Rafaela Céo
Uma semana após a invasão da Câmara por manifestantes sem-terra, o Congresso viverá hoje uma terça-feira, no mínimo, inusitada. Por causa da estréia do Brasil na Copa da Alemanha, as sessões deliberativas foram antecipadas para a parte da manhã e as comissões praticamente suspenderam suas atividades. Os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), dispensarão seus times às 14h, duas horas antes do confronto do Brasil com a Croácia.
O trabalho só será retomado na quarta-feira, véspera do feriado de Corpus Christi, também em horário diferenciado. Para evitar o mais provável, ou seja, que toda a semana seja perdida, Renan e Aldo anunciaram que vão punir os parlamentares faltosos pela parte mais sensível: o bolso, com o corte do ponto.
O horário especial de hoje vale também para os servidores das duas Casas. Eles trabalham em esquema de horário corrido, das 8h30 às 14h. Apenas profissionais responsáveis por serviços essenciais, como segurança e informática, terão que trabalhar durante a estréia. Esses terão que se contentar com televisores improvisados.
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"Vamos votar as medidas provisórias e, a partir das 14 horas, todos estaremos dispensados para torcer pelo Brasil. Estou mesmo disposto a cortar o ponto dos senadores faltosos, o que o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, já anunciou que fará em relação aos deputados que não comparecerem à sessão deliberativa da Casa", alertou o senador.
Mensaleiro na marca do pênalti
A votação das MPs não é o único assunto importante do dia. O Conselho de Ética marcou para as 10h a votação do parecer do deputado Jairo Carneiro (PFL-BA) que pede a cassação do mandato do ex-líder do PP José Janene (PR), o último dos mensaleiros a ser julgado pela Casa. O deputado paranaense é acusado de ter recebido R$ 4,1 milhões do valerioduto e tem travado uma batalha no Supremo Tribunal Federal (STF) e na própria Câmara para escapar do julgamento.
Além do Conselho de Ética, apenas outras três comissões marcaram reunião para esta terça-feira: Constituição e Justiça e de Cidadania; Especial da Lei da Adoção e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática.
No Senado, apenas duas comissões se reúnem. Às 9h30, a Comissão de Assuntos Econômicos ouve as explicações do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, a respeito das decisões do Copom sobre taxas de juros. Pouco depois, às 10h, os integrantes da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle se encontram para votar quatro proposições.
Tirando o time de campo
Mas o quorum de ontem sinaliza a dificuldade que os presidentes da Câmara e do Senado terão hoje para colocar seus jogadores em campo. Segundo informações da secretaria-geral da Mesa da Câmara, apenas três deputados estavam presentes na abertura da sessão de debates dessa segunda-feira. Há uma semana, 16 parlamentares estavam no plenário.
No Senado a situação não foi diferente. Apesar de a secretaria da Mesa não controlar o número de parlamentares que comparecem às sessões não deliberativas, o efeito Copa do Mundo tirou dos gramados o capitão do time. O senador Renan Calheiros deixou a Casa mais cedo para assistir do conforto do seu lar ao confronto entre Itália e Gana, no meio da tarde.
Embolando o meio-campo
Dois itens trancam a pauta do Senado. A partir das 10h, os senadores devem examinar o Projeto de Lei de Conversão 14/06, que permite ao empregador doméstico deduzir do Imposto de Renda Pessoa Física o valor da contribuição previdenciária paga sobre um salário mínimo e o 13º salário. Está em pauta também a MP 286/06, que abre crédito extraordinário em favor dos Ministérios da Justiça, da Previdência Social e do Esporte, no valor global de R$ 250,5 milhões.
Já na Câmara três MPs têm prioridade na sessão marcada para as 9h. A MP 285/06, que trata da renegociação de dívidas rurais dos agricultores; a MP 291/06, que autoriza o reajuste de 5% nos benefícios previdenciários dos segurados que ganham mais de um salário mínimo, e a MP 202/06, que modifica dispositivos legais relacionados aos imóveis da União.
Torcida animada
O clima da Copa não contagiou apenas ao parlamentares. Os funcionários do anexo IV da Câmara, prédio onde fica a maioria dos gabinetes dos deputados, por exemplo, se organizaram para enfeitar cada um dos 10 andares do edifício. E fazem questão de esclarecer que tudo foi bancado por eles mesmos. "Não recebemos dinheiro da Câmara. Cada um de nós deu R$ 3 para uma outra funcionária deste andar que se disponibilizou a comprar os enfeites e colocá-los", diz uma funcionária do gabinete do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS).
Alguns gabinetes, como os dos deputados Leonardo Tiscoski (PP-SC), Inaldo Leitão (PL-PB) e Deley (PSC-RJ), têm decoração própria. Nas salas, o clima é de festa e otimismo. E todos têm um palpite para o jogo de jogo de hoje: o Brasil fará três gols no jogo contra a Croácia. A dúvida é se os croatas também vão mandar a bola para a rede.
O placar até que se discute. Mas não há hesitação quando o que está em jogo é gosto do brasileiro pela Copa. "Não é só a Câmara que só pensa na copa. É todo mundo", diz a chefe do gabinete do deputado Pastor Reinaldo (PTB-RS), Damares Alves. Ela e outros três funcionários do gabinete são responsáveis pela decoração que mais chama atenção no anexo IV. Além da bandeira verde-amarela que toma conta da porta da sala, eles prepararam um arco de balões que emoldura a frase: "Para essa seleção a gente tira o chapéu". E quem discorda?