em maio de 2016. Nesta ação, o relator era Teori Zavascki, morto em fevereiro deste ano. A Ação Cautelar 4070 permitiu o afastamento por se tratar de situações “excepcionais”. Nesta ação, o STF manifestou-se pela primeira vez sobre o tema e admitiu o afastamento preventivo do exercício do mandato.
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“Respeito ao povo”
Durante as apresentações das defesas, primeiro a falar, o advogado Aristides Junqueira, que representa o PP, afirmou que o aval do Congresso não se tratava “de impunidade, mas de respeito ao voto do povo”, além de “manter a harmonia dos poderes”. Para o advogado, o mandato popular deve ser preservado sempre, não se podendo afastar o parlamentar como se a função e profissão dele fosse a de um “comum dos mortais”. Ele defendeu que a única prisão de parlamentar permitida pela Constituição é a em flagrante, não podendo ser substituída por prisão cautelar.
Representando o Senado, o advogado Hugo Souto Kalil começou sua defesa fazendo um questionamento: “Podem ser aplicadas medidas cautelares de natureza penal aos parlamentares sem autorização da Constituição?”. Diante da sua própria indagação, ele respondeu que não. Para Kalil, a imunidade funciona como garantia de defesa institucional de um Legislativo independente e livre. Ele afirmou que o Senado não é maior que o Supremo, nem o contrário, e “todos devem obediência à Constituição”.
Pela Câmara, falou o deputado pelo PV de São Paulo e advogado Evandro Gussi. De acordo com ele, os mandatos parlamentares, apesar de todos os problemas, sempre foram os “garantidores últimos da liberdade humana”. “Não se pode dizer que o constituinte de 1988 errou, e que certos estavam os constituintes de 1969. É proteção do parlamentar intocável”, defendeu.
A advogada-geral da União, Grace Mendonça, que comanda órgão que deu posições antagônicas sobre o tema, falou pelo presidente Michel Temer (PMDB). Ela criticou o recolhimento noturno, alegando que muitas das atividades parlamentares ocorrem à noite, e defendeu que a regra concebida pelo legislador é a não prisão do parlamentar. “Não é privilégio. Imunidade parlamentar preserva o poder Legislativo”, alegou.