A convenção do PSDB que oficializou ontem a candidatura de José Serra ao governo de São Paulo transformou-se em um ato de desagravo ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Segundo o tucano, seu sucessor no Planalto só o vence em três quesitos: corrupção, escândalos e publicidade. No último sábado, durante o lançamento de sua candidatura à reeleição, Lula desafiou os tucanos ao dizer que, em três anos e meio, fez mais do que FHC fez em oito.
Fernando Henrique retrucou: "Eu quero a comparação do meu governo com o governo atual. Eu quero, e vou dizer por quê. Teve coisas que eles fizeram mais do que nós: muita corrupção, os escândalos, aí ganharam. Também gastaram muito. É muita publicidade, é muita propaganda, é muita palavra para encobrir o nada. Aí, ganharam", afirmou, em discurso ontem.
O ex-presidente retornou de uma viagem à Itália ainda pela manhã e foi informado do conteúdo do discurso de Lula, feito na convenção nacional petista em Brasília anteontem. Em reunião no diretório estadual do PSDB, antes de chegar à Assembléia, FHC conclamou o partido a reagir. Ao final da festa, resumiu seu sentimento: "Chega, alguém tem que dizer a verdade".
Leia também
"Agora, ainda ontem (anteontem), o presidente outra vez veio dizer "vamos esperar a palavra final da Justiça, enquanto ela não vem, somos todos iguais". Eu não. Eu não sou igual a essa gente, não. Nós não somos iguais", afirmou FHC.
Em seguida, o ex-presidente passou a fazer comparações pontuais, começando pela área de energia. "Vamos falar de uma área que eles gostam de falar. Qual foi a usina feita por eles que não tivesse sido começada por nós?", perguntou. "(Eles) estão cacarejando sobre os ovos postos por outros", atacou o ex-presidente. "Não temos medo de comparação. Venham com qualquer tema. Chega de bazófia, de garganta. E esse presidente fala muito e, quando tem de fazer, deixa para os outros".
Sobre a agricultura, disse que Lula se aproveitou da situação deixada por seu governo, mas deu um passo atrás nas questões sanitária e cambial. "Deixaram o câmbio valorizar demais. Não tiveram interesse em proteger aquilo que foi a âncora verde do Real, que é a produção agrícola. Agora, se gabam que estão exportando. Sim, é bom que exportem. O Brasil precisa exportar. Por que estão exportando? Porque nós acertamos as bases para a produção."
O ex-presidente ressaltou a paternidade de seu governo em programas sociais, como o Bolsa Escola e o Vale-Gás, unificados no Bolsa-Família, carro-chefe de Lula na área social. "Eles juntaram tudo isso e aumentaram", disse. Na educação, FHC citou o Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério). "Quem inventou isso? Foi o PT? Não, o PT votou contra."
Mas a crítica pontual mais aguda ficou para a economia: "É uma vergonha que em um mundo nas condições de hoje, bem diferentes das do meu tempo, o Brasil não tenha aproveitado a onda para crescer mais. Falavam e ameaçavam. Mesma coisa: 2,6% (média de crescimento do PIB no primeiro mandato de FHC). Eu, com quatro crises financeiras, e eles com um "boom" econômico no mundo todo. Incompetentes."
Primeiro a discursar após FHC, Alckmin fez a defesa dos tucanos, chamados de "vozes do atraso" por Lula. "O Fundeb (fundo para o ensino básico), ficou só na propaganda, como não existe a transposição do São Francisco, como não existe a Transnordestina, como não existe o Fome Zero, como não existe o Meu Primeiro Emprego, como não existe o Banco Popular. O que existe é a mentira reiterada", disse sobre Lula.
Serra também não deixou de defender o legado de FHC, de quem foi ministro: "Tucano não gosta de lama, não tem nenhuma identidade com pântano, tucano voa", disse. Estrela do dia, o ex-prefeito até separou parte de seu discurso de quase 30 minutos para fazer promessas de campanha. Disse que, se eleito, vai buscar a redução de impostos estaduais e priorizar as áreas da educação e segurança no seu governo. Mas o ato de encerramento da convenção, que coincidiu com o aniversário de 18 anos de fundação do PSDB, teve novos ataques contra Lula, acusado por Serra de ter "duas caras".
"Somos hoje o que fomos ontem. Não temos do que nos envergonhar. Nunca vendemos esperanças para entregar ilusões. Não mudamos de lado, de cor, de cara. Dizem que sou mal-humorado. Pode até ser, mas tenho uma vantagem: só tenho uma cara", discursou o ex-prefeito de São Paulo.
Na seqüência, Serra afirmou que os discursos do PT seriam falsos como uma nota de R$ 3. "Os petistas, os vestais do templo da moralidade, defendem-se das acusações dizendo que todos os políticos são iguais. Isso é falso como nota de R$ 3. Nunca confundimos governo e partido. Nossa escala de valores é outra."